Editora: Vozes
ISBN: 85-326-0772-1
Tradução: Paulo Meneses
Opinião: ★★★☆☆
“769 O espírito, representado primeiro
como substância no elemento do puro pensar, é por isso, imediatamente, a
essência eterna, simples e igual a si mesma, mas que não tem essa significação
abstrata da essência, e sim a significação do espírito absoluto. Porém o
espírito consiste em ser, não significação, não o interior, mas o efetivo.
Portanto, a eterna essência simples seria espírito somente segundo uma palavra
vazia, se permanecesse na representação e na expressão da eterna essência
simples. Mas a essência simples, por ser a abstração, de fato é o negativo
em si mesmo, e na verdade, a negatividade do pensar, ou a negatividade como
ela é em si na essência. Quer dizer: a essência simples é a diferença
absoluta de si, ou seu puro tomar-se-Outro. Como essência, é somente
em-si ou para nós; mas enquanto essa pureza é precisamente a abstração
ou a negatividade, ela é para si mesma, ou seja, é o Si, o conceito.
A essência eterna é portanto objetiva: e
enquanto a representação apreende e exprime como um acontecer a necessidade,
acima mencionada, do conceito, - deve dizer-se que a essência eterna
engendra para si um Outro. Contudo, nesse ser-outro retorna também
imediatamente a si; porque a diferença é a diferença em si; isto é, ela
imediatamente é diferente só de si mesma, e assim, é a unidade que a si mesma
retornou.
Portanto, distinguem-se os três momentos: [1]
- o da essência; [2] - o do ser-para-si que é o ser-outro da
essência, e para o qual é a essência; [3] - o do ser-para-si, ou do
saber a si mesmo no Outro. A essência só contempla a si mesma em seu
ser-para-si; nessa extrusão está somente junto de si. O ser-para-si que se
exclui da essência é o saber de si mesma da essência; é o Verbo que,
pronunciado, deixa atrás o pronunciante extrusado e esvaziado; mas também é
ouvido de modo não menos imediato; e o ser-aí do Verbo é somente esse ouvir-se
a si mesmo. Assim as diferenças que se fazem dissolvem-se tão imediatamente
quanto são feitas, e tão imediatamente se fazem quanto se dissolvem. O
verdadeiro e efetivo é justamente esse movimento que gira dentro de si.
771 Esse movimento
dentro de si mesmo exprime a essência absoluta como espírito; a essência
absoluta, que não é apreendida como espírito, é só o vazio abstrato; - assim
como o espírito que não é compreendido como esse movimento, é apenas uma
palavra vazia. Enquanto seus momentos são captados em sua pureza, são os
conceitos sem-repouso, que somente são, sendo seu contrário em si mesmos, e
tendo seu repouso no todo.”
“O espírito absoluto, representado na pura
essência, não é de certo a pura essência abstrata; mas antes, essa,
justamente por ser só um momento do espírito, afundou até o nível de elemento.
Porém a apresentação do espírito nesse elemento tem em si, quanto à forma, o
mesmo defeito que a essência como essência. A essência é o abstrato, e por
isso, o negativo da sua simplicidade: é um Outro. Igualmente, o espírito no
elemento da essência é a forma da unidade simples, que por isso,
também essencialmente, é um vir-a-ser-Outro. Ou, o que é o mesmo, a relação da
essência eterna com seu ser-para-si é a relação imediatamente simples do puro
pensar. Nesse simples contemplar a si mesmo no Outro, portanto, não é
posto o ser-outro, como tal; ele é a diferença que no pensar puro
imediatamente não é diferença alguma: é um reconhecer do amor, em
que os dois não se opõem segundo sua essência. O espírito que é
enunciado no elemento do puro pensar, é ele mesmo essencialmente isto: não
estar só nesse elemento, mas ser Efetivo, pois em seu conceito reside o
próprio ser-outro; quer dizer, o suprassumir do puro conceito somente
pensado.
