Editora: InterSaberes
ISBN: 978-85-8972-090-7
Opinião: ★★☆☆☆
Páginas: 200
Sinopse: Para se
familiarizar com uma ciência tão antiga quanto a lógica, é preciso percorrer um
longo caminho de estudos. Contudo, não se deve ter pressa para avançar nos
conteúdos. Nesse trajeto, os primeiros passos são fundamentais. Esta obra pode
servir como um guia, proporcionando o esclarecimento de conceitos e teorias
elementares da lógica e conduzindo o leitor pelas diferentes vias dessa
caminhada. E então, o conhecimento adquirido servirá de base para a construção
de ideias que ultrapassam a opinião.
“Uma busca incansável que fazemos quando
estudamos lógica é a da precisão. Os raciocínios lógicos são exercícios para um
pensamento correto, diretrizes de como o discurso mais claro e mais adequado
pode ser realizado. Tudo deve estar de acordo com algumas regras estabelecidas
por pessoas que se debruçaram para resolver imprecisões no discurso e, se
possível, evitar falhas que eventualmente aparecem quando se apresentam
argumentos. Também vale observar que, muitas vezes, a ambiguidade está presente
nos debates de todos os tipos, ou seja, estão permeados de duplo sentido. No
caso da imprecisão, devemos entender que o que foi dito não é possível
determinar. Esses conceitos e outros são importantes para aceitarmos que
raciocínios lógicos bem conduzidos não são adorno na aquisição do conhecimento
de qualidade, mas constituem uma necessidade real para sermos entendidos sempre
que nos fazemos representar pelo discurso escrito ou oral.”
“Todos os homens, por natureza, tendem ao
saber” (Aristóteles, Metafísica, 2005,
p, 3). Essa proposição indica a principal preocupação do filósofo: um desejo,
uma força que nos leva a buscar o conhecimento. (...)
O ramo do conhecimento inaugurado de maneira
mais formal por Aristóteles trata da demonstração (formalização da linguagem) das
condições em que se apresentam as premissas verdadeiras e os argumentos
válidos.”
“A importância da lógica para eles pode ser
conferida em uma metáfora que Diógenes Laércio citou: “Os estoicos assemelham a
filosofia a um animal, comparam a lógica aos ossos e aos tendões, a ética à
carne e a física à alma. Ou então comparam-na a um ovo: a lógica é a parte mais
exterior, mais para o interior é a ética e a parte mais interior é a física”
(Kneale; Kneale, O desenvolvimento da
lógica, 1991, p. 142).”
“Os preceitos da lógica cartesiana
assinalavam um confronto com a teoria aristotélica da demonstração.
Descartes vinculava o caráter incontroverso
de um raciocínio não a relações entre as formas das premissas e das conclusões
— a composição das premissas e conclusões a partir da correta combinação de
sujeitos e predicados — mas ao impacto que as proposições exercem sobre um
espírito que se aperfeiçoou o suficiente para alcançar níveis ideais de atenção
e assentimento. (Sorell, Descartes,
2004, p. 60)”
“A dedução
é o tipo de raciocínio que traz certa segurança aos lógicos e, por sua vez, é a
maneira mais correta de inferir. Os raciocínios do tipo dedutivo são mais
comuns em análises lógicas rigorosas, como o citado. Além do uso em matemática
— que busca constantemente a dedução como fonte de justificação dos raciocínios
feitos nas passagens de cálculos realizados para se chegar a um resultado tido
como mais correto, verdadeiro etc. — esse tipo de raciocínio também aparece em
filosofia, pois o que se almeja na argumentação filosófica é o melhor
argumento.
Assim, os filósofos aspiram em suas obras a
uma estrutura textual que visa mostrar ao leitor como o tema que exploram deve
ser investigado. Para isso, costumeiramente elaboram a temática de modo a ser
entendida por certa pergunta e desenvolvem os textos na perspectiva de
responder a ela. Isso é feito como se, do começo ao fim do texto, a questão
debatida estivesse contida ali nos parágrafos, nas páginas de artigos ou mesmo
em alguns volumes de livros que compõem as obras. Somente dessa forma as
respostas às grandes questões podem ser contempladas pelo poder argumentativo
que o conhecimento de tais obras pode proporcionar. Em resumo, qualquer texto
que ambicione uma boa compreensão por parte do leitor deverá, necessariamente,
ter uma boa estrutura que faça aquele que interage com o texto inferir de modo
seguro do início ao fim da argumentação.
