sexta-feira, 5 de agosto de 2022

A Luta Contra o Fascismo: Revolução e Contrarrevolução (Parte I), de Leon Trotsky

Editora: Sundermann

ISBN: 978-85-4556-006-7

Tradução: Mario Pedrosa (1933) e Rafael Padial (2019)

Opinião: ★★☆☆☆

Páginas: 440

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Sinopse: A Luta Contra o Fascismo: Revolução e Contrarrevolução, a Editora Sundermann oferece ao leitor um dos maiores clássicos do marxismo. Sua primeira edição traduzida do russo foi publicada em 1933 sob o título Revolução e Contrarrevolução na Alemanha. Trata-se de um conjunto de textos escritos por Leon Trotsky entre 1930 e 1933. Agregamos a esta edição os textos “A vitória de Hitler significará a guerra contra a URSS”, de 1932, “Hora da decisão”, “A tragédia do proletariado alemão” e “Que é o nacional-socialismo”, de 1933, extraídos e traduzidos do livro Comment vaincre le fascisme, publicado pela Les Editions de la Passion em 1993.



“De sua análise, Engels concluía que seria preciso esperar que chegasse “primeiramente a vez da democracia dos pequenos burgueses, antes da classe operária e comunista poder esperar tomar o poder e abolir definitivamente esse sistema de salariato que a conserva sob o jugo da burguesia”.

Assim, quase um século depois, percebe-se hoje claramente que o que se está decidindo atualmente na Alemanha não é mais do que o mesmo processo histórico iniciado em 1848. O processo do desenvolvimento industrial, pari passu com o desenvolvimento do proletariado e de sua consciência de classe, iniciado naquela época, encontra agora o seu epílogo. A pequena burguesia, então revolucionária, tinha fatalmente de ocupar o primeiro lugar na cena política e era a condutora natural do proletariado na senda da revolução. O proletariado via-se obrigado a pegar em armas para defender interesses que não eram diretamente os seus.

A situação em nossos dias é outra. E o problema que se põe agora com toda a sua grandeza e agudez é o problema da tomada do poder pelo proletariado. A pequena burguesia tornou-se para sempre incapaz de conduzir qualquer movimento independente. Os papéis se inverteram: agora, ou ela segue o proletariado para o futuro, ou toma a direita para a reação.

De democrática revolucionária que era, passa a reacionária; de jacobina, transforma-se em fascista. O fascismo, segundo a definição de Trotsky, não é mais do que a caricatura reacionária do jacobinismo na época do capitalismo em decadência.

Enquanto em 1848 a pequena burguesia fazia o proletariado lutar por ela contra a sociedade feudal, em 1933 vê-se mobilizada pelo capital financeiro, como um aríete contra a classe operária organizada: espera assim vencer a crise que corrói o regime e que a leva à miséria, sair da situação desesperada em que se encontra, procurando destruir os fatores de intensificação da implacável luta que enche toda a nossa época, travada entre a burguesia e o proletariado. Eis o fundamento do fascismo.”

(Mario Pedrosa)

 

 

“A Alemanha, pelo contrário, não é tarefa fácil. A Europa balcanizada em Versalhes está num impasse. O nacional-socialismo é a expressão política concentrada da Alemanha. Em termos de psicologia social, essa corrente pode ser descrita como uma histeria contagiosa, nascida do desespero das camadas médias. Pensemos nos pequenos comerciantes, artesãos e camponeses arruinados, numa parte do proletariado desempregado, nos oficiais e ex-oficiais da Grande Guerra, que ainda portam suas condecorações mas mal recebem salário, nos empregados de escritórios fechados, nos contadores de bancos falidos, nos engenheiros sem emprego, nos jornalistas sem trato nem perspectiva, nos médicos cujos clientes ainda estão doentes, mas não sabem como lhes pagar.”

 

 

“As camadas possuidoras são muito pouco numerosas e muito odiadas pelo povo para dirigir em seu próprio nome. É necessária a eles uma cobertura: monarquia tradicional (“pela graça de deus”), liberalismo parlamentar (“a soberania do povo”), bonapartismo (“o árbitro imparcial”) ou, enfim, fascismo (“a cólera do povo”).”

