Editora: Boitempo
Edição: Friedrich Engels
ISBN: 978-85-7559-390-5
Tradução: Rubens
Enderle
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 984
Sinopse: Certamente
um dos livros mais aguardados do ano é este volume da obra-prima de crítica da
economia política de Marx. Intitulado O
processo global da produção capitalista, o texto procura conjugar as
análises do Livro
I (dedicado ao processo de produção do capital) e do Livro
II o (dedicado ao processo de circulação do capital).Embora possa ser
considerado em muitos sentidos o ápice da obra de Marx – é nele que está
contida, por exemplo, a famosa apresentação do problema da queda tendencial da
taxa de lucro, bem como toda a discussão sobre capital de comércio financeiro –,
o Livro III de O capital é também um
texto muito delicado, porque não chegou a ser finalizado em vida pelo autor,
sendo editado posteriormente por Friedrich Engels. Por isso é tão importante o
fato de a edição da Boitempo ser a primeira realizada a partir dos documentos
da MEGA-2 (Marx-Engels-Gesamtausgabe), que traz a mais completa e minuciosa
apuração dos manuscritos, notas e apontamentos de Marx e das opções de
Friedrich Engels para a publicação.
“Quando as coisas e suas relações recíprocas não são concebidas como
fixas, mas como mutáveis, também seus reflexos mentais, os conceitos, estão
igualmente submetidos a modificação e renovação; que estes não se encontram
enclausurados em definições rígidas, mas desenvolvidos em seu processo de
formação histórico ou, a depender do caso, lógico.” (Friedrich Engels)
“A fórmula geral do capital é D-M-D’; isto é, uma soma de valor é posta
em circulação para dela se extrair uma soma de valor maior. O processo que cria
essa soma de valor maior é a produção capitalista; o processo que a realiza é a
circulação do capital. O capitalista produz a mercadoria não em razão dela mesma,
não em razão de seu valor de uso ou para consumo próprio. O produto que o
capitalista tem realmente em vista não é o produto palpável em si, mas o
excedente de valor do produto, acima do valor do capital nele consumido. O
capitalista adianta o capital total sem levar em consideração os diferentes
papéis que seus componentes desempenham na produção do mais-valor. Ele adianta
todos esses componentes em igual medida, não só para reproduzir o capital adiantado,
mas para produzir um excedente de valor sobre esse capital. Transformar o valor
do capital variável por ele adiantado num valor maior é algo que ele só pode
fazer por meio de seu intercâmbio com trabalho vivo, da exploração de trabalho
vivo. E ele só pode explorar o trabalho na medida em que adianta as condições
para a realização desse trabalho – os meios e os objetos de trabalho, a
maquinaria e a matéria-prima –, isto é, na medida em que utiliza, na forma de
condições de produção, uma soma de valor de que dispõe; do mesmo modo, ele só é
capitalista, só é capaz de promover o processo de exploração do trabalho,
porque, como proprietário das condições de trabalho, ele se confronta com o
trabalhador como mero proprietário da força de trabalho. No Livro I[a], já mostramos que é precisamente a posse desses
meios de produção pelo não trabalhador que transforma os trabalhadores em
assalariados e os não trabalhadores em capitalistas.”
[a] Cf. Karl Marx, O
capital, Livro I, cit., p. 244.
(N. T.)
“A produção capitalista, quando a consideramos de forma isolada,
abstraindo do processo da circulação e dos excessos da concorrência, lida de
modo extremamente parcimonioso com o trabalho efetivado, objetivado em mercadorias.
Em contrapartida, ela é, num grau muito maior que qualquer outro modo de produção,
uma dissipadora de seres humanos, de trabalho vivo, uma dissipadora não só de
carne e sangue, mas também de nervos e cérebro. Com efeito, é apenas por meio
do mais gigantesco desperdício de desenvolvimento individual que o
desenvolvimento da humanidade em geral é assegurado e conduzido na época
histórica que precede imediatamente à reconstituição consciente da sociedade
humana. Como toda essa economia, da qual se trata aqui, resulta do caráter
social do trabalho, conclui-se que é esse caráter imediatamente social do
trabalho que gera essa dissipação de vida e de saúde dos trabalhadores.
Característica, nesse sentido, é a pergunta lançada pelo inspetor de fábricas R.
Baker: “A questão inteira é digna de uma séria consideração: qual é a melhor
maneira de evitar esse sacrifício da vida infantil ocasionado pelo trabalho em
massas aglomeradas?” (Rep.[orts of the Inspectors of] Fact.[ories], Oct.[ober] 1863,
p. 157).”
“Como quer que estejam regulados os preços, o resultado é o seguinte:
1.
A lei do valor rege seu movimento, uma vez que a alta ou a baixa dos
preços de produção decorrem do aumento ou diminuição do tempo de trabalho
requerido para a produção. É nesse sentido que Ricardo (que, sem dúvida,
percebe que seus preços de produção diferem dos valores das mercadorias) diz
que the inquiry to which he wishes to draw the reader’s attention, relates
to the effect of the variations in the relative value of commodities, and not
in their absolute value[d].
2.
O lucro médio, que determina os preços de produção, tem de ser sempre
aproximadamente igual à quantidade de mais-valor que corresponde a um capital
dado como alíquota do capital social total. Suponhamos que a taxa geral de
lucro e, por conseguinte, o lucro médio estejam expressos num valor monetário
mais elevado que o mais-valor médio real, calculado segundo seu valor
monetário. Para os capitalistas, é indiferente que cada um deles cobre do outro
um lucro de 10% ou 15%. Nenhuma dessas porcentagens corresponde a um
valor-mercadoria real maior que a outra, já que o exagero na expressão
monetária é recíproco. Mas, no que diz respeito aos trabalhadores (estando
pressuposto que eles recebem o salário normal, de modo que o aumento do lucro
médio não expressa uma dedução real do salário, isto é, expressa uma coisa
inteiramente distinta do mais-valor normal do capitalista), o aumento dos
preços das mercadorias, que resulta do aumento do lucro médio, precisa
corresponder a uma elevação na expressão monetária do capital variável. Na
realidade, essa elevação nominal geral da taxa de lucro e do lucro médio acima
da taxa dada pela relação entre o mais-valor real e o capital total adiantado
não é possível sem produzir uma alta do salário e, do mesmo modo, uma alta dos
preços das mercadorias que formam o capital constante. O mesmo ocorre, de
maneira inversa, no caso de uma redução. Como o valor total das mercadorias
regula o mais-valor total, que, por sua vez, regula o grau do lucro médio e,
assim, da taxa geral de lucro – seja como norma geral, seja regulando as flutuações
–, então a lei do valor regula os preços de produção.