O que podemos discutir, então, é: Qual é o
modo mais seguro de construir uma argumentação: dedução ou indução?
Sabemos que todo argumento é construído com a
pretensão de que suas premissas ofereçam a verdade para a conclusão
apresentada. O que podemos afirmar é que a dedução tem a característica de ser
mais facilmente aceita como uma prova conclusiva. Por quê? Porque as premissas
levam a concluir validamente. Por isso se diz que o raciocínio dedutivo é mais
adequado para o tipo de robustez que a matemática busca. A geometria
euclidiana, por exemplo, não enfrentou dificuldades para ser aceita pelos
filósofos naturais no período moderno, Descartes, Espinosa, Hobbes e outros
usaram o fato de que argumentos filosóficos podem ser validados com a lógica
que apresentaram, segundo eles, dedutivamente. Thomas Hobbes, por exemplo,
acreditava que a política tinha de ser construída com a precisão da geometria
de Euclides, que tem uma característica extremamente dedutiva entre seus
axiomas.
Em resumo, a dedução fornece a prova
conclusiva em decorrência de suas premissas. Aliás, é importante ficar atento
ao vocabulário: válido ou inválido. Usa-se essa terminologia no
lugar de correto ou incorreto.
Por outro lado, temos os raciocínios
indutivos como poderosa fonte de conhecimento, pois envolvem boa parte dos
trabalhos científicos.
De modo geral, a ciência desenvolve
principalmente os experimentos em função da indução — o que não quer dizer que seja algo menos confiável pelo
fato de inferências indutivas apresentarem um caráter mais particular de suas A
indução oferece algumas provas, um estudo de caso, o que confirma o caráter
experimental da ciência, mas não disponibiliza meios para que seja criada a
noção de crença verdadeira e justificada, como se concebe de forma
clássica na epistemologia.
Ao contrário da inferência dedutiva, a
indutiva apresenta alta chance de que seja verdadeira, mas tem a possibilidade
de assim ser se as premissas forem verdadeiras. Ela também não é uma “prova” no
sentido forte que a dedutiva pode ser considerada. Além disso, é possível
avaliar de modo diferente a forma lógica que as inferências apresentam.
Todos os vegetais verdes são saudáveis.
O espinafre é um vegetal verde;
Logo, o espinafre é saudável.
Nessa inferência, se as premissas forem
verdadeiras, a conclusão também deverá ser verdadeira. Portanto, pode ser
classificada como um tipo de raciocínio dedutivo.
Vejamos outro caso:
A maioria dos vegetais verdes é saudável.
O espinafre é um vegetal verde.
Logo, o espinafre é saudável.
Esse argumento terá grande chance* de ter uma
conclusão verdadeira se as premissas o forem; portanto, pode ser classificado
como indutivo. Além do mais, os argumentos indutivos presentam uma limitação
nas suas premissas, que é a quantidade de casos observados. Geralmente, são
poucos objetos ou entidades observados, o que quer dizer que se trata de
situações particulares. No último exemplo, é possível perceber que o caso é de
indução porque a premissa “A maioria dos vegetais verdes é saudável” indica que
foram analisados alguns casos, mas não todos. Então, aqui entra outro item que
compõe as inferências indutivas: elas são do tipo que mantém alguma relação com
a observação, ou seja, com a empiria.
Isso não significa que, se a premissa tiver
algo de empírico, deverá ser considerada nada confiável. Apenas o nível de
confiabilidade na verdade da premissa é que deve mudar, ou seja, não existe uma
prova, como no caso dedutivo, mas
uma evidência de que há uma premissa
presente na estrutura do argumento e de que sua verdade se situa no campo da
possibilidade. A prova do raciocínio dedutivo deve ser vista como uma conclusão
irrevogável, em certo sentido; no caso indutivo, trata-se de um argumento que
ainda pode submeter a conclusão a uma análise posterior, pois não se trata de
um tipo de verdade robusta, forte.
