Editora: InterSaberes
ISBN: 978-85-8212-465-9
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 96
Sinopse: É comum ouvir nos meios educacionais,
sobretudo entre os alunos, expressões como: “Aquele professor não tem didática…”
ou “ele tem conhecimento, mas não sabe comunicar…”. Tais enunciados revelam a
importância da didática na formação do professor e a exigência dos alunos na
busca do conhecimento. Ao propor um estudo sobre didática, Pura Lúcia Oliver
Martins avalia o processo de ensino atual com o objetivo de fornecer ao
professor condições de refletir sobre sua prática pedagógica. Afinal, seu
aprimoramento profissional faz com que o aluno também evolua. Com esta obra, os
leitores compreenderão que a tarefa de buscar práticas pedagógicas consistentes
e coerentes com as necessidades atuais pode até ser difícil, mas é
proporcionalmente fascinante e recompensadora para o professor e todos aqueles
que estão envolvidos no processo de ensino-aprendizagem. Afinal, Didática não
trata apenas de educação. Trata da arte de ensinar.
“O documento final
do I Seminário A Didática em Questão (1984, p. 111-114), segundo Vera
Maria Candau, destaca a necessidade de se rever o ensino de didática, que em
geral se constituía em
dissociação entre a didática que é
vivenciada, inclusive nas aulas de didática, e o discurso sobre o que deveria
ser a própria prática. [...] É necessário rever essa postura: partir da prática
pedagógica, procurando refletir e analisar as diferentes teorias em confronto
com ela. Trata-se de trabalhar continuamente a relação teoria-prática
procurando, inclusive, reconstruir a própria teoria a partir da prática.”
“Explica José
Carlos Libâneo (Democratização da escola pública, 1985, p. 127-128); “A
pedagogia crítico-social dos conteúdos valoriza a instrução enquanto domínio do
saber sistematizado e os meios de ensino, enquanto processo de desenvolvimento
das capacidades cognitivas dos alunos e viabilização da atividade de transmissão/assimilação
ativa de conhecimentos”.
Para esses grupos,
o elemento central está calcado na concepção segundo a qual a aprendizagem se
faz fundamentalmente a partir do domínio da teoria. A prática, pois, decorre da
teoria. Daí a importância do racional, do cognitivo, do pensamento. Nessa
concepção, a ação prática é guiada pela teoria; valoriza-se o pensamento sobre
a ação.
As propostas de
uma pedagogia crítica originadas desses grupos acentuam a importância de
estimular uma consciência crítica e uma ação transformadora pela
transmissão-assimilação ativa de conteúdos críticos, articulados aos interesses
da maioria da população. Entende-se que uma formação teórica crítica sólida
garantirá uma prática consequente.”
“Nas palavras de
Oder José dos Santos (Pedagogia dos conflitos sociais, 1992, p. 130), “a
compreensão da realidade social decorre não da assimilação resultante da
transmissão de 'bons conteúdos', mas sim da prática sobre essa realidade
social. É a teoria que é a expressão da prática; e são tantas práticas... É
este o papel do conhecimento; ele é meio, não se constitui em objetivo em si
mesmo”.
Nas propostas
desses grupos, o elemento central é a ação prática — uma ação prática material
e social determinante do processo. Alteram-se as formas de agir, de pensar, de
sentir a própria situação escolar. Valorizam-se a prática dos alunos e os
problemas postos por essa prática. As propostas de uma pedagogia crítica desses
grupos deixam de cingir-se transmissão-assimilação de conteúdos, ainda que
críticos e valorizam o próprio processo de fazer como elemento educativo,
Nas palavras de
Pura Lúcia Oliver Martins (Didática teoria/didática prática, 2006),
Um dos pontos-chave da nova proposta
pedagógica encontra-se na alteração do processo de ensino e não apenas na
alteração do discurso a respeito dele. [...] não basta transmitir ao futuro
professor um conteúdo mais crítico, [...] é preciso romper com o eixo da
transmissão-assimilação em que se distribui saber sistematizado falando sobre
ele. Não se trata de falar sobre, mas de vivenciar e refletir com.
E acrescenta a
autora: “Aquilo que é vivenciado e analisado provoca mudanças mais profundas do
que aquilo que é apenas ouvido, no plano do discurso. No fazer, gera-se o
saber”.”
“Nesse momento
histórico, segundo Oder José dos Santos (Eméritos e Pioneiros, 2005)
assistimos à reestruturação do capitalismo:
As novas formas de organização dos processos
de trabalho […] tendem a colocar, para segundo plano, a exploração do
componente manual do trabalho e passa a priorizar o intelectual. As novas
formas de exploração e controle da força de trabalho exigem um novo tipo de
trabalhador, uma vez que a produtividade repousa cada vez mais na utilização do
trabalho complexo.
Com efeito,
torna-se fundamental que a escola prepare um trabalhador intelectualmente
ativo, criativo, produtivo e, para tal, volta-se a discutir a importância de
centrar o fazer e as práticas de interação entre professores e alunos no aprender a aprender.”