 

 

O campo do proletariado

Quando o Partido Comunista oficial declara que a social-democracia é o suporte mais importante da dominação burguesa, nada faz senão repetir as ideias da III Internacional no momento de sua fundação. A social-democracia preza pelo regime capitalista, e por isso a burguesia a associa ao poder. A social-democracia tolera qualquer governo burguês que tolere a social-democracia. Mesmo totalmente afastada do poder, a social-democracia continua a sustentar a sociedade burguesa, recomendando aos operários que poupem suas energias para os momentos de combate (os quais ela nunca está disposta a convocar). Ao paralisar a energia revolucionária do proletariado, a social-democracia dá à sociedade burguesa a possibilidade de viver, ainda que ela não tenha mais força para viver e, por isso mesmo, encontre no fascismo uma necessidade política. O chamado por conduzir Hitler ao poder emana do marechal de campo dos Hohenzollern, eleito graças às vozes dos sociais-democratas. A corrente política que leva de Wels a Hitler tem um caráter particular muito evidente. Não pode haver duas opiniões diferentes a esse respeito entre marxistas. Mas o problema não é de interpretar a situação política, e sim de transformá-la de forma revolucionária.

O erro da burocracia stalinista não consiste em ser “intransigente” com a social-democracia, mas em tornar essa “intransigência” algo politicamente impotente.”

 

 

“Na abundante literatura dedicada à questão do fascismo, basta nos referirmos ao discurso do chefe oficial do partido alemão, Thälmann, que, no plenum do Comitê Executivo da Internacional Comunista, em abril de 1931, “desmascarou” da seguinte forma os “pessimistas” — isto é, aqueles que sabem minimamente olhar o futuro —: “não nos deixamos enganar pelos medrosos... Nós constatamos firmemente e com bom senso que o dia 14 de setembro [de 1930] foi, de certa forma, o ponto alto de Hitler, e que os próximos dias não serão melhores para ele, mas piores; essa apreciação do desenvolvimento de seu partido [de Hitler] foi confirmada pelos eventos... Hoje, os fascistas já não têm mais qualquer motivo para sorrir.” Em alusão ao fato de que a social-democracia formava então seus próprios grupos de defesa, Thälmann argumentou em seu discurso que esses destacamentos não se distinguiam em nada das tropas de choque do nacional-socialismo e que ambos se preparavam para esmagar os comunistas.

Hoje, Thälmann está preso. Os bolcheviques-leninistas encontram-se com ele, sob os golpes da reação triunfante. Mas a política de é a política de Stalin, ou seja, a política oficial da Internacional Comunista. É precisamente essa política a causa da desmoralização completa do partido no momento do perigo, quando os chefes perdem a cabeça, quando os militantes perderam o hábito de pensar e caem num estado de prostração, quando as posições históricas mais importantes são perdidas sem combate. Uma teoria política errada contém nela mesma seu castigo. A força e a obstinação do aparelho apenas aumentam a amplitude da catástrofe.”

 

 

“Os espíritos ingênuos acreditam que o título de rei mantém o próprio rei em carne e osso, com seu manto de pele e sua coroa. Na realidade, o título de rei nasce das relações entre os homens. O rei só é rei porque sua pessoa reflete interesses e ideologias de milhões de homens. Quando tais relações se erodem na torrente dos acontecimentos, o rei nada mais é que um ser humano desgastado, com um lábio inferior que pende ante aos acontecimentos.”

 

 

“A bandeira do nacional-socialismo foi erguida pelos homens saídos dos quadros médios e subalternos do antigo exército. Cobertos de condecorações, oficiais e suboficiais não podiam admitir que seu heroísmo e sofrimento pela pátria tenham sido em vão e, sobretudo, que não teriam qualquer direito a reconhecimento especial em seu país. Daí seu ódio pela revolução e pelo proletariado, E não queriam aceitar que banqueiros, industriais e ministros lhes relegassem a postos insignificantes de contadores, engenheiros, funcionários de correios e professores. Daí seu “socialismo”. Durante as batalhas de Yser e de Verdum, aprenderam a arriscar sua vida e a de outros, bem como a falar a linguagem do comando, que impuseram aos pequeno-burgueses da retaguarda. Foi assim que se tornaram chefes.