773 O elemento do
puro pensar, porque é o elemento abstrato, é ele mesmo antes o Outro de
sua simplicidade, e portanto passa para o elemento particular do representar;
- o elemento em que os momentos do conceito puro tanto adquirem um em
relação ao outro, um ser-aí substancial, como são sujeitos, que
tem para um terceiro a indiferença recíproca do ser; mas refletidos sobre si
mesmos, se separam e se contrapõem, um em relação ao outro.
774 Assim, o espírito
somente eterno ou abstrato torna-se para si um Outro, ou seja, entra no
ser-aí e entra imediatamente no ser-aí imediato. Cria, portanto, um
mundo. Esse criar é a palavra da representação para o conceito mesmo,
segundo o seu movimento absoluto, ou para significar que o Simples enunciado
como absoluto, ou o pensar puro, por ser o abstrato, é antes o negativo; e
assim é o oposto a si, ou Outro. Ou então, para dizer o mesmo ainda de
outra forma, porque o que é posto como essência, é a imediatez simples
ou o ser; porém como imediatez ou ser carece do Si, e assim privado
de interioridade é passivo ou ser para Outro.
Esse ser para Outro ao mesmo tempo é um
mundo: o espírito na determinação do ser para Outro é a tranquila
subsistência dos momentos antes incluídos no pensar puro, portanto a dissolução
de sua universalidade simples e dissociação dela em sua própria
particularidade.
775 Entretanto, o
mundo não é apenas esse espírito jogado fora e disperso na totalidade e na
respectiva ordem exterior; mas, por ser essencialmente o Si simples, está
igualmente esse Si presente no mundo: o espírito aí-essente, que é o Si
singular, que possui a consciência, e se distingue de si como Outro ou como
mundo. Como esse Si singular só foi posto imediatamente, ainda não é o espírito
para si; portanto, não é como espírito; pode chamar-se inocente, mas
bom mesmo, não pode. Para que de fato seja Si e espírito, deve também,
antes de tudo, tornar-se primeiro para si mesmo um Outro, assim como a essência
eterna se apresenta como o movimento de ser igual a si mesma no seu ser-outro.
Por ser determinado esse espírito como só imediatamente aí-essente, ou como
disperso na variedade de sua consciência, seu tornar-se-Outro é o
adentrar-se-em-si do saber em geral.”
“778 A alienação da essência divina se
coloca, pois, em sua dupla modalidade: o Si do espírito e seu pensamento
simples são os dois momentos cuja unidade absoluta é o espírito mesmo; sua
alienação consiste em se dissociarem esses momentos e em terem um valor
desigual, um em relação ao outro. Tal desigualdade é por isso desigualdade
dupla: e surgem duas uniões, cujos momentos comuns são os indicados. Em uma
delas a essência divina conta como o essencial, enquanto o ser-aí
natural e o Si contam como o inessencial e o que se-deve-suprassumir. Ao
contrário, na outra união, o ser-para-si conta como o essencial, e o
Divino simples como o inessencial. Seu meio-termo, ainda vazio, é o ser-aí em
geral, a simples comunidade de seus dois momentos.
779 A solução dessa
oposição não sucede pela luta desses dois momentos que são representados como
essências separadas e independentes. Em sua independência se baseia que em
si, mediante seu conceito, cada um deva dissolver-se nele mesmo. A luta só
recai onde os dois deixam de ser essa combinação de pensamento e de
ser-aí independente; e onde se contrapõem, um ao outro, somente como
pensamentos. Pois só então, como conceitos determinados, estão essencialmente
só na relação de opostos; ao contrário, como independentes, têm sua
essencialidade fora da oposição: seu movimento é, assim, o movimento próprio e
livre, deles mesmos.
Como assim o movimento dos dois é o movimento
em si, - porque neles mesmos tem de ser considerado - assim também o que começa
o movimento é aquele que é determinado como o em-si essente, em contraste com o
outro. Representa-se isso como um agir voluntário; mas a necessidade de sua
extrusão se baseia no conceito de que o em-si-essente - que só na oposição é
assim determinado - por isso mesmo não tem subsistência verdadeira. Por
conseguinte, o momento para o qual conta como essência, não o ser-para-si mas o
simples, é o momento que se extrusa a si mesmo, vai à morte e por isso
reconcilia a essência absoluta consigo mesmo.
