Editora: Geração Editorial
ISBN: 978-85-8130-257-7
Opinião: ★★★☆☆
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Páginas: 256
Sinopse: Ver Parte I
“Até tu, Malan?
Tudo somado, contas benfeitas
mostrariam que as privatizações não reduziram a dívida e o “rombo” do governo.
Ao contrário, elas contribuíram para aumentá-los. O governo ficou com dívidas —
e sem as fontes de lucros para pagá-las.
Ironicamente, o governo
reconheceu isso com todas as letras. Na carta de intenções que o ministro da
Fazenda, Pedro Malan, entregou ao FMI (Fundo Monetário Internacional),
inconscientemente, o governo confessa que o equilíbrio das contas do Tesouro
ficou mais difícil porque... o governo deixou de contar com os lucros que as
estatais ofereciam como contribuição para cobrir o rombo até serem vendidas.
Pasmem-se, mas é verdade.”
“Importações, o ralo
Antes mesmo das privatizações,
o governo elevou os investimentos na área de telecomunicações, de 3,5 bilhões
para 7 bilhões de reais por ano, como já visto. Apesar dessas cifras, o
faturamento dos fabricantes brasileiros recuou, empresas foram fechadas e o
desemprego avançou... Razão da contradição? As grandes multinacionais, já
existentes ou extraídas para o setor — e beneficiadas, mais uma vez, por
financiamentos do BNDES —, passaram a importar maciçamente. Alguns equipamentos
de telefonia chegaram a utilizar 97% de peças e componentes importados — e
aparelhos celulares de algumas marcas chegam a utilizar de 85% a 100% de peças
vindas do exterior, isto é, são apenas “montados” no país.
Quando preparava a privatização,
o governo chegou a acenar com a possibilidade de obrigar as fábricas locais a
usarem pelo menos 35% de peças e componentes nacionais. À medida que o leilão
se aproximava, porém, o governo foi recuando, rebaixou aquela previsão de 20%
de índice de nacionalização e, no final, às vésperas do leilão, descartou
qualquer obrigatoriedade de compra de peças nacionais. Estabeleceu apenas que o
BNDES iria financiar fabricantes do país, quando seus produtos competissem com
similares estrangeiros em termos de preço, tecnologia e prazo de entrega. Ao
regulamentar a decisão, porém houve novo recuo governamental: os financiamentos
serão concedidos às próprias empresas “compradoras” das teles, que terão
liberdade para escolher os fornecedores, mantendo-se a “preferência” pelo
produto nacional, dentro das condições expostas acima. Isto é, tudo apenas para
inglês ver... Resultado: em suas primeiras “concorrências” para a compra de
equipamentos, em março de 1999, a Telefônica, comprada da Telesp de São Paulo,
não convidou uma única empresa brasileira fabricante de peças e equipamentos
para disputar as encomendas. O peso das importações do setor de
telecomunicações no “rombo” da balança comercial pode ser avaliado por estes
dados: de 1993 a 1998, as compras da área de telecomunicações no exterior
aumentaram dez vezes, 1.000%, de 280 milhões de dólares para 2,8 bilhões de
dólares, deixando um déficit setorial de 2,5 bilhões de dólares.
Esses números, ainda por cima,
não retratam o verdadeiro tamanho do “rombo” em dólares provocado pelo setor.
Por quê? Há peças e componentes que são classificados como produtos
“eletrônicos”, embora na verdade se destinem ao setor de telecomunicações. E,
nessa área de eletrônicos, o déficit ganhou dimensões assombrosas, chegando aos
8 bilhões de dólares, com a importação de 11 bilhões de dólares e a exportação
de 3 bilhões de dólares. Bom notar: o saldo negativo do setor é superior a todo
o “rombo” da balança comercial brasileira, de 6,4 bilhões de dólares. Vale
dizer: ele é capaz de devorar o valor das exportações e os saldos positivos de
outros setores — sobretudo a agricultura... No frigir dos ovos, as
privatizações contribuíram para a “torra” de dólares, o “rombo” nas contas
externas e consequentes abalos nas cotações do real.”