O que
a concorrência realiza, começando por uma esfera individual da produção, é a
criação de um valor de mercado e um preço de mercado iguais a partir dos
diversos valores individuais das mercadorias. E é a concorrência dos capitais
nas diversas esferas que primeiro fixa o preço de produção, equalizando as
taxas de lucro nas distintas esferas. Este último processo requer um grau mais
elevado de desenvolvimento do modo de produção capitalista do que o anterior.
Para
que as mercadorias da mesma esfera de produção, do mesmo tipo e aproximadamente
da mesma qualidade, possam ser vendidas a seus valores, são necessárias duas
coisas:
Primeiramente, que os diversos valores
individuais se equalizem num só valor social, o valor de mercado a que nos
referimos anteriormente; para isso, requer-se uma concorrência entre os
produtores do mesmo tipo de mercadorias, bem como a existência de um mercado no
qual eles ofertem conjuntamente suas mercadorias. Para que o preço de mercado
de mercadorias idênticas, porém produzidas, cada uma delas, sob circunstâncias
ligeiramente distintas, corresponda ao valor de mercado, não divergindo dele,
seja com uma elevação acima, seja com uma redução abaixo de seu valor, é
necessário que a pressão que os diversos vendedores exercem uns sobre os outros
seja grande o suficiente para lançar no mercado a massa de mercadorias requerida
para a satisfação das necessidades sociais, isto é, a quantidade pela qual a
sociedade pode pagar o valor de mercado. Se a massa de produtos lançada no
mercado excede essas necessidades, as mercadorias terão de ser necessariamente
vendidas abaixo de seu valor de mercado; no caso contrário, precisarão ser
vendidas acima de seu valor de mercado, caso a massa de produtos não seja
suficiente ou, o que dá no mesmo, a pressão da concorrência entre os vendedores
não seja suficientemente forte para obrigá-los a levar ao mercado essa massa de
mercadorias. Se varia o valor de mercado, variam também as condições nas quais
a massa total de mercadorias pode ser vendida. Caindo o valor de mercado,
crescem, em média, as necessidades sociais (que, nesse caso, são sempre necessidades
solventes), que podem então absorver massas maiores de mercadorias. Subindo o valor
de mercado, contraem-se as necessidades sociais com relação a essas
mercadorias, de modo que apenas massas menores destas últimas podem ser
absorvidas. Assim, se a oferta e a demanda regulam o preço de mercado ou,
melhor dizendo, os desvios dos preços de mercado com relação ao valor de
mercado, temos que, por outro lado, este regula a relação entre oferta e
demanda ou é o centro em torno do qual as flutuações da oferta e da demanda
fazem oscilar os preços de mercado.
Se
observamos a questão mais de perto, percebemos que as condições que regem o
valor da mercadoria individual se reproduzem aqui como condições para o valor
da soma total de um tipo[e]; que a produção
capitalista é, em si mesma, produção em massa e que, pelo menos quanto às mercadorias
principais, outros modos de produção menos desenvolvidos concentram, acumulam e
põem a venda no mercado, em grandes massas e nas mãos de relativamente poucos
comerciantes, o produto fabricado em pequena quantidade como produto coletivo –
ainda que fruto do trabalho de um grande número de produtores de pequeno porte
– de um ramo inteiro da produção ou de um contingente maior ou menor deste
último.
Observemos
aqui, apenas de passagem, que as “necessidades sociais”, isto é, aquilo que regula
o princípio da demanda, encontram-se essencialmente condicionadas pela relação
das diversas classes entre si e por sua respectiva posição econômica, ou seja,
em primeiro lugar, pela proporção entre o mais-valor total e o salário; em
segundo lugar, pela proporção entre as diversas partes nas quais se decompõe o
mais-valor (lucro, juros, renda fundiária, impostos etc.). De modo que aqui
novamente se demonstra que não se pode explicar absolutamente nada a partir da
relação entre a oferta e a demanda, antes de estar desenvolvida a base sobre a
qual opera essa relação.
Ainda
que ambos os elementos, a mercadoria e o dinheiro, sejam unidades de valor de
troca e de valor de uso, já vimos (Livro I, capítulo 1, item 3) que, nas
operações de compra e venda, essas duas funções aparecem distribuídas como
polos extremos, de modo que a mercadoria (vendedor) representa o valor de uso,
e o dinheiro (comprador), o valor de troca. A mercadoria tem um valor de uso,
ou seja, satisfaz uma necessidade social, e isso constitui precisamente um dos
requisitos da venda. O outro requisito é, como vimos, que a quantidade de
trabalho contida na mercadoria represente trabalho socialmente necessário, ou
seja, que o valor individual (e, o que sob esse pressuposto é sinônimo, o preço
de venda) da mercadoria coincida com seu valor social[28].”
[d] “A investigação para
a qual ele deseja chamar a atenção do leitor refere-se ao efeito das variações
no valor relativo das mercadorias, não em seu valor absoluto.” (N. T.)
[e] Leia-se: de um tipo
de mercadorias. (N. T.)
[28] Karl Marx, Zur
Kritik der pol.[itischen] Ök.[onomie] (Berlim, 1859) [ed. bras.: Contribuição
à crítica da economia política, trad. Florestan Fernandes, São Paulo,
Expressão Popular, 2008].