Essa é uma análise que se deve fazer em
relação às críticas que muitas pessoas exercem sobre a ciência, principalmente
filósofos e outros pensadores. A queixa é a de que a ciência “não prova coisa
alguma!”.
Não é bem assim. É preciso entender a
pretensão do discurso científico e seu objeto de estudo. De forma resumida,
podemos afirmar aqui que estudar os objetos que compõem os fenômenos da
natureza não implica chegar a uma ou várias conclusões que se mostram
estáticas, absolutas, do ponto de vista de entendimento do fenômeno. De modo
geral, a ciência apresenta suas teorias e seus experimentos como uma rota para
a compreensão dos fenômenos.
A dedução por raciocínios que parte de
premissas verdadeiras e, passo a passo, leva a uma conclusão sem algum tipo de
dúvida é o que poderíamos chamar de discurso
perfeito logicamente. Porém, isso é quase impossível de ser efetuado quando
se percebe que o fundamento de tal argumento pode ser usado apenas para alguns
casos. Esse, aliás, é o motivo pelo qual encontramos em grandes filósofos do
passado (entre os modernos, por exemplo) grande desejo de construir sistemas
filosóficos. Tais pensadores buscavam uma forma de revelar a verdade em todas
as áreas que o conhecimento humano havia construído. Procuravam uma verdade
completa em suas obras e queriam alcançá-la na teoria do conhecimento, na
moral, na política, na estética e em outras áreas.
São várias as situações em que a certeza não
pode ser atingida como se espera; portanto, o que se almeja é que todas as
inferências sejam cuidadosamente avaliadas. Isso se deve ao caráter formal que
a lógica tem como pretensão. Ao nos depararmos com um argumento, não basta
usarmos uma regra que faça uma análise sobre a validade ou não dele; a verdade
é um valor epistemológico que se busca comumente, apesar de não ser o principal
objeto de estudo da lógica.
Desse modo, a principal distinção que a
inferência dedutiva oferece em relação à indutiva está no grau de certeza. A
primeira pode ser considerada uma prova porque sua conclusão atinge o ápice da
racionalidade, ou seja, seria do tipo indubitável; a segunda, entretanto,
carece de algo que possa fazê-la permanecer no estatuto de prova, por isso fica
no campo da evidência.
Também é importante reconhecer que as
inferências indutivas apontam para conclusões que excedem as possibilidades das
premissas, ou seja, o conteúdo das premissas não oferece a legitimidade para se
deduzir o resultado que se espera, como no caso das inferências dedutivas.
Há muitas formas de associar a análise da
inferência indutiva com outros conceitos que podem ser usados para se obter
conhecimento no campo da probabilidade, ou chances maiores de estar ali um tipo
de conhecimento com algum nível de confiabilidade. Francis Bacon foi o primeiro
a valorizar a inferência indutiva de modo a tomá-la como uma forma de
raciocínio que inegavelmente produz conhecimento. A Figura 2.1 ilustra como a
indução está relacionada com a experiência e como produz a generalização. De
certa forma, a inferência indutiva é mais flexível que a dedutiva, se observada
a pretensão do resultado, pois seu tipo de conclusão indica o “melhor” a ser
aceito, segundo aquelas premissas.
Fonte: Adaptado de Kunzmann; Burkard;
Wiedmann, Atlas de Filosofía, 2007,
p. 94, tradução nossa).
As outras formas de inferência que merecem
ser citadas são usadas para raciocínios diversos. São elas:
a) Inferência
por enumeração: ocorre com base na observação, por isso a conclusão sobre
todos os elementos de uma classe é inferida das premissas.
b) Inferência
analógica: consiste em uma comparação entre dois objetos ou fenômenos que
compartilham características comuns. Podemos comparar aquelas características
relevantes entre ambos e concluir que, por analogia, o resultado é digno de
determinada confiança. É possível fazer a inferência analógica entre
indivíduos, quando, por exemplo, analisamos as semelhanças entre as pessoas da família
e percebemos que aquela pequena criança tem mesmo os traços de outros parentes;
podemos analisar uma posição de um jogo de xadrez e concluir que tal disposição
das peças é semelhante à de outra partida jogada por outrem; um caso de doença
pode guardar semelhança com outro, e a conclusão de que se trata de um caso
quase igual permite que, por comparação, um médico use medicamentos semelhantes
no tratamento etc.
