Editora: Vozes
ISBN: 85-326-0687-3
Tradução: Paulo
Meneses
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 272
Sinopse: Ver Parte
I
“341 - Lançando um olhar retrospectivo sobre
a série de relações consideradas até agora, e que constituem o conteúdo e o
objeto da observação, vemos que:
[1] - No primeiro modo, o ser sensível
desvanece já na observação das relações da natureza inorgânica. Os momentos
de suas relações apresentam-se como puras abstrações e como conceitos simples,
que deveriam estar firmemente unidos ao ser-aí das coisas; mas esse se perdeu,
de forma que o momento se mostra como puro movimento ou como universal. Esse
processo livre, completo em si mesmo, conserva a significação de algo objetivo:
mas agora vem à cena como um Uno. No processo do inorgânico, o Uno é o
interior inexistente; e inversamente, o processo existente como Uno é o
orgânico.
[2] - O Uno, enquanto ser para si ou essência
negativa, defronta o universal, esquiva-se dele, e permanece livre para si.
Desse modo o conceito, realizado somente no elemento da singularização
absoluta, não encontra na existência do orgânico sua expressão autêntica, que
seria a de estar ali como universal; porém permanece um exterior, ou, -
o que é o mesmo - um interior da natureza orgânica.
[3] - O processo orgânico é livre somente em
si, mas não para si mesmo; o ser para si de sua liberdade emerge no fim;
existe como outra essência, como uma sabedoria sua consciente de si que
está fora desse processo. Volta-se pois a razão observadora para essa
sabedoria, para o espírito, para o conceito existindo como universalidade ou
fim existindo como fim; de agora em diante sua própria essência é seu objeto.
342 - Volta-se primeiro a razão observadora
para a pureza do objeto; mas sendo ela o apreender desse objeto como um objeto
essente, movendo-se em suas diferenças - suas leis do pensamento se
tornam relações do permanente com o permanente. Ora, como o conteúdo dessas
leis são apenas momentos, elas se perdem no Uno da consciência de si.
Esse novo objeto, tomado igualmente como algo
essente, é a consciência-de-si singular e contingente; mantém-se,
pois, a observação dentro do espírito visado e da relação contingente entre uma
efetividade consciente e uma efetividade inconsciente. Em si mesmo, o objeto em
questão é só a necessidade desse relacionamento; a observação, portanto, ainda
o abraça mais estreitamente, e compara sua efetividade querente e operante com
sua efetividade em si mesma refletida e contemplativa que por sua vez é também
objetiva.
Embora esse exterior seja na verdade uma
linguagem do indivíduo, que ele possui em si mesmo, é ao mesmo tempo, enquanto
signo, algo indiferente ao conteúdo que deveria significar; como o que põe para
si mesmo o signo é indiferente quanto a ele.
343 - Por isso a observação retrocede dessa
linguagem mutável ao ser fixo e enuncia, segundo seu conceito próprio,
que exterioridade - não como órgão, nem como linguagem, ou signo, mas como coisa
morta - é a efetividade exterior e imediata do espírito. O que fora
suprassumido pela primeiríssima observação da natureza inorgânica - a saber,
que o conceito deveria estar presente como coisa - é restaurado por essa última
modalidade da observação, que assim faz da efetividade do próprio espírito uma
coisa, ou, exprimindo inversamente, dá ao ser morto a significação do espírito.
Sendo assim, a observação chegou ao ponto em
que enuncia o que era nosso conceito sobre ela - a saber, que a certeza da
razão busca a si mesma como efetividade objetiva.”
“A consciência-de-si encontra a coisa como a
si, e a si como coisa, quer dizer: é para ela que essa consciência é em
si efetividade objetiva. Não é mais a certeza imediata de ser toda a
realidade; mas é uma certeza tal, que o imediato tem para ela a forma de
um suprassumido, de modo que sua objetividade só vale como superfície,
cujo interior e essência é a própria consciência-de-si.