“Adubo para a recessão
Implantada com distorções, a
política de privatizações acabou por ser um dos fatores da recessão, por
diversos caminhos. As importações maciças realizadas pelos “compradores”
tiveram um efeito mais devastador do que parecia à primeira vista. A compra de
peças e componentes no exterior, em substituição à produção local, significou
cortes na utilização também de matérias-primas, como plástico, borracha,
metais, devastando setores inteiros, fechando fábricas, cortando empregos —
isto é, puxando a economia do país para o fosso. Além disso, a própria
concentração dos empréstimos do BNDES a esses “compradores” implicou, na
prática, que as demais áreas e centenas de milhares de empresas continuassem às
voltas com a falta de crédito. Ou, ainda, submetidos a juros elevadíssimos,
enquanto os clientes do BNDES desfrutam de taxas baixíssimas, privilegiadas:
chegam a apenas um terço dos juros cobrados no mercado.”
“No primeiro semestre de 1997, a Telebras ainda era uma
empresa estatal. Mas seu lucro, naqueles seis meses, deu um salto de 250%,
passando para 1,8 bilhão de reais, contra 500 milhões de reais em igual período
do ano anterior. Fenômeno similar ocorreu com as compras de energia elétrica: a
lucratividade da Eletrobras explodiu para 1,5 bilhão de reais, com praticamente
200% de avanço sobre os 550 milhões de reais do ano anterior. Como explicar
esses saltos, que desmentem desde já as afirmações repetidas pelo governo FHC e
pelos meios de comunicação de que as estatais são um “saco sem fundo”, que devoram
o dinheiro do Tesouro?
Não houve “milagre” algum. Pura
e simplesmente, como já visto, o governo havia, finalmente, começado a eliminar
o congelamento das tarifas dos serviços das estatais, atualizando-as. Bastou
dar início aos reajustes negados durante anos, enquanto a inflação continuava a
aumentar os custos das estatais, para a situação se inverter e os lucros
dispararem. Sem privatização.
Os prejuízos que o achatamento
de tarifas e preços trouxe para as estatais teve efeitos que o consumidor
conhece bem: nesses períodos, eles ficaram sem dinheiro para investir e ampliar
serviços. Explicam-se, assim, as filas de espera para os telefones ou as
constantes ameaças de “apagões” no sistema de eletricidade. Ou, dito de outra
forma: não é verdade que os serviços das estatais tenham se deteriorado por
“incompetência”. Como também é mentira que o “Estado perdeu sua capacidade de
investir”, como diz a campanha dos privatizantes. O que houve foi uma política
absurda que sacrificou as estatais.
Além do congelamento das
tarifas, houve outra decisão — absolutamente incrível — que prejudicou os
investimentos nas estatais de todas as áreas. Por incrível que pareça,
repita-se, em 1989, houve um decreto do presidente da República, nunca revogado,
simplesmente proibindo o banco oficial, o BNDE (hoje BNDES), de realizar
empréstimos a empresas estatais.
Cancelando a história
Proibir um banco estatal de
financiar empresas estatais, de setores vitais para o país, é uma decisão
esdrúxula. Mas, no caso do BNDES, chega à beira da insanidade, porque esse
banco, como o próprio nome — Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (e Social)
— diz, foi criado no governo Juscelino Kubitschek exatamente com o objetivo de
fornecer recursos para a execução de projetos de infraestrutura, que exigem
desembolso de bilhões e bilhões — e precisam de alguns anos para sua execução.
Mais especificamente, dentro da filosofia desenvolvimentista do governo JK, o
BNDES disporia de recursos retirados do Imposto de Renda (e outras fontes de
“impostos”, como o PIS/Pasep) para permitir a construção de usinas
hidrelétricas, ferrovias, rodovias, portos, sistemas de telecomunicações,
enfim, toda a infraestrutura que o processo de industrialização exigia. Um
instrumento estratégico, em resumo, capaz de viabilizar a política de
desenvolvimento de longo prazo, incumbido de dar apoio às áreas consideradas
prioritárias.”
