terça-feira, 26 de janeiro de 2021

O mundo das Copas (Parte II), de Lycio Velloso Ribas

Editora: Lua de papel

ISBN: 978-85-6306-609-1

Opinião: ★★★★☆

Páginas: 588

Sinopse: Parte I



1962 – Local: Chile Campeão: Brasil

 

– Dois anos antes da Copa, dois terremotos (um possivelmente atingiu 8,5 graus na escala Richter – o que o colocava como o mais violento já registrado no mundo até então) destruíram o Chile, afetando mais de 400 mil quilômetros quadrados e deixando 25% de sua população desabrigada. Cogitou-se em mudar o lugar do mundial, porém, o carismático brasileiro naturalizado chileno Carlos Dittborn Pinto, presidente da confederação sul-americana de futebol, que já havia conquistado a sede da Copa para o seu país devido ao grande carisma que possuía, convenceu os dirigentes da Fifa em manter a Copa no Chile. Um de seus argumentos que ficaram famosos foi uma frase a respeito do esforço de reconstrução que o Chile deveria fazer para organizar o mundial: “Porque não temos nada, faremos tudo!”.

 

– As seleções da Itália e Espanha pagaram para terem jogadores de outras origens em seus times. A seleção italiana naturalizava os que tinham ao menos um sobrenome italiano. A azurra comprou os argentinos Maschio e Sivori, além dos brasileiros Sormani e Mazzola – este jogou a Copa de 58 pelo Brasil e a de 62 pela Itália. A Espanha já não fazia distinção em haver sobrenome de seu país. Levou os craques veteranos Puskas, da Hungria, e Di Stéfano, da argentina. Também naturalizaram o paraguaio Eulogio Martinez e o uruguaio José Santamaría. A grande quantidade de origens dos seus jogadores fez com que a Espanha fosse apelidada de ONU F.C.

 

– O jogo de desempate deixou de valer como critério para decidir qual time seguiria quando eles terminavam com o mesmo número de pontos, já que este jogo extra desgastava as seleções e prejudicavam as que o faziam, pois não tinham tempo para se recuperarem antes das outras partidas. Passou a valer o gol average, a divisão dos gols marcados pelos gols sofridos, o que não é a mesma coisa que o saldo de gols. Por exemplo, se um time faz cinco gols e toma dois, fica com três de saldo. E outro faz três e toma um, fica com dois de saldo, o que classificaria o primeiro. Já no gol average, classificaria o último, pois 5/2 = 2,5 e 3/1 = 3.

 

– Nas eliminatórias a Holanda se recusou a deixar os alemães orientais ingressarem no país – o muro de Berlim havia sido construído há dois meses. Para evitar um incidente diplomático, a Fifa cancelou o jogo, já que nenhuma das duas seleções tinha mais chance de classificação.

 

– A União Soviética e a Iugoslávia decidiram a EuroCopa de 1960 num jogo com muita pancadaria, vencendo a URSS por 2 a 1. Na Copa, a URSS ganhava o jogo por 2 a 0 com o goleiro soviético Yashin fechando o gol. A cinco minutos do fim, o atacante iugoslavo Mujic sofreu um pênalti e o árbitro não marcou. O atacante revidou quebrando a perna direita do zagueiro soviético Dubinski em dois pontos, na tíbia e no perônio. O iugoslavo não foi expulso, mas não jogou mais na Copa – foi mandado embora pela sua própria delegação. As fraturas em Dubinski nunca regeneraram totalmente, o que inutilizou o soviético para o futebol para sempre. No local da pancada desenvolveu-se um sarcoma – uma espécie de câncer. A perna de Durbinski foi amputada para que o câncer não se espalhasse, mas isto não bastou e a doença o matou sete anos depois.

 

– O único gol olímpico marcado em Copas ocorreu na de 62, no empate de 4 a 4 de URSS e Colômbia, depois de uma falha do zagueiro soviético Chokeli, para desespero do goleiraço Yashin. Assim como a URSS, o destaque do time mexicano estava no gol, com o goleiro Carbajal.

 

– O craque argentino naturalizado espanhol Di Stéfano não pôde jogar, pois se recuperaria de uma lesão no meio do mundial, porém, a Espanha caiu logo na primeira fase e ele acabou nunca disputando uma partida de Copa do mundo.