Assim sendo, o objeto a que ela se refere
positivamente é uma consciência-de-si; um objeto que está na forma da
coisidade, isto é, um objeto independente. No entanto, a
consciência-de-si tem a certeza de que esse objeto independente não lhe é nada
de estranho, pois sabe que por ele é reconhecida em si. Ela então é o espírito,
que tem a certeza, de ter sua unidade consigo mesmo na duplicação de
sua consciência-de-si e na independência das duas consciências-de-si daí
resultantes. Essa certeza agora tem de elevar-se à verdade, para a
consciência-de-si: o que para ela vale como sendo em si, e em sua certeza
interior, deve entrar na sua consciência e vir-a-ser para ela.
348 - Comparando o caminho até aqui percorrido,
já se pode caracterizar as estações universais dessa efetivação em geral. A
saber: assim como a razão observadora repetira no elemento da categoria o
movimento da consciência, isto é, a certeza sensível, a percepção
e o entendimento, - assim também esta razão ativa percorrerá de novo o duplo
movimento da consciência-de-si, e da independência passará à sua
liberdade.
De início, essa razão ativa só está
consciente de si mesma como de um indivíduo, e enquanto tal deve exigir e
produzir sua efetividade em outro. Mas depois, ao elevar sua consciência à
universalidade, torna-se razão universal, e o indivíduo é consciente de
si como razão, como algo já reconhecido em si e para si, que unifica em sua
pura consciência toda a consciência de si. É a essência espiritual simples que,
ao chegar à consciência é, ao mesmo tempo, substância real; para dentro
dela retomam, como a seu fundamento, todas as formas anteriores, que assim, em
relação a ela, são momentos singulares simples de seu vir a ser. Os momentos se
desprendem, sem dúvida, e aparentam formas próprias; mas de fato só têm ser-aí
e efetividade sustidos pelo fundamento; e só têm verdade na medida que
neles estão e permanecem.
349 - Tomemos em sua realidade essa meta
alcançada: o conceito, que já surgiu para nós - isto é, a consciência de
si reconhecida, que tem em outra consciência de si livre a certeza de si mesma,
e aí precisamente encontra sua verdade. Destaquemos esse espírito ainda
interior como substância já amadurecida em seu ser-aí, O que vemos patentear-se
nesse conceito é o reino da eticidade.
Com efeito, esse reino não é outra coisa que
a absoluta unidade espiritual dos indivíduos em sua efetividade independente.
É uma consciência-de-si universal em si, que é tão efetiva em uma outra
consciência, que essa tem perfeita independência - ou seja, é uma coisa para
ela. Tão efetiva que justamente nessa independência está cônscia da sua unidade
com a outra, e só nessa unidade com tal essência objetiva é
consciência-de-si.
Essa substância ética, na abstração
da universalidade, é apenas lei pensada; mas, não menos
imediatamente, é a consciência-de-si efetiva ou o etos. Inversamente, a
consciência singular só é esse Uno essente porque em sua própria
singularidade está cônscia da consciência universal, como de seu próprio ser:
porque seu agir e seu ser aí são o etos universal.
350 - É na vida de um povo que o conceito tem
de fato, a efetivação da razão consciente-de-si e sua realidade consumada: ao
intuir, na independência do Outro, a perfeita unidade com ele; ou seja,
ao ter por objeto, como meu ser-para-mim, essa livre coisidade de
um outro, por mim descoberta - que é o negativo de mim mesmo.
A razão está presente como fluida substância
universal, como imutável coisidade simples, que igualmente se
refrata em múltiplas essências completamente independentes, como a luz nas
estrelas, em seus inúmeros pontos rutilantes. Em seu absoluto ser-para-si, tais
essências não só em si se dissolvem na substância independente simples,
mas ainda são para si mesmas; cônscias de serem tais essências simples
singulares, porque sacrificam sua singularidade e porque essa substância
universal é sua alma e essência. Do mesmo modo, esse universal é, por sua vez,
o agir dessas essências como singulares; ou a obra por elas produzida.