No começo de sua carreira política, Hitler não se destacava, senão, talvez, por um temperamento mais enérgico, uma voz mais forte, uma estreiteza de espírito mais segura de si mesma. Ele não trazia ao movimento qualquer programa pronto, senão a sede de vingança do soldado humilhado, Hitler começou pelas injúrias e recriminações contra as condições [do Tratado] de Versalhes, o custo de vida, a falta de respeito aos meritosos suboficiais, as intrigas de banqueiros e jornalistas sobre a fé de Moisés. Havia no país muita gente arruinada, afogada, coberta de cicatrizes e feridas frescas. Cada uma delas queria bater o punho na mesa. Hitler fazia-o melhor que todos. É verdade que ele não sabia como remediar todos os males. Mas suas acusações ressoavam ora como ordens, ora como prece por um destino infalível. As classes condenadas, como doentes incuráveis, não se cansam de evocar seus sofrimentos nem de receber consolações. Todos os discursos de Hitler soavam nesse diapasão. Um sentimentalismo disforme, uma ausência total de rigor no raciocínio, uma ignorância mascarada por erudição desordenada: tudo o que era menos se tornou mais. Isso lhe deu a possibilidade de enfiar todas as formas de descontentamento no saco de mendigo do nacional-socialismo e conduzir a massa aonde ela queria. Das suas primeiras improvisações, o agitador conservou em sua memória apenas o que recebeu aprovação. Suas ideias políticas são fruto de uma acústica oratória. Foi assim que selecionou suas palavras de ordem e construiu seu programa. E foi de tal matéria bruta que se esculpiu o “chefe”.

Desde o início, Mussolini se voltou de forma mais consciente à matéria social do que Hitler, o qual está mais próximo do misticismo policial de um Matternich do que da álgebra política de um Maquiavel. Do ponto de vista intelectual, Mussolini é mais audacioso e cínico. Basta lembrar que o ateu romano apenas se serviu da religião, da mesma forma como fez com a polícia e a justiça, enquanto seu colega berlinense crê piamente na proteção particular da divina Providência. Na época em que o futuro ditador italiano ainda considerava Marx “o mestre imortal de todos nós”, defendia, não sem habilidade, a teoria que considera como vida da sociedade atual a interação de duas classes fundamentais: a burguesia e o proletariado. É verdade, escrevia Mussolini em 1914, que entre elas se colocam numerosas camadas intermediárias, que formam um tipo de “tecido conjuntivo do coletivo humano”; mas, “nos períodos de crise, as classes intermediárias são conduzidas, com base em seus interesses e suas ideias, por uma ou outra dessas duas classes fundamentais”. Generalização muito importante! Sabe-se que a ciência médica pode curar uma doença, no entanto, pode também, de maneira bastante expressa, enviar um sujeito saudável ad patres13. Da mesma forma, a análise científica das relações de classe, destinada por seu autor à mobilização do proletariado, permitiu a Mussolini, quando passou ao campo inimigo, mobilizar as classes intermediárias contra o proletariado. Hitler realizou o mesmo trabalho, traduzindo para a linguagem mística alemã a metodologia do fascismo.

As fogueiras em que arde a literatura ímpia do marxismo iluminam vivamente a natureza de classe do nacional-socialismo. Enquanto os nazis agiam como partido e não como poder de Estado, o acesso à classe operária lhes estava praticamente cerrado por completo. Por outro lado, a grande burguesia, mesmo aquela que sustentou Hitler financeiramente, não considerava o nacional-socialismo um partido seu. O “renascimento” nacional se apoiava inteiramente nas classes médias — a parte mais atrasada da nação, o fardo pesado da história. A habilidade política consistia em soldar a unidade da pequena burguesia por meio do ódio ao proletariado. Que fazer para ficar melhor? Antes de tudo, esmagar os que estão abaixo de si. A pequena burguesia, impotente frente ao grande capital, esperava ao menos reconquistar sua dignidade social por meio do esmagamento dos operários.