“Assim como os subsídios à população pobre reduziam os lucros das teles e
empresas de energia, a Petrobras também pagou o preço de decisões que o governo
tomou em favor de outros setores, por considerá-los “estratégicos” dentro da
política econômica do momento. Para permitir que a indústria petroquímica
nacional tivesse preços capazes de enfrentar a concorrência internacional, por
exemplo, a Petrobras durante longos anos vendeu a nafta, matéria-prima do
setor, a preços mais baixos, com um “prejuízo” acumulado que chegou aos 4
bilhões de dólares. Na mesma linha, as siderúrgicas estatais, como CSN, Cosipa,
Usiminas, tiveram os preços do aço achatados em até 75%, acumulando imensos
prejuízos em seus balanços. Somente quando se preparava a privatização é que o
aço teve aumentos de até 300% nos preços. Por que o achatamento? O governo
impôs preços mais baixos na venda do aço nacional para que as indústrias de
automóveis, eletrodomésticos, máquinas e equipamentos, principalmente, tivessem
custos mais baixos e conseguissem exportar, ou evitar importações, trazendo
dólares para o país. As siderúrgicas estatais, portanto, também foram
utilizadas como arma na guerra para obter dólares (e conter a inflação). Por
isso, ficaram arruinadas. É lamentável que os consumidores de aço ou nafta, que
foram beneficiados com subsídios das siderúrgicas estatais e da Petrobras,
nunca tenham dito uma palavra para explicar à opinião pública que essa política
foi a principal culpada pelos prejuízos das siderúrgicas — e pela menor lucratividade
da Petrobras —, permitindo que a população fosse convencida de que as estatais
“sugavam” o Tesouro.”
“Subtrair, subtrair...
Em 1996 e 1997, já decidida a
privatização, o governo investiu 16 bilhões de reais no sistema Telebras e,
somente no primeiro semestre de 1998, às portas do leilão realizado em julho,
mais 5 bilhões de reais. No total, 21 bilhões de reais, praticamente mais de
duas vezes e meia (250%) os 8,8 bilhões de reais recebidos de entrada pela sua
privatização.
Há mais, porém. O sistema
Telebras, graças ao descongelamento rápido das tarifas e à expansão do número
de linhas e serviços trazidos por aqueles investimentos do governo, apresentou
faturamento e lucros crescentes, que chegaram aos 4 bilhões de reais em 1997 —
e pela lógica continuariam a crescer nos anos seguintes. Além disso, não se
pode esquecer o cálculo do retorno que o governo poderia obter sobre esse
dinheiro aplicado nas teles: mesmo a juros médios de 20% ao ano, baixíssimos em
relação ao padrão brasileiro naquele período, os 21 bilhões gastos pelo governo
deveriam render aproximadamente 9 bilhões de reais nos mesmos 30 meses.
E os demais investimentos
realizados ao longo de décadas, antes de 1996, para formar o patrimônio da
Telebras? Não entram no preço da venda? Não. É isso que a maioria dos
brasileiros não entendeu até hoje — e por isso aceita passivamente a entrega
das estatais aos preços anunciados.”
“Desde maio de 1998, os banqueiros e investidores internacionais já
estavam fugindo, cortando o crédito, do Brasil, e o real caminhava para a
desvalorização. Os leilões da Telebras, a toque de caixa, eram uma forma de
captar dólares e reais, mesmo que em quantidades abaixo do preço justo, e
permitir que o governo mantivesse a ilusão do real até a reeleição. Prevaleceu
a política de vender as estatais a preço de banana, com a “torra” de um
patrimônio de 120 bilhões de reais. Mas o preço baixo da Telebras não foi uma
exceção.”
“• Rede Ferroviária — o governo previa, inicialmente, arrecadar 4 bilhões
de reais. Vendeu todas as malhas — a prazo — por aproximadamente 1,4 bilhão de
reais. Investimentos previstos pelos “compradores” para a recuperação de 400
locomotivas: 240 milhões de reais. Em 20 anos. Ou 12 milhões de reais por ano.
Tostões.”
“E o Banespa?
Antes mesmo do BB, o Banespa já
havia sido vítima de manobras para considerá-lo “quebrado”. Poucos dias antes
da posse do governador Mário Covas, em seu primeiro mandato, no final de 1994,
o Banco Central decretou a intervenção no banco paulista, alegando que o estado
havia deixado de pagar uma parcela de um acordo de refinanciamento da dívida,
firmado com o governo federal. No entanto, segundo a defesa de um ex-governador
paulista, em juízo, o atraso era inferior a dez dias — e as regras do acordo de
financiamento previam que qualquer punição poderia ser adotada apenas após 30
dias de atraso.