Com efeito, nesse movimento ele se apresenta
como espírito. A essência abstrata se alienou, tem ser-aí natural e
efetividade própria-do-Si. Esse seu ser-outro - ou sua presença sensível - se
retoma por meio do segundo tomar-se-outro, e é posto como suprassumido, como universal.
Mediante isso, a essência veio-a-ser para si mesma nessa presença sensível;
o ser-aí imediato da efetividade deixou de ser estranho ou exterior a ela, por
ser suprassumido, universal. Esta sua morte é portanto seu ressurgir como
espírito.
780 A presença
imediata suprassumida da essência consciente-de-si é essa essência como
consciência-de-si universal. Esse conceito do Si singular suprassumido - que é
a essência absoluta - exprime por isso, imediatamente, a constituição de uma
comunidade que, tendo-se demorado até então no representar, agora a si retoma
como ao Si; e o espírito passa assim do segundo elemento de sua determinação -
do representar - ao terceiro, que é a consciência-de-si como tal.”
786 O espírito é,
desse modo, o espírito que se sabe a si mesmo: ele se sabe; o que para
ele é objeto, é. Ou seja, sua representação é o verdadeiro conteúdo absoluto;
exprime, como vimos, o espírito mesmo. Ao mesmo tempo, não é somente conteúdo
da consciência-de-si, nem é somente objeto para ela, mas é também espírito
efetivo. O espírito é isso, ao percorrer os três elementos de sua natureza,
- esse movimento através de si mesmo que constitui sua efetividade; [1] o que
se move é ele: [2] ele é o sujeito do movimento, e [3] ele é igualmente o mover
mesmo, ou a substância através da qual passa o sujeito.”
“Essa superação do objeto da consciência não
se deve tomar como algo unilateral, em que o objeto se mostrasse como retornado
ao Si; mas, de modo mais determinado, em que o objeto como tal se mostrasse ao
Si como evanescente. Melhor ainda, toma-se de modo que é a extrusão da
consciência-de-si que põe a coisidade, e que essa extrusão não tem só a
significação negativa, mas a positiva; não só para nós ou em si, mas para ela
mesma. Para a consciência-de-si, o negativo do objeto, ou o suprassumir
do objeto a si mesmo, tem significação positiva; ou seja, ela sabe essa
nulidade do objeto, de uma parte, porque se extrusa a si mesma, pois nessa
extrusão se põe como objeto, ou põe o objeto como a si mesma em razão da
inseparável unidade do ser-para-si.
De outra parte, aí reside ao mesmo tempo esse outro momento, que a
consciência-de-si também tenha igualmente suprassumido e recuperado dentro de
si essa extrusão e objetividade: assim está junto de si no seu ser-outro
como tal.
E isso o movimento da consciência, e
nesse movimento ela é a totalidade de seus momentos. A consciência deve
igualmente relacionar-se com o objeto segundo a totalidade de suas
determinações, e deve tê-lo apreendido conforme cada uma delas. Essa totalidade
de suas determinações faz do objeto em si a essência espiritual; e isso
ele se torna em verdade para a consciência, mediante o apreender de cada
determinação sua singular como o Si, ou pelo relacionamento espiritual para com
elas, acima relacionado.
789 O objeto é assim,
de uma parte, ser imediato, ou uma coisa em geral, - o que corresponde à
consciência imediata. De outra parte é um tornar-se outro de si, sua
relação ou ser para outro e ser-para-si: a determinidade - o que
corresponde à percepção. E ainda por outra parte, é essência ou é como
universal, - o que corresponde ao entendimento. Enquanto todo, o objeto é
silogismo ou o movimento do universal, através da determinação, para a
singularidade, - como é também o movimento inverso da singularidade, através da
singularidade como suprassumida, ou da determinação, para o universal.