 

– O jogo Chile e Itália foi tumultuado desde o começo, com os chilenos partindo pra cima do árbitro inglês Ken Aston, que perdeu o controle da partida. O chileno Toro deu um chute no italiano Mora, que foi vingado por Ferrini, porém, só este foi expulso, o que gerou grande confusão, carecendo da polícia entrar em campo para retirá-lo. Depois, o italiano Maschio acertou Leonel Sanchez e este revidou com um soco, quebrando o nariz do italiano. Nenhum dos dois foi punido, mas Sanchez acabou levando um chute no pescoço do italiano David – e este foi expulso. Com tanta confusão, o primeiro tempo terminou com 72 minutos, e a Itália, com dois jogadores a menos, perdeu por 2 a 0. O criticado árbitro Ken Aston veio a abandonar o futebol devido a uma lesão muscular – e não por causa do jogo. Anos depois, como diretor de arbitragem da Fifa, ele criou os cartões amarelo e vermelho.

 

– O Brasil só precisava de um empate com a Espanha, mas entrou nervoso – Pelé havia se machucado e não jogaria mais na Copa. Sufocado pela Espanha, levou um gol. E só não levou o segundo devido a uma ajuda da arbitragem. Nilton Santos derrubou Collar dentro da área, porém, deu um passo à frente saindo dela, induzindo o árbitro a marcar apenas falta. Na cobrança desta falta, Peiró marcou de bicicleta, porém, o juiz deu jogo perigoso – embora ele estivesse a um metro e meio do zagueiro brasileiro Zózimo. Reanimada, a seleção brasileira foi pra cima e o substituto de Pelé, Amarildo, fez dois gols. O Brasil passou e a Espanha estava fora. Comemorando, Pelé, vestido, abraçou seu substituto enquanto este ainda estava embaixo do chuveiro.

 

– O jogo Inglaterra e Brasil foi interrompido devido a invasão no campo por cachorros – cenas que ficaram famosas. O primeiro driblou até Garrincha, e só foi pego pelo zagueiro inglês Jimmy Greaves, que ficou de quatro e conseguiu se aproximar do cão. O segundo, depois de passear pelo campo, passou por debaixo do alambrado e desapareceu.

 

– Na semifinal Brasil 4 X 2 Chile, o árbitro anulou um gol legítimo de Vavá, além de marcar um duvidoso pênalti a favor dos anfitriões. No fim do jogo, expulsou o chileno Landa que fez dura falta em Zito. Garrincha, que apanhou o jogo inteiro, revidou em Rojas “Foi um pontapezinho da amizade”, disse o brasileiro depois, sobre o lance. Os chilenos reclamaram, e depois de consultar o bandeira, o árbitro expulsou Garrincha – o que tiraria o craque da final. Até Tancredo Neves, presidente do conselho de ministros do Brasil, intercedeu junto à Fifa para que o brasileiro pudesse jogar, argumentando que era a primeira falta do jogador na Copa e isto deveria contar em seu favor. Foi convocada uma reunião extraordinária na Fifa para tratar do caso, e o árbitro confirmou que não viu o lance – havia seguido o bandeira uruguaio Esteban Mariano. Mariano foi convocado a depor, mas havia deixado o Chile – acreditava-se, com destino a Montevidéu, mas ninguém sabia ao certo. Depois, especulou-se que sua viagem para fora do Chile foi paga pela CBD e que ele teria ido para o Brasil. O fato é que um mês depois da Copa, o uruguaio foi contratado pela federação paulista de futebol. E Garrincha jogou a final.

 

– Garrincha não jogou bem na primeira fase da Copa. Porém, nos jogos finais, lavou a alma. Nas quartas-de-final contra a Inglaterra fez dois gols que não eram da sua especialidade (o drible): um de cabeça, subindo mais alto que o zagueiro inglês, e outro chutando por cobertura de fora da área. E ainda bateu uma falta, originando um rebote que Vavá concluiu. Na semifinal, marcou outros dois contra o Chile. O jornal chileno El mercúrio estampou em suas páginas durante a competição: “Garrincha, de que planeta vienes?”. Na final jogou com febre, proveniente de uma gripe ainda mal curada de dois dias antes da partida e acabou não marcando o seu. Apesar de saber da importância da Copa, chamava o adversário da final, a Tchecoslováquia de “aquela equipe com a camisa do São Cristóvão”. “Dava até orgulho de jogar contra ele”, disse o tcheco Novak, a quem coube marcá-lo na final. Garrincha veio a ser eleito o craque da Copa.