Os nazis batizaram seu golpe de Estado com um nome usurpado da revolução. De fato, na Alemanha, como na Itália, o fascismo deixa o sistema social inalterado. O golpe de Estado de Hitler, enquanto tal, nem mesmo tem direito ao título de “contrarrevolução”. Porém não deve ser considerado isoladamente: ele é o fechamento de um ciclo de abalos que começou na Alemanha de 1918. A revolução de novembro, que deu poder a conselhos de operários e soldados, foi fundamentalmente proletária. Mas o partido que estava à frente do proletariado entregou o poder à burguesia. Nesse sentido, a social-democracia abriu uma era de contrarrevolução antes de a revolução ter tempo de terminar sua obra. De toda forma, enquanto a burguesia dependia da social-democracia, e, por consequência, dos operários, o regime conservava elementos de compromisso. Mas a situação interior e internacional do capitalismo alemão não deixava mais espaço a concessões. Se a social-democracia salvou a burguesia da revolução proletária, o momento chegou para o fascismo libertar a burguesia da social-democracia. O golpe de Estado de Hitler é o elo final da cadeia das forças contrarrevolucionárias.

A pequena-burguesia é hostil à ideia de desenvolvimento, pois esse se volta inevitavelmente contra ela própria: o progresso não lhe traz nada, senão dívidas impagáveis. O nacional-socialismo rejeita o marxismo, mas também o darwinismo. Os nazis amaldiçoam o materialismo, pois as vitórias da técnica sobre a natureza levaram à vitória do grande capital sobre o pequeno. Os chefes do movimento atacam o “intelectualismo” não tanto porque possuam eles mesmos inteligência de segunda ou terceira ordem, mas sobretudo porque seu papel histórico não admite que um pensamento seja levado ao limite da conclusão lógica. O pequeno burguês necessita de uma instância superior, localizada acima da matéria e da história, protegida da concorrência, da inflação, da crise e das hipotecas. Ao desenvolvimento, ao pensamento econômico, ao racionalismo — aos séculos 20, 19, e 18 —, opõem o idealismo nacionalista como fonte de um princípio heroico. A nação de Hitler é a sombra mítica da própria pequena burguesia, seu sonho patético de um reino milenar sobre a terra.

Para erguer a nação acima da história, dá-lhe o bastião da raça. A história é compreendida como uma emanação da raça. As qualidades da raça são construídas independentemente das condições sociais que mudam. Rejeitando o “pensamento econômico” como vil, o nacional-socialismo regride um degrau: do materialismo econômico, passa ao materialismo zoológico. (...)

No plano político, o racismo é uma variedade hipertrofiada e modesta do chauvinismo, associado à frenologia. Assim como a aristocracia arruinada busca uma consolação na nobreza do seu sangue, a pequena burguesia pauperizada se embriaga nas lendas dos méritos particulares de sua raça. É curioso notar que os chefes do nacional-socialismo não são alemães puros, mas originários da Áustria, como o próprio Hitler, ou de antigas províncias bálticas do Império Tsarista, como Rosenberg, ou de países coloniais, como Hess, o atual substituto de Hitler na direção do partido. Foi necessária uma escola de agitação nacionalista e bárbara dos confins da civilização para ensinar aos “chefes” as ideias que ecoaram no coração das classes mais bárbaras do interior da Alemanha.

O indivíduo e a classe — o liberalismo e o marxismo — eis o mal. A nação é o bem. Mas, no caso da propriedade, essa filosofia tem de se tornar seu oposto. A salvação está unicamente na propriedade individual. A ideia de propriedade nacional é uma invenção bolchevique. Ao mesmo tempo em que divide a nação, a pequena burguesia não lhe quer dar nada. Pelo contrário, ela espera que a nação lhe distribua a propriedade e lhe proteja do operário e do oficial de justiça. Infelizmente, o Terceiro Reich não dará nada ao pequeno burguês, apenas novos impostos.

No domínio da economia contemporânea, internacional por suas ligações, impessoal por seus métodos, o princípio da raça parece saído de um cemitério medieval. Os nazistas fazem concessões por antecedência: a pureza da raça, que se contenta com um passaporte para o reino do espírito, deve provar sua força principalmente pela eficácia no domínio econômico. Isso significa, nas condições atuais, ser competitivo. Pela porta dos fundos, o racismo retorna ao liberalismo econômico, desembaraçado das liberdades políticas.

