Editora: Jorge Zahar
ISBN: 978-85-7110-414-3
Tradução: Guido Antonio de Almeida
Opinião: ★★★★☆
Páginas: 224
“O locutor de rádio não precisa mais falar de maneira pomposa. Aliás, ele
seria esquisito, caso sua entonação se distinguisse da entonação de seu público
ouvinte. Em compensação, a linguagem e os gestos dos ouvintes e espectadores,
até mesmo naquelas nuanças que nenhum método experimental conseguiu captar até
agora, estão impregnados mais fortemente do que nunca pelos esquemas da
indústria cultural. Hoje, a indústria cultural assumiu a herança civilizatória
da democracia de pioneiros e empresários, que tampouco desenvolvera uma fineza
de sentido para os desvios espirituais. Todos são livres para dançar e para se
divertir, do mesmo modo que, desde a neutralização histórica da religião, são
livres para entrar em qualquer uma das inúmeras seitas. Mas a liberdade de
escolha da ideologia, que reflete sempre a coerção econômica, revela-se em
todos os setores como a liberdade de escolher o que é sempre a mesma coisa. A
maneira pela qual uma jovem aceita e se desincumbe do dateag obrigatório, a entonação no telefone e na mais familiar situação,
a escolha das palavras na conversa, e até mesmo a vida interior organizada
segundo os conceitos classificatórios da psicologia profunda vulgarizada, tudo
isso atesta a tentativa de fazer de si mesmo um aparelho eficiente e que
corresponda, mesmo nos mais profundos impulsos instintivos, ao modelo
apresentado pela indústria cultural. As mais íntimas reações das pessoas estão
tão completamente reificadas para elas próprias que a ideia de algo peculiar a
elas só perdura na mais extrema abstração: personality
significa para elas pouco mais que possuir dentes deslumbrantemente brancos
e estar livres do suor nas axilas e das emoções. Eis aí o triunfo da
publicidade na indústria cultural, a mimese compulsiva dos consumidores, pela
qual se identificam às mercadorias culturais que eles, ao mesmo tempo, decifram
muito bem.”
o Ousado,
audacioso. (N.T.)
p Gracejo,
brincadeira. (N.T.)
q A severidade é a
verdadeira alegria. (N.T.)
r Fuga e rapto,
respectivamente. (N.T.)
s Quadrinhos ou
filmes cômicos. (N.T.)
t Romance
folhetim, publicado em revistas femininas. (N.T.)
u Conversa de
vendedor, lábia. (N.T.)
v Pelos caminhos
ásperos aos astros. (N.T.)
w Olá, garota.
(N.T.)
x Meter-se em
apuros e depois safar-se. (N.T.)
y Romances de A.
Döblin e H. Fallada, respectivamente. (N.T.)
z O toque, a marca
de Lubitsch. (N.T.)
aa Este concerto é
levado até você como um serviço público. (N.T.)
ab Nos primórdios
do cinema, intervalos durante os quais se organizavam concursos entre os
espectadores. (N.T.)
ac Publicidade,
recomendação de alguém ou alguma coisa, por exemplo, num programa radiofônico.
(N.T.)
ad Moda, mania.
(N.T.)
ae Devaneio e
rapsódia, respectivamente. (N.T.)
af Schriftleiter
é o termo adotado pelos puristas da língua alemã, para substituir a
expressão Redakteur, de origem francesa. (N.T.)
ag Encontro (com o namorado). (N.T.)
