Editora:
InterSaberes
ISBN: 978-85-5972-672-5
Opinião: ★★★★☆
Páginas: 360
Sinopse: A
reunião de perspectivas da pedagogia, da psicologia e da filosofia contribui
enormemente para o aprofundamento de discussões científicas que investigam o
desenvolvimento humano e os diferentes mecanismos de aprendizagem. Assim, esta
obra analisa como conhecimentos dessas três áreas podem nos ajudar a solucionar
os desafios que encontramos hoje nos sistemas educacionais, revelando aspectos
fundamentais dos processos de ensino-aprendizagem. Junte-se a nós neste estudo
e dê início a sua própria investigação sobre caminhos que possam levar a
processos educacionais mais eficazes e significativos.
“Portanto, é muito difícil, como apresentado
na epígrafe deste capítulo, “observar a criança sem lhe emprestar alguma coisa
dos nossos sentimentos ou das nossas intenções”1. Entretanto, se
observado com cautela, podemos verificar que, no que diz respeito à atividade
mental, as crianças não se desenvolvem em um único e mesmo plano – elas
apresentam progressos.”
1. Wallon, A evolução psicológica da
criança, 2005, p. 36.
“A psicanálise tornou-se, a partir do
desenvolvimento da práxis freudiana, um método de investigação. A metodologia
psicanalítica caracteriza-se pela investigação e interpretação do que está
oculto, ou seja, daquilo que é “manifesto por meio de ações e palavras ou pelas
produções imaginárias, como os sonhos, os delírios, as associações livres, os
atos falhos”1.
A obra de Freud foi influenciada pelo modelo
cartesiano de ciência, embora ele discordasse dos racionalistas em relação à
razão humana, pois acreditava que o homem é fortemente comandado pelo
inconsciente (conteúdos reprimidos não presentes na consciência pela ação de
censuras internas) e por forças instintivas.
Para Freud2, todo comportamento
humano é sobredeterminado, ou seja, nossos atos (mesmo os que parecem ocorrer
ao acaso) estão relacionados a uma série de causas, das quais frequentemente
não temos consciência. Tais causas, em geral, estão correlacionadas a impulsos
sexuais latentes, os quais se constituem desde a primeira infância.”
1. Bock; Furtado; Teixeira, Psicologia
sócio-histórica, 2002, p. 70.
2. Obras completas de Sigmund Freud, 1974.
“A primeira tópica do aparelho psíquico1
Consciente: Formado
por pensamentos, ideias e percepções acerca da realidade.
Pré-consciente: Sistema formado por conteúdos/lembranças que podem tornar-se
conscientes sem grandes dificuldades pelo sujeito. Funciona como censura,
afastando da consciência determinados conteúdos desprazerosos emanados do
inconsciente.
Inconsciente: Refere-se ao que está latente, é regulado pelo princípio do prazer e é
constituído por desejos em busca de satisfação.
1. Adaptado de Nunes; Silveira, Psicologia
da aprendizagem, 2008, p. 53.
“Freud reformulou continuamente seus conceitos,
chegando a uma segunda teoria do aparelho psíquico, a qual denominou segunda
tópica. Nesse segundo momento, ele apresenta outro patamar de desenvolvimento
da teoria psicanalítica, definindo mais três conceitos fundamentais para a
psicanálise: ego, id, superego.
Freud explica que o primeiro deles, o ego
(eu), corresponde à razão humana, ou seja, está diretamente relacionado à
consciência e ao inconsciente, simultaneamente. Nesse sentido, uma parte
(pequena) do ego é consciente, enquanto a outra é influenciada pelo
inconsciente. Assim, o ego recebe influência do mundo externo e do id.
O ego é o sistema que estabelece o
equilíbrio entre as exigências do id, as exigências da realidade e as “ordens”
do superego. Procura “dar conta” dos interesses da pessoa. É regido pelo
princípio da realidade, que, com o princípio do prazer, rege o funcionamento
psíquico. É um regulador, na medida em que altera o princípio do prazer para
buscar a satisfação considerando as condições objetivas da realidade. Neste
sentido, a busca do prazer pode ser substituída pelo evitamento do desprazer.
