sexta-feira, 14 de abril de 2023

Entre quatro paredes, de Jean-Paul Sartre

Editora: Civilização Brasileira

ISBN: 978-65-5802-063-9

Tradução: Alcione Araújo e Pedro Hussak

Opinião: ★★★☆☆

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Páginas: 142

Sinopse: Neste drama estão todos mortos e, ao contrário do que acreditavam, percebem que o inferno não é uma câmara de tortura, mas uma sala de estar ao estilo do Segundo Império francês. Lá eles irão – eternamente – espionar, provocar, tentar seduzir e, acima de tudo, dilacerar uns aos outros. “O inferno são os outros.” Essa é, certamente, a frase que pontua Entre quatro paredes, peça escrita pelo filósofo existencialista Jean-Paul Sartre em 1944 e publicada no ano seguinte.


 

“GARCIN: — Você sabe o que as pessoas falam do lado de lá, né?

CRIADO: — Sobre o quê?

GARCIN:— Bem... (Com um gesto vago e amplo.) Sobre tudo isso.

CRIADO: — Como é que você pode acreditar nessas besteiras? Gente que nunca botou os pés aqui. Porque se tivessem vindo...

GARCIN:— É.

Os dois riem.

GARCIN (Ficando sério de repente.):— Cadê as estacas?

CRIADO: — O quê

GARCIN:— As estacas, as grelhas, os foles de couro?

CRIADO: — Você está de brincadeira?

GARCIN (Olhando para ele.):— Não, não. Eu não estou de brincadeira. (Silêncio. Anda pela sala.) Sem espelhos nem janelas, é claro. Nada de quebrar.”

 

 

“GARCIN:— Então você me achou com cara de carrasco? E como é que se reconhecem os carrascos? Você pode me dizer?

INÊS: — Eles parecem estar sempre com medo.

GARCIN:— Medo? Essa foi demais. E de quem? Das suas vítimas?

INÊS: — Sei do que estou falando, eu me olhei num espelho.”

 

 

“INÊS: — Você é muito bonita. Queria ter flores para lhe dar as boas-vindas.

ESTELLE: — Flores? Ah, sim. Eu adorava as flores. Mas aqui não dá, elas iriam murchar: é quente demais. Enfim, o essencial é manter o bom humor, não é mesmo? Você...

INÊS: — Sim, na semana passada. E você?

ESTELLE: — Eu? Ontem. A cerimônia nem acabou ainda. (Ela fala com muita naturalidade, mas como se estivesse vendo o que descreve.) O vento balança o véu da minha irmã. Ela faz o que pode pra chorar. Vamos, vamos, mais um esforço. Pronto! Duas lágrimas, duas lagriminhas brilhando embaixo do crepe de seda. Nossa, Olga Jardet está horrorosa esta manhã. Ela está segurando a minha irmã pelo braço. Não chora por causa do rímel. Acho que no seu lugar eu também... era minha melhor amiga.

 

 

“ESTELLE: — E, enfim, o que tudo isso significa? Talvez nós nunca tenhamos sido tão vivos. Se for absolutamente necessário dar nome a este... estado de coisas, proponho que nos intitulemos “os ausentes”, seria mais correto. Há quanto tempo você está ausente?

GARCIN:— Mais ou menos um mês.

ESTELLE: — De onde você é?

GARCIN:— Do Rio.

ESTELLE: — E eu, de Paris. (Pausa longa.) Você ainda tem alguém por lá?

GARCIN:— Minha mulher. (Mesmo gesto que Estelle.) Ela foi ao quartel, como todos os dias; não a deixaram entrar. Olha entre as barras da grade. Ela ainda não sabe que eu estou ausente, mas está desconfiando. Agora, está andando. Está toda de preto. Não está chorando; nunca chorava mesmo. Está o maior sol, e ela está toda de preto andando pela rua deserta, com esses grandes olhos de vítima. Ah! Ela me dá nos nervos.”

 

 

“ESTELLE: — Eu não posso suportar que estejam esperando alguma coisa de mim. Me dá logo vontade de fazer tudo ao contrário.”

 

 

“GARCIN:— Se ao menos tivessem me colocado com homens... os homens sabem ficar calados.”

 

 

“INÊS: — Não tenho mais nenhum álibi (...). Estou seca por dentro. Não posso dar nem receber; como é que você quer que eu te ajude? Um galho morto que o fogo vai queimar.”

 

 

“INÊS: — Tudo é uma armadilha. Mas que me importa? Eu também sou uma armadilha.”

 

 

“INÊS: — Somente os atos decidem a respeito do que a gente quis.”

 

 

“GARCIN:— Então, é isto o inferno. Eu não poderia acreditar... Vocês se lembram: enxofre, fornalhas, grelhas... Ah! Que piada. Não precisa de nada disso: o inferno são os Outros.”

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