No caso do Banespa, ainda,
houve um aspecto nunca explicado suficientemente à opinião pública. Afirmava-se
que o banco tinha um “rombo”, que estava “quebrado”, insinuando-se que seria
uma situação igual à do Nacional, do Econômico e de outros bancos particulares
que quebraram.
Na verdade, no caso desses
bancos privados, as dívidas eram superiores aos créditos que os bancos tinham —
inclusive a receber. Havia um “rombo”, sim. No caso do Banespa, a situação era
outra: o dinheiro do banco não havia “evaporado” ou sumido, deixando um
“rombo”. Havia, o que não foi satisfatoriamente explicado, um grande devedor,
que não estava pagando suas dívidas: o governo do estado. O Banespa nunca
quebrou. Quem estava “quebrado” era o governo do estado. Os créditos a receber
existiam. O dinheiro existia. Mas a equipe de FHC construiu uma imagem de
“quebra” para o Banespa, para abrir caminho para a privatização.”
“Ainda, acredite...
Com base na nova lei, o governo
FHC já providenciou “parcerias” para a Petrobras, isto é, sócios estrangeiros e
nacionais que passarão a investir, junto com a empresa estatal em pesquisa e
exploração de campos de petróleo.
Para completar, o governo FHC
também “tomou” da Petrobras áreas em que ela havia descoberto petróleo, ou indícios
de petróleo, para entregá-las a empresas nacionais ou multinacionais por meio
de licitações (concorrências). Parece incrível, mas é verdade: com base na nova
lei, a Petrobras foi obrigada a entregar todos os estudos e relatórios de
pesquisas que fez sobre as possíveis jazidas de petróleo no Brasil. Estudos e
pesquisas de décadas, que custaram dezenas e dezenas de bilhões de reais à
Petrobras, isto é, ao povo brasileiro. E que foram entregues à Agência Nacional
de Petróleo de graça, com um único objetivo: serem vendidos às empresas
interessadas em participar das concorrências. O preço cobrado pela Agência? De
novo, parece incrível: apenas 300 mil reais por todo o “pacote” de pesquisas
que custaram bilhões ao Brasil. Isso mesmo, 300 mil reais. E tem mais: as
empresas que quiserem comprar os estudos relativos apenas a uma região do país
poderão pagar uns 20 mil, 30 mil reais, qualquer trocadinho por eles. Um
assalto, literalmente, contra os contribuintes e cidadãos brasileiros, que
pagaram as pesquisas da Petrobras ao longo de décadas.
Detalhe final, que retrata o
comportamento do governo FHC e seus aliados no Congresso: há empresas
multinacionais que também estudaram o subsolo brasileiro, na década de 1970,
como participantes dos contratos de risco do governo Geisel. A nova lei não
previu que elas deveriam entregar esses estudos à Agência Nacional de Petróleo.
Só a Petrobras.”
“Não verás país nenhum
Numa sexta-feira, cinco dias
antes do leilão de “privatização” da Cemig, empresa de energia de Minas Gerais,
o presidente Fernando Henrique Cardoso assinou um decreto revolucionário. Por
ele, o BNDES ficou “autorizado” a — leia-se “recebeu ordens para” — conceder
empréstimos também a grupos estrangeiros. Reviravolta histórica — e
inconcebível. Criado para dar apoio ao desenvolvimento nacional, o banco
estatal se concentrou inicialmente no financiamento de projetos de
infraestrutura e, posteriormente, como instrumento de política industrial,
recebeu a incumbência de criar condições de competição para grupos nacionais.
Para cumprir esse papel, o BNDES estava proibido por lei de financiar empresas
estrangeiras. O decreto presidencial de 24 de maio de 1997 escancarou os cofres
do BNDES às multinacionais, para que comprassem estatais. Isso ao mesmo tempo
que o banco continuava proibido de conceder empréstimos às estatais
brasileiras, incumbidas dos setores de infraestrutura e básicos. Na
quarta-feira seguinte, um grupo norte-americano comprou um bloco de um terço
das ações da Cemig por 2 bilhões de reais, com metade desse valor financiado
pelo BNDES. Pois é.”
