Editora: Clube de Literatura Clássica
ISBN: 978-65-87036-22-9
Opinião: ★★★★☆
Páginas: 360
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Sinopse: Nesta
história, que se passa no interior da França, somos apresentados a Landry e
Sylvinet, gêmeos idênticos na aparência e opostos no temperamento. A relação
dos irmãos, até então inseparáveis, é abalada pela chegada de Fadette, menina
pobre e desprezada que se apaixona por Landry e causa ciúmes em Sylvinet.
“Para os homens de ação que se ocupam
pessoalmente da política, há, em toda decisão, em toda situação, uma febre de
esperança ou de angústia, uma cólera ou uma alegria, a embriaguez do triunfo ou
a indignação da derrota. Mas para o pobre poeta, como para a mulher ociosa, que
contemplam os acontecimentos sem neles encontrar um interesse direto e pessoal,
qualquer que seja o resultado da luta, há o horror profundo ao sangue derramado
de uma parte e de outra, uma espécie de desespero à vista desse ódio, dessas
injúrias, dessas ameaças, dessas calúnias que sobem aos céus como um holocausto
impuro, após as convulsões sociais.
Nesses momentos, um gênio tempestuoso e
poderoso como o de Dante escreve com suas lágrimas, com sua bile, com seus
nervos, um poema terrível, um drama todo repleto de torturas e de gemidos. É preciso
ter a têmpera dessa alma de ferro e de fogo para deter a imaginação sobre os
horrores de um inferno simbólico, quando se tem diante dos olhos o doloroso
purgatório da desolação sobre a terra. Em nossos dias, mais fraco e mais
sensível, o artista, que é tão-somente o reflexo e o eco de uma geração bem
parecida com ele, sente a necessidade imperiosa de desviar a vista e de
distrair a imaginação, dirigindo-se a um ideal de calma, de inocência e de
devaneio. É sua enfermidade que o faz agir assim, mas que ele não enrubesça por
isso, pois isto também é seu dever. No tempo em que o mal vem do fato de os
homens se ignorarem e se odiarem, a missão do artista é celebrar a brandura, a confiança,
a amizade, lembrando assim aos homens empedernidos ou desalentados que os
costumes puros, os sentimentos ternos e a igualdade primitiva são, ou podem
ser, ainda deste mundo. As alusões diretas aos infortúnios presentes, o apelo
às paixões que fermentam, não é este o caminho da salvação; mais vale uma doce
canção, o som da flauta rústica, um conto para ninar as criancinhas sem pavor e
sem sofrimento, que o espetáculo dos males reais reforçados e obscurecidos
também pelas cores da ficção.” (Prefácio)
“— A natureza não mudou, prosseguiu meu
amigo: a noite é sempre pura, as estrelas brilham sempre, e o tomilho selvagem sempre
cheira bem.
— Mas os homens pioraram, e nós como os
outros. Os bons se tornaram fracos; os fracos, medrosos; os medrosos, covardes;
os generosos, temerários; os céticos, perversos; os egoístas, ferozes.
— E nós, disse ele, que éramos nós e o que
nos tornamos?
— Éramos tristes, tornamo-nos infelizes,
respondi-lhe.
Ele repreendeu meu desânimo e quis provar que
as revoluções não são leitos de rosas. Eu o sabia muito bem e, da minha parte,
isso não me preocupava; mas ele também quis provar que a escola da infelicidade
era boa e desenvolvia forças que a calma termina por entorpecer. Não concordei
com ele naquele momento; eu não podia aceitar tão facilmente os maus instintos,
as más paixões e as más ações que as revoluções trazem à tona. Um pouco de
embaraço e de aumento de trabalho pode ser bastante salutar para as pessoas de
nossa condição, dizia-lhe eu; mas o aumento da miséria é a morte do pobre. Além
disso, deixemos de lado o sofrimento material: há, na humanidade, neste
momento, um sofrimento moral que nada pode trazer de bom. O mau sofre, e o
sofrimento do mau é a raiva; o justo sofre, e o sofrimento do justo é o
martírio, ao qual poucos homens sobrevivem.
— Estás então perdendo a fé? perguntou-me meu
amigo, escandalizado.