O nacionalismo em economia se reduz, na prática, às explosões impotentes, ainda que brutais, de antissemitismo. Os nazis separam do sistema econômico atual, como força impura, o capital usurário ou bancário: a burguesia judia ocupa, precisamente nessa esfera, como se sabe, um espaço importante. Ao mesmo tempo em que se prostra por completo frente ao capitalismo, a pequena burguesia declara guerra contra o espírito maldoso do lucro, personificado no judeu polonês de longo casaco (e, muitas vezes, sem um centavo no bolso). O pogrom se torna a prova superior da superioridade da raça.

O programa com o qual o nacional-socialismo chegou ao poder relembra muito, infelizmente, as lojas “universais” de judeus nos buracos das províncias: o que não se encontra lá, a preços baixos e numa qualidade ainda mais baixa?! Lembranças dos tempos “felizes” da livre concorrência e lendas sobre a solidariedade da sociedade dividida em Estados; esperanças de renascimento de um império colonial e sonhos de uma economia fechada; frases sobre abandonar o direito romano e retornar ao direito germânico, combinados a proclamações sobre a moratória americana; hostilidade invejosa frente à desigualdade, simbolizada na mansão e no automóvel, e medo animalesco frente à igualdade, simbolizada no operário de boné e sem colarinho; desencadeamento do nacionalismo e medo diante dos credores mundiais... Todos os dejetos do pensamento político internacional vêm preencher o tesouro intelectual do novo messianismo alemão.

O fascismo levou à política os setores mais profundos da sociedade. Não apenas nas casas camponesas, mas também nos arranha-céus das cidades ainda vivem, paralelamente, os séculos 20, 10 e 12. Centenas de milhões de pessoas utilizam a corrente elétrica sem deixar de crer nas forças mágicas dos gestos e dos encantamentos. Em Roma, pela rádio, o Papa faz preces a respeito do milagre da transformação da água em vinho. Astros de cinema vão a cartomantes. Aviadores, pilotando maravilhas mecânicas, criadas pela genialidade humana, escondem amuletos embaixo dos seus macacões. Que reservas inesgotáveis de obscurantismo, ignorância e barbárie! O desespero os ergueu, o fascismo lhes deu uma bandeira. Tudo o que o desenvolvimento livre da sociedade deveria rejeitar do organismo nacional, sob a forma de excremento da cultura, é hoje vomitado publicamente: a civilização capitalista regurgita uma barbárie não digerida. Tal é a fisiologia do nacional-socialismo.

O fascismo alemão, como o fascismo italiano, içou-se ao poder sobre as costas da pequena burguesia, a qual utilizou como aríete contra a classe operária e as instituições democráticas. Mas um governo da pequena burguesia é a última coisa que significa o fascismo. Pelo contrário, ele é a ditadura mais impiedosa do capital monopolista. Mussolini tem razão: as classes intermediárias não são capazes de realizar uma política independente. Nos períodos de crise, elas são chamadas a conduzir, até o limite do absurdo, a política de uma das duas classes fundamentais. O fascismo conseguiu colocá-las a serviço do capital. Palavras de ordem como estatização dos trustes e supressão das rendas não provenientes do trabalho foram lançadas ao mar tão logo os fascistas chegaram ao poder. A defesa do particularismo das “terras” alemãs, apoiada sobre as particularidades da pequena-burguesia, foi logo substituída pelo centralismo policialesco capitalista. Cada sucesso político interior e exterior do nacional-socialismo marcará inevitavelmente a continuidade do esmagamento do pequeno capital pelo grande.

O programa de ilusões pequeno-burguesas não está suprimido; destaca-se da realidade e se transforma em atos ritualísticos. A união de todas as classes se reduz a um “trabalho obrigatório” praticamente simbólico e ao “confisco em proveito do povo” da manifestação operária de primeiro de maio. A manutenção do alfabeto gótico em detrimento do latino é uma revanche simbólica contra o jugo do mercado mundial. A dependência em relação aos banqueiros mundiais — entre os quais, muitos judeus — não diminui uma vírgula; mas, em compensação, fica proibido degolar animais segundo os rituais do Talmude Se o caminho para o inferno está cheio de boas intenções, as avenidas do Terceiro Reich são pavimentadas por simbologia.