351 - O agir e o atarefar-se puramente singulares
do indivíduo referem-se às necessidades que possui como ser-natural, quer
dizer, como singularidade essente. Graças ao meio universal que sustem o
indivíduo, graças à força de todo o povo, sucede que suas funções
inferiores não sejam anuladas, mas tenham efetividade.
Na substância universal, porém, o indivíduo
não só tem essa forma da subsistência de seu agir em geral, mas
também seu conteúdo. O que ele faz, é o gênio universal, o etos de
todos. Esse conteúdo, enquanto se singulariza completamente, está em sua efetividade
encerrada nos limites do agir de todos. O trabalho do indivíduo para
prover a suas necessidades, é tanto satisfação das necessidades alheias quanto
das próprias; e o indivíduo só obtém a satisfação de suas necessidades mediante
o trabalho dos outros.
Assim como o singular, em seu trabalho singular,
já realiza inconscientemente um trabalho universal, assim
também realiza agora o trabalho universal como seu objeto consciente: torna-se
sua obra o todo como todo, pelo qual se sacrifica, e por isso mesmo dele
se recebe de volta. Nada há aqui que não seja recíproco, nada em que a
independência do indivíduo não se atribua sua significação positiva - a
de ser para si - na dissolução de seu ser-para-si e na negação de si
mesmo. Essa unidade do ser para outro - ou do fazer-se coisa - com o
ser-para-si, essa substância universal fala sua linguagem universal nos
costumes e nas leis de seu povo.
No entanto, essa imutável essência não é
outra coisa que a expressão da individualidade singular que aparenta ser-lhe
oposta. As leis exprimem o que cada indivíduo é e faz; o indivíduo não
as conhece somente como sua coisidade objetiva universal, mas também nela
se reconhece, ou: conhece-a como singularizada em sua própria
individualidade, e na de cada um de seus concidadãos. Assim, no espírito
universal, tem cada um a certeza de si mesmo - a certeza de não encontrar, na
efetividade essente, outra coisa que a si mesmo. Cada um está tão certo dos
outros quanto de si mesmo.
Vejo em todos eles que, para si mesmos, são
apenas esta essência independente, como Eu sou. Neles vejo a livre unidade com
os outros, de modo que essa unidade é através dos Outros como é através de mim.
Vejo-os como me vejo, e me vejo como os vejo.
352 - Por conseguinte, em um povo livre, a
razão em verdade está efetivada: é o espírito vivo presente.
Nela, o indivíduo não apenas encontra sua determinação,
isto é, sua essência universal e singular expressa e dada como coisidade, senão
que ele mesmo é tal essência e alcançou também sua determinação. Por isso os
homens mais sábios da Antiguidade fizeram esta máxima: que a sabedoria e a
virtude consistem em viver de acordo com os costumes de seu povo.”
“365 - Essa passagem de seu ser vivo
para a necessidade sem-vida se lhe manifesta, pois, como uma inversão, que por
nada é mediatizada. O mediador deveria ser algo em que os dois lados fossem um
só - portanto, a consciência que conhecesse um momento no outro: - seu fim e
agir no destino, e seu destino no seu fim a agir; sua essência própria nessa
necessidade. Porém essa unidade é para essa consciência justamente o
prazer mesmo, ou o sentimento singular simples. A passagem do momento desse
seu fim ao momento de sua essência verdadeira é para ela um puro salto no
oposto, pois esses momentos não estão contidos e ligados no sentimento, mas só
no puro Si, que é um universal ou o pensar.
Assim, por meio da experiência - em que sua
verdade deveria vir-a-ser para ela - a consciência tomou-se, antes, um enigma
para si mesma: as consequências de seus atos não são, para ela, atos seus; o
que lhe acontece não é, para ela, a experiência do que é em si; a
passagem não é uma simples mudança-de-forma do mesmo conteúdo e essência, ora
representado como essência e conteúdo da consciência, ora como objeto ou
essência intuída de si mesma. A necessidade abstrata vale
portanto como potência da universalidade, uma potência apenas negativa e
não-concebida, contra a qual a individualidade se despedaça.