As funções básicas do ego são: percepção, memória, sentimentos, pensamento.1
O id (isso) são os impulsos humanos mais
primitivos. É regido pelo princípio do prazer, pelo desejo, sendo impulsionado
pela busca da satisfação. Além disso, o id é uma instância psíquica pouco
acessível ao sujeito, sendo, portanto, inconsciente.
Nas palavras de Bock, Furtado e Teixeira2,
“o id constitui o reservatório da energia psíquica, é onde se
‘localizam’ as pulsões: a de vida e a de morte. As características atribuídas
ao sistema inconsciente, na primeira teoria, são, nesta teoria, atribuídas ao
id. É regido pelo princípio do prazer”3.
O superego (supereu) é a representação da
moral, da lei e da ordem. Funciona, nesse sentido, como instância crítica,
controlando conteúdos provenientes do id, não aceitáveis conscientemente.
Apesar de não ser consciente, advém da introjeção das regras, dos valores e das
normas socialmente impostos pela cultura e pela família às quais pertence o
sujeito. O superego tem a função de buscar o equilíbrio no conflito de forças
entre o id e o ego. “O superego origina-se com o complexo de Édipo, a
partir da internalização das proibições, dos limites e da autoridade. A moral,
os ideais são funções do superego. O conteúdo do superego refere-se a
exigências sociais e culturais”4.
Nessa perspectiva, de acordo com a teoria
freudiana, o superego funciona como uma espécie de “pai internalizado”, um
censo de moral e autoridade, que permite à humanidade manter a vida civilizada,
regida por leis, costumes e regras criadas para manter o id sob controle.
A segunda tópica do aparelho psíquico5
Id: Possui uma
atividade inconsciente, é regido pelo princípio do prazer e impulsionado pela
busca de satisfação. Instância psíquica menos acessível ao sujeito.
Ego: Relacionado à
consciência. Sua existência está conectada ao sistema perceptivo, recebe
influência do mundo externo e das forças provenientes do id. Uma parte do ego é
consciente (uma pequena parte) e outra é movida pela influência do
inconsciente.
Superego: Funciona
como instância crítica, controlando conteúdos provenientes do id, não
aceitáveis no plano da consciência. Emerge do ego, não é consciente e surge em
virtude da introjeção de normas e valores existentes na família e na cultura às
quais o sujeito pertence.
Tenta regular o conflito de forças entre o id e o ego.
As teorias do aparelho psíquico de Freud
revolucionaram os estudos e “chocaram” os estudiosos da psique humana em sua
época. Ainda hoje, esses estudos influenciam sobremaneira a psicologia e a educação
contemporâneas.”
1. Bock; Furtado; Teixeira,Op. cit., 2002,
p. 77, grifo do original.
2. Ib.
3. Ib., grifo do original.
4. Ib., grifo do original.
5. Adaptado de Nunes; Silveira, Op. cit.,
p. 53.
“7.3 O método não diretivo de Rogers
O método não diretivo, ou centrado no
cliente, desenvolvido por Rogers, prescreve uma postura empática e
incondicional por parte do terapeuta e enxerga o cliente como uma pessoa capaz
de compreender a si próprio e ao mundo.
Por conseguinte, esse autor defende a ideia
de que uma pessoa pode “abrir-se para a experiência terapêutica, objetivando
desenvolver uma consciência mais clara de si e do mundo, assim como desenvolver
a autoestima positiva necessária para se relacionar de forma harmônica”1.
É importante ressaltarmos que seu método foi
desenvolvido com base em suas experiências com pessoas emocionalmente
perturbadas.
Sobre o método não diretivo, Schultz e
Schultz2 elucidam:
O nome de sua terapia sugere algo da sua
concepção da personalidade humana. Atribuindo a responsabilidade da mudança à
pessoa ou cliente, e não ao terapeuta, como é o caso na psicanálise ortodoxa,
Rogers supôs que as pessoas podem alterar consciente e racionalmente seus
pensamentos e comportamentos indesejáveis, tornando-os desejáveis. Ele não
acreditava que as pessoas sejam controladas por forças inconscientes ou por
experiências da infância.