Uma vez que o programa de ilusões pequeno-burguesas se reduz a pleno e simples disfarce burocrático, o nacional-socialismo se ergue acima da nação como forma mais pura de imperialismo. É vã a esperança de que o governo de Hitler caia, se não hoje, amanhã, vítima de sua própria inconsistência interna. Um programa era necessário aos nazis para chegar ao poder; mas o poder não será usado por Hitler para completar esse programa. É o capital monopolista que lhe dita as regras e tarefas. A concentração forçada de todas as energias e meios do povo no interesse do imperialismo, que é a verdadeira missão histórica do fascismo, implica na preparação da guerra. Tal objetivo, por sua vez, não tolera qualquer resistência interior e conduz diretamente à concentração futura do poder. É impossível reformar o fascismo ou lhe dar trégua. Só é possível derrubá-lo. A órbita política do regime dos nazis se resume a esta disjuntiva: guerra ou revolução.”

13 Expressão latina que significa “aos antepassados”. Ou seja: à morte. (N. do T.)

 

Fim dos textos complementares

 

XXXXXXXXXXXX

 

 

Revolução e contrarrevolução

 

“Na situação atual do mundo, o tempo é a mais preciosa das matérias-primas.”

 

 

“A primeira qualidade de um partido verdadeiramente revolucionário é poder olhar de frente a realidade.”

 

 

“Se o Partido Comunista é um partido de esperança revolucionária, o fascismo, como movimento de massas, é então um partido de desespero contrarrevolucionário.”

 

 

“O fascismo é um perigo real na Alemanha. É a expressão aguda da situação sem saída do regime burguês, do papel conservador da social-democracia em relação a esse regime e da fraqueza acumulada do KPD* para destruir esse regime. Quem nega isso é um cego ou um fanfarrão.”

*: Kommunistische Partei Deutschlands – Partido Comunista da Alemanha.

 

 

“Toda situação crítica contém em si grandes fontes de incertezas. Os estados de espírito, os pontos de vista e as forças inimigas e amigas formam-se no processo da crise. Não se pode prevê-los matematicamente de antemão. É necessário medi-los no processo da luta, pela luta, e introduzir, segundo essas medidas vivas, as correções necessárias na política.”

 

 

“É evidente que a escolha do momento para a luta decisiva depende não somente de nós, mas também dos nossos inimigos. Estamos todos de acordo em que atualmente a tarefa de nossa estratégia deve ser dificultar, e não facilitar, o desenlace por parte de nossos inimigos. Se os nossos inimigos nos impõem a luta, nós, é claro, a aceitaremos, pois não há e não pode haver derrota mais pesada, mais funesta, mais humilhante e mais desmoralizadora do que o abandono sem combate de grandes posições históricas.”

 

 

“A massa não é uma argila mole que se pode modelar como se queira. Ela reage à sua maneira, lentamente, mas solidamente, contra os erros e as cretinices da direção.”

 

 

“O fascismo é o filho legítimo da democracia formal da época da decadência.”

 

 

“O fascismo, se não se brinca estupidamente com as palavras, não é absolutamente um traço distintivo de todos os partidos burgueses, mas constitui um partido burguês especial, adaptado a condições e tarefas particulares, em oposição aos partidos burgueses e, do modo mais violento, precisamente à social-democracia.

Pode-se procurar objetar a isto que a hostilidade dos partidos burgueses entre si é muito relativa. Isto não é apenas verdadeiro, é o abecê da verdade, o que, entretanto, não nos faz avançar um passo. O fato de que todos os partidos burgueses, do fascismo à social-democracia, coloquem a defesa da dominação burguesa acima de suas divergências de programa não suprime, entretanto, nem a diferença desses partidos, nem a luta entre eles, nem a nossa obrigação de tirar proveito dessa luta.”

 

 

“Nas operações de guerra, como na política das crises revolucionárias, o cálculo do tempo é de uma importância decisiva.”

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