— É o momento da minha vida em que, pelo
contrário, mais tive fé no futuro das ideias, na bondade de Deus, nos destinos
da revolução. Mas a fé se conta em séculos; e a ideia abrange o tempo e o
espaço, sem fazer caso dos dias e horas; e nós, pobres humanos, contamos os
instantes de nossa rápida passagem e saboreamos sua alegria ou amargura, sem podermos
nos proibir de viver pelo coração e pelo pensamento com nossos contemporâneos.
Quando eles se desorientam, nós nos inquietamos; quando se perdem, nos
desesperamos; quando sofrem, não podemos ficar sossegados e felizes. A noite
está bela, dizes, e as estrelas brilham. Sem dúvida, essa serenidade tanto dos
céus quanto da terra é a imagem da imperecível verdade cuja fonte divina os
homens não são capazes de esgotar nem turvar. Mas, enquanto contemplamos o éter
e os astros, enquanto respiramos o perfume das plantas selvagens e a natureza
canta à nossa volta seu eterno idílio, há gente sufocando, definhando,
chorando, estertorando, expirando nas mansardas e masmorras. Jamais a raça humana
fez ouvir um queixume mais surdo, rouco e ameaçador. Tudo isso passará, e o
futuro nos pertence, eu sei; mas o presente nos dizima. Deus sempre reina; mas,
neste momento, não governa.
— Faz um esforço para sair desse abatimento,
disse-me meu amigo. Pensa em tua arte e trata de encontrar algum encanto para
ti mesmo nos prazeres que ela te impõe.
— A arte é como a natureza, disse-lhe eu: é
sempre bela. Ela é como Deus, que é sempre bom, mas há épocas em que ela se
contenta em existir no estado de abstração, podendo se manifestar mais tarde,
quando seus adeptos forem dignos. Então seu sopro reanimará as liras há muito emudecidas;
mas poderá vibrar aquelas que se partiram na tempestade ? A está hoje em
processo de decomposição para uma nova eclosão. Ela é como todas as coisas
humanas em tempos de revolução, como as plantas que morrem no inverno para
renascer na primavera. Mas o mau tempo faz muitos germes perecer. Que
importância têm, na natureza, algumas flores ou alguns frutos a menos? Que
importância têm, na humanidade, algumas vozes extintas, alguns corações
congelados pela dor ou pela morte? Não, a arte não conseguiria me consolar do
que a justiça e a verdade sofrem hoje na terra. A arte viverá bem sem nós.
Esplêndida e imortal como a poesia, como a natureza, ela sorrirá sempre sobre
nossas ruínas. Nós que atravessamos esses dias nefastos, antes de artistas, tratemos
de ser homens; temos muito mais a lamentar do que o silêncio das musas.”
“Era bem verdade que ele era o mais sensível
dos dois, fosse por ter um temperamento menos forte, fosse porque Deus, em sua
lei da natureza, tivesse escrito que de duas pessoas que se amam, seja por
amor, seja por amizade, houvesse sempre uma que devesse entregar seu coração
mais do que a outra.”
“Então, Landry, tendo prometido fazer o seu
melhor, foi para a lavoura, onde se portou bem e trabalhou bem todo o dia, e
donde voltou com grande apetite; pois era a primeira vez que trabalhava tão
arduamente, e um pouco de fadiga é um remédio infalível contra a tristeza.”
“Jamais se faz justiça quando se deixa
consumir o próprio coração pelo ciúme.”
“Na roça, ninguém jamais é sábio sem ser um
pouco bruxo.”
“Há quem seja feliz demais e não conheça sua
sorte.”
“— Seus pais o ensinaram a ser ingrato,
Landry, e esse é o pior defeito para um homem, depois de ser medroso.”
“— Não há tolice maior do que mostrar seu
próprio sofrimento aos outros.”
“As mulheres têm o coração feito de modo que
um rapaz começa a parecer homem assim que elas o veem estimado e mimado por
outras mulheres.”
“O amor não espera, e, uma vez que se
infiltra no sangue de dois jovens, é um milagre se ele aguarda a aprovação de
outrem.”
“O bom deus só abandona aqueles que se
abandonam a si mesmos, e aquele que tem coragem de dissimular a sua dor é mais
forte contra ela que aquele que se queixa.”
“O ressentimento, nas mulheres, dura mais que
a mágoa.”
“O mundo funciona da seguinte maneira, que
quando duas ou três pessoas maltratam outra, todas as outras também se
envolvem, atiram-lhe as pedras e lhe criam uma má reputação sem saber muito bem
por quê, e como se fosse pelo prazer de esmagar quem não se pode defender.”
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