A consciência, portanto, deve saber o objeto
como a si mesma, segundo essas três determinações. Contudo, não se fala aqui do
saber como conceituar puro do objeto, mas esse saber deve ser indicado somente
em seu vir-a-ser ou em seus momentos, - segundo o lado que pertence à
consciência como tal; e os momentos do conceito propriamente dito, ou do saber
puro, devem ser indicados na forma de figurações da consciência. Por isso, na
consciência como tal, ainda não aparece o objeto como a essencialidade espiritual,
do modo como acima foi expressa por nós; e o comportar-se da consciência para
com ele não é a consideração do objeto nessa totalidade; como tal, nem em sua
pura forma-de-conceito; mas é, de uma parte, a figura da consciência em geral,
e de outra, um certo número de tais figuras, que nós reunimos, e nas
quais a totalidade dos momentos do objeto e do comportamento da consciência só
se pode mostrar dissolvida nos momentos dessa totalidade.”
“A coisa é Eu: de fato, nesse juízo
infinito a coisa está suprassumida: a coisa nada é em si; só tem significação
na relação, somente mediante o Eu, e mediante sua referência ao
Eu. Para a consciência, apresentou-se esse momento na pura inteligência e no
Iluminismo. As coisas são pura e simplesmente úteis, e só segundo sua
utilidade há que considerá-las. A consciência-de-si cultivada, - que
percorreu o mundo do espírito alienado de si, produziu por sua extrusão a coisa
como a si mesma: portanto, conserva-se ainda a si mesma na coisa e sabe a
falta-de-independência da coisa, ou sabe que a coisa é essencialmente apenas
ser-para-outro; ou, para exprimir perfeitamente a relação - isto
é, o que constitui aqui somente a natureza do objeto - a coisa para ela vale
como algo para-si-essente. Ela enuncia a certeza sensível como
verdade absoluta, mas esse mesmo ser-para-si como momento que apenas
desvanece e passa ao seu contrário: ao ser que ao outro se abandona.
792 Mas a essa
altura, o saber da coisa ainda não chegou à perfeição: a coisa deve ser
conhecida não somente segundo a imediatez do ser e segundo a determinidade, mas
também como essência ou interior: como o Si. Isso está presente
na consiência-de-si moral. Ela sabe seu saber como a absoluta
essencialidade, ou seja, sabe o ser pura e simplesmente como a pura
verdade ou o puro saber, e nada mais é que essa vontade e saber somente.
A uma outra consciência que não à consciência moral compete só o ser
inessencial, isto é, não essente-em-si; só sua casca vazia. A consciência
moral, enquanto em sua representação-do-mundo, desprende do Si o ser-aí, ela
igualmente o recupera dentro de si mesma. Como boa-consciência, enfim, não é
mais esse colocar e deslocar, alternadamente, do ser-aí e do Si; mas sabe que
seu ser-aí, como tal, é a pura certeza de si mesma: o elemento
objetivo, para o qual se traslada enquanto operante, não é outra coisa que o
puro saber do Si sobre si mesmo.”
“Esse conceito já está também presente no
lado da própria consciência-de-si; mas tal como se apresentou no que precede,
tem, como todos os demais momentos, a forma de ser uma figura particular da
consciência. E assim aquela parte da figura do espírito certo de si mesmo,
que permanece firme dentro de seu conceito, e que se chama a bela alma. É
que a bela alma é seu saber sobre si mesma, em sua pura unidade translúcida; é
a consciência-de-si que sabe como sendo o espírito esse puro saber sobre o puro
ser-dentro-de-si; não é somente a intuição do divino, mas a auto-intuição
do divino. Enquanto esse conceito se mantém oposto à sua realização, ele é a
figura unilateral, cujo desvanecer em névoa vazia nós vimos; mas também vimos
sua extrusão positiva e movimento para a frente.