366 - Até este ponto chega a manifestação
dessa figura da consciência-de-si; o último momento de sua existência é o
pensamento de sua perda na necessidade, ou o pensamento dela mesma como uma
essência absolutamente estranha a si. A consciência-de-si porém
sobreviveu, em si, a essa perda: pois essa necessidade ou a
universalidade pura é sua essência própria. Essa reflexão da
consciência sobre si mesma, que faz saber a necessidade como Si, é uma
nova figura sua.”
“372 - (...) O indivíduo, através de seu ato,
põe-se no elemento - melhor, como o elemento - universal da
efetividade essente. Seu ato deve, até mesmo pelo sentido que lhe confere, ter
o valor de uma ordem universal. Mas assim, o indivíduo libertou-se de si
mesmo, cresce para si como universalidade, e se purifica da singularidade. O indivíduo
- que só quer conhecer a universalidade sob a forma de seu imediato ser-para-si
- não se reconhece nessa universalidade livre; e contudo, ao mesmo tempo, lhe
pertence, pois ela é seu agir; agir que tem, pois, a significação pervertida de
contradizer a ordem universal, já que seu ato deve ser ato de seu coração
singular, e não efetividade universal livre. Mas, ao mesmo tempo, o indivíduo a
reconheceu no ato, pois o agir tem o sentido de pôr sua essência como efetividade
livre, quer dizer, reconhecer a efetividade como sua essência.
373 – Por meio do conceito de seu agir, o
indivíduo determinou de maneira mais exata como é que se volta contra ele a
universalidade efetiva - da qual ele se fez propriedade. Seu agir, como efetividade,
pertence ao universal; mas seu conteúdo é a própria individualidade,
querendo manter-se como este singular, oposto ao universal. Não se trata
aqui do estabelecimento de qualquer lei determinada; porém a unidade imediata
do coração singular com a universalidade, é o pensamento que deve valer e ser erigido
em lei: "que todo coração deve reconhecer-se a si mesmo no
que é lei".
Mas o coração deste indivíduo apenas pôs sua
efetividade no seu ato, que exprime seu ser-para-si ou seu prazer. O
ato deve valer imediatamente como universal, quer dizer, é na verdade algo
particular: da universalidade tem apenas a forma; seu conteúdo particular deve,
como tal, valer por universal. Por isso os outros não encontram realizada
nesse conteúdo a lei de seu coração, e sim a de um outro. Ora, de acordo
com a lei universal, justamente - de que "cada um deve encontrar seu
coração no que é lei" -, voltam-se contra a efetividade que este
indivíduo propunha, assim como ele se voltava contra a dos outros. Por
conseguinte, o indivíduo, como antes abominava somente a lei rígida, agora acha
os corações dos próprios homens, contrários a suas excelentes intenções e
dignos de abominação.
374 - Para essa consciência, a natureza da
efetivação e da eficiência lhe é desconhecida, porque só conhece a
universalidade como imediata, e a necessidade como necessidade do coração.
Não sabe que essa efetivação como essente é antes, em sua verdade, o
universal em si - no qual some a singularidade da consciência que a ele
se confia, para ser esta singularidade imediata. Portanto, em lugar
desse Ser seu, o que ela consegue é a alienação de si mesma no
ser.
Mas aquilo em que a consciência não se
reconhece já não é a necessidade morta, e sim a necessidade enquanto vivificada
por meio da individualidade universal. Essa ordem divina e humana, que
encontrou vigente, a consciência a tomou por uma efetividade morta. Nela, não
teriam consciência de si mesmos, não somente ela - que se fixa como este
coração para si essente oposto ao universal -, mas também os outros que a tal
ordem pertencem. Mas antes, ela encontra essa ordem vivificada pela consciência
de todos, e como lei de todos os corações. Faz a experiência de que a efetividade
é uma ordem vivificada; e isso justamente porque ao mesmo tempo torna efetiva a
lei de seu coração. Isso significa apenas que a individualidade se torna para
si objeto como universal; um objeto, aliás, em que não se reconhece.”