“Só a cegueira do antissemitismo, sua falta
de objetivo, confere uma certa verdade à explicação de que ele seria uma
válvula de escape. A cólera é descarregada sobre os desamparados que chamam a
atenção. E como as vítimas são intercambiáveis segundo a conjuntura:
vagabundos, judeus, protestantes, católicos, cada uma delas pode tomar o lugar
do assassino, na mesma volúpia cega do homicídio, tão logo se converta na norma
e se sinta poderosa enquanto tal. Não existe um genuíno antissemitismo e,
certamente, não há nenhum antissemita nato. Os adultos, para os quais o brado
pelo sangue judeu tornou-se uma segunda natureza, conhecem tão pouco a razão
disso quanto os jovens que devem derramá-lo. Os mandantes altamente situados, é
verdade, que a conhecem, não odeiam os judeus e não amam os que obedecem seu
comando. Estes, porém, que não se satisfazem nem econômica nem sexualmente, têm
um ódio sem fim; não admitem nenhum relaxamento, porque não conhecem nenhuma
satisfação. Assim, é uma espécie de idealismo dinâmico que, de fato, anima o
bando organizado dos ladrões assassinos. Eles saem a pilhar e constroem uma
ideologia grandiosa para isso, e falam disparatadamente da salvação da família,
da pátria, da humanidade. Mas como continuam a ser os logrados – o que já
pressentiam secretamente –, seu mísero motivo racional, o roubo, ao qual devia
servir a racionalização, desaparece inteiramente, e esta ideologia torna-se
involuntariamente sincera. A obscura pulsão, com que desde o início tinham
maior afinidade do que com a razão, toma conta deles totalmente. A ilha
racional é inundada e os desesperados aparecem agora unicamente como os
defensores da verdade, os renovadores da terra, que têm de reformar até o seu
último recanto. Tudo o que vive converte-se em material de seu dever atroz, que
nenhuma inclinação mais vem prejudicar. A ação torna-se realmente um fim em si
e autônomo, ela encobre sua própria falta de finalidade. O antissemitismo
conclama sempre a ir até o fim do trabalho. Entre o antissemitismo e a
totalidade havia desde o início a mais íntima conexão. A cegueira alcança tudo,
porque nada compreende.”
“A sociedade atual, onde os renascimentos e
os sentimentos religiosos primitivos, bem como o legado das revoluções, estão à
venda no mercado; onde os chefes fascistas negociam atrás das portas o
território e a vida das nações, enquanto o público esperto calcula o preço no
rádio; a sociedade, onde a palavra que a desmascara se legitima por isso mesmo
como recomendação para a admissão no banditismo político; essa sociedade, na
qual a política não é mais somente um negócio, mas o negócio é a política
inteira – essa sociedade se toma de indignação contra o retrógrado
mercantilismo do judeu e designa-o como o materialista, o traficante, que deve
recuar diante do fogo sagrado daqueles que erigiram o negócio em algo de
absoluto.
O antissemitismo burguês tem um fundamento
especificamente econômico: o disfarce da dominação na produção. Se, em épocas
mais antigas, os dominadores eram imediatamente repressivos, de tal sorte que
não somente abandonavam todo o trabalho às classes inferiores, mas declaravam o
trabalho como a ignomínia que sempre foi sob a dominação, no mercantilismo, o
monarca absoluto sofre uma metamorfose e transforma-se nos mais poderosos donos
de manufaturas. A produção passa a ser aceitável na corte. Os senhores transformados
em burgueses acabaram por despir o casaco colorido e passaram a envergar um
traje civil. O trabalho não envergonha, diziam, para se apoderar mais
racionalmente do trabalho de outrem. Eles próprios se incluíam entre os
produtores, ao passo que continuavam a ser os mesmos rapinadores de sempre. O
fabricante arriscava e embolsava, como o negociante e o banqueiro. Ele
calculava, dispunha, comprava, vendia. No mercado, ele concorria com todos por
um lucro compatível com seu capital. Só que ele não rapinava apenas no mercado,
mas também na fonte: como representante de sua classe, tomava cuidados para não
ficar prejudicado no trabalho de sua gente. Os trabalhadores tinham de fornecer
o máximo possível. Como o verdadeiro Shylock, ele insistia em sua promissória.
Com base na posse das máquinas e do material, ele forçava os outros a produzir.
Ele se denominava “produtor”, mas como qualquer um sabia no íntimo a verdade. O
trabalho produtivo do capitalista – não importa se justificava seu lucro como
salário do empresário, como no liberalismo, ou como vencimentos de diretor,
como hoje – era a ideologia que encobria a essência do contrato de trabalho e a
natureza rapinante do sistema econômico em geral.