Graças a essa realização, suprassume-se o
obstinar-se em si dessa consciência-de-si carente-de-objeto, a determinidade
do conceito contra sua implementação. Sua consciência-de-si ganha a
forma da universalidade, e o que lhe resta é seu conceito verdadeiro, ou o
conceito que ganhou sua realização. E o conceito em sua verdade, isto é, na
unidade com sua extrusão: - o saber do saber puro, não como essência abstrata,
que é o dever, - mas do saber puro como essência que é este saber, esta
consciência-de-si pura, que assim ao mesmo tempo é o verdadeiro objeto, pois
é o Si para-si-essente.”
“796 (...) Em verdade, aquele Em-si do
começo é igualmente como negatividade o Em-si mediatizado. Agora se põe
tal como é em verdade; e o negativo é como determinidade de
cada um para com o outro, e é em si o que suprassume a si mesmo. Uma das duas
partes da oposição é a desigualdade do ser-dentro-de-si em sua singularidade,
em contraste com a universalidade; a outra, é a desigualdade de sua
universalidade abstrata em contraste com o Si. O primeiro Em-si morre ao seu
ser-para-si, se extrusa e se confessa; este outro renuncia à dureza de sua
universalidade abstrata, e morre ao seu Si sem-vida e à universalidade
inconcussa; de modo que assim o primeiro Em-si se completou através do momento
da universalidade que é a essência, e o segundo, através da universalidade que
é o Si. Mediante esse movimento do agir, o espírito - que só é espírito porque é-aí
porque eleva seu ser-aí ao pensamento e por isso à oposição
absoluta, e desta, por ela e nela mesma retorna; - o espírito surgiu como pura
universalidade do saber, que é consciência-de-si. Como consciência-de-si, é a
unidade simples do saber.
797 Por conseguinte,
o que na religião era conteúdo ou forma do representar de um outro,
isso mesmo é aqui agir próprio do Si: o conceito o obriga a que o
conteúdo seja o agir próprio do Si; pois esse conceito é, como
vemos, o saber do agir do Si dentro de si como saber de toda a essencialidade e
de todo o ser-aí: o saber sobre este sujeito como sendo a substância,
e da substância como sendo este saber de seu agir. O que aqui acrescentamos
é, de uma parte, somente a reunião dos momentos singulares, cada um dos
quais apresenta em seu princípio a vida do espírito todo; e de outra parte, o
manter-se firme do conceito na forma do conceito, cujo conteúdo já havia
resultado naqueles momentos, e na forma de uma figura da consciência.
798 Essa última
figura do espírito - o espírito que ao mesmo tempo dá ao seu conteúdo perfeito
e verdadeiro a forma do Si, e por isso tanto realiza seu conceito quanto
permanece em seu conceito nessa realização - é o saber absoluto. O saber
absoluto é o espírito que se sabe em figura-deespírito, ou seja: é o saber
conceituante. A verdade não é só em si perfeitamente igual à certeza,
mas tem também a figura da certeza de si mesma: ou seja, é no
seu ser-aí, quer dizer, para o espírito que sabe, na forma do saber de si
mesmo. A verdade é o conteúdo que na religião é ainda desigual à sua
certeza. Ora, essa igualdade consiste em que o conteúdo recebeu a figura do Si.
Por isso, o que a essência mesma, a saber, o conceito, se converteu no
elemento do ser-aí, ou na forma da objetividade para a consciência. O
espírito, manifestando-se à consciência nesse elemento, ou, o que é o
mesmo, produzido por ela nesse elemento, é a ciência.
799 A natureza, os
momentos e o movimento desse saber se mostram, pois, de modo que esse saber é o
puro ser-para-si da consciência-de-si; o saber é o Eu, que é este e
nenhum outro Eu, e que é igualmente o Eu universal, imediatamente
mediatizado ou suprassumido. Tem um conteúdo que distingue de
si, pois é a negatividade pura ou o cindir-se: o Eu é consciência. Esse
conteúdo é, em sua diferença mesma, o Eu, por ser o movimento do
suprassumir-a-si-mesmo; ou essa mesma negatividade pura que é o Eu. O Eu está
no conteúdo como diferenciado, refletido sobre si: o conteúdo é conceituado somente
porque em seu ser outro está junto de si mesmo. Esse conteúdo, determinado com
mais rigor, não é outra coisa que o movimento mesmo que acabamos de expor: pois
é o espírito que se percorre a si mesmo, e certamente o faz para si como
espírito, porque tem a figura do conceito na sua objetividade.”