Dessa forma, Rogers deposita na própria
pessoa a responsabilidade da cura. Ao contrário da psicanálise freudiana,
segundo a qual o ser humano é fortemente comandado pelo inconsciente (conteúdos
reprimidos não presentes na consciência pela ação de censuras internas) e por
forças instintivas, Rogers não acreditava no poder das forças inconscientes,
mas na perspectiva humanista.
Embora Rogers entendesse que as experiências
infantis e o processo de aprendizagem poderiam ajudar ou prejudicar a formação
e a autotransformação da personalidade de cada sujeito, ele defendia a ideia de
que a personalidade é moldada pelo presente e pela maneira como o percebemos
conscientemente.
Para esse autor, não obstante, o
pré-requisito para o desenvolvimento de uma personalidade saudável é “a estima
positiva incondicional na infância. Durante esse período a mãe deve demonstrar
seu amor e aceitação da criança, pouco importando o comportamento desta última”3.
Nessa perspectiva, a criança que recebe essa
estima positiva da mãe desenvolve uma espécie de autoestima, denominada por
Rogers de autoatualização: “A autoatualização é o nível mais alto de
saúde psicológica, e é alcançado por meio de um processo que Rogers denominou
de funcionamento pleno”4.
Esse é o desenvolvimento pleno (ápice), na
teoria desse estudioso:
Para Rogers, as pessoas que alcançaram seu
pleno funcionamento se caracterizam por uma abertura a toda experiência, uma
tendência a viver plenamente cada momento, a capacidade de serem guiadas pelos
próprios instintos, e não pela razão ou pelas opiniões dos outros, um sentido
de liberdade de pensamento e de ação e um alto grau de criatividade.5
A abordagem psicológica de Rogers suscitou
críticas, mas também pesquisas colaborativas, e foi amplamente utilizada como
psicoterapia clínica. “Sua obra é vista como uma importante contribuição da
tendência de humanização da psicologia”6.”
1. Carpigiani, Psicologia, 2000, p. 65-6.)
2. História da psicologia moderna, 1992, 5ª ed.,
p. 400.
3. Ib., p. 398.
4 Ib.
5 Ib.
6. Ib., 13ª ed, p. 398-399.
“Em sua obra Liberdade para aprender1,
Carl Rogers aponta os princípios de aprendizagem:
1. Os seres humanos têm naturalmente potencialidade
para aprender.
2. A aprendizagem significativa verifica-se
quando o estudante percebe que a matéria a estudar se relaciona com os seus
próprios objetivos.
3. A aprendizagem que envolve mudança na
organização de cada um na percepção de si mesmo é ameaçadora e tende a suscitar
reações.
4. As aprendizagens que ameaçam o próprio ser
são mais facilmente percebidas e assimiladas quando as ameaças externas se
reduzem a um mínimo.
5. Quando é fraca a ameaça ao “eu”, pode-se
perceber a experiência sob formas diversas, e a aprendizagem pode ser levada a
efeito. É por meio de atos que se adquire aprendizagem mais significativa.
6. A aprendizagem é facilitada quando o aluno
participa responsavelmente do seu processo.
7. A aprendizagem autoiniciada, que envolve
toda a pessoa do aprendiz – seus sentimentos tanto quanto sua inteligência – é
a mais durável e impregnante.
8. A independência, a criatividade e a
autoconfiança são facilitadas quando a autocrítica e a autoapreciação são
básicas e a avaliação feita por outros tem importância secundária.
9. A aprendizagem socialmente mais útil, no
mundo moderno, é do próprio processo de aprendizagem, uma contínua abertura à
experiência e à incorporação, dentro de si mesmo, do processo de mudança.
Dessa forma, o estudante precisa ser
compreendido pelo professor como sujeito da sua própria aprendizagem. Nesse
sentido, destacamos que cabe ao professor incentivar e ajudar o aprendiz a
desenvolver a autonomia, o autoconhecimento e a autopercepção, articulando
saberes por meio de aulas interativas de modo a desencadear as aprendizagens.