“Na primeira figura da razão ativa, a
consciência de si era, para si, pura individualidade, e frente a ela se postava
a universalidade vazia. Na segunda figura, cada uma das duas partes continha os
dois momentos - lei e individualidade: uma das partes, o coração, era
sua unidade imediata, e a outra, sua oposição. Aqui, na relação entre a virtude
e o curso do mundo, os dois membros são, cada um, unidade e
oposição desses momentos, ou seja, são um movimento da lei e da individualidade
- um em relação ao outro, mas em sentido oposto.
Para a consciência da virtude, a lei é
o essencial, enquanto a individualidade é o que deve ser suprassumido,
tanto na sua consciência mesma quanto no curso do mundo. Nela, a
individualidade própria deve disciplinar-se sob o universal, o verdadeiro e o
bem em si. Porém, mesmo assim, fica ainda sendo consciência pessoal: a
verdadeira disciplina é só o sacrifício da personalidade toda, como garantia de
que a consciência de fato já não está presa a singularidades. Ao mesmo tempo,
nesse sacrifício singular, é extirpada no curso-do-mundo a
individualidade, por ser também um momento simples, comum aos dois termos.
A individualidade se comporta no curso do
mundo de maneira inversa da que tinha na consciência virtuosa, a saber: ela se
faz essência, e em contrapartida subordina a si o que em si é bom e
verdadeiro. Além do que, para a virtude, o curso do mundo não é somente esse
universal pervertido pela individualidade; mas a ordem
absoluta é igualmente um momento comum aos dois termos; só que no curso do
mundo não está presente, para a consciência como efetividade essente,
mas é sua essência interior. Portanto, essa ordem não tem de ser
produzida só pela virtude, já que o produzir, enquanto agir, é
consciência da individualidade; a qual deve, antes, ser suprassumida. Porém com
esse suprassumir, somente se dá espaço ao Em-si do curso do
mundo, para que possa entrar na existência em si e para si.
382 - O conteúdo universal do efetivo
curso do mundo já se deu a ver: examinado mais de perto, não é outra coisa que
os dois movimentos anteriores da consciência de si. Deles brotou a figura da
virtude; posto que são sua origem, elas os têm diante de si; porém empreende
suprassumir sua origem, realizar-se ou vir a ser para si. O curso do
mundo é, pois, de um lado, a individualidade singular que busca seu prazer e
gozo; assim agindo, encontra sua ruína, e desse modo satisfaz o universal. Mas
essa satisfação mesma - como aliás os outros momentos dessa relação - é uma
figura e um movimento pervertidos do universal. A efetividade é somente a
singularidade do prazer e do gozo, enquanto o universal é o seu oposto: uma
necessidade que é apenas a figura vazia do universal, uma reação puramente negativa
e um agir carente de conteúdo.
O outro momento do curso do mundo é o da
individualidade que pretende ser lei em si e para si, e que nessa pretensão
perturba a ordem estabelecida. Na verdade, a lei universal se mantém contra
essa enfatuação, e não surge mais como algo oposto à consciência e vazio; nem
como necessidade morta, mas sim como necessidade na consciência mesma.
Porém essa lei universal, quando existe como relação consciente da
efetividade absolutamente contraditória, é o desvario; e quando é como
efetividade objetiva, então é a perversidade em geral. Portanto o
universal se apresenta, decerto, nos dois lados, como a potência de seu
movimento; mas a existência dessa potência é apenas a perversão
universal.
383 - Agora deve o universal receber da
virtude sua verdadeira efetividade, mediante o suprassumir da individualidade -
do princípio da perversão. O fim da virtude é, pois, reverter de novo o curso
pervertido do mundo, e trazer à luz sua verdadeira essência. Primeiro, essa
essência verdadeira está no curso do mundo somente como seu Em si; não é ainda
efetiva. Por isso a virtude nela crê, apenas. Procede a elevar essa fé ao
contemplar, mas sem gozar dos frutos de seu trabalho e sacrifício. Com efeito:
na medida em que a virtude é individualidade, ela é o agir da
luta que trava com o curso do mundo; seu fim e sua verdadeira essência são o
triunfo sobre a efetividade do curso do mundo: a existência assim efetuada do
bem é desse modo a cessação de seu agir, ou da consciência da
individualidade.”