“Para compreender
a razão de ser das formas e das práticas de interação entre professores e
alunos assumidas em uma determinada teoria pedagógica, é preciso entender que
esta é produzida socialmente a partir de determinadas circunstâncias
históricas, as quais estabelecem tipos de relações sociais que vão forjar
tecnologias específicas a serem utilizadas por meio da relação pedagógica.
Própria da escola capitalista, essa relação se constituiu na materialização das
relações sociais básicas do modo de produção que a sustenta.
Segundo Ilma
Passos Alencastro Veiga (Conhecimento local e conhecimento universal,
2004, p. 15), intencionalidade educativa está presente no processo de ensino e
é indicadora das concepções de quem a propõe”. Essa intencionalidade define o caminho (método) a ser percorrido e os
veículos através dos quais esse caminho será percorrido (técnicas).”
“No final do
século XX, sobretudo no final dos anos 1970 e princípio dos anos 1980, ocorre
uma mudança de paradigma decorrente dos movimentos sociais. Nesse período, no
âmbito da didática, o próprio processo de fazer (a forma) passa a ser
considerado fundamental como elemento educativo. (...)
Essa abordagem
pauta-se na concepção de homem concreto, síntese de múltiplas determinações,
sujeito histórico, situado num contexto sociocultural e afirma-se na
ação-reflexão-ação. O mundo é concreto, construído pelo homem nas relações
sociais de produção dos meios materiais de subsistência. A educação é um
processo histórico, global e dialético de compreensão da realidade, tendo em
vista a sua transformação. A escola é um espaço onde se desenvolve um processo
de ação-reflexão-ação comprometido com ações transformadoras. Nessa
perspectiva, a ênfase do processo desloca-se para a práxis social e a questão central está na relação dialética da compreensão — transformação.
Nessa abordagem, a
interação entre professor e alunos se dá pela atuação do professor como
mediador entre o saber sistematizado e a prática social de ambos. O aluno é
considerado um ser histórico, sujeito do processo portador de uma prática
social a ser problematizada e sistematizada coletivamente. Assim, o centro do
processo não está nem no professor, como na abordagem da
transmissão-assimilação, nem no aluno, como na abordagem do aprender a aprender,
nem no planejamento, como na abordagem do aprender a fazer. O centro do
processo desloca-se para a práxis social
de ambos.”
“As formas e as
práticas de interação entre professores e alunos nas perspectivas da transmissão-assimilação,
do aprender a aprender, do aprender a fazer, da sistematização coletiva do
conhecimento expressam diferentes contextos históricos e indicam várias
possibilidades de organização do ensino tanto pelo professor como pela escola.
Assim, ao planejar o ensino, é preciso que o professor faça uma opção pelo
caminho que pretende percorrer (método). Isso favorece a escolha dos
procedimentos (técnicas) mais adequados para alcançar os objetivos propostos.”
QUADRO 5 – OBJETIVOS DE ENSINO
EM DIFERENTES ABORDAGENS
Abordagem |
Definição de objetivos |
Transmissão-assimilação |
- Preparação
intelectual e moral (disciplinar a mente e formar hábitos). - Imprimir um
modelo adequado à sociedade; - Desenvolver o
domínio da arte e da prática da retórica; - Difundir a
cultura; - Estimular a
competição, - Teórico e
remoto, desvinculado da vida presente e futura. |
Aprender a aprender |
- Desenvolver a
liberdade e a autonomia da criança; - Desenvolver as
habilidades latentes na criança; - Estimular a
cooperação; - Respeitar a
individualidade da criança adequando as necessidades individuais ao mero
social; - A definição
dos objetivos constitui fator decisivo, dinamizar dá sentido e direção ao
trabalho escolar. |
Aprender a fazer |
- Reordenar o
processo educativo, tornando-o objetivo e operacional; - Treinar o
aluno para executar as múltiplas tarefas demandadas pelo sistema; - Elaborado por
especialistas, sem a participação direta do professor; - Descrever as
competências e as habilidades a serem desenvolvidas nos alunos, de forma
operacional. |
Sistematização coletiva do conhecimento |
- Preparar
homens polivalentes, desenvolvidos em todos os sentidos; - Desenvolver um
processo de educação aprendido no e pelo trabalho; - Relação
dialética compreensão-transformação; - Elaborados de
forma coletiva, a partir da caracterização e da problematização da prática
social de alunos e professor. |
QUADRO 6 – SELEÇÃO E
ORGANIZAÇÃO DE CONTEÚDOS EM DIFERENTES ABORDAGENS
Abordagem |
Seleção e organização de conteúdos |
Transmissão-assimilação |
- Científico e
dogmático. Concebe conhecimento como produto. - Distanciado da
experiência do aluno e das realidades sociais. - Enciclopédico
intelectualista, acumulativo quantitativo. “Todo o acervo acumulado pela
humanidade”. - Seleção e
organização obedecem a uma ordenação rigorosamente lógica. |
Aprender a aprender |
- Vinculados aos
interesses e às necessidades do aluno de acordo com o seu estágio de