Por isso as pessoas gritam: “pega ladrão!” e
apontam para o judeu. Ele é, de fato, o bode expiatório, não somente para
manobras e maquinações particulares, mas no sentido mais amplo em que a
injustiça econômica da classe inteira é descarregada nele. Na fábrica, o
fabricante tem sob os olhos seus devedores, os trabalhadores, e controla sua
contrapartida antes mesmo de adiantar o dinheiro. O que na realidade se passou
eles só percebem quando veem o que podem comprar em troca: o menor dos magnatas
pode dispor de um quantum de serviços e bens como jamais pôde nenhum senhor antes;
os trabalhadores, porém recebem o chamado mínimo cultural. Não bastava
descobrir no mercado como são poucos os bens que lhes cabem, o vendedor ainda
elogia o que eles não podem se permitir. Só a relação do salário com os preços
exprime o que é negado aos trabalhadores. Com seu salário, eles aceitaram ao
mesmo tempo o princípio da expropriação do salário [Entlohnung]. O comerciante apresenta-lhes a letra que assinaram
para o fabricante. O comerciante é o oficial de justiça para o sistema inteiro
e atrai para si o ódio voltado aos outros. A responsabilidade do setor da
circulação pela exploração é uma aparência socialmente necessária.”
“O fascismo também é totalitário na medida em que se esforça por colocar
diretamente a serviço da dominação a própria rebelião da natureza reprimida
contra essa dominação.”
“Os impulsos que o sujeito não admite como
seus e que, no entanto, lhe pertencem são atribuídos ao objeto: a vítima em potencial.
Para o paranoico usual, sua escolha não é livre, mas obedece às leis de sua
doença. No fascismo, esse comportamento é adotado pela política, o objeto da
doença é determinado realisticamente; o sistema alucinatório torna-se a norma
racional no mundo, e o desvio a neurose. O mecanismo que a ordem totalitária
põe a seu serviço é tão antigo quanto a civilização. Os mesmos impulsos sexuais
que a raça humana reprimiu souberam se conservar e se impor num sistema
diabólico, tanto dentro dos indivíduos, quanto dos povos, na metamorfose
imaginária do mundo ambiente. O indivíduo obcecado pelo desejo de matar sempre
viu na vítima o perseguidor que o forçava a uma desesperada e legítima defesa,
e os mais poderosos impérios sempre consideraram o vizinho mais fraco como uma
ameaça insuportável, antes de cair sobre eles. A racionalização era uma finta
e, ao mesmo tempo, algo de compulsivo. Quem é escolhido para inimigo é
percebido como inimigo. O distúrbio está na incapacidade de o sujeito discernir
no material projetado entre o que provém dele e o que é alheio.”
“O patológico no antissemitismo não é o
comportamento projetivo enquanto tal, mas a ausência da reflexão que o
caracteriza. Não conseguindo mais devolver ao objeto o que dele recebeu, o
sujeito não se torna mais rico, porém, mais pobre. Ele perde a reflexão nas
duas direções: como não reflete mais o objeto, ele não reflete mais sobre si e
perde assim a capacidade de diferenciar. Ao invés de ouvir a voz da consciência
moral, ele ouve vozes; ao invés de entrar em si mesmo, para fazer o exame de
sua própria cobiça de poder, ele atribui a outros os “Protocolos dos Sábios de
Sião”. Ele incha e se atrofia ao mesmo tempo. Ele dota ilimitadamente o mundo
exterior de tudo aquilo que está nele mesmo; mas aquilo de que o dota é o
perfeito nada, a simples proliferação dos meios, relações, manobras, a práxis
sinistra sem a perspectiva do pensamento. A própria dominação que, mesmo sendo
absoluta, é, em sentido próprio, sempre um mero meio, torna-se nessa projeção
irrefreada, ao mesmo tempo, seu próprio fim e o fim de outrem, ou melhor, o fim
em geral. Com a enfermidade do indivíduo, o aparelho intelectual aguçado do
homem atua de novo contra os homens como a arma cega da pré-história animal,
que ele nunca deixou de ser para a espécie, ao se voltar contra todo o resto da
natureza. Do mesmo modo que, desde sua ascensão, a espécie humana mostrou-se em
face das demais como a mais evoluída historicamente e, por isso mesmo, como o
mais terrível poder de destruição, do mesmo modo que no interior da humanidade
as raças mais avançadas se confrontaram com as mais primitivas, e os povos
tecnicamente mais bem equipados com os mais lentos, assim também o indivíduo
doente se confronta com os outros indivíduos, tanto na megalomania quanto na
mania de perseguição. Nos dois casos, o sujeito está no centro, e o mundo, que
é uma simples ocasião de seu delírio, torna-se a totalidade impotente ou
onipotente de tudo o que é projetado nele. A resistência de que se queixa a
todo momento o paranoico é a consequência da falta de resistência e do vazio
que produz em seu redor aquele que se coloca fora de foco. Ele não pode parar.