“409 - (...) Assim a consciência reflete
dessa maneira em si, a partir de sua obra efêmera, e afirma seu conceito e sua
certeza como o essente e o permanente em contraste com a
experiência da contingência do agir. Experimenta de fato seu conceito no
qual a efetividade é só um momento: algo que é para a consciência, e não
o em-si-e-para-si. Experimenta a efetividade como momento evanescente, que
portanto só vale para a consciência como ser em geral, cuja
universalidade é uma só e a mesma coisa com o agir.
Esta unidade é a obra verdadeira, e a obra
verdadeira é a Coisa mesma, a qual pura e simplesmente se afirma e é
experimentada como o que permanece, independente da Coisa que é a contingência
do agir individual enquanto tal, das circunstâncias, do meio e da efetividade.
410 - A Coisa mesma só se opõe a esses
momentos enquanto se supõe que devem ser válidos isoladamente, pois ela é
essencialmente sua unidade, como interpenetração da efetividade e da
individualidade. Sendo um agir - e como agir, puro agir em geral - é também,
por isso mesmo, agir deste indivíduo. E sendo esse agir como ainda lhe
pertencendo, em oposição à efetividade, isto é como fim, também é a
passagem dessa determinidade à oposta: e enfim, é uma efetividade que
está presente para a consciência.
A Coisa mesma exprime, pois, a
essencialidade espiritual, em que todos esses momentos estão
suprassumidos como válidos para si; nela, portanto, só valem como universais.
Ali, a certeza de si mesma é para a consciência uma essência objetiva - uma
Coisa, objeto engendrado pela consciência-de-si como seu, mas que
nem por isso deixa de ser objeto livre e autêntico. A coisa da certeza
sensível e da percepção tem agora, para a consciência-de-si, sua significação
unicamente através dela: nisso reside a diferença entre uma coisa e a Coisa.
Aqui se fará o percurso de um movimento correspondente ao da certeza sensível e
da percepção.
411 - Por conseguinte, na Coisa mesma,
enquanto interpenetração que se tornou objetiva da individualidade e da
objetividade mesma, veio a ser para a consciência de si seu verdadeiro conceito
de si, ou chegou à consciência de sua substância. Ao mesmo tempo a consciência
de si, como é aqui, é a consciência de uma substância; consciência que recém
veio a ser; é, portanto, imediata.
Essa é a maneira determinada como a essência
espiritual aqui se faz presente, sem ter ainda completado seu desenvolvimento
de substância verdadeiramente real. A Coisa mesma nessa consciência imediata
da substância possui a forma de essência simples, que como universal
contém em si seus diferentes momentos, aos quais pertence; mas também é de novo
indiferente para com eles, enquanto momentos determinados; é livre para si e
vale com esta Coisa mesma simples e abstrata: vale como a essência.
Os diferentes momentos da determinidade
originária ou da Coisa deste indivíduo, de seu fim, dos meios, do
próprio agir e da efetividade - são para essa consciência momentos singulares
os quais pode deixar de lado e abandonar pela Coisa mesma; mas de outro
lado, todos só têm por essência a Coisa mesma de modo que se encontre em cada
um deles, como universal abstrato, e possa ser seu predicado. Ha
mesma ainda não é o sujeito, pois como sujeito valem aqueles momentos por se
situarem do lado da singularidade em geral, enquanto a Coisa mesma é por
ora apenas o simplesmente Universal. Ela é o gênero que se encontra em
todos esses momentos como em suas espécies, e é também livre em relação
a eles.”