“Embora cada artigo ou cada quantidade determinada de um tipo de
mercadoria possa conter somente o trabalho social requerido para sua produção e
embora, considerado sob esse aspecto, o valor de mercado de toda essa classe de
mercadoria represente apenas trabalho necessário, quando a mercadoria
determinada tiver sido produzida numa medida que, em dado momento, ultrapasse a
necessidade social, uma parte do tempo de trabalho social terá sido desperdiçada,
e a massa de mercadorias representará então, no mercado, uma quantidade de
trabalho social muito menor que a quantidade nela efetivamente contida. (É
somente onde a produção está submetida a um controle preestabelecido da sociedade
que esta última pode estabelecer a coordenação necessária entre o tempo de
trabalho social aplicado na produção de determinados artigos e o volume da
necessidade social que esse artigo deve satisfazer.) Por conseguinte, essas
mercadorias têm de ser vendidas abaixo de seu valor de mercado, e uma parte
delas pode até tornar-se invendável. Já quando o volume do trabalho social
empregado para a produção de uma classe determinada de mercadorias é pequeno
demais para o volume da necessidade social particular que esse produto deve satisfazer,
o resultado é o inverso. Em contrapartida, se o volume do trabalho social empregado
para a produção de um artigo determinado corresponde ao volume da necessidade
social a ser satisfeita, de modo que, mantendo-se inalterada a demanda, a massa
produzida corresponda à escala habitual da reprodução, então a mercadoria será
vendida por seu valor de mercado. O intercâmbio ou a venda das mercadorias por
seu valor é o racional [das Rationelle], a lei natural de seu equilíbrio;
dela devemos partir para explicar os desvios – e não o inverso, partir dos
desvios para explicar a lei.”
“Com um salário e uma jornada de trabalho dados, um capital variável, por
exemplo, de 100, representa um número determinado de trabalhadores postos em
movimento; ele é o índice desse número. Seja de £100 o salário de 100
trabalhadores, digamos, por 1 semana. Se esses 100 trabalhadores efetuam tanto
trabalho necessário quanto mais-trabalho, ou seja, se trabalham diariamente
tanto tempo para si mesmos, isto é, para a reprodução de seu salário, quanto
para o capitalista, quer dizer, para a produção de mais-valor, seu produto de
valor total seria = £200, e o mais-valor por eles gerado seria de £100. A taxa
do mais-valor m/v seria = 100%. No entanto,
ela se expressaria, como vimos, em taxas de lucro muito diversas segundo os
vários volumes do capital constante c e, por conseguinte, do capital
total C, uma vez que a taxa de lucro = C. Sendo a taxa de mais valor 100%,
se c
= 50 e v = 100, então l’ = 100/150 = 66⅔%
se c
= 100 e v = 100, então l’ = 100/200 = 50%
se c
= 200 e v = 100, então l’ = 100/300 = 33⅓%
se c
= 300 e v = 100, então l’ = 100/400 = 25%
se c
= 400 e v = 100, então l’ = 100/500 = 20%
A
mesma taxa de mais-valor, com um grau de exploração constante do trabalho,
seria expressa assim numa taxa decrescente de lucro, porque, com seu volume
material, também aumenta, ainda que não na mesma proporção, o volume de valor
do capital constante e, com isso, do capital total.
Se,
além disso, partirmos do pressuposto de que essa alteração gradual na
composição do capital não se opera simplesmente em esferas isoladas da
produção, mas, em maior ou menor grau, em todas ou pelo menos nas esferas
decisivas da produção e que, portanto, essas alterações afetam a composição
orgânica média do capital total existente numa determinada sociedade,
chegaremos necessariamente à conclusão de que crescimento gradual do capital
constante em proporção ao variável tem necessariamente como resultado uma
queda gradual na taxa geral de lucro, mantendo-se constante a taxa do mais-valor,
ou seja, o grau de exploração do trabalho pelo capital. Porém, vimos que
constitui uma lei do modo de produção capitalista que, conforme este se
desenvolve, opera-se uma diminuição relativa do capital variável em relação ao
capital constante e, assim, em proporção ao capital total mobilizado. Isso significa
apenas que o mesmo número de trabalhadores, a mesma quantidade de força de
trabalho tornada disponível por um capital variável de volume de valor dado, mobiliza
– elabora, consome produtivamente –, em consequência dos métodos de produção
peculiares que se desenvolvem no interior da produção capitalista, uma massa
sempre crescente de meios de trabalho, maquinaria e capital fixo de todo tipo,
matérias-primas e materiais auxiliares, no mesmo intervalo de tempo e, por
conseguinte, também um capital constante de volume de valor sempre crescente.
Essa diminuição relativa crescente do capital variável em relação ao capital
constante e, assim, ao capital total, é idêntica ao aumento progressivo da
composição orgânica do capital social em sua média. E, do mesmo modo, não é
mais que outro modo de expressar o desenvolvimento progressivo da força
produtiva social do trabalho, que se revela precisamente no fato de que, graças
ao emprego crescente de maquinaria e de capital fixo em geral, o mesmo número
de trabalhadores transforma em produtos uma quantidade maior de matérias-primas
e materiais auxiliares no mesmo tempo, ou seja, com menos trabalho. A esse
crescente volume de valor do capital constante – embora ele só represente de
forma longínqua o crescimento da massa real dos valores de uso, das quais o
capital constante é materialmente constituído – corresponde um crescente
barateamento do produto. Cada produto, considerado em si mesmo, contém uma soma
de trabalho menor que nos estágios inferiores da produção, nos quais o capital
desembolsado em trabalho se encontra em proporção incomparavelmente maior em
relação ao capital desembolsado em meios de produção. Portanto, a série
hipoteticamente formulada no início expressa a tendência efetiva da produção
capitalista. Com a queda progressiva do capital variável em relação ao capital
constante, a produção capitalista gera uma composição orgânica cada vez mais
alta do capital total, que tem como consequência imediata o fato de que a taxa
do mais-valor, mantendo-se constante e inclusive aumentando o grau de
exploração do trabalho, se expressa numa taxa geral de lucro sempre
decrescente. (Adiante mostraremos por que esse decréscimo aparece não nessa
forma absoluta, mas, antes, tendendo a uma queda progressiva.) A tendência
progressiva da taxa geral de lucro à queda é, portanto, apenas uma
expressão, peculiar ao modo de produção capitalista, do desenvolvimento
progressivo da força produtiva social do trabalho. Não dizemos, com isso, que a
taxa de lucro não possa cair provisoriamente por outras razões, mas
demonstramos como uma necessidade evidente, com base na própria essência do
modo de produção capitalista, que no progresso deste último a taxa média geral
do mais-valor tem necessariamente de se expressar numa taxa geral decrescente
de lucro. Assim como a massa do trabalho vivo empregado sempre decresce em
relação à massa do trabalho objetivado que o trabalho vivo mobiliza, isto é, em
relação aos meios de produção produtivamente consumidos, também a parte desse
trabalho vivo que não é paga e que se objetiva em mais-valor tem de encontrar-se
numa proporção sempre decrescente em relação ao volume de valor do capital
total empregado. E essa proporção entre a massa de mais-valor e o valor do
capital total empregado constitui a taxa de lucro, que tem, portanto, de
diminuir constantemente.