____________________
Livro II
“No começo dos anos 1990, o sonho estava ao alcance da mão, o Amanhã
chegava. O Brasil conquistara uma posição entre as dez maiores economias do
mundo. Melhor ainda: o Brasil nadava em dólares, porque era capaz de realizar
exportações muito maiores do que as importações. Poucos se lembram disso hoje,
mas o Brasil tinha um dos maiores saldos comerciais positivos (exportações
menos importações) do mundo, na casa dos 10 a 15 bilhões de dólares por ano.
Tinha dólares seus, não precisava mais de empréstimos ou de capital das
multinacionais para realizar investimentos e manter a economia em expansão para
criação de empregos e solução dos problemas do seu Povo.
Foi ontem, e está tudo tão
distante. A serviço de outros países, o governo escancarou o mercado às importações
e às multinacionais. Feiticeiros malditos transformaram o saldo positivo da
balança comercial em um “rombo” permanente, deram vantagens na cobrança de
impostos sobre a remessa de juros e de lucros, estimulando o envio de dólares
para o exterior, elevaram os juros para cobrir os rombos criados, “quebraram”
assim a União, os estados, os municípios. Destruíram a indústria e a
agricultura.
Em cinco ou seis anos, clones
malditos dos intelectuais de ontem destruíram o que havia sido construído ao
longo de décadas. Destruíram mais. Destruíram o sonho, a Alma Nacional. O que
somos hoje? Um quintal dos países ricos? Não. Somos um curral. Bovinos
ruminando babosamente enquanto o vizinho do lado, o trabalhador, o funcionário
público, o aposentado, o agricultor, o empresário, todos, um a um, são
arrastados para o grande matadouro em que o país se transformou, com suas mil
formas de abate como o desemprego, os cortes na aposentadoria, as falsas
reformas do funcionalismo, a falência, as importações. Bovinos ruminando no
curral, enquanto empresas de todos os portes são engolidas por grupos
estrangeiros e até o petróleo, ou os campos mais fabulosos de petróleo do
mundo, com poços capazes de produzir 10 mil barris por dia, cada um, são
entregues a preço simbólico às multinacionais.
Em cinco anos, o governo
Fernando Henrique Cardoso não destruiu apenas a economia nacional, tornando-a
dependente do exterior. Seu crime mais hediondo foi destruir a Alma Nacional, o
sonho coletivo. Para isso, e com a ajuda dos meios de comunicação, jogou o
consumidor contra os empresários nacionais, “esses aproveitadores”; o
contribuinte contra os funcionários públicos, “esses marajás”; o pobre contra
os agricultores, “esses caloteiros”; a opinião pública contra os aposentados,
“esses vagabundos”.
No governo FHC, o brasileiro
foi levado a esquecer que, em qualquer país do mundo, a sociedade só pode
funcionar com base em objetivos que atendam aos interesses e necessidades de
todos — ou, mais claramente, não se pode, por exemplo, ter uma política de
importação indiscriminada a pretexto de beneficiar o consumidor sem provocar
desemprego e quebra de empresas. Ou, a longo prazo, desemprego generalizado.
Com o jogo perverso de
estimular a busca de pretensas vantagens individuais, o governo FHC destruiu a
busca de objetivos coletivos. Destruiu a Alma Nacional, o Projeto Nacional. A
violenta desnacionalização sofrida pelo Brasil em sua economia vai eternizar a
remessa de lucros, dividendos, juros para o exterior. Isto é, vai torná-lo
totalmente dependente da boa vontade dos governos de países ricos em fornecer
dólares e, portanto, de ordens e autorizações desses governos de países ricos.
Uma espécie de colônia, mesmo, como alertou o economista Celso Furtado, em
palestra que encerrou com sua frase, arrasadora para quem viveu o Brasil de
1950 para cá: “Nunca estivemos tão distantes do Brasil com que um dia
sonhamos”. Mesmo sem tê-lo consultado a respeito, uma sugestão: escreva a frase
de Furtado em um pedaço de papel e a releia todos os dias. Ou faça decalques
com ela. Sugira que seus amigos façam o mesmo. E comece a agir. Ainda há tempo
de ressuscitar a Alma Nacional, antes que o Brasil vire colônia.”