Criam-se, desse modo, condições para as manifestações individuais e coletivas
dos alunos, provocando movimentos metacognitivos por meio dos quais o estudante
se sente capaz de refletir, intervir, perguntar e discordar. Também ressaltamos
que, no planejamento de atividades, os educandos podem ser incentivados a se
posicionar e decidir em conjunto com o professor os melhores caminhos, os
referenciais, as datas de entrega e os critérios de avaliação.
Assim, com certeza, o professor auxilia os
alunos, e muito, em um processo de ensino-aprendizagem mais humano. Além disso,
é evidente que hoje se estabelece, para os docentes, uma relação entre a
educação que se faz e a sociedade que se pretende formar, o que a sociedade
precisa e no que a educação pode colaborar com essa sociedade. Está claro,
pois, que os docentes são capazes de contribuir para que a educação seja mais
humanizadora, garantindo aos seres humanos a possibilidade de viver em um mundo
melhor. Por fim, acreditamos que, neste século XXI, é preciso vencer as
resistências e abrir perspectivas e novos paradigmas para a educação humanista.”
1. Citado por Gadotti, História das ideias
pedagógicas, 2003, p. 183.
“Na visão desses autores, que trabalham na
perspectiva sócio-histórica (como Leontiev, Bock e Gonçalves, González Rey
Aguiar e Ozella), o sujeito e o objeto são sociais, históricos e ativos. Eles
se constituem e são constituídos numa relação dialética. Assim, a interação
face a face entre indivíduos particulares desempenha um papel fundamental na
construção do ser humano: é por meio da relação interpessoal concreta com
outros homens que o indivíduo chega a interiorizar as formas culturalmente
estabelecidas de funcionamento psicológico.
Sendo assim, todos nós, ao nascermos, já
fazemos parte de uma cultura que é a forma de organização social de um grupo,
com valores, crenças e costumes específicos. O que somos como seres humanos é o
resultado da interação dialeticamente estabelecida entre os processos intrapessoais
(eu) e interpessoais (outro) que se constituem e se transformam numa
determinada cultura, num contexto social e histórico.
O processo pelo qual o indivíduo internaliza
a matéria-prima fornecida pela cultura não é, pois, um processo de absorção
passiva, mas de transformação e de síntese na constituição de sua
subjetividade.
De acordo com Bock e Gonçalves1:
A partir da dialética
subjetividade-objetividade pode-se falar em dimensão subjetiva da realidade, na
medida em que se entende que a subjetividade é individual, mas constituída
socialmente, a partir de um processo objetivo, com conteúdo histórico. Por
outro lado, a realidade social é construída historicamente, em um processo que
se dá entre o plano subjetivo e o objetivo. A base material agrega subjetividade,
a partir da ação do sujeito sobre ela, aí está sua historicidade. Por isso, não
é possível falar-se da realidade sem considerar o sujeito que a constitui e ao
mesmo tempo é constituído por ela.
Assim, a dimensão subjetiva é constituída na
inter-relação dialética com a dimensão objetiva e tem caráter histórico. Isso
quer dizer que as nossas experiências individuais e subjetivas só são possíveis
a partir das nossas relações intersubjetivas, materiais e históricas. Sobre
isso, Bock e Gonçalves2 explicitam que
a subjetividade não está dada, nem para cada
indivíduo, nem enquanto processos ou estruturas universais da humanidade, mas
configura-se como algo que se constitui nas relações sociais e históricas; é
processo que decorre de situações concretas que incluem, necessariamente, a
atividade, objetiva e subjetiva, do indivíduo. O sujeito é ativo, atividade
decorrente de sua ação, de seu pensamento, de sua capacidade de registrar
cognitiva e afetivamente todas as suas experiências; da sua capacidade de
vivenciar. Suas ações e experiências individuais subjetivas só são possíveis a
partir das relações sociais e do espaço da intersubjetividade, pois falamos de
um sujeito que é social e histórico. A subjetividade, portanto, não é natural.