Ainda
que, de acordo com o que foi exposto até aqui, essa lei pareça muito simples,
toda a economia política não conseguiu descobri-la até o momento atual, como
veremos numa seção posterior. Ela vislumbrou o fenômeno e supliciou-se em
contraditórias tentativas de interpretá-lo. Porém, dada a grande importância
que possui para a produção capitalista, pode-se dizer que essa lei constitui o
mistério de toda a economia política desde Adam Smith e que a diferença entre
as diversas escolas desde Adam Smith consiste nas tentativas de lhe dar uma
solução. Se, por outro lado, menciona-se o fato de que a economia política até
o presente tateava às cegas a diferença entre capital constante e capital
variável, sem jamais conseguir formulá-la com exatidão; que ela jamais
apresentou o mais-valor separado do lucro, tampouco este último em forma pura,
em contraste com seus diversos componentes reciprocamente autonomizados como
lucro industrial, lucro comercial, juros, renda fundiária; que ela jamais
analisou profundamente a diferença na composição orgânica do capital e, por
isso, tampouco o fez com a formação da taxa geral de lucro – então deixa de ser
enigmático o fato de que ela jamais tenha encontrado a solução desse enigma.
(...)
A lei
da taxa decrescente de lucro, na qual se expressa a mesma taxa ou inclusive uma
taxa superior de mais-valor, quer dizer, em outras palavras, que, partindo de
uma quantidade determinada qualquer do capital social médio, por exemplo, de um
capital de 100, a parte destinada a meios de trabalho tende sempre a aumentar,
ao passo que a destinada ao trabalho vivo tende a diminuir. Como a massa total
do trabalho vivo agregado aos meios de produção diminui em relação ao valor
desses meios de produção, diminui também o trabalho não pago e a parcela de
valor na qual ele se representa, em relação ao valor do capital total adiantado.
Ou: uma alíquota sempre menor do capital total desembolsado converte-se em
trabalho vivo, e esse capital total suga, assim, cada vez menos mais-trabalho
em relação a sua grandeza, embora a proporção entre a parte não paga do
trabalho empregado e a parte paga deste último possa crescer simultaneamente. O
decréscimo relativo do capital variável e o acréscimo do capital constante,
apesar de ambos crescerem em termos absolutos, é, como já vimos, apenas outra
expressão da produtividade aumentada do trabalho. (...)
A lei
da queda progressiva da taxa de lucro ou da diminuição relativa do mais-trabalho
apropriado em comparação com a massa de trabalho objetivado posta em movimento
pelo trabalho vivo não exclui de modo nenhum a possibilidade de crescer a massa
absoluta do trabalho posto em movimento e explorado pelo capital social e, por
conseguinte, também a massa absoluta do mais-trabalho por ele apropriado;
tampouco exclui o fato de que os capitais que se encontram nas mãos de diversos
capitalistas movimentem uma massa crescente de trabalho e, assim, de
mais-trabalho, ainda que não aumente o número dos trabalhadores por eles
empregados.”
“Aqui se mostra a lei já exposta[b],
segundo a qual, na medida em que diminui relativamente o capital variável, isto
é, na medida em que se desenvolve a força produtiva social do trabalho, uma
massa maior de capital total é necessária para pôr em movimento a mesma
quantidade de força de trabalho e absorver a mesma massa de mais-trabalho. Por
isso, na mesma proporção em que se desenvolve a produção capitalista,
desenvolve-se a possibilidade de uma população trabalhadora relativamente supranumerária,
não porque a força produtiva do trabalho social diminui, mas porque aumenta,
isto é, não por uma desproporção absoluta entre trabalho e meios de existência
ou meios para a produção desses meios de existência, mas por uma desproporção decorrente
da exploração capitalista do trabalho, da desproporção entre o crescimento
progressivo do capital e sua necessidade relativamente decrescente de uma
população cada vez maior.
Se a
taxa de lucro cai em 50%, então ela cai pela metade. Portanto, para que a massa
de lucro permaneça constante, o capital terá de duplicar-se. Para que a massa
do lucro continue a mesma ao diminuir a taxa de lucro, o multiplicador que
indica o crescimento do capital total tem de ser igual ao divisor que indica a
queda da taxa de lucro. Se a taxa de lucro cai de 40 para 20, o capital total
tem de aumentar inversamente na proporção de 20 : 40, a fim de que o resultado
permaneça o mesmo. Se a taxa de lucro tivesse diminuído de 40 para 8, então o
capital precisaria aumentar na relação de 8 : 40, isto é, o quíntuplo. Um
capital de 1.000.000 a 40% produz 400.000, e um capital de 5.000.000 a 8%
produz igualmente 400.000. Isso tem validade para que o resultado permaneça o
mesmo. Se, pelo contrário, o resultado deve aumentar, então o capital terá de
crescer numa proporção maior que aquela em que diminui a taxa de lucro. Em
outros termos, para que o componente variável do capital total não só permaneça
invariável em termos absolutos, mas para que aumente, ainda que diminua sua
porcentagem do capital total, é necessário que este último cresça numa
proporção maior que a queda percentual do capital variável. Ele tem de aumentar
tanto que, em sua nova composição, necessite não só da antiga parte variável do
capital, mas de uma quantidade ainda maior desta última para a compra de força
de trabalho. Se a parte variável de um capital = 100 diminui de 40 para 20,
então o capital total terá de aumentar a mais de 200 para poder empregar um
capital variável maior que 40.