 

– O árbitro soviético Nikolai Latichev tinha o sonho de ficar com a bola da final. Porém, o massagista brasileiro Mário América, assim como em 58, surrupiou-a. A Fifa compensou o árbitro dando-lhe um apito de ouro.

 

 

1966 – Local: Inglaterra Campeã: Inglaterra

 

– Das 14 vagas disponíveis para a Copa do mundo (as outras duras eram preenchidas pelo campeão anterior e o anfitrião), a Fifa só destinava uma para os africanos e asiáticos – que possuíam 42% dos países filiados à entidade, o que os incomodava. Porém, a gota d’água foi a definição dos grupos eliminatórios, quando a Fifa aceitou a inscrição da África do Sul, que vivia sob o regime racista do apartheid. 15 dos 19 concorrentes desistiram em represália a decisão da entidade de aceitar o país nas eliminatórias. Mais adiante a Fifa desclassificou a África do Sul, mas já era tarde – apenas a Austrália e as duas Coreias disputaram a vaga.

 

– Esta foi a primeira Copa a ter uma mascote, o leão Willie, uma forma idealizada para arrecadar dinheiro com o licenciamento da imagem. A mascote virou mania nacional na Inglaterra, sendo estampado nos mais variados produtos – até em anúncios de cerveja.

 

– Pouco antes da Copa, a CBD recebeu um comunicado da Federação Inglesa dizendo que o café seria considerado um estimulante. A CBD rebateu afirmando que isso era assunto para o Instituo Brasileiro do Café, e que o chá, tradicional bebida dos ingleses, era muito mais estimulante.

 

– O técnico brasileiro Feola, sem a blindagem de Paulo Machado de Carvalho, acabou aceitando a pressão dos cartolas que queriam jogadores dos seus clubes na Copa e acabou pré-convocando mais de 40 jogadores. A bagunça era tamanha, que numa reunião aonde já tinham sido pré-convocados 43 jogadores, um cartola reclamou que havia poucos jogadores do Corinthians e outro cartola sugeriu o nome do meia Ditão, e os demais concordaram. A relação foi encaminhada à secretária da entidade, que deveria datilografar a lista oficial. Porém, só havia os nomes de guerra dos jogadores, e ela precisava dos nomes completos. Ela então pediu auxílio a um repórter, que, sem saber da reunião, passou o nome de outro Ditão, um zagueiro, jogador do flamengo, que desta forma foi chamado por engano. E por incrível que pareça, mesmo sabendo do erro, tudo ficou por isto mesmo na convocação oficial da CBD, e o Ditão trocado foi o pré-convocado. Do grupo que foi à Copa, os cortes mais contestados foram o do zagueiro Djalma Dias, do lateral Carlos Alberto Torres e do atacante Servílio.

 

– O goleiro mexicano Carbajal, titular da posição desde 1950, foi a Copa de 1966 como reserva, tendo jogado apenas uma partida, contra o Uruguai. Acabou sendo – juntamente com o árabe Al-Deayea – o goleiro mais vazado em toda a história das Copas, tendo tomado 25 gols – não por sua culpa. Em 1998 foi reconhecido como o melhor goleiro das Américas Central e do Norte de todos os tempos.

 

– No jogo Inglaterra em que a Inglaterra venceu a França por dois a zero, os franceses reclamaram muito da arbitragem do peruano Arturo Yamasaki. Primeiro ele validou um gol que Roger Hunt converteu impedido, e depois, validou um gol quando os franceses pediam que o jogo fosse paralisado para atendimento do lateral francês Simon, duramente atingido por Stiles. Sem fair play, os ingleses não pararam e converteram o gol. Os franceses, que precisavam do empate, ficaram fora da Copa.

 

– A Itália foi eliminada na primeira fase ao perder para a União Soviética e para a inexperiente Coreia do Norte. Apesar de ter tentado despistar jornalistas e torcedores, assim como em 1954 a seleção italiana foi recebida com uma chuva de frutas e tomates podres no aeroporto.