c) Inferência
estatística: busca-se a generalização por meio de padrões apresentados por
certa quantidade de dados geralmente oferecidos em gráficos e tabelas. Esse
método é bastante usual hoje para formar opinião quando se trata de resolver
problemas que precisam de uma solução e a maioria deve votar ou optar pelo
convencimento que os dados estatísticos produzem. Não é um tipo de raciocínio
comum aos textos de filosofia, mas é muito divulgado pelos meios de
comunicação, porque passam a imagem de que a quantidade pode levar os
indivíduos a se decidirem pelos aspectos mostrados estatisticamente. De certo
modo, trata-se de um tipo de correlação e não há uma conclusão absoluta; o que
os dados estatísticos podem mostrar depende de uma interpretação, portanto
podem ser avaliados de diversas formas**. Nesse caso, a regularidade constitui
uma variável muito importante para atacar o problema e interpretá-lo
estatisticamente.
d) Inferência
causal: fundamenta-se no conhecimento de causas e efeitos e pode ser
encontrada em diversas áreas, pois o conhecimento causal é uma forma de buscar
conhecimento e confirmá-lo desde os primórdios da filosofia. A ciência a usa
sempre que se pergunta como determinado fenómeno pode acontecer. Para David
Hume, filósofo escocês do século XVIII, a inferência causal é a base do
conhecimento humano. Uma doença, por exemplo, pode ser curada quando se
investiga que seus efeitos podem ser observados e se tenta atuar sobre eles com
medicamentos específicos. Assim, nesse caso, o medicamento pode ser a causa da
cura de determinada doença.
Para finalizarmos, devemos ressaltar que as
inferências indutivas são de grande importância para o avanço do conhecimento.
Reconhecê-las como poderosas ferramentas para a investigação é uma justa medida
quando se pretende avançar em direção às formas diferentes de conhecer objetos
da natureza ou mesmo a natureza humana.”
[*: O termo chance (de um acontecimento
ocorrer) foi empregado aqui em detrimento do uso do termo probabilidade. Isso
porque esta requer uma discussão que leva ao conceito de lógica probabilística,
que foge ao interesse da presente obra.]
**: Merece atenção, como exercício de
curiosidade, a investigação sobre os portfólios a presentados para compra e
venda de ações nas bolsas de valores. Os dados são interpretados de diversas
formas, principalmente por gráficos, e podem levar os investidores a ganhos e
perdas.
“Sabemos que as inferências são usadas para
obter evidências que levem a uma conclusão. Porém, no caso das falácias, a
relação entre as premissas e a conclusão geralmente tem certo grau de falha que
compromete a avaliação da validade do argumento. Para um argumento ser
falacioso, basta, simplesmente, ter premissas que não digam verdade alguma
sobre qualquer objeto ou fenômeno do mundo, razão pela qual não será possível
conferir sua verdade, mesmo que seja encontrada a forma válida de suas
premissas e conclusão verdadeiras.”
“As falácias constituem o tipo de argumento
que se utiliza de elementos subjetivos, ou seja, em que não há quase nenhuma
explicitação das correlações entre os fatos a serem discutidos, e certamente
são, em muitos casos, uma tentativa de distorção dos acontecimentos, avaliados
por uma perspectiva unilateral de pensamento. Existe, portanto, mais interesse
em persuadir que em obter a correção dos raciocínios. Assim, as falácias são a
ferramenta básica para a formação do convencimento, atitude muito pouco
louvável quando se trata de construir um argumento livre de confusões ou
parcialidades. Podemos concluir, então, que as falácias fogem ao objetivo dos
argumentos lógicos: a busca por raciocínios corretos. Apesar disso, são
amplamente usadas porque, em muitas situações, é de difícil percepção a
ocorrência delas nos debates.”
“A lógica precisa ser compreendida como uma
área do conhecimento que propõe uma estrutura de argumentação que nos
possibilita raciocinar com a maior exatidão que pudermos.”
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