Ainda
que a massa explorada da população trabalhadora permanecesse constante e só
aumentassem a duração e a intensidade da jornada de trabalho, a massa do
capital empregado teria de aumentar, inclusive para que, ao mudar a composição
modificada do capital, ela pudesse empregar a mesma massa de trabalho sob as
antigas condições de exploração.
Portanto,
com o progresso do modo de produção capitalista, o mesmo desenvolvimento da
força produtiva social do trabalho se expressa, por um lado, numa tendência à
queda progressiva da taxa de lucro e, por outro, no aumento constante da massa
absoluta do mais-valor ou do lucro apropriado; de modo que, em geral, ao
decréscimo relativo do capital variável e do lucro corresponde um aumento
absoluto de ambos. Como já demonstramos, esse efeito dúplice só se pode representar
num aumento do capital total em progressão mais acelerada que aquela na qual
diminui a taxa de lucro. No caso de uma composição mais alta ou um aumento
relativo mais intenso do capital constante, o emprego de um capital variável
acrescido em termos absolutos requer que o capital total aumente não só na
proporção da composição mais alta, mas com rapidez ainda maior. Disso se segue
que, quanto mais se desenvolve o modo de produção capitalista, uma quantidade
cada vez maior de capital é requerida para ocupar a mesma força de trabalho e,
mais ainda, para ocupar uma força de trabalho crescente.”
[b] Cf. Karl Marx, O
capital, Livro I, cit., p.
699-700 e 719-20. (N. T.)
“A massa de mais-valor gerada por um capital de dada grandeza é produto
de dois fatores: da taxa do mais-valor, multiplicada pelo número de
trabalhadores empregados com a taxa dada. Portanto, dada a taxa do mais-valor,
ela depende do número de trabalhadores, e dado o número de trabalhadores,
depende da taxa do mais-valor, ou seja, depende em geral da relação composta
entre a grandeza absoluta do capital variável e a taxa do mais-valor. Ora,
ficou demonstrado que, via de regra, as causas que elevam a taxa do mais-valor
relativo são as mesmas que reduzem a massa da força de trabalho empregada, mas
está claro que, nesse caso, produz-se mais ou menos, conforme a proporção determinada
em que se realiza esse movimento antitético, e que a tendência de diminuição da
taxa de lucro é especialmente enfraquecida pela elevação da taxa do mais-valor
absoluto, gerado graças ao prolongamento da jornada de trabalho.
No
caso da taxa de lucro, descobrimos, em geral, que o crescimento da massa de lucro
corresponde à diminuição da taxa ocasionada pelo aumento da massa do capital
total empregado. Considerando o capital variável total da sociedade, o
mais-valor que ele gera é igual ao lucro produzido. Além da massa absoluta,
cresceu também a taxa de mais-valor – a primeira, devido ao aumento da massa da
força de trabalho empregada pela sociedade; a segunda, devido ao aumento do
grau de exploração desse trabalho. Porém, com relação a um capital de dada
grandeza, por exemplo, de 100, a taxa do mais-valor pode aumentar enquanto
diminui a média de sua massa, uma vez que a taxa está determinada pela
proporção em que a parte variável do capital se valoriza, ao passo que a massa
se determina pela parte proporcional do capital total que constitui o capital
variável.
O
aumento da taxa de mais-valor – porquanto ele também ocorre especialmente em
circunstâncias em que, como indicado, não se verifica um aumento do capital
constante nem um aumento relativo deste último com relação ao capital variável
– é um fator por meio do qual se determinam a massa do mais-valor e, por
conseguinte, também a taxa de lucro. Ele não derroga a lei geral, mas faz com
que esta atue mais como tendência, isto é, como uma lei cuja aplicação absoluta
é contida, refreada e enfraquecida por circunstâncias contra-arrestantes.
Considerando que as mesmas causas que elevam a taxa do mais-valor (o
prolongamento do tempo de trabalho é um resultado da grande indústria) tendem a
diminuir a força de trabalho empregada por dado capital, essas mesmas causas
tendem a diminuir a taxa de lucro e a frear o movimento dessa diminuição. Se um
trabalhador é forçado a efetuar o trabalho que racionalmente só poderia ser
executado por dois trabalhadores e se isso ocorre em circunstâncias nas quais
ele poderia substituir outros três, esse trabalhador produzirá tanto
mais-trabalho quanto antes o forneciam dois trabalhadores e, em tal medida,
terá aumentado a taxa do mais-valor. Mas ele não produzirá tanto quanto antes
produziam três, e desse modo a massa do mais-valor terá diminuído. Sua queda
estará compensada ou limitada pelo aumento da taxa do mais-valor. Se a
população inteira for ocupada com a taxa do mais-valor aumentada, aumentará a
massa do mais-valor, ainda que a população permaneça a mesma. E aumentará ainda
mais se a população crescer – embora isso esteja ligado a uma queda relativa do
número de trabalhadores ocupados em relação com a grandeza de capital total,
tal queda se verá moderada ou freada pelo aumento na taxa de mais-valor.
Antes
de finalizar esse ponto, cabe sublinhar uma vez mais que, com uma grandeza dada
do capital, pode ocorrer um aumento da taxa do mais-valor, embora sua massa
diminua, e vice-versa. A massa do mais-valor é igual à taxa multiplicada pelo
número de trabalhadores; a taxa jamais é calculada sobre o capital total, mas
sobre o capital variável e, com efeito, apenas sobre uma jornada de trabalho em
cada caso. Ao contrário, com uma grandeza dada do valor de capital, a taxa
de lucro jamais pode aumentar ou diminuir sem que também aumente ou diminua
a massa do mais-valor.”
