Editora: Crítica
ISBN: 978-85-4220-940-2
Tradução: Luis
Reyes Gil
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 576
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Sinopse: Ver Parte
I
“Conquista
e consequências
Os
“53 anos” de Políbio cobriam o final do século III a.C. e o início do II a.C.,
mas foi cerca de sessenta anos antes que os romanos enfrentaram pela primeira
vez um inimigo de ultramar. Tratava-se de Pirro [Pyrrhus], governador de um
reino no norte da Grécia, que em 280 a.C. navegou até a Itália para dar apoio à
cidade de Taranto contra os romanos. Seu chiste autodepreciativo — que suas
vitórias contra Roma haviam lhe custado tantos homens que ele não teria como
arcar com outra vitória — está por trás da famosa expressão moderna “vitória de
Pirro”, indicando um tipo de vitória com um preço tão alto que equivale a uma
derrota. A expressão é até generosa com o lado romano da história, pois Pirro
era um oponente à altura. Supõe-se que Aníbal o teria
avaliado como o maior líder militar depois de Alexandre, o Grande, e — segundo
várias anedotas afetuosas — era uma espécie de showman encantador. Foi o
primeiro a realizar a façanha de trazer elefantes para a Itália, e dizem que em
certa ocasião tentou, sem sucesso, desconcertar um romano visitante ao fazer
sair de trás de uma cortina uma de suas feras escondida. É também o primeiro personagem
da história de Roma a quem podemos atribuir um rosto de maneira plausível.
Da invasão de Pirro até 146 a.C. — quando os exércitos romanos
destruíram não só Cartago, no final do que ficou conhecido como Terceira Guerra
Púnica (do latim punicus, ou “cartaginês”), mas também, quase
simultaneamente, a rica cidade grega de Corinto —, houve uma guerra mais ou
menos continuada, envolvendo Roma e seus inimigos, na península Itálica e
além-mar. Um estudioso antigo apontou o ano “em que Caio
Atílio [Gaius Atilius] e Tito Mânlio [Titus Manlius] foram cônsules” (235 a.C.)
como o único momento desse período em que não houve hostilidades.
Os
conflitos mais celebrados, e mais devastadores, foram as duas primeiras Guerras
Púnicas, contra Cartago. A primeira durou mais de vinte anos (de 264 a 241
a.C.), a maior parte dela travada na Sicília e nos mares em volta, exceto a
desastrosa incursão romana no território cartaginês, no norte da África. O
conflito terminou com a Sicília sob controle romano — e após uns poucos anos a
Sardenha e a Córsega também, embora o epitáfio do filho de Barbato exagere um
pouco suas realizações afirmando que ele “capturou” a ilha. Num achado recente
extraordinário, alguns dos detritos da última batalha naval entre romanos e
cartagineses foram dragados do fundo do Mediterrâneo. Próximo ao litoral da
Sicília, onde as duas frotas supostamente se enfrentaram, arqueólogos que
exploravam a área desde 2004 recuperaram vários esporões de bronze de navios
afundados (a maioria romanos, mas também um de navio cartaginês), pelo menos
oito elmos de bronze, um deles carregando um vestígio de algum escrito púnico,
provavelmente riscado por seu dono afogado, e ânforas de cerâmica que
possivelmente carregavam os suprimentos dos navios (ver lâmina 8).