Dessa forma, podemos afirmar que a dimensão
subjetiva não é descolada da realidade objetiva, mas sim, que ela é parte dessa
realidade, criada pelo homem social.
Sobre isso Bock3 esclarece:
Falar da subjetividade humana é falar da
objetividade em que vivem os homens. A compreensão do “mundo interno” exige a
compreensão do “mundo externo”, pois são dois aspectos de um mesmo movimento,
de um processo no qual o homem atua e constrói/modifica o mundo e este, por sua
vez, propicia os elementos para a constituição psicológica do homem.
Importante ressaltarmos, neste contexto, que
o homem contém o social, mas não se reduz a ele, não se expressa uma relação de
correspondência biunívoca entre ele e a sociedade. Essa relação é uma unidade
contraditória, onde um contém o outro sem ser igual ao outro. Em outras
palavras, o indivíduo “mundo interno” (subjetivo) contém o social “mundo
externo” (objetivo), mas não é igual a ele e, ao mesmo tempo, constitui e é
constituído por ele.
Nesse sentido, Bock e Gonçalves4 acrescentam
que
a partir da dialética
subjetividade-objetividade pode-se falar em dimensão subjetiva da realidade, na
medida em que se entende que a subjetividade é individual, mas constituída
socialmente, a partir de um processo objetivo, com conteúdo histórico. Por
outro lado, a realidade social é construída historicamente, em um processo que
se dá entre o plano subjetivo e o objetivo. A base material agrega
subjetividade a partir da ação do sujeito sobre ela, aí está sua historicidade.
Por isso, não é possível falar-se da realidade sem considerar o sujeito que a
constitui e ao mesmo tempo é constituído por ela.
Buscando uma síntese, podemos afirmar que o
homem é originariamente constituído por inter-relações dialéticas com a
natureza e com os outros homens e é por meio dessas inter-relações
psicossociais que ele transforma a si e aos grupos com os quais se relaciona.
Por conseguinte, o ser humano, ao atuar e transformar o contexto social, vai
constituindo também significações e vai construindo, assim, um mundo material e
simbólico que forma o que costumamos chamar de realidade, sem que se
precise ou se deva diferenciar como realidade externa e interna.
Dessa forma, o indivíduo age sobre o mundo,
relaciona-se, realiza objetivamente o que elaborou subjetivamente. “Não há uma
sociedade externa e independente dos indivíduos; não há indivíduos a priori ou
independentes da sociedade […]. Essa compreensão está posta na delimitação do
objeto da psicologia social como sendo a dimensão subjetiva dos fenômenos
sociais”5.
Ainda de acordo com Bock e Gonçalves6,
“a dimensão subjetiva é uma configuração dos sujeitos a partir de suas
experiências no mundo social”. Para as autoras, “é a dimensão dos registros
simbólicos e emocionais que o sujeito vai construindo no decorrer de suas
vivências; é o mundo psicológico propriamente dito”.
Ainda em consonância com as estudiosas
anteriormente citadas:
a noção de subjetividade tem, de acordo com a
concepção sócio-histórica, um conteúdo histórico que deve ser considerado. O
conteúdo das experiências subjetivas expressa os lugares e posições
contraditórias a partir das quais o sujeito vivencia a realidade e utiliza suas
capacidades. A subjetividade, então, tem contornos compatíveis com a realidade
histórica que a engendrou; por isso, devemos falar desde sempre em
subjetividades para designar os aspectos psicológicos dos sujeitos, salientando
o caráter processual e complexo desses aspectos.7 (...)
De modo que, ao se pensar nas relações que se
constroem social e historicamente, é possível afirmar que
no conjunto das relações sociais, mediadas
pela linguagem, o indivíduo vai desenvolvendo sua consciência. Com o
desenvolvimento da consciência, o homem sabe seu mundo, sabe-se no mundo,
antecede as coisas do seu mundo, partilha-as com os outros, troca, constrói e
reproduz significados. Quando atua sobre o mundo, relacionando-se, apropria-se
da cultura e adquire linguagem; apropria-se dos significados e constrói um
sentido pessoal para suas vivências. Tem, assim, todas as condições para
atuar com os outros, criar cultura e elaborar significados. O homem se faz
homem ao mesmo tempo em que constrói seu mundo.8”
1. A dimensão subjetiva da realidade, 2009,
p. 142.