“O pressuposto de Ricardo, de que o lucro industrial (mais os juros)
embolsa originalmente todo o mais-valor, é histórica e conceitualmente falso.
Pelo contrário, é apenas o progresso da produção capitalista que 1) dá aos capitalistas
industriais e comerciais todo o lucro para sua ulterior distribuição e 2) reduz
a renda ao excedente acima do lucro. Sobre essa base capitalista cresce, por
sua vez, a renda (que é uma parte do lucro, isto é, do mais-valor considerado
produto do capital total), mas não a parte específica do produto que o
capitalista embolsa.
Estando
pressuposta a existência dos meios de produção necessários, isto é, de uma
acumulação suficiente de capital, a criação de mais-valor pode encontrar apenas
dois obstáculos: a população trabalhadora, se está dada a taxa de mais-valor,
isto é, o grau de exploração do trabalho; e o grau de exploração do trabalho,
se está dada a população trabalhadora. O processo de produção capitalista
consiste essencialmente na produção de mais-valor, representado pelo mais-produto,
ou na alíquota das mercadorias produzidas, na qual o trabalho não pago está
objetivado. Não se pode jamais esquecer que a produção desse mais-valor – e a
reconversão de parte dele em capital (ou seja, a acumulação) constitui parcela
integrante dessa produção do mais-valor – é a finalidade direta e o motivo
determinante da produção capitalista. Razão pela qual não se deve apresentá-la
como o que ela não é, a saber, como uma produção que tem por finalidade direta
o desfrute ou a criação de meios de desfrute para o capitalista. Com isso,
abstraímos inteiramente de seu caráter específico, que se apresenta em toda sua
configuração nuclear interna.
A
obtenção desse mais-valor constitui o processo direto de produção, que, como já
dissemos, não encontra outros obstáculos senão os já indicados. O mais-valor estará
produzido tão logo a quantidade espoliável de mais-trabalho estiver objetivada.
Mas com essa produção do mais-valor está consumado apenas o primeiro ato do processo
de produção capitalista, o processo direto de produção. O capital absorveu
certa quantidade de trabalho não pago. Com o desenvolvimento do processo que se
expressa na queda da taxa de lucro, a massa do mais-valor assim produzido
aumenta monstruosamente. Tem-se, então, o segundo ato do processo. É preciso
vender a massa inteira das mercadorias, o produto total, tanto a parte que
repõe o capital constante e variável como a que representa o mais-valor. Se não
se conseguir vendê-la ou se conseguir apenas em parte ou a preços inferiores
aos de produção, o trabalhador terá sido explorado, certamente, mas sua
exploração não se terá realizado como tal para o capitalista, não terá
alcançado em absoluto a realização do mais-valor espoliado ou o terá alcançado
apenas parcialmente, podendo inclusive acarretar a perda parcial ou total de
seu capital. As condições da exploração direta e as de sua realização não são
idênticas. Elas divergem não só quanto ao tempo e ao lugar, mas também
conceitualmente. Umas estão limitadas pela força produtiva da sociedade;
outras, pela proporcionalidade entre os diversos ramos de produção e pela
capacidade de consumo da sociedade. Essa capacidade não é determinada pela
força absoluta de produção nem pela capacidade absoluta de consumo, mas pela
capacidade de consumo sobre a base de relações antagônicas de distribuição, que
reduzem o consumo da grande massa da sociedade a um mínimo só suscetível de
variação dentro de limites mais ou menos estreitos. Além disso, ela está
limitada pelo impulso de acumulação, de aumento do capital e da produção de
mais-valor em escala ampliada. Essa é uma lei da produção capitalista, lei dada
pelas constantes revoluções nos próprios métodos de produção, pela constante
desvalorização do capital existente acarretada por essas revoluções, pela luta
concorrencial generalizada e a necessidade de melhorar a produção e ampliar sua
escala, apenas como meio de autoconservação e sob pena de sucumbir. Por isso, o
mercado precisa ser constantemente expandido, de modo que seus nexos e as
condições que os regulam assumam cada vez mais a forma de uma lei natural
independente dos produtores, tornem-se cada vez mais incontroláveis. A
contradição interna procura ser compensada pela expansão do campo externo da
produção. Quanto mais se desenvolve a força produtiva, mais ela entra em
conflito com a base estreita sobre a qual repousam as relações de consumo.
Sobre essa base plena de contradições não é em absoluto uma contradição que o
excesso de capital esteja ligado a um excesso crescente de população, pois, se
os fatores combinados fazem aumentar a massa do mais-valor produzido,
justamente com isso se acentua a contradição entre as condições nas quais esse
mais-valor é produzido e as condições nas quais ele é realizado.
Partindo
de dada taxa de lucro, a massa do lucro dependerá sempre da grandeza do capital
adiantado. A acumulação se determina, então, pela parte dessa massa que volta a
se converter em capital. Porém, essa parte, por ser igual ao lucro menos a
renda consumida pelo capitalista, dependerá não só do valor de tal massa, como
também do baixo preço das mercadorias que o capitalista pode comprar com ela –
mercadorias destinadas em parte a seu consumo, sua renda, em parte a seu
capital constante. (Nesse caso, o salário é pressuposto como dado.)
A
massa do capital que o trabalhador põe em movimento e cujo valor ele conserva e
faz reaparecer no produto por meio de seu trabalho é totalmente distinta do
valor que esse mesmo trabalhador agrega. Se a massa do capital é = 1.000 e o
trabalho agregado é = 100, o capital reproduzido será = 1.100. Se a massa é =
100 e o trabalho agregado é = 20, o capital reproduzido será = 120. A taxa de
lucro será, no primeiro caso, = 10%; no segundo, = 20%. No entanto, pode-se
acumular mais a partir de 100 do que a partir de 20. Assim o fluxo do capital
(abstraindo de sua desvalorização em virtude do aumento da força produtiva), ou
sua acumulação, avança em proporção ao peso que ele já possui, e não em
proporção ao nível da taxa de lucro. (...)
