Editora: Martins Fontes
ISBN: 978-85-7827-069-8
Tradução: Paulo
Mendes Campos
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 124
Sinopse: Ver Parte I
“– Bem – disse Tirian –, daqui vamos para o Norte. Por sorte, a noite
está estrelada, e nossa jornada agora será bem mais curta, pois esta manhã nos
desviamos muito, ao passo que agora iremos direto. Se formos interpelados,
mantenham a calma; farei o possível para falar como um detestável, cruel e
orgulhoso lorde calormano. Se eu puxar a espada, Eustáquio, faça o mesmo; e
você, Jill, coloque-se atrás e fique com o arco a postos. Mas se eu gritar
“Para casa”, então fujam para a torre. E, quando eu tiver dado o sinal de
retirada, não tentem lutar – nem um golpe sequer –, pois esse tipo de falsa
bravura em guerras já arruinou muitos planos excelentes.”
“– Ninguém
deve chamar o demônio sem saber o que está fazendo.”
“De qualquer forma, a gente se sente bem melhor depois de tomar uma
decisão.”
“– Uma morte nobre é um tesouro que ninguém é pobre demais
para comprar.”
“– Você, Eustáquio, controle-se e não fique aí xingando feito um moleque
de rua! Um guerreiro nunca diz palavrões. Palavras corteses e golpes duros são
sua única linguagem.”
“– Como disse um poeta, “um inimigo nobre é a melhor dádiva depois de um
amigo nobre”.”
“Existe
certo tipo de felicidade e assombro que faz a gente ficar séria. É bom demais
para se estragar com piadinhas.”
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Três maneiras de
escrever para crianças
“Quando
escrevemos longamente sobre crianças vistas pelos olhos de adultos, o
sentimentalismo tende a se introduzir, ao passo que a realidade da infância, tal
como todos nós a vivemos, tende a se excluir. Ora, todos nós nos lembramos de
que nossa infância, tal como a vivemos, era infinitamente diferente de como os
adultos a viam. Foi por isso que, quando perguntaram a Sir Michael
Sadler qual sua opinião sobre uma nova escola experimental, ele respondeu: “Não
vou dar nenhuma opinião sobre nenhum desses experimentos enquanto as crianças
não crescerem para nos dizer o que realmente aconteceu”.”
“Inclino-me
quase a afirmar como regra que uma história para crianças de que só as crianças
gostam é uma história ruim. As boas permanecem. Uma valsa da qual você só gosta
enquanto está dançando não é uma boa valsa.”
“O
conto de fadas é acusado de dar às crianças uma falsa impressão do mundo em que
vivem. Na minha opinião, porém, nenhum outro tipo de literatura que as crianças
poderiam ler lhes daria uma impressão tão verdadeira. As histórias infantis que
se pretendem “realistas” tendem muito mais a enganar as crianças. Quanto a mim,
nunca achei que o mundo real pudesse ser igual aos contos de fadas. Acho que eu
esperava que escola fosse igual às histórias da escola. As fantasias não me
enganavam, as histórias de escola, sim... Todas as histórias em que as crianças
passam por aventuras e sucessos que são possíveis, no sentido de que não rompem
as leis da natureza, mas quase infinitamente improváveis, tendem muito mais que
os contos de fadas a criar falsas expectativas.
Quase
o mesmo argumento responde à popular acusação de escapismo, embora a questão,
nesse caso, não seja tão simples. Será que os contos de fadas ensinam as
crianças a se recolher num mundo em que todos os desejos se realizam – numa
“fantasia” no sentido técnico-psicológico do termo – em vez de enfrentar os
problemas do mundo real? Bem, é aqui que o problema se torna sutil. Mais uma
vez, vamos comparar o conto de fadas com a história escolar ou qualquer outra
história que seja rotulada como “Livro para Meninos” ou “Livro para Meninas” em
vez de “Livro Infantil”. Não há dúvida de que ambos despertam desejos e os
satisfazem imaginariamente. Temos vontade de passar através do espelho, de
chegar ao país das fadas. Também temos vontade de ser aquele aluno ou aluna
imensamente popular e bem-sucedido, de ser o menino ou a menina de sorte que
descobre a trama do espião ou monta o cavalo que nenhum caubói consegue domar.
Os dois anseios, porém, são muito diferentes. O segundo, especialmente quando
voltado para algo tão próximo como a vida escolar, é voraz e extremamente
sério. Sua realização no nível imaginário é de fato compensadora: nós a
buscamos, fugindo das decepções e humilhações do mundo real, e somos mandados
de volta a ele com uma insatisfação nem um pouco divina. Trata-se sempre de
lisonjear o ego. O prazer consiste em imaginar-se objeto de admiração. O outro
anseio, o anseio pelo país das fadas, é muito diferente. Em certo sentido, a
criança não anseia pelo país das fadas da mesma maneira que o garoto anseia por
ser o herói da sexta série. Será que alguém supõe que ele, de fato e
prosaicamente, anseia pelos perigos e desconfortos de um conto de fadas? – que
seu desejo é de fato que houvesse dragões na Inglaterra contemporânea? De jeito
nenhum. Seria muito mais verdadeiro dizer que o país das fadas desperta no
menino um anseio por algo que ele não sabe o que é. Comove-o e perturba-o
(enriquecendo toda a sua vida) com a vaga sensação de algo que está além de seu
alcance, e, longe de tornar insípido ou vazio o mundo exterior, acrescenta-lhe
uma nova dimensão de profundidade. O menino não despreza as florestas de
verdade por ter lido sobre florestas encantadas: a leitura torna todas as
florestas de verdade um pouco encantadas. Trata-se de um tipo especial de
anseio. O menino que lê a história “escolar” do tipo que tenho em mente deseja
o sucesso e fica infeliz (quando termina o livro) porque esse sucesso lhe
escapa; o menino que lê o conto de fadas simplesmente deseja e sente-se feliz
no próprio ato de desejar. Sua mente não esteve concentrada nele mesmo, como
acontece frequentemente nas histórias mais realistas.”
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