2. Ib.
3. Psicologia sócio-histórica, 2007,
p. 22.
4. Op. cit., p. 142.
5. Ib., p. 144.
6. Subjetividade, 2005, p. 123.
7 Ib., p. 115.
8. Bock, As aventuras do Barão de
Munchausen na psicologia, 1999, p. 32-33, grifo nosso.
“Não fomos educados para olhar pensando o
mundo, a realidade, nós mesmos. Nosso olhar cristalizado nos estereótipos
produziu em nós paralisia, fatalismo, cegueira. Para romper esse modelo, a
observação é a ferramenta básica neste aprendizado da construção do olhar
sensível e pensante. Olhar que envolve atenção e presença. Atenção que envolve
sintonia consigo mesmo e com o grupo. Concentração do olhar que inclui escuta
de silêncios e ruídos na comunicação. O ver e o escutar fazem parte do processo
da construção desse olhar. Em geral, não ouvimos o que o outro fala; mas sim o
que gostaríamos de ouvir. O mesmo acontece em relação ao nosso olhar
estereotipado, querendo ver só o que nos agrada, o que sabemos, também
reproduzindo um olhar de monólogo. Ver e ouvir demandam implicação, entrega ao
outro. A ação de olhar e escutar é um sair de si para ver o outro e a realidade
segundo seus próprios pontos de vista, segundo sua história.” (Madalena Freire)
“O outro já foi suficientemente
massacrado. Ignorado. Silenciado. Assimilado. Industrializado. Globalizado.
Cibernetizado. Protegido. Envolto. Excluído. Expulso. Incluído. Integrado. E
novamente assassinado. Violentado. Obscurecido. Branqueado. Anormalizado.
Excessivamente normalizado. E voltou a estar fora e a estar dentro. A viver em
uma porta giratória. O outro já foi observado e nomeado o bastante como para
que possamos ser tão impunes ao mencioná-lo e observá-lo novamente. O outro já
foi medido demais como para que tornemos a calibrá-lo em um laboratório desapaixonado e sepulcral.1 (...)
É o outro que revela, segundo o autor, que
não seríamos nada sem ele:
O outro da educação foi sempre um outro que
devia ser anulado, apagado. Mas as atuais reformas pedagógicas parecem não
suportar o abandono, a distância, o descontrole. E se dirigem à captura maciça
do outro para que a escola fique ainda mais satisfeita com a sua missão de
possuir tudo dentro de seu próprio ventre.2
Quando o autor fala no outro, refere-se às
pessoas com algum tipo de deficiência, as pessoas com algum transtorno, as
pessoas debilitadas por uma doença, as pessoas com alguma dificuldade no
processo de escolarização, as pessoas marginalizadas socialmente, as pessoas
que fazem parte do que se denomina diversidade e que, hoje, estão sobre a
“proteção” de determinadas políticas da diferença. Estão dentro dos muros da
escola, mas não necessariamente recebem “atenção à diversidade”.”
1. Skliar, A educação que se pergunta
pelos outro, 2003, p. 290.
2. Ib., p. 27.
Um comentário:
Este foi um dos livros em que fiquei na dúvida sobre qual seria a nota (entre bom e muito bom). Como pode ser visto, acabei optando pela nota mais generosa. De qualquer modo, o possível “bom” não seria por ser mal escrito (é um livro correto e justo), mas sim por ser limitado pelo fato de ser uma obra compiladora e não um formuladora (como todos, aliás, da editora InterSaberes que pude ler).
Devo destacar também que alguns autores, como Piaget, Wallon e, especialmente, Vigotski, poderiam ter sido mais citados. No presente caso, foi difícil selecionar um ou outro trecho deles, dando uma explicação incompleta e parcial do que efetivamente representam.
Postar um comentário