A
taxa de lucro diminui não porque o trabalhador seja menos explorado, mas porque
se emprega menos trabalho em proporção ao capital investido em geral.
Se,
como demonstramos, a taxa decrescente de lucro coincide com o aumento da massa
de lucro, uma parte maior do produto anual do trabalho será apropriada pelo
capitalista sob a categoria capital (como reposição do capital consumido), e
uma parte proporcionalmente menor, sob a categoria do lucro. Isso explica a
fantasia do padre Chalmers de que, quanto menor for a parte do produto anual
desembolsada pelos capitalistas como capital, maiores serão os lucros por eles
obtidos; e nisso ele recebe a ajuda da Igreja estatal[a],
que zela pelo consumo, em vez de pela capitalização, de uma grande parte do
mais-produto. O padre confunde a causa e o efeito. Além disso, ainda que o
lucro seja menor, a massa do lucro aumenta com a grandeza do capital
desembolsado. Isso condiciona ao mesmo tempo a concentração do capital, já que
agora as condições de produção exigem o emprego massivo de capital. E
condiciona também sua centralização – isto é, que os pequenos capitalistas
sejam engolidos pelos grandes – e a descapitalização dos primeiros. Trata-se,
uma vez mais, porém elevada à segunda potência, do divórcio entre as condições
de trabalho e os produtores, entre os quais ainda se encontram esses pequenos
capitalistas, já que, no caso deles, o trabalho próprio ainda desempenha certo
papel; em geral, o trabalho do capitalista se encontra em proporção inversa à grandeza
de seu capital, isto é, ao grau em que ele é capitalista. Esse divórcio entre
as condições de trabalho, de um lado, e os produtores, de outro, é o que forma
o conceito de capital; um divórcio que tem início com a acumulação primitiva (Livro
I, capítulo 24) aparece em seguida como processo constante na acumulação e na
concentração do capital e, por fim, se expressa aqui na centralização de
capitais já existentes em poucas mãos e na descapitalização de muitos (fenômeno
no qual se converte agora a expropriação). Esse processo logo provocaria o
colapso da produção capitalista, se tendências contra-arrestantes não atuassem
constantemente com um efeito descentralizador junto à força centrípeta.”
[a] Isto é, a Igreja
anglicana. (N. T.)
“O desenvolvimento da força produtiva social do trabalho revela-se
duplamente: em primeiro lugar, na grandeza das forças produtivas já produzidas,
no volume do valor e da massa das condições de produção sob as quais tem lugar
a nova produção e na grandeza absoluta do capital produtivo já acumulado; em
segundo lugar, na relativa pequenez da parte de capital desembolsada no salário
em relação ao capital total, isto é, na relativa pequenez do trabalho vivo
requerido para a reprodução e a valorização de um capital dado, para a produção
em massa. Isso supõe, ao mesmo tempo, a concentração do capital.
Com
relação à força de trabalho empregada, o desenvolvimento da força produtiva
também se revela de dois modos: primeiro, no aumento do mais-trabalho, isto é,
na abreviação do tempo de trabalho necessário para a reprodução da força de
trabalho. Segundo, na diminuição da quantidade de força de trabalho (número de
trabalhadores) que se emprega, em geral, para pôr em movimento um capital dado.
Ambos
os movimentos não só transcorrem paralelamente, mas se condicionam de maneira
recíproca, são fenômenos nos quais se expressa a mesma lei. No entanto, atuam
em sentido contrário sobre a taxa de lucro. A massa total do lucro é igual à
massa total do mais-valor, e a taxa de lucro m/C =
mais-valor/capital total adiantado. Mas o mais-valor,
como soma total, está determinado, em primeiro lugar, por sua taxa e, em segundo
lugar, pela massa do trabalho simultaneamente empregado a essa taxa, ou, o que
dá no mesmo, pela grandeza do capital variável. Por um lado, aumenta um dos
fatores, a taxa de mais-valor; por outro, diminui (relativa ou absolutamente) o
outro fator, o número de trabalhadores. Ao diminuir a parte paga do trabalho
empregado, o desenvolvimento da força produtiva provoca o aumento do mais-valor,
porquanto aumenta sua taxa; porém, ao diminuir a massa total do trabalho
empregado por um capital dado, ele diminui o fator do número pelo qual se
multiplica a taxa de mais-valor para obter sua massa. Dois trabalhadores que
trabalham 12 horas diárias não podem fornecer a mesma massa de mais-valor que
24 trabalhadores que trabalham apenas 2 horas cada, ainda que pudessem viver de
ar e, portanto, não tivessem de trabalhar um só minuto para si mesmos. Por
isso, aqui a compensação do menor número de trabalhadores mediante o aumento do
grau de exploração do trabalho encontra certos limites insuperáveis; ela pode,
portanto, frear a queda da taxa de lucro, mas não a anular.
A
taxa de lucro diminui, pois, à medida que se desenvolve o modo de produção
capitalista, enquanto sua massa aumenta na proporção do crescimento da massa do
capital empregado. Partindo de uma taxa dada, a massa absoluta em que cresce o
capital depende da grandeza atual deste último. Por outro lado, dada essa grandeza,
a proporção na qual ele cresce – a taxa de seu crescimento – depende da taxa de
lucro. O incremento da força produtiva (que, além disso, como já indicamos,
acompanha sempre a desvalorização do capital existente) só pode aumentar
diretamente a grandeza de valor do capital se, elevando a taxa de lucro, ele
aumenta a parte de valor do produto anual que se reconverte em capital. Quando
se considera a força produtiva do trabalho, isso só pode ocorrer (pois essa
força produtiva nada tem a ver diretamente com o valor do capital
existente) na medida em que se eleve o mais-valor relativo ou se reduza o valor
do capital constante, isto é, na medida em que as mercadorias que entram na
reprodução da força de trabalho ou nos elementos do capital constante
baratearem. Ambas as coisas implicam uma desvalorização do capital existente, e
ambas correm paralelamente à redução do capital variável em relação ao capital
constante. Ambas condicionam a queda da taxa de lucro, e ambas freiam essa
queda. Além disso, elevação da taxa de lucro, enquanto provoca elevação na
demanda de trabalho, influi sobre o aumento da população trabalhadora e, por
conseguinte, do material explorável, que faz com que o capital seja capital.