“418 - (...) A Coisa mesma não é somente uma
Coisa oposta ao agir em geral e ao agir singular; nem um agir que se opusesse à
subsistência e que fosse o gênero livre de seus momentos - que constituiriam as
suas espécies. A Coisa mesma é uma essência cujo ser é o agir
do indivíduo singular e de todos os indivíduos e cujo agir é
imediatamente para outros, ou uma Coisa, e que só é Coisa como agir
de todos e de cada um. É a essência que é a essência de todas as essências:
a essência espiritual.
A consciência experimenta que nenhum daqueles
momentos é sujeito; mas que, ao contrário, se dissolvem na Coisa
mesma universal. Os momentos da individualidade, que para essa consciência carente-de-pensamento
valiam sucessivamente como sujeito, se agrupam na individualidade simples, que
sendo esta, é ao mesmo tempo imediatamente universal. A Coisa mesma
perde, assim, a condição de predicado e a determinidade de universal abstrato e
sem-vida; ela é, antes: a substância impregnada pela individualidade; o sujeito,
em que a individualidade está tanto como ela mesma, ou como esta, quanto
como de todos os indivíduos; o universal, que só é um ser como
este agir de todos e de cada um; uma efetividade, porque esta consciência
a sabe como sua efetividade singular e como efetividade de todos.
A pura Coisa mesma é o que acima se
determinava como categoria: o ser que é Eu, ou o Eu que é ser, mas como pensar
que ainda se distingue da consciência-de-si efetiva. Porém os
momentos da consciência-de-si efetiva - enquanto os denominamos conteúdo, fim,
agir e efetividade seus - ou os chamamos sua forma e ser-para- si e ser para
outro - se põem aqui como um só com a própria categoria simples; que é,
portanto, ao mesmo tempo, todo conteúdo.”
“419 - A essência espiritual no seu ser simples
é pura consciência e esta consciência-de-si. A natureza originariamente
determinada do indivíduo perdeu seu significado positivo, de ser em-si
o elemento e o fim de sua atividade: é apenas um momento suprassumido, e o
indivíduo é um Si, como Si universal. Inversamente, a Coisa mesma
formal tem sua implementação na individualidade agente que se diferencia em
si mesma, pois suas diferenças constituem o conteúdo daquele universal.
A categoria é em si, como o universal da pura consciência. E
também para si, pois o Si da consciência é também um momento seu.
A categoria é o ser absoluto, porquanto aquela universalidade é a
simples igualdade-consigo-mesmo do ser.
420 - Assim, o que é objeto para a
consciência tem a significação de ser o verdadeiro. O verdadeiro é e
vale no sentido de ser, e de valer em-si e para si
mesmo: é a Coisa absoluta que já não sofre a oposição entre a
certeza e a verdade, entre o universal e o singular, entre o fim e sua
realidade. Ao contrário; seu ser-aí é a efetividade e o agir da
consciência-de-si; essa Coisa é portanto a substância ética, e sua
consciência, consciência ética.
Seu objeto vale também para ela como o verdadeiro,
porque reúne a consciência-de-si e o ser em uma unidade. Vale como o absoluto
pois a consciência-de-si não pode nem quer mais ultrapassar este objeto,
porque ali está junto a si mesma: não pode, porque ele é todo o seu ser
e todo o seu poder; não quer, porque ele é o Si ou o querer desse Si. É
o objeto real nele mesmo como objeto, por ter nele a diferença da
consciência. Divide-se em "massas" que são as leis determinadas da
essência absoluta. Porém são massas que não ofuscam o conceito, pois nele
permanecem incluídos os momentos do ser e da pura consciência e do Si - uma
unidade que constitui a essência dessas "massas", e que nessa
diferença faz que os momentos não se separem mais um do outro.”
“437 - (...) As leis são. Se indago seu nascimento, e as limito ao ponto de sua origem, já passei além delas: pois então sou eu o universal, e elas, o condicionado e o limitado. Se devem legitimar-se dos olhos de minha inteligência, já pus em movimento seu ser em si, inabalável, e as considero como algo que para mim talvez seja verdadeiro, talvez não seja. Ora, a disposição ética consiste precisamente em ater-se firmemente ao que é justo, e em abster-se de tudo o que possa mover, abalar e desviar o justo.”