 

– Nas quartas-de-final Inglaterra X Argentina, o time anfitrião jogava melhor, mas perdia muitos gols, e nervoso, começou a bater, no que foi seguido pelo time portenho. Porém, o árbitro alemão Rudolf Kreitlein só coibia os argentinos. O jogador argentino Rattin decidiu protestar de um lance (em espanhol), e o árbitro, sem entender nada do que lhe era dito, o expulsou (o que, anos seguintes, seria a justificativa para a criação dos cartões amarelo e vermelho – linguagem universal). Rattin demorou mais de dez minutos para sair de campo, e tocou a bandeira inglesa ao sair, causando a ira da torcida local. Mesmo com um a menos, o duelo foi equilibrado, porém, a Inglaterra fez um gol no final, num lance legal, em que os argentinos reclamaram impedimento. No fim do jogo houve grande confusão, e o reserva argentino Astoriza deu uma bofetada no árbitro – acabou tomando gancho de 4 jogos. Rattin reclamou que os torcedores ingleses jogavam latinhas de cerveja nele – e ele nem gostava de cerveja inglesa. Já o técnico inglês impediu que os seus jogadores trocassem camisa com o time adversário: “Nós não trocamos uniformes com animais”.

 

– Em outro jogo das quartas-de-final, o árbitro inglês James Finney não deu um pênalti a favor do Uruguai, e os sul-americanos, que vinham melhores, perderam a cabeça de vez quando os alemães acharam um gol quase por acaso. As jogadas violentas foram se sucedendo, com grande conivência do árbitro, até o segundo tempo, quando expulsou dois jogadores – somente uruguaios. Com nove em campo a celeste não resistiu, acabou tomando mais três gols e foi eliminada.

 

– A Coreia do Norte era o azarão da Copa, grande candidato a saco de pancadas. Porém, chegou nas quartas-de-final e aos 25 minutos do 1º tempo já ganhava por 3 a 0, na base da velocidade. Porém, numa das viradas mais impressionantes da história das Copas, Portugal fez 5 gols, sendo 4 de Eusébio (um de pênalti). Já a torcida inglesa, no fim do jogo, aplaudiu os coreanos pelo feito que realizaram.

 

– Na final disputada entre a Inglaterra e a Alemanha, a partida terminou 2 a 2 no tempo regulamentar. Na prorrogação, com dois gols irregulares, a Inglaterra sagrou-se campeã. Mais uma vez o time anfitrião era beneficiado pela arbitragem.

 

– Sempre que o Brasil é campeão mundial os políticos querem tirar uma casquinha da seleção. Porém, isso aconteceu também depois do fiasco de 66, só que de outra maneira. Foi aberta uma CPI para apurar o fracasso do Brasil na Copa.

 

– A Coreia do Norte não possuía relações diplomáticas com a Inglaterra, por isso seu hino não seria executado antes das partidas. Para evitar problemas diplomáticos, a Fifa suprimiu a execução de todos os hinos – que só voltaram a ser executados depois que a Coreia foi eliminada.

 

– Garrincha, que jogou a Copa com uma artrose no joelho, despediu-se da seleção brasileira na derrota para a Hungria por 3 a 1. Foi seu único revés em 60 partidas pela equipe, pela qual o ponta marcou 16 gols.

 

 

1970 – Local: México Campeão: Brasil

 

– Pela primeira vez houve uma vaga destinada somente para as equipes africanas. Também estrearam nesta Copa um novo tipo de bola – a telstar da Adidas, que mantinha melhor a esfericidade e redefiniu o formato das bolas do futuro – e os cartões amarelo e vermelho (inspirados nos semáforos).

 

– Foi a primeira Copa onde pôde haver substituições de jogadores e a inaugurar transmissão a cores em via satélite para todo o planeta, além do replay.

 

– O critério de desempate passou a ser o saldo de gols.

 

– Argentina, Hungria, França e Iugoslávia, países que se destacaram em outras Copas, não passaram das eliminatórias.

 

– Com medo de pegarem o “Mal de Montezuma”, uma intoxicação alimentar que frequentemente ataca os estrangeiros que vão para o México, os ingleses levaram sua própria água e comida para o país. O problema é que os ingleses deixaram escapar que estavam levando a própria água para não serem “contaminados” com alguma peste mexicana. Tal postura, naturalmente, indignou o país-sede. A mais dramática manchete dizia: “Sua Majestade nos chamou de porcos” e os mexicanos passaram a odiar os ingleses, fazendo algazarras nas madrugadas em frente ao hotel onde eles dormiam, impedindo-os de descansarem. A delegação brasileira também foi questionada sobre a alimentação, e o embaixador Pinheiro Batista, que acompanhava a delegação, respondeu no ato: “O que é bom para os mexicanos é bom para os brasileiros”. Foi uma contribuição diplomática colossal: ali, naquela declaração, estava ganha a torcida mexicana, que apoiou o Brasil em toda a Copa.