“Classe média e
trabalhadores pagam até 27,5% de Imposto de Renda sobre tudo o que ganham —
isto é, sem o direito de descontar as despesas feitas para trabalhar, ter
renda. Abatimentos? Só ridículos valores para mensalidades escolares, despesas
médicas, dependentes. A Vale do Rio Doce, ex-estatal portentosa, “dona” de
outras 30 empresas das áreas de mineração, navegação, portos, celulose,
madeira, doada por FHC a um grupo liderado pelo sr. Steinbruch, teve um lucro
de 1,25 bilhão de reais em 1999, para um faturamento de 4,4 bilhões de reais.
Quanto vai pagar de Imposto de Renda? Segure-se na cadeira: míseros 5 (c-i-n-c-o)
milhões de reais. Ou menos de 0,5% do lucro, ou 0,125% do faturamento...
Como isso é possível? O
secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, já havia dado uma pista sobre
aberrações como esta ao depor no Congresso Nacional em meados do ano passado na
CPI sobre o socorro do Banco Central a bancos quebrados, na crise do Real em
janeiro de 1999. Maciel, tão sério que vivem pedindo sua demissão, apontou
distorções na cobrança dos impostos no Brasil, fazendo revelações
inacreditáveis, que, em outros países, derrubariam governos.
Primeiro: foi ele quem mostrou
que o governo estava perdendo bilhões de reais em impostos com as
privatizações. Como? Porque o “ágio”, ou diferença entre o preço pedido pelo
governo, nos leilões, e o preço oferecido pelo “comprador”, é devolvido pelo
Tesouro, sob a forma de abatimento no Imposto de Renda. Segundo: Maciel revelou
ao Congresso que metade das 500 maiores empresas do Brasil não pagam um tostão
de Imposto de Renda, e a outra metade paga em média apenas 5%. Por quê?
Sonegação? Não. Há “brechas” na lei, disse ele, de forma diplomática, mas na verdade
são privilégios e vantagens oferecidos pelo governo FHC às grandes empresas e
aos bancos, para reduzir o imposto devido. O balanço da Vale, com 0,5% de
Imposto de Renda sobre o lucro, é um retrato do Brasil de FHC/Malan, que
aumenta impostos e corta verbas para as áreas sociais em nome do “equilíbrio do
Tesouro”, e abre buracos no Tesouro para favorecer os grupos de elite. Mas ele
mostra muito, muito mais, sobre este Brasil.”
“Durante séculos, os países
ricos, que dependem de petróleo importado, fizeram guerras, trucidaram povos,
patrocinaram golpes de Estado para se apropriar de jazidas dos países pobres.
Hoje basta manipular governantes e a grande imprensa, e oficializar o assalto
em salões de luxo. Ah, sim: no dia dos leilões, correram dois boatos. Primeiro:
que o país ainda dispõe de uma instituição chamada Congresso Nacional. Segundo:
que, ainda por cima, seus integrantes pensam no interesse nacional. Do Brasil,
claro.”
“Há dois domingos, os paulistas
tiveram a oportunidade de avaliar a evolução de seu governador. O jornalista
Bóris Casoy, que o entrevistava, questionou Covas sobre a privatização do
Banespa e suas críticas ao secretário da Receita Federal, por causa da multa de
2,8 bilhões de reais aplicada ao banco. A resposta veio rasteira e rápida: “Eu
quero é o ‘meu’ (dinheiro). O culpado por essa multa deve pagá-la”. Para
avaliar melhor a atitude do governador, é preciso recapitular alguns fatos:
• Intervenção — o Banespa
sofreu intervenção do governo federal, às vésperas da posse de Covas. O Banco
Central alegou que o banco paulista estava “quebrado”. O tempo se encarregou de
mostrar que isso era mentira, como deixou claro também que os interventores do
Banco Central “falsificaram” balanços do Banespa para inventar prejuízos.
Motivo das manobras: convencer os paulistas da (falsa) necessidade de
privatizar o Banespa. O governador Covas foi conivente.
