terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Pra Ser sincero: 123 Variações Sobre Um Mesmo Tema – Humberto Gessinger

Editora: Belas Letras
ISBN: 9788560174454
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 304
Sinopse: Em 11 de janeiro de 1985, mesmo dia da abertura da primeira edição do Rock in Rio, Humberto Gessinger subia ao palco do auditório da Faculdade de Arquitetura da UFRGS de cabelo new wave e bombacha, para o primeiro show de uma banda que tinha nascido para durar uma noite só. Era para ter se chamado Frumelo & Os 7 Belos, mas ninguém gostou, então os integrantes da banda resolveram fazer uma brincadeira com os estudantes de Engenharia e os surfistas que frequentavam o bar da universidade, que estava a pelo menos 100 quilômetros do mar. Engenheiros do Hawaii. Vinte e cinco anos depois dessa estreia, Humberto Gessinger – que acompanhou todas as formações desde o primeiro show – lança neste livro seu olhar sobre a trajetória do grupo, sobre cada uma das composições e revela curiosidades e bastidores das gravações. Com fotografias inéditas, informações sobre cada um dos discos, letras comentadas e um diário de 1984 a 2009, Pra Ser Sincero é um livro sobre uma banda que era para ter durado uma noite só, mas que acabou escrevendo um capítulo da história do rock brasileiro, mesmo estando longe demais das capitais.



“Desde sempre escrevi, com a pior caligrafia da turma, letras de músicas que não existiam. O violão foi ficando para trás, acumulando poeira. Quando eu tinha doze anos, meu pai adoeceu. Faleceu quando eu tinha catorze. Tudo ficou em stand-by, nesse período, lá em casa. Acumulando poeira. Muita coisa ficou em stand-by para sempre. Não deu tempo pra ele me ensinar a fazer a barba.
Enquanto meus colegas brigavam com seus pais na saudável busca de identidade, à noite, eu colocava os chinelos do meu pai para andar no escuro da casa. Fisicamente não nos parecíamos, mas o som dos chinelos caminhando era igual. Matava um pouco da saudade.”


“Esse primeiro show parece ter ido bem. Pintaram convites pra apresentações em outras faculdades e alguns bares. A banda que montamos pra durar uma única noite estava virando uma banda pra durar algumas semanas. Já como um trio, tocávamos onde dava pra tocar. Onde não dava, também tocávamos.
O repertório ia mudando rapidamente. As colagens performáticas foram dando lugar a um material mais pessoal, saído do velho caderno. Dos bares, começamos a andar pelo interior. Era algo que as outras bandas menosprezavam. Ficavam umas tocando para as outras, no mesmo bar. Dizem as más línguas que são necessários 100 guitarristas gaúchos para gravar um solo (um para tocar e 99 para dizer que fariam melhor). Não é bem assim, mas é quase.”


Toda Forma de Poder, primeira música do nosso primeiro disco, cometeu quatro pecados capitais: colocou Fidel e Pinochet na mesma frase, tinha participação de um ícone da MPG, estourou no Brasil inteiro e entrou numa novela (nessa ordem).”


“As mudanças de formação se tornaram frequentes na história dos Engenheiros do Hawaii. Não que eu gostasse. Não que eu evitasse. Num mundo ideal, as pessoas ficariam juntas para sempre. Mas, num mundo ideal, talvez não se precise de música.”


“Sempre achei que tua maior virtude e teu maior defeito são irmãos siameses.”


“O mundo pop é muito novidadeiro. A onda é vir, a cada ano, com outra onda. Como se novidade fosse um valor em si. Sempre achei empobrecedor pensar assim. Prefiro artistas que abrem poucas portas e se jogam na sala escura a artistas que abrem todas as portas só pra dar uma espiadinha.”


“Sempre desconfiei dos atalhos. Não gosto de seguir literalmente cartilhas. As indústrias que crescem na periferia da produção artística têm os mesmos vícios de qualquer indústria. Vivem criando seus presets. Camisas pretas e guitarras pontudas para o heavy metal. Meninas tocando baixo para os alternativos. Guitarras semiacúsitcas e terninhos para os retrôs. Bonés dos Yankees e Adidas pros rappers. Se vacilar, até o tipo de droga, ou a não-utilização de drogas, já vem no cardápio do estilo. Quando eu acabar de escrever essa frase, os modelos podem ter mudado, mas a existência de um modelo certamente persistirá.”


“Uma coletânea de videoclips dos Engenheiros do Hawaii foi lançada nesse ano (2006). Não tenho a menor ideia do que representam, se representam algo. No início, eram feitos por uma grande rede de TV, para passar no seu programa de domingo. Depois, viraram simples peças promocionais. Não sei se deixaram de ser, se agora são obras de arte em si. Nunca vi muito nexo no formato. Eu paro de zapear, na hora, para ver qualquer músico tocar ao vivo. Mas colar outras imagens numa música, acho que só a empobrece.
Convergência? Divirjo. Obra de arte total me parece uma contradição. Me interessa mais o que é parcial. Não quero ser uma colcha de retalhos. Quero ser só um retalho na colcha. A soma pode ser menor do que as partes. Não se trata de empilhar sentidos (Cinco? Bingo!). Se a pomba desenhada por Picasso voasse, seria um fracasso.”


“Um dos grenais de que me lembro com mais carinho foi o de 1977. Ganhamos por 1 a 0, quebrando uma série de 123 anos correndo atrás. Meu pai estava internado num hospital perto do Estádio Olímpico. No fim do jogo, assisti, pela janela do quarto, à caravana das bandeiras tricolores. Carros e torcedores silenciosos por respeito. Sensação boa de pertencimento. Consolo de não estar sozinho. A vida seria uma bobagem sem essas bobagens.”


“Ouço vozes, tenho pavor de cobras e às vezes tenho medo de começar a flutuar e não conseguir descer. Fico atento às árvores a aos fios elétricos para me agarrar caso aconteça.”


“Uma possível medida de felicidade seria o número de relações não capitalistas que um cara tem... tem gente que até com a mãe tem uma relação de custo/benefício.”


“Não sei me expressar bem, tenho aquela ética silenciosa do cowboy numa cidade estranha... não faço juras de amor.”


“A tentativa de autoconhecimento é o que me fez cair na estrada, a busca de um espelho que não esteja embaçado pela minha própria respiração.”


“Destino? Essa é a questão, tava escrito ou nós é que escrevemos? Acho que nós escrevemos com a caneta que nos foi dada e suas limitações... de fato, é lápis e não caneta... qualquer coisa, o tempo apaga.”


“De cada 10 palavras, sete se perdem.”


Concreto e Asfalto, para mim, é uma oração. Gostaria de cantar para Jesus Cristo... ele ia achar uma merda e eu ia entender.”

3 comentários:

Dom Quixote disse...

esse livro é mto bom!Humberto Gessinger realmente é um gênio,filósofo e poeta...e que mtas vezes não recebe o reconhecimento merecido.
Grande HUMBERTO!!!

Anônimo disse...

Chorei, será o primeiro livro da minha lista a ser comprado. O Humberto é muito mestre. E Concreto e Asfalto é uma das que mais gosto.

Anônimo disse...

com certeza vai ser o proximo livro a ser comprado por minha pessoas. sou muito fã do Humberto e de tudo que ele escreve,sendo musica ou livros
obg pelo site!