 

– O jornalista João Saldanha era um feroz crítico da seleção em seus artigos em O Globo. Seguindo a linha “você é capaz de fazer melhor?”, a CBD convidou-o para ser técnico, julgando que ele recusaria devido a ter pouca experiência como treinador. Entretanto, para surpresa da CBD, o jornalista não só aceitou, como definiu os onze titulares no mesmo dia em que foi anunciado, armando um time bastante ofensivo. O gaúcho, apelidado “João sem medo” obteve um ótimo retrospecto, porém, o técnico era comunista e nutria antipatia pela ditadura militar que comandava o Brasil. Para piorar, o ditador que dava as cartas, Médici, era fã de futebol, e dizia-se (nunca fez uma declaração pública neste sentido) que ele desejava que Dario (o mesmo que viria a se auto-intitular “Dadá Maravilha”) fosse convocado. Saldanha respondeu que nem ele escalava o ministério, nem o presidente escalava a seleção. Saldanha, deixando um time semi-pronto acabou demitido, assumindo Zagallo, que tinha bom relacionamento com os cartolas e não se opunha ao regime militar. Porém, Zagallo não queria – como João Saldanha fazia – escalar Pelé e Tostão juntos, deixando este último e Rivellino na reserva, contrariando os anseios da torcida. Depois de resultados desfavoráveis e vaias da torcida, Zagallo acabou cedendo e escalando-os. Na véspera de um amistoso contra a Áustria, numa reunião no quarto de Pelé – contando com o próprio Rei, mais Clodoaldo, Tostão, Rivellino e Gérson, decidiu-se como o time jogaria. O time titular não possuía um ponta-esquerda, portanto Tostão cairia por este lado. Rivellino (que segundo Zagallo seria um terceiro meio-campista) atacaria bastante, mas também deveria ajudaria Gérson na armação – a este caberia comandar tudo. Clodoaldo poderia avançar para combater o adversário no campo de ataque, e Pelé ficaria pelo meio, sem recuar muito, buscando tabelas com Tostão. Tal esquema flexibilizaria o 4-3-3 imposto pelo técnico. Apesar de Zagallo, o Brasil conseguiria ser campeão.

 

– O zagueiro Djalma Dias e o lateral esquerdo Rildo, titulares absolutos com João Saldanha foram cortados da convocação para a Copa, sendo chamados por Zagallo os irregulares Everaldo e Marco Antônio.

 

– O jogo México x El Salvador corria normalmente quando no fim do primeiro tempo foi marcada uma falta perto da lateral e os salvadorenhos pensaram que fosse a favor deles. Os mexicanos cobraram a falta e fizeram o gol, e os salvadorenhos nada fizeram para impedir. Porém, quando o árbitro egípcio Aly Hussein Kandil confirmou o gol, os salvadorenhos não o deixaram reiniciar a partida, cercando-o e tirando a bola do meio de campo – até que o capitão salvadorenho Mariona chutou-a para fora do campo e o árbitro teve de encerrar a primeira etapa. Os salvadorenhos cogitaram não voltar para os gramados, porém, voltaram a campo e, psicologicamente abalados, levaram mais três gols.

 

– Na prorrogação de URSS X Uruguai, os soviéticos marcaram um gol logo no primeiro minuto, mas o juiz o anulou, sem explicações. A três minutos do fim, o Uruguai fez um gol proveniente de um cruzamento em que os soviéticos reclamaram que a bola saiu na linha de fundo, mas o juiz validou o gol, o que os eliminou da Copa.

 

– Na prorrogação da semifinal Itália X Alemanha, saíram 5 gols: o primeiro para a Alemanha, a Itália virou, a Alemanha empatou, e por fim, os italianos conseguiram passar a frente novamente. Estes trinta minutos são considerados os mais emocionantes de toda a história das Copas.

 

– O goleiro brasileiro Félix complicou a defesa brasileira ao longo do torneio, levando diversos gols infantis.

 

– O Brasil derrotou na final a seleção da Itália por 4 a 1. Os carcamanos reclamaram bastante da arbitragem, porém, o prejudicado foi o Brasil, que teve um gol legítimo de Pelé anulado no fim do primeiro tempo.