• Prova definitiva — agora,
preste atenção. A multa aplicada pela Receita Federal tem uma importância
imensa, que a grande imprensa não destacou até agora. Qual é? Veja bem: o
Banespa foi multado exatamente porque seus diretores, os interventores do
governo federal, fizeram (outros) balanços falsos para criar prejuízos
inexistentes ou reduzir os lucros. Reflita um minuto: o episódio da multa
revelou, para a sociedade brasileira, aquilo em que ela se recusava a
acreditar: o governo FHC/Malan & Cia. Falsifica até balanços para forçar a
privatização, isto é, para poder doar patrimônio coletivo a determinados grupos
empresariais, brasileiros ou multinacionais. Há governadores coniventes com
esse autêntico assalto, em que bilhões e bilhões de reais pertencentes aos
contribuintes, isto é, trabalhadores, classe média, empresários, agricultores,
são transferidos para os bolsos e os cofres de grupos que enriquecem cada vez
mais.
A esta altura, você deve estar
pensando com seus botões: “Pelo menos o governador Covas está defendendo os
contribuintes de São Paulo, recusando-se a pagar a multa”. Engano seu. Pense bem:
os balanços falsificados representam prejuízos gigantescos ao Estado (aos
paulistas), que continua a ser acionista do banco, e Covas não tocou nesse
assunto. Continua conivente. “Atrelado” ao governo FHC e às manobras sujas da
política de privatização. Passado esquecido.”
“As provas do crime (Diário Popular,
23/11/99)
O governo do estado do Rio de Janeiro gastou 7 bilhões (com a letra bê) de reais para
“preparar” o seu banco, o Banerj, para a “privatização”. O “comprador”, o Itaú,
pagou apenas 310 milhões (com a letra eme), ou quase 25 vezes menos, no leilão.
O governo da Bahia gastou 2 bilhões (com a letra bê) para preparar o seu banco,
o Baneb, para a “privatização”. O “comprador”, o Bradesco, pagou apenas 260
milhões, ou oito vezes menos, no leilão. Três meses depois, o Bradesco recebeu
de volta nada menos de 240 milhões, pagos pelo Tesouro, isto é, por todos os
brasileiros. Ou seja, o Bradesco pagou apenas 20 milhões de reais, o preço de
dez apartamentos de luxo, por um banco estadual, com toda a sua rede de
agências, dezenas de milhares de clientes, rede de informática, caixas
automáticos etc. O governo baiano ficou com dívidas de 1,7 bilhão, assim como o
governo do Rio ficou com dívidas de 6,7 bilhões, o governo federal gastou 240
milhões, ou um quarto de bilhão. Os bancos compradores ficaram com os lucros e
o patrimônio de bilhões de reais formado com o dinheiro dos cidadãos ao longo
de décadas.
Essas aberrações são
relembradas pelo jornalista Alex Ribeiro em reportagem publicada ontem pela Folha
de S. Paulo. Elas já são suficientes para demonstrar que as privatizações
comandadas pelo governo FHC são criminosas: as empresas e os bancos estatais
não estão apenas sendo literalmente doados aos grupos privilegiados,
brasileiros ou multinacionais. O assalto vai mais longe: na prática, estamos
até pagando, bilhões de reais, para que os compradores “façam” o favor de
embolsar o patrimônio coletivo e tenham lucros bilionários.
O esquema montado pelo governo
FHC para espoliar a sociedade brasileira chega a ser maquiavélico: numa
primeira etapa, a própria equipe econômica, o Banco Central, faz manobras para
“inventar” prejuízos nos balanços dos bancos estatais já escolhidos para ser
privatizados. Com essa falsificação, o governo FHC atinge dois objetivos. De um
lado, engana a opinião pública, isto é, consegue convencer os cidadãos de que
os bancos estatais não dão lucros e, portanto, é vantajoso privatizá-los a
qualquer preço. De outro, essa mesma falsificação não apenas reduz o preço a
ser pago pelos “compradores” como garante que eles terão rapidamente lucros de
centenas de milhões ou bilhões de reais — como ocorreu com o Bradesco e o Itaú,
nas compras do Banerj e do Baneb. Lucros que seriam dos governos estaduais e do
governo federal, isto é, de toda a população, e que vão para os cofres de
grupos privilegiados. Responda você mesmo: os paulistas vão aceitar que o
Banespa seja doado, ou, pior, vão pagar para que os banqueiros privados
abocanhem o seu patrimônio?”
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