“801 (...) No conceito que se sabe
como conceito, os momentos se apresentam, pois, anteriormente ao todo
implementado, cujo vir-a-ser é o movimento desses momentos. Na consciência,
ao contrário, é anterior a esses momentos o todo, mas o todo
não-conceituado. O tempo é o conceito mesmo, que é-aí, e
que se faz presente à consciência como intuição vazia. Por esse motivo, o
espírito se manifesta necessariamente no tempo; e manifesta-se no tempo
enquanto não apreende seu conceito puro; quer dizer, enquanto não
elimina o tempo. O tempo é o puro Si exterior intuído mas não
compreendido pelo Si: é o conceito apenas intuído. Enquanto compreende a si
mesmo, o conceito suprassume sua forma-de-tempo, conceitua o intuir, e é o
intuir concebido e conceituante.
O tempo se manifesta, portanto, como o
destino e a necessidade do espírito, que ainda não está consumado dentro de si
mesmo; como a necessidade de enriquecer a participação que a consciência-de-si
tem na consciência, e de pôr em movimento a imediatez do Em-si - a forma
em que está a substância na consciência. Ou, inversamente - tomando o Em-si
como o interior - como a necessidade de realizar e de revelar o que é
somente interior; isto é, de reivindicá-lo para a certeza de si
mesmo.
802 Por essa razão
deve-se dizer que nada é sabido que não esteja na experiência; - ou,
como também se exprime a mesma coisa - que não esteja presente como verdade
sentida, como Eterno interiormente revelado, como o sagrado em
que se crê, ou quaisquer outras expressões que sejam empregadas. Com
efeito, a experiência é exatamente isto: que o conteúdo - e ele é o espírito -
seja em si substância, e assim, objeto da consciência. Mas
essa substância, que é o espírito, é o seu vir-a-ser para ser o que é em
si; e só como esse vir-a-ser refletindo-se sobre si mesmo ele é em si, em
verdade, o espírito. O espírito é em si o movimento que é o conhecer, -
a transformação desse Em-si no Para-si; da substância no sujeito;
do objeto da consciência em objeto da consciência-de-si; isto
é, em objeto igualmente suprassumido, ou seja, no conceito.
Esse movimento é o círculo que retorna sobre
si, que pressupõe seu começo e que só o atinge no fim. Assim, pois, enquanto o
espírito é necessariamente esse diferenciar dentro de si, seu todo intuído se
contrapõe à sua consciência-de-si simples. E já que esse todo é o diferenciado,
diferencia-se em seu conceito puro: no tempo, e no conteúdo, - ou no Em-si.
A substância, como sujeito, tem nela a necessidade, inicialmente
interior, de apresentar-se nela mesma como o que ela é em si, como espírito.
Só a exposição completa e objetiva é, ao mesmo tempo, a reflexão da
substância, ou seu converter-se em Si. Portanto, o espírito não pode atingir
sua perfeição como espírito consciente-de-si antes de ter-se consumado em-si,
antes de ter-se consumado como espírito do mundo. Por isso o conteúdo da
religião proclama no tempo, mais cedo que a ciência, o que é o espírito; mas
só a ciência é o verdadeiro saber do espírito sobre si mesmo.
803 O movimento, que
faz surgir a forma de seu saber de si, é o trabalho que o espírito executa como
história efetiva.”