A
Segunda Guerra Púnica se deu em uma escala geográfica muito diferente. Travada
entre 218 a.C. e 201 a.C., é hoje mais lembrada pelo heroico fracasso de
Aníbal, que cruzou os Alpes com seus elefantes (mais um golpe de propaganda do
que um recurso militar efetivo) e infligiu pesadas baixas aos romanos na
Itália, em especial no confronto mais famoso, a Batalha de Canas [Cannae], no
sul, em 216 a.C. Somente depois de mais de uma década de confrontos, o governo
de Aníbal em Cartago — cada vez mais inquieto em relação ao desfecho da
aventura e agora tendo que enfrentar o exército invasor de Cipião Africano —
chamou-o de volta para casa. Mas não se tratou de um mero confronto entre a
Itália e o norte da África. Havia começado com uma batalha entre romanos e
cartagineses na Espanha, o que fez os romanos lutarem ali pela maior parte do
século II a.C. E a possibilidade de Aníbal receber apoio da Macedônia levou os romanos a uma série de guerras no norte da Grécia,
que terminaram com a derrota do rei macedônio Perseu em 168 a.C. por Emílio
Paulo [Aemilius Paullus], pai natural de Cipião Emiliano, e logo depois com o
controle de toda a região que chamamos de Grécia continental.
Além
disso, os romanos estavam também envolvidos em grandes conflitos com os
gauleses no extremo norte da Itália na década de 220 a.C. E fizeram também
intervenções periódicas cruzando o Adriático, em parte para lidar com aqueles
que chamavam de piratas (um termo genérico para “inimigos em navios”), que eram
apoiados pelas tribos e reinos do litoral oposto — pelo menos era o que se
dizia. E em 190 a.C., sob o comando de Cipião Asiático, impuseram derrota
decisiva a Antíoco, “o Grande”, da Síria. Este não só estava ocupado em seguir
o modelo de Alexandre, o Grande, e estender sua base de poder, mas também havia
abrigado Aníbal, agora no exílio de Cartago, que segundo se dizia oferecia ao
rei aulas sobre como enfrentar os romanos.
As
campanhas militares eram um aspecto definidor da vida romana, e os escritores
organizaram a história desse período, como acabei de fazer também, em torno da
sucessão de guerras, dando-lhes títulos caligráficos, muitos deles mantidos até
hoje. Quando Salústio chamou seu ensaio sobre o complô de Catilina de Guerra
contra Catilina, ou Bellum Catilinae, estava refletindo, e talvez
sutilmente parodiando, a tradição romana de encarar a guerra como o
princípio estruturante da história. Era uma tradição bem antiga. Há um
trecho sobrevivente do poema épico de Ênio sobre a história de Roma que se
refere explicitamente à “Segunda Guerra Púnica”, na qual ele lutou como aliado
romano; foi escrito antes de a terceira ter acontecido.
Em
termos práticos, os romanos direcionavam enormes recursos para a guerra e,
mesmo como vencedores, pagaram um preço imenso em vidas humanas. Ao longo desse
período, algo em torno de 10% a 25% da população adulta masculina havia servido
em legiões todos os anos, uma proporção maior do que em qualquer outro Estado
pré-industrial e, na estimativa mais alta, comparável à taxa de convocação da
Primeira Guerra Mundial. Em Canas, combateram duas vezes
mais legiões do que em Sentino oitenta anos antes — o que é uma boa indicação
do crescente porte desses conflitos e da logística cada vez mais complexa. Um
exército do porte daquele que os romanos e seus aliados posicionaram em Canas
exigiria, por exemplo, cerca de cem toneladas só de trigo, por dia. As
tratativas com comunidades locais que isso implicava, a organização de centenas
de animais, que por sua vez avolumavam as exigências ao consumirem
necessariamente parte do que carregavam, e as redes de coleta e distribuição,
tudo isso teria sido inconcebível no início daquele século.
É
mais difícil estipular uma cifra para as baixas: não havia uma contagem
sistemática das mortes num campo de batalha naquela época; e todos os números
dos textos antigos têm que ser tratados com reservas, vitimados por exageros,
equívocos e, ao longo dos anos, por alguns terríveis erros de cópia por parte
de monges medievais. Mesmo assim, o total das cifras de baixas romanas que
Lívio fornece para todas as batalhas que ele registra nos primeiros trinta anos
do século II a.C. — ou seja, sem incluir as grandes perdas enfrentadas contra
Aníbal — chega a pouco mais de 55 mil mortes. É uma cifra extremamente baixa.