Mas o
desenvolvimento da força produtiva do trabalho contribui indiretamente para o
aumento do valor de capital existente ao incrementar a massa e a variedade dos
valores de uso nos quais se apresenta o mesmo valor de troca e que constituem o
substrato material, os elementos materiais do capital, os objetos materiais em
que consistem diretamente o capital constante e, ao menos indiretamente, o
capital variável. Com o mesmo capital e o mesmo trabalho, criam-se mais coisas
a ser transformadas em capital, abstraindo de seu valor de troca. Coisas que
podem servir para absorver trabalho adicional – portanto, também mais-trabalho
adicional – e, assim, formar capital adicional. A massa de trabalho que pode
ser comandada pelo capital não depende de seu valor, mas da massa das matérias-primas
e dos materiais auxiliares, da maquinaria e dos elementos do capital fixo, dos
meios de subsistência que compõem esse capital, independentemente do valor
desses componentes. Ao crescer assim a massa do trabalho empregado – e,
consequentemente, do mais-trabalho –, aumenta também o valor do capital
reproduzido e o mais-valor novo que lhe foi adicionado.
Mas
esses dois fatores compreendidos no processo de acumulação não devem ser
considerados apenas na tranquila justaposição em que os trata Ricardo; eles
implicam uma contradição que se manifesta em tendências e manifestações
contraditórias. As forças antagônicas operam umas contra as outras.
Simultaneamente
ao impulso para o aumento real da população trabalhadora, impulso que emana do
incremento da parte do produto social total que funciona como capital, atuam as
forças que criam uma superpopulação apenas relativa.
Simultaneamente
à queda da taxa de lucro cresce a massa dos capitais, e paralelamente a essa
queda ocorre uma desvalorização do capital existente, que detém essa queda e
imprime um impulso acelerador à acumulação de valor do capital.
Simultaneamente
ao desenvolvimento da força produtiva há o aumento progressivo da composição do
capital e a diminuição relativa da parte variável em relação à parte
constante.
Essas
diversas influências se fazem sentir, ora de maneira mais justaposta no espaço,
ora de maneira mais sucessiva no tempo; o conflito entre as forças antagônicas
desemboca periodicamente em crises. Estas são sempre apenas violentas soluções momentâneas
das contradições existentes, erupções violentas que restabelecem por um momento
o equilíbrio perturbado.
A
contradição, expressa de maneira bem genérica, consiste no fato de que o modo
de produção capitalista implica uma tendência ao desenvolvimento absoluto das
forças produtivas, abstraindo do valor – e do mais-valor nele incorporado – e
também das relações sociais no interior das quais se dá a produção capitalista;
por outro lado, esse modo de produção tem como objetivo a conservação do valor de
capital existente e sua valorização na máxima medida possível (isto é, o
incremento cada vez mais acelerado desse valor). Seu caráter específico orienta-se
para o valor de capital existente como meio para a maior valorização possível
desse valor. Os métodos pelos quais ela atinge esse objetivo incluem: o
decréscimo da taxa de lucro, a desvalorização do capital existente e o
desenvolvimento das forças produtivas do trabalho à custa das forças produtivas
já produzidas.
A
desvalorização periódica do capital existente, que é um meio imanente ao modo
de produção capitalista para conter a queda da taxa de lucro e acelerar a
acumulação do valor de capital mediante a formação de capital novo, perturba as
condições dadas nas quais se consuma o processo de circulação e reprodução do
capital e é, por isso, acompanhada de paralisações súbitas e crises do processo
de produção.
O
decréscimo relativo do capital variável em relação ao constante, que ocorre
paralelamente ao desenvolvimento das forças produtivas, incentiva o crescimento
da população trabalhadora, enquanto cria de modo permanente uma superpopulação
artificial. A acumulação do capital, considerada em relação ao valor, é desacelerada
pela queda da taxa de lucro a fim de acelerar ainda mais a acumulação do valor
de uso, enquanto esta, por sua vez, imprime um movimento acelerado à acumulação
em relação ao valor.
A
produção capitalista tende constantemente a superar esses limites que lhes são
imanentes, porém consegue isso apenas em virtude de meios que voltam a elevar
diante dela esses mesmos limites, em escala ainda mais formidável.
O verdadeiro obstáculo à produção
capitalista é o próprio capital, isto é, o fato de que o capital e sua
autovalorização aparecem como ponto de partida e ponto de chegada, como mola propulsora
e escopo da produção; o fato de que a produção é produção apenas para o capital,
em vez de, ao contrário, os meios de produção serem simples meios para um desenvolvimento
cada vez mais amplo do processo vital, em benefício da sociedade dos produtores.
Os limites nos quais unicamente se podem mover a conservação e a valorização do
valor de capital, as quais se baseiam na expropriação e no empobrecimento da
grande massa dos produtores, entram assim constantemente em contradição com os
métodos de produção que o capital tem de empregar para seu objetivo e que
apontam para um aumento ilimitado da produção, para a produção como fim em si
mesmo, para um desenvolvimento incondicional das forças produtivas sociais do
trabalho. O meio – o desenvolvimento incondicional das forças produtivas sociais
– entra em conflito constante com o objetivo limitado, que é a valorização do
capital existente. Assim, se o modo de produção capitalista é um meio histórico
para desenvolver a força produtiva material e criar o mercado mundial que lhe
corresponde, ele é, ao mesmo tempo, a constante contradição entre essa sua
missão histórica e as relações sociais de produção correspondentes a tal modo
de produção.”
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