“804 (...) O espírito é esse movimento do
Si, que se extrusa de si mesmo e se submerge em sua substância, e que tanto
saiu dessa substância como sujeito, e se adentrou em si, convertendo-a em
objeto e conteúdo, - quanto suprassume essa diferença entre a objetividade e o
conteúdo. Aquela primeira reflexão, que parte da imediatez, é o diferenciar-se
do sujeito em relação à sua substância, ou o conceito que se cinde: - o
adentrar-se em si e o vir-a-ser do puro Eu. Enquanto essa diferença é o agir
puro do Eu = Eu, o conceito é a necessidade e o eclodir do ser-aí, que
tem a substância por sua essência, e subsiste para si.
Ora, o subsistir do ser-aí para si é o
conceito posto na determinidade, e por isso é igualmente seu movimento, nele
mesmo, de ir mais fundo dentro da substância simples, que só é sujeito
enquanto é esta negatividade e movimento. O eu tampouco tem que aferrar-se à forma
da consciência-de-si, contra a forma da substancialidade e objetividade,
como se tivesse pavor de sua extrusão. A força do espírito consiste, antes, em
permanecer igual a si mesmo em sua extrusão, e como o essente-em-si e para-si,
em pôr tanto o ser-para-si quanto o ser-em-si apenas como momento. O
Eu também não é um terceiro termo que rejeite as diferenças, lançando-as no
abismo do absoluto, e que proclame sua igualdade dentro desse abismo. Ao
contrário: o saber consiste muito mais nessa aparente inatividade que só
contempla como é que o diferente se move nele mesmo, e retorna à sua unidade.
805 No saber,
portanto, o espírito concluiu o movimento de seu configurar-se enquanto esse
configurar-se é afetado pela diferença não-superada da consciência. O espírito
ganhou o puro elemento do seu ser-aí, - o conceito. O conteúdo é, segundo a liberdade
de seu ser, o Si que se extrusa, ou a unidade imediata do
saber-se a si mesmo. O puro movimento dessa extrusão, considerado no conteúdo,
constitui a necessidade desse mesmo conteúdo. O conteúdo diversificado
está como determinado na relação; não é em si. Sua inquietude é
suprassumir-se a si mesmo, ou a negatividade: assim é a necessidade ou a
diversidade; é tanto o si quanto é o ser livre; e nessa forma de-Si, em
que o ser-aí é imediatamente pensamento, - o conteúdo é conceito.
Quando, pois, o espírito ganhou o conceito,
desenvolve o ser-aí e o movimento nesse éter de sua vida, e é ciência. Os
momentos de seu movimento já não se apresentam na ciência como figuras determinadas
da consciência, mas, por ter retornado ao Si a diferença da consciência,
apresentam-se como conceitos determinados, e como seu movimento
orgânico, fundado em si mesmo. Se na fenomenologia do espírito cada momento é a
diferença entre o saber e a verdade, e é o movimento em que essa diferença se
suprassume; - ao contrário, a ciência não contém essa diferença e o respectivo
suprassumir; mas, enquanto o momento tem a forma do conceito, reúne em unidade
imediata a forma objetiva da verdade e a forma do Si que-sabe. O momento não
surge mais como esse movimento de ir e vir da consciência ou da representação
para a consciência-de-si e vice-versa; mas sua figura pura, liberta de sua
manifestação na consciência - o conceito puro e seu movimento para diante -
dependem somente de sua pura determinidade.
Inversamente, a cada momento abstrato da
ciência corresponde em geral uma figura do espírito que-se-manifesta. Como o
espírito aí-essente não é mais rico que a ciência, assim também não é mais
pobre em seu conteúdo. Conhecer os conceitos puros da ciência, nessa forma de
figuras da consciência, constitui o lado de sua realidade segundo o qual sua
essência - o conceito - que nela está posto em sua simples mediação como
pensar, dissocia um do outro os momentos dessa mediação, e se apresenta
segundo a oposição interna.
806 A ciência contém,
nela mesma, essa necessidade de extrusar-se própria da forma do puro conceito;
e contém a passagem do conceito à consciência. Pois o espírito que se
sabe a si mesmo, precisamente porque apreende o seu conceito, é a igualdade
imediata consigo mesmo, a qual em sua diferença é a certeza do imediato, ou
a consciência sensível, - o começo donde nós partimos. Esse
desprender-se da forma de seu Si é a suprema liberdade e segurança de seu saber
de si.