Havia provavelmente uma tendência patriótica de reduzir o número das perdas
romanas; não fica claro se os aliados eram somados aos cidadãos romanos nessa
conta; algumas batalhas e escaramuças podem não ter sido incluídas na lista de
Lívio; e muitos morreram subsequentemente devido a ferimentos (na maioria das
circunstâncias, as armas antigas eram muito melhores para ferir do que para
matar; a morte sobrevinha mais tarde, por infecção). Mas isso dá uma indicação
do custo humano dessa atividade bélica somente no lado romano. O preço pago
pelos derrotados é ainda mais difícil de estimar, mas presume-se que tenha sido
bem mais alto.
É
necessário, no entanto, ver além dessa carnificina, por mais terrível que tenha
sido, para examinar melhor a realidade e a organização do combate e investigar
a política doméstica que sustentou a expansão romana, assim como as ambições
romanas e a geopolítica mais ampla do antigo Mediterrâneo que podem tê-la
incentivado. Políbio é o guia mais importante, mas há outras evidências
contemporâneas eloquentes — com frequência, documentos inscritos em pedra — que tornam possível rastrear algumas interações
entre os romanos e o mundo exterior. Ainda sobrevivem relatos que captam em
primeira mão as experiências desconcertantes vividas em Roma por enviados das
pequenas cidades gregas; e também podemos ler os textos de detalhados tratados
entre os romanos e Estados estrangeiros. O fragmento mais antigo, de 212 a.C.,
é parte de um tratado entre Roma e um grupo de cidades gregas, e estabelece
regras precisas sobre como qualquer saque de guerra deverá ser dividido:
basicamente, cidades e casas aos gregos, bens móveis aos romanos.
Também
houve consequências importantes para a própria Roma do seu sucesso militar
ultramarino. A revolução literária foi apenas parte disso. Em meados do século
II a.C., os lucros da atividade bélica haviam tornado o povo romano de longe o
mais rico entre todos em seu mundo conhecido. Milhares e milhares de cativos
viraram mão de obra escrava que trabalhava nos campos romanos, em suas minas e
fábricas, explorando recursos em uma escala muito mais intensiva do que já
ocorrera antes e alimentando a produção romana e o crescimento de sua economia.
Lingotes de ouro e prata eram transportados em carrinhos de mão, trazidos (ou
roubados) das ricas cidades e reinos do Oriente, despejados no bem guardado
porão do templo de Saturno no Fórum, que funcionava como o “tesouro” do Estado.
E as sobras eram suficientes para encher os bolsos dos soldados, de um general
ao mais reles recruta.
Os
romanos tinham muito o que celebrar. Parte da riqueza foi para deleites
urbanos, das novas instalações do porto e amplos armazéns no Tibre a novos
templos que se enfileiravam pelas ruas, agradecendo o auxílio dos deuses em
assegurar as vitórias que haviam gerado toda aquela riqueza. E é fácil imaginar
o prazer generalizado quando em 167 a.C. Roma se tornou um Estado livre de
impostos: o tesouro estava tão abarrotado — graças, particularmente, aos
espólios da recente vitória sobre a Macedônia — que a taxação direta dos
cidadãos romanos foi suspensa, exceto em emergências, embora eles continuassem
sujeitos a uma série de outras cobranças, como tributos alfandegários ou uma
taxa especial sobre a libertação de escravos.
Essas mudanças, porém, também foram
desestabilizadoras. O problema não se restringia a alguns moralistas romanos
mal-humorados, preocupados com os perigosos efeitos de toda aquela riqueza e
“luxo” (nas palavras deles). A expansão do poder romano suscitou grandes
debates e paradoxos sobre o lugar de Roma no mundo, a respeito do que podia ser
considerado “romano” quando uma área enorme do Mediterrâneo estava sob controle
de Roma e onde se poderia colocar agora o limite entre barbárie e civilização,
e de que lado dessa divisão estaria Roma. Quando, por exemplo, no final do
século III a.C. as autoridades romanas deram as boas-vindas à deusa Grande Mãe
dos planaltos da atual Turquia e solenemente instalaram-na num templo no
Palatino, com tudo o que tinha direito, incluindo seu séquito de sacerdotes de
longos cabelos, autocastrados e autoflagelantes — o quanto isso tinha de
romano?”