 

– Com o título de 1970, Pelé sagrou-se tricampeão mundial – o único jogador até hoje a obter tal feito. Quando não esteve machucado foi titular em 58 e 62. Em 70, aos 29 anos, foi escolhido o melhor jogador da Copa, com 4 gols, cinco assistências e três gols “não completos” em jogadas antológicas. Em sua lendária carreira, foram 1.283 gols em 1.367 partidas. Posteriormente, cada gol ganhou uma medalha comemorativa, sendo cada uma delas leiloada com a renda destinada a entidades que cuidam de crianças. Além dos títulos com a seleção brasileira (nove), Pelé ergueu 45 taças com o Santos – inclusive o bicampeonato mundial 62-63 –, uma pelo Cosmos, uma pela seleção das forças armadas brasileiras e uma pela seleção paulista. Pelé também foi eleito atleta do século pelo jornal francês L’Equipe em 81, e pelo Comitê Olímpico Internacional (COI), em 1999.

 

– Para o jornal italiano Stampa Sera, o problema é que o adversário era de outro mundo. “A Itália enfrentou pelo menos quatro monstros de outro planeta”, afirmou, referindo-se a Pelé, Gérson, Rivellino e Jairzinho.

 

– Ao fim do jogo a torcida mexicana invadiu o gramado. Tostão perdeu todo o uniforme para os torcedores, saindo de campo só de cueca. Rivellino desmaiou em campo, e mesmo assim, durante o atendimento do massagista, foi rodeado de fãs. Pelé, sem camisa, foi carregado nos ombros pela torcida usando um sombreiro. A sua camisa havia sido levada pelo jogador italiano Rosato, que em 2002 leiloou-a por 283 mil dólares.

 

– Desde a Copa de 1934, nunca o time que abria o placar da final tornava-se campeão, tradição que foi quebrada.

 

– Jairzinho (Botafogo), Gérson (São Paulo), Tostão (Cruzeiro), Pelé (Santos) e Rivelino (Corinthians), ou seja, toda a linha de frente do Brasil utilizava a camisa 10 em seus respectivos clubes. Como na Copa só poderia haver um camisa 10, a honra, obviamente, coube a Pelé.

 

– Depois da conquista da taça Jules Rimet pelo Brasil, a Fifa cogitou batizar o novo troféu – a ser disputado a partir da Copa de 74 – de Taça Pelé, mas acabou escolhendo mesmo o nome Taça Fifa.

 

– Esta foi a Copa em que mais jogadores de uma seleção foram escolhidos para a seleção da Copa da Fifa: 6. Eram eles Carlos Alberto, Clodoaldo, Gérson, Jairzinho, Rivelino e Pelé – este último também eleito craque da Copa.

 

 

1974 – Local: Alemanha Campeã: Alemanha

 

– O técnico brasileiro Zagallo ignorou um jovem meia-atacante que já brilhava no flamengo e viria a ser o maior jogador de todos os tempos deste clube: Zico, e não o convocou. Tampouco levou um time-base montado para a Copa. Perguntado sobre o que achava das outras seleções, disse que: “Não temos que nos preocupar com os outros. Somos os tricampeões mundiais. Logo, os outros é que têm que se preocupar conosco”. Em seu retranqueiro esquema tático, os meias tinham que recuar para pegar a bola atrás dos laterais.

 

– A seleção holandesa brilhava no mundial e devido ao seu estilo de jogo em que os jogadores mudavam de posição dentro de campo e foi apelidada de “Laranja mecânica”. Já o Brasil, atual campeão, nas duas primeiras partidas da primeira fase empatou por 0 a 0, e ainda por cima nas costas do goleiro Leão que fez diversas grandes defesas. Na última partida da primeira fase o Brasil precisava de uma vitória por três gols contra o fraquíssimo Zaire (que já tinha tomado de 9 da Iugoslávia) e só conseguiu o feito devido a um frango do goleiro africano a poucos minutos do fim. Nas quartas de final o Brasil se classificou com um gol de falta de Rivelino. Apesar do fraco futebol apresentado, antes da semifinal contra a Holanda, Zagallo se gabava: “A Holanda é muito tico-tico no fubá, que nem o América nos anos 50”, dizendo ainda que o time não tinha tradição em Copas e isto pesava contra eles: “Nós somos tricampeões, eles é que têm que ter medo da gente. A Holanda não me preocupa. Estou pensando na final contra a Alemanha”. A Holanda derrotou o Brasil por 2 a 0, mandando a seleção canarinho – e a arrogância de seu técnico – de volta pra casa mais cedo.