desenvolvimento. - Concebe
conhecimento como processo. Dá maior valor aos processos mentais e habilidades
do que a conteúdos organizados racionalmente. - A seleção e a
organização obedecem a uma ordenação psicológica. |
Aprender a fazer |
- Organização
sistêmica, voltada para a integração horizontal e vertical dos conteúdos. - Em termos de conhecimento
organizado, dilui-se nos objetivos operacionais. -
Compartimentado e atomizado. Produtos específicos e operacionais. |
Sistematização coletiva do conhecimento |
- Vinculado à
prática dos alunos e determinado por ela. - Organiza-se a
partir da problematização da prática social dos agentes do processo
(professor-aluno). - Voltado para
mediatizar a compreensão dos problemas postos pela prática social. - Concebe conhecimento
como um processo de produção e sistematização coletiva a partir da
caracterização e da problematização da prática social dos envolvidos no
processo. |
QUADRO 7 – MÉTODO DE ENSINO EM
DIFERENTES ABORDAGENS
Abordagem |
Método |
Transmissão-assimilação |
Ênfase —
transmissão de conteúdo Questão central
— aprender o conteúdo Centro do
processo — professor |
Aprender a aprender |
Ênfase —
redescoberta do conhecimento Questão central
— aprender o método de aprender Centro do
processo — aluno |
Aprender a fazer |
Ênfase —
obtenção de produtos específicos Questão central
— aprender a fazer Centro do
processo — planejamento |
Sistematização coletiva do conhecimento |
Ênfase — práxis
social Questão central
— compreender / transformar Centro do
processo — prática social (de
alunos e professor) |
QUADRO 8 – MÉTODO DE ENSINO EM
DIFERENTES ABORDAGENS
Abordagem |
Método |
Transmissão-assimilação |
- Restringe-se à
evocação dos conhecimentos memorizados. - Feita por meio
de interrogatórios orais, provas e trabalhos escritos. - Envolve uma
vigilância rigorosa e constante sobre a disciplina do aluno. |
Aprender a aprender |
A avaliação
formal (escrita, oral) perde o seu sentido e dá lugar à autoavaliação e à
observação do comportamento do aluno pelo professor. |
Aprender a fazer |
- Torna-se
importante o padrão de competência e habilidade individual do aluno. - Previamente
estabelecida uma equipe de programadores - A avaliação
faz por meio de testes objetivos tendo em vista a aquisição das habilidades e
das competências. |
Sistematização coletiva do conhecimento |
- A avaliação se
faz pela reflexão coletiva do grupo de alunos e professor, tendo como
critério o avanço na capacidade de reflexão crítica e proposição de
alternativas. |
“O movimento
histórico do final do século XX provocou uma alteração na concepção de
conhecimento que dá um passo à frente em relação aos modelos anteriores.
Trata-se de um processo didático pautado numa concepção de conhecimento que tem
a prática como elemento básico, fazendo a mediação entre a realidade e o
pensamento. Nessa concepção, a teoria não é entendida como verdade que vai
guiar a ação prática, mas como expressão de uma relação, de uma ação sobre a
realidade, que pode indicar caminhos para novas práticas, nunca guiá-las. Desse
princípio básico, delineia-se um modelo aberto de didática que, de acordo com
Pura Lúcia Oliver Martins (op. cit., 2006), vai além de “compreender o
processo de ensino em suas múltiplas determinações para intervir nele e
reorientá-lo na direção política pretendida”, ela expressa a ação prática dos
professores, sendo uma forma de abrir caminhos possíveis para novas ações. Ao
se trabalhar com os professores problematizando e analisando suas práticas,
está se produzindo um novo conhecimento, o qual não vai constituir-se num guia
da ação prática, mas apontará possíveis formas de novas práticas. Esse é um
princípio fundamental para a didática.”
“Nessa nova forma
de entendimento das formas e práticas de interação entre professores, alunos e
conhecimento, um elemento fundamental é a questão do individual nesse processo
coletivo. Este, ao mesmo tempo em que incentiva o trabalho coletivo, considera
a individualidade dos agentes, que, em função da sua experiência pessoal, da
sua prática “individual”, constituem um campo ideológico individual e têm
condições de criar, de produzir, enfim, de se colocar enquanto agentes (ator e
autor) do processo e do conhecimento deles resultantes. Deixam de ser um
elemento receptivo e passam a ter uma atitude ativa, garantindo, assim, a sua
individualidade. O processo considera o campo ideológico individual do sujeito
e favorece o seu desenvolvimento em função daquilo que ele é, e não daquilo que
os outros querem que ele seja.
Esses princípios didáticos apontam para um
modelo aberto de didática em busca de novas práticas: ultrapassa a transmissão
do conhecimento, colocando pesquisa-ensino como unidade; amplia as relações
sociais coletivas e solidárias, redefinindo o entendimento das formas de
interação professor-alunos no ensino; considera a importância do individual nos
processos coletivos de ensinar.”
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