A ideia que não encontra nenhum apoio firme na realidade insiste e torna-se
fixa.”
“Pouco importa como são os judeus realmente;
sua imagem, na medida em que é a imagem do que já foi superado, exibe os traços
aos quais a dominação totalitária só pode ser hostil: os traços da felicidade
sem poder, da remuneração sem trabalho, da pátria sem fronteira, da religião
sem mito. Esses traços são condenados pela dominação porque são a aspiração
secreta dos dominados. A dominação só pode perdurar na medida em que os
próprios dominados transformarem suas aspirações em algo de odioso. Eles fazem
isso graças à projeção patológica, pois também o ódio leva à união com o objeto
– na destruição. O ódio é o negativo da reconciliação. A reconciliação é o
conceito supremo do judaísmo, e todo o seu sentido consiste na espera; é da
incapacidade de esperar que surge a forma de reação paranoica. Os antissemitas
estão em vias de realizar com as próprias forças seu negativo absoluto, eles
estão transformando o mundo no inferno que sempre viram nele. Uma reviravolta
vai depender da capacidade dos dominados, em face da loucura absoluta, de se
tornarem senhores de si mesmos e de pôr termo a ela. Só com a liberação do
pensamento relativamente à dominação e com a eliminação da violência seria
possível realizar a ideia que até agora permaneceu uma inverdade, a saber, que
o judeu é um ser humano. Isso representaria a passagem da sociedade
antissemita, que impele os judeus e os demais para uma condição patológica,
para a sociedade humana. Essa passagem realizaria, ao mesmo tempo, a mentira
fascista, mas como a sua contradição: a questão judia se revelaria, de fato,
como o momento decisivo da história. Superando a doença do espírito, que grassa
no terreno da autoafirmação imune à reflexão, a humanidade deixaria de ser a
contrarraça universal para se tornar a espécie que, embora natureza, é mais que
a simples natureza, na medida em que se apercebe de sua própria imagem. A
emancipação individual e social da dominação é o movimento contrário à falsa
projeção, e todo judeu que soubesse vencê-la dentro de si perderia toda
semelhança com a desgraça que irrompe cegamente sobre ele, assim como sobre
todos os perseguidos, homens ou animais.”
“Não é fácil falar com um fascista. Quando o
outro toma a palavra, ele reage interrompendo-o com insolência. Ele é
inacessível à razão porque só a enxerga na capitulação do outro.”
“Na competição dos Estados, os fascistas não
só são igualmente capazes de cometer erros, mas também, com suas qualidades
como miopia intelectual, obstinação, desconhecimento das forças econômicas e,
sobretudo, com a incapacidade de ver o negativo e levá-lo em conta na avaliação
da situação em seu conjunto, também contribuem subjetivamente para a catástrofe
que, no íntimo, sempre esperaram.”
“Atualmente, o declínio da individualidade
não ensina simplesmente a compreender sua categoria como algo de histórico, mas
também desperta dúvidas quanto à sua essência positiva. A injustiça que sofre o
indivíduo era o princípio de sua própria existência na fase da concorrência.
Mas isso não se aplica apenas à função do indivíduo e de seus interesses
particulares na sociedade, mas também à complexidade interna da própria
individualidade. Foi sob o seu signo que se colocou a tendência à emancipação
do homem, mas ela é, ao mesmo tempo, o resultado justamente dos mecanismos dos
quais é preciso emancipar a humanidade. É na autonomia e na incomparabilidade
do indivíduo que se cristaliza a resistência contra o poder cego e opressor do
todo irracional. Mas essa resistência só foi possível historicamente através da
cegueira e irracionalidade daquele indivíduo autônomo e incomparável.