 

– No jogo contra a Holanda o Brasil só se destacou pela violência – dentre outros, a poucos minutos do fim, Luis Pereira quase rachou Neeskens em dois. Foi expulso e ainda bateu boca com a torcida alemã.

 

– Zagallo deixou no banco aquele que é considerado o maior jogador de todos os tempos do Palmeiras, Ademir da Guia. Na disputa do terceiro lugar ele foi escalado e era um dos melhores do time, porém, o técnico resolveu substituí-lo: quando ele saiu a Polônia passou a dominar o meio de campo, e acabou marcando um gol, que lhe deu o seu melhor resultado de sua história, um terceiro lugar.

 

– O carrossel holandês vinha como grande favorito para a final contra a anfitriã Alemanha, e tudo parecia dar certo quando logo ao primeiro minuto de jogo os holandeses sofreram um pênalti e Neeskens converteu. Porém, a Alemanha virou pra cima da Holanda, e ganhou por 2 a 1. E o placar só não foi maior devido ao fato de o árbitro ter anulado um gol legítimo alemão, além de ignorar um pênalti claro a favor dos teutônicos. A Alemanha derrotava a favorita Holanda e seu carrossel.

 

– O holandês Cruyff foi eleito o melhor jogador da Copa – fato raro, já que normalmente o jogador escolhido é da seleção campeã. Até então isto só havia acontecido com o húngaro Puskas, em 54, curiosamente também vencido pela seleção alemã. Quem observava Cruyff correr em campo não poderia imaginar que ele teve dificuldades para andar na infância por causa de um defeito na formação dos pés, necessitando usar aparelhos ortopédicos até os 10 anos de idade. Sua mãe, viúva, que trabalhava como faxineira no Ajax, teve a ideia de colocá-lo no futebol para ajudá-lo a desenvolver as pernas. O holandês também se destacava fora dos gramados. Politizado, poliglota (falava holandês, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano e um pouco de sueco), fumava dois maços de cigarros fortíssimos por dia, e conseguiu um prêmio aos jogadores holandeses mais alto do que o pago aos campeões alemães.

 

– Beckenbauer, considerado o melhor zagueiro de todos os tempos, popularizou a função de líbero. Ele foi o único a ser eleito para três seleções ideais de mundiais diferentes (1966, 1970 e 1974), algo que nem Pelé conseguiu – o brasileiro foi a quatro Copas, mas só jogou plenamente em duas, nas de 62 e 66 esteve machucado devido às muitas pancadas que levava.

 

– Galvão Bueno foi escalado para “fazer tubo” narrar uma partida a partir das imagens de TV, e não ao vivo. Vendo um time de branco e outro de amarelo, começou a narrar como se fosse Suécia e Bulgária. Porém, o time amarelo chutou a bola para a linha de fundo, e no replay aparecem os caracteres do placar eletrônico: Alemanha Oriental 0 X 0 Austrália. O narrador seguiu como se nada houvesse acontecido: “Cobra o tiro de meta a Alemanha Oriental”...

 

– Pouco antes da Copa, a seleção uruguaia viajou para a Indonésia e para a Austrália, para disputar amistosos preparatórios. Uma mudança de planos fez com que a delegação decidisse partir à noite, o que levou ao cancelamento das reservas anteriormente feitas. O avião que seguiu sem a equipe caiu e matou 107 pessoas.

 

 

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Outras partes desta publicação:

Parte I: http://listadelivros-doney.blogspot.com.br/2010/10/o-mundo-das-copas-lycio-velloso-ribas.html

Parte III: https://listadelivros-doney.blogspot.com/2021/01/o-mundo-das-copas-parte-iii-de-lycio.html

Parte IV: https://listadelivros-doney.blogspot.com/2021/01/o-mundo-das-copas-parte-iv-de-lycio.html

Um comentário:

Doney disse...

- Diferentemente de outras obras, nesta faço uma compilação das melhores histórias sem citação direta.
- A postagem original deste livro, feita em outubro de 2010, tinha um tamanho excessivo. Na época eu não tinha tido a ideia de dividi-la. Fazendo uma correção das postagens do Blog, agora a dividi em 4 partes.