807 Essa extrusão,
contudo, é ainda incompleta: exprime a relação da certeza de si
mesmo com o objeto, que não ganhou sua perfeita liberdade, justamente porque
está na relação. O saber conhece não só a si, mas também o negativo de si
mesmo, ou seu limite. Saber seu limite significa saber sacrificar-se. Esse
sacrifício é a extrusão, em que o espírito apresenta seu processo de vir-a-ser
o espírito, na forma do livre acontecer contingente, intuindo seu
puro Si como o tempo fora dele, e igualmente seu ser como espaço.
Esse último vir-a-ser do espírito, a natureza, é seu vivo e imediato
vir-a-ser. Ora, a natureza - o espírito extrusado - em seu ser-aí não é senão
essa eterna extrusão de sua subsistência, e o movimento que restabelece
o sujeito.
808 Mas o outro lado
de seu vir-a-ser, a história, é o vir-a-ser que-sabe e que se mediatiza,
- é o espírito extrusado no tempo. Mas essa extrusão é igualmente a
extrusão dela mesma: o negativo é o negativo de si mesmo. Esse vir-a-ser
apresenta um movimento lento e um suceder-se de espíritos, um ao outro; uma
galeria de imagens, cada uma das quais, dotada com a riqueza total do espírito,
desfila com tal lentidão justamente porque o Si tem de penetrar e de digerir
toda essa riqueza de sua substância. Enquanto sua perfeição consiste em saber
perfeitamente o que ele é - sua substância - esse saber é então seu adentrar-se
em si, no qual o espírito abandona seu ser-aí e confia sua figura à
recordação. No seu adentrar-se-em-si, o espírito submergiu na noite de sua
consciência-de-si; mas nela se conserva seu ser-aí que desvaneceu; e esse
ser-aí suprassumido - o mesmo de antes, mas recém-nascido agora do saber - é o
novo ser-aí, um novo mundo e uma nova figura-de-espírito. Nessa figura o
espírito tem de recomeçar igualmente, com espontaneidade em sua imediatez;
e partindo dela, tornar-se grande de novo, - como se todo o anterior
estivesse perdido para ele, e nada houvesse aprendido da experiência dos
espíritos precedentes. Mas a recordação os conservou; a recordação é o
interior, e de fato, a forma mais elevada da substância. Portanto, embora esse
espírito recomece desde o princípio sua formação, parecendo partir somente de
si, ao mesmo tempo é de um nível mais alto que recomeça.
“O reino-dos-espíritos, que desse modo se
forma no ser-aí, constitui uma sucessão na qual um espírito sucedeu a um outro,
e cada um assumiu de seu antecessor o reino do mundo. Sua meta é a revelação da
profundeza, e essa é o conceito absoluto. Essa revelação é, por isso, o
suprassumir da profundeza do conceito, ou seja, sua extensão, a
negatividade desse Eu que-em-si-se-adentra: negatividade que é sua extrusão ou
sua substância. Essa revelação é seu tempo, em que essa extrusão se
extrusa nela mesma, e desse modo está, tanto em sua extensão quanto em sua profundeza,
no Si. A meta - o saber absoluto, ou o espírito que se sabe como
espírito - tem por seu caminho a recordação dos espíritos como são neles
mesmos, e como desempenham a organização de seu reino. Sua conservação, segundo
o lado de seu ser-aí livre que se manifesta na forma da contingência, é a
história; mas segundo o lado de sua organização conceituai, é a ciência do
saber que-se-manifesta. Os dois lados conjuntamente - a história
conceituada - formam a recordação e o calvário do espírito absoluto; a efetividade,
a verdade e a certeza de seu trono, sem o qual o espírito seria a solidão sem
vida; somente
“do cálice desse reino dos espíritos
espuma até ele sua infinitude”.
Schiller”
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