Inversamente, tudo o que se opõe incondicionalmente ao todo enquanto particular
permanece preso de maneira ruim e opaca à ordem existente. Os traços
radicalmente individuais e irredutíveis de uma pessoa são sempre duas coisas
numa só: o que não foi totalmente capturado pelo sistema dominante e sobrevive
para sorte nossa e as marcas da mutilação que o sistema inflige a seus membros.
Esses traços repetem de maneira exagerada as determinações básicas do sistema:
na avareza, por exemplo, a propriedade fixa; na doença imaginária, a
autoconservação irrefletida. Na medida em que o indivíduo utiliza esses traços
para se afirmar desesperadamente contra a compulsão da natureza e da sociedade,
contra a doença e a bancarrota, esses traços assumem necessariamente um caráter
compulsivo. Em sua célula mais íntima o indivíduo choca-se com o mesmo poder do
qual ele foge para dentro de si mesmo. Isso torna sua fuga numa quimera sem
esperança. (...)
É só contra a sociedade endurecida, e não em
termos absolutos, que o indivíduo endurecedor apresenta o melhor. Ele fixa a
vergonha que se sente em face daquilo que a coletividade volta sempre a
infligir ao indivíduo e que se consuma quando não há mais indivíduos. Os
sequazes despersonalizados de hoje são a consequência dos boticários maníacos,
dos apaixonados cultivadores de rosas e dos aleijados políticos dos tempos de
outrora.”
“PROPAGANDA
Propaganda para mudar o mundo, que bobagem! A
propaganda faz da linguagem um instrumento, uma alavanca, uma máquina. A
propaganda fixa o modo de ser dos homens tais como eles se tornaram sob a
injustiça social, na medida em que ela os coloca em movimento. Ela conta com o
fato de que se pode contar com eles. No íntimo, cada um sabe que ele próprio
será transformado pelo meio num outro meio, como na fábrica. A fúria que sentem
quando se deixam levar por ela é a velha fúria dirigida contra o jugo,
reforçada pelo pressentimento de que a saída indicada pela propaganda é uma
falsa saída. A propaganda manipula os homens; onde ela grita liberdade, ela se
contradiz a si mesma. A falsidade é inseparável dela. É na comunidade da
mentira que os líderes (Führer) e seus liderados se reúnem graças à propaganda,
mesmo quando os conteúdos enquanto tais são corretos. A própria verdade
torna-se para ela um simples meio de conquistar adeptos para sua causa, ela já
a falsifica quando a coloca em sua boca. Por isso, a verdadeira resistência não
conhece nenhuma propaganda. A propaganda é inimiga dos homens. Ela pressupõe
que o princípio segundo o qual a política deve resultar de um discernimento em
comum não passa de uma façon de parler.o
Numa sociedade que sabiamente impõe limites à
superabundância que a ameaça, tudo o que é recomendado a todos por outras
pessoas merece desconfiança. A advertência contra a publicidade comercial, que
chama a atenção para o fato de que nenhuma firma dá nada de graça, vale em toda
parte e, depois da moderna fusão do mundo dos negócios com a política, vale
sobretudo para esta. Quanto maiores os elogios, menor a qualidade;
diferentemente de um Rolls-Royce, o Volkswagen depende da publicidade. Os
interesses da indústria e dos consumidores não se harmonizam nem mesmo quando
aquela tem algo de sério a oferecer. Até mesmo a propaganda da liberdade pode
engendrar confusão, na medida em que deve necessariamente nivelar a diferença
entre a teoria e os interesses particulares daqueles a quem se destina. O
fascismo defraudou os líderes trabalhistas assassinados na Alemanha da verdade
de sua própria ação, porque desmentia a solidariedade através da seleção da
vingança. Quando o intelectual é torturado até a morte no campo de
concentração, nem por isso os trabalhadores do lado de fora precisam passar
pior. O fascismo não foi o mesmo para Ossietzky e para o proletariado. A
propaganda enganou a ambos.
É bem verdade que o que é suspeito não é a
representação da realidade como um inferno, mas a exortação rotineira a fugir
dela. Se o discurso ainda pode se dirigir a alguém hoje, não é nem às massas,
nem ao indivíduo, que é impotente, mas antes a uma testemunha imaginária, a
quem o entregamos para que ele não desapareça totalmente conosco.”
o Maneira de
falar. (N.T.)
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