“Políbio dissecou a organização interna de Roma — que, insistia, era o sustentáculo de seu sucesso externo — de
uma posição privilegiada, que combinava um par de décadas de experiências em primeira
mão com toda a sofisticação da teoria política grega na qual havia sido
treinado em casa. Sua obra é, com efeito, uma das mais antigas tentativas que
sobreviveram de uma antropologia política comparativa.
Não
surpreende, portanto, que o seu relato seja uma maravilhosa combinação de aguda
observação, assombro e desesperadas tentativas ocasionais de teorizar a
política romana em seus próprios termos. Ele investigou com atenção o ambiente
à sua volta e seus novos amigos romanos. Identificou, por exemplo, a
importância da religião, ou do “temor dos deuses”, no controle do comportamento
romano, e ficou impressionado com a sistemática eficiência da organização
romana; daí a sua importante — mas hoje frequentemente desconsiderada —
discussão sobre os arranjos militares, com suas regras autodidáticas sobre como
dispor um acampamento do Exército, onde deveria ser colocada a tenda do cônsul,
como planejar um comboio de bagagem para os legionários, e o cruel sistema de
disciplina. Era também perspicaz o suficiente para enxergar, sob a superfície
dos vários costumes romanos e de seus passatempos favoritos, seu sentido social
subjacente. Todas aquelas histórias sobre a coragem, o heroísmo e o
autossacrifício romanos que ele deve ter ouvido — contadas e recontadas em
volta de fogueiras de acampamentos militares ou em mesas de jantar — não eram
simples entretenimento, concluiu. Tinham a função de incentivar os jovens a
imitarem os feitos nobres de seus ancestrais; eram um aspecto do espírito de
emulação, ambição e competição que ele viu percorrer a elite da sociedade
romana.
Outro
aspecto disso — e um que se abre para um estudo de caso mais extenso, apesar de
um pouco mórbido — podia ser encontrado nos funerais de “homens ilustres”.
Novamente, Políbio deve ter participado de um número suficiente para poder
extrair seu sentido mais profundo. O corpo, explica ele, era carregado até o
Fórum e colocado sobre a rostra, normalmente apoiado de algum modo para
ficar na posição vertical, visível para uma grande plateia. Na procissão que se
seguia, os membros da família usavam máscaras feitas à semelhança dos ancestrais do falecido e vestiam roupas adequadas aos
cargos que cada um deles tivesse ocupado (togas com bainha roxa, e assim por
diante), como se estivessem todos presentes, “vivos e respirando”. O discurso
no funeral, pronunciado por um membro da família, começava com o relato das
realizações do cadáver exposto na rostra, mas depois prosseguia com as
carreiras de todos os outros personagens, que nessa hora estavam sentados em
cadeiras de marfim, ou pelo menos revestidas de marfim, enfileiradas perto do
cadáver. “O mais importante resultado disso”, conclui Políbio, “é que a geração
mais jovem se inspira a suportar todo o sofrimento em nome do bem comum, na
esperança de alcançar a glória que pertence aos valentes.”
Essa
talvez seja uma visão muito cor-de-rosa do lado competitivo da cultura romana.
A competição desenfreada acabou sendo mais detrutiva do que construtiva para a
República. Mesmo antes, vale supor que para cada jovem romano inspirado a ficar
à altura das realizações de seus ancestrais, havia outro oprimido pelo peso da
tradição e pelas expectativas alimentadas a seu respeito — como Políbio poderia
ter compreendido se tivesse escolhido refletir sobre todas as histórias da
cultura romana que falavam de filhos que mataram seus pais. Mas essa é uma
visão muito bem condensada em outro epitáfio no túmulo dos Cipiões, que é
tentador achar que Políbio possa ter visto: “Tive descendentes. Procurei
igualar os feitos de meu pai. Obtive elogios de meus ancestrais, que portanto
ficaram felizes por eu ter nascido deles. Minha carreira enobreceu a linhagem
da minha família”.
No
cerne da discussão de Políbio, porém, residia uma questão maior. Como seria
possível caracterizar o sistema político romano como um todo? Como funcionava?
Nunca houve uma constituição romana escrita, mas Políbio viu em Roma um exemplo
perfeito, na prática, de um velho ideal filosófico grego: a “constituição
mista”, que combinava os melhores aspectos de monarquia, aristocracia e
democracia. Os cônsules — que tinham total controle militar, podiam convocar
assembleias populares e dar ordens a todas as demais autoridades (exceto aos
tribunos plebeus) — representavam o elemento monárquico. O Senado — que naquela
época tinha a seu encargo as finanças de Roma, a
responsabilidade por delegações para e de outras cidades e supervisionava de
fato a lei e a segurança por todo o território romano e de seus aliados —
representava o elemento aristocrático. O povo representava o elemento
democrático. Não era “democracia” ou “o povo” no sentido moderno: não havia
algo como sufrágio universal no mundo antigo — mulheres e escravos nunca
tiveram direitos políticos formais em lugar algum. Políbio referia-se ao grupo
de cidadãos homens como um todo. Como na Atenas clássica, eles — e só eles —
elegiam as autoridades do Estado, aprovavam ou rejeitavam leis, tomavam
decisões finais sobre ir à guerra e agiam como corte judicial no caso de
grandes transgressões.
O
segredo, sugeria Políbio, estava em uma delicada relação de pesos e contrapesos
entre cônsules, o Senado e o povo, de modo que nem monarquia, nem aristocracia,
nem Senado nunca prevaleciam inteiramente. Os cônsules, por exemplo, poderiam
ter tido comando total, monárquico, em campanha, mas tinham que ter sido
eleitos pelo povo em primeiro lugar, e dependiam do Senado para verbas — e era
o Senado que decidia atribuir ou não ao general vitorioso um triunfo no final
da campanha. Exigia-se também um voto do povo para ratificar qualquer tratado
que pudesse ser feito. E assim por diante. Eram, segundo Políbio, tais pesos e
contrapesos no sistema político que produziam a estabilidade interna sobre a
qual o sucesso exterior de Roma se assentava.
Essa
é uma análise muito perspicaz, sensível às pequenas diferenças e sutis nuances
que distinguem um sistema político de outro. Sem dúvida, em certos aspectos
Políbio tenta forçar a vida política que ele testemunhou em Roma a se acomodar
ao modelo analítico grego, que não se encaixa inteiramente. Impor à sua
discussão termos como “democracia”, por exemplo, é profundamente enganoso.
“Democracia” (demokratia) era algo com raízes políticas e linguísticas
no mundo grego. Nunca foi uma palavra de ordem em Roma, mesmo em seu restrito
sentido antigo ou mesmo para os políticos populares romanos mais radicais. Na
maior parte dos escritos conservadores que sobreviveram, a palavra significa
algo próximo de “governo da massa”. Faz pouco sentido perguntar o quanto os políticos
da Roma republicana eram “democráticos”: os romanos
lutavam por liberdade, não por democracia. No entanto, sob outro aspecto, ao
forçar seus leitores a atentarem para o povo em sua apreciação da política
romana e olharem além do poder das autoridades eleitas e do Senado
aristocrático, Políbio abriu um importante debate que é válido ainda hoje. O
quanto a voz popular tinha influência na política da Roma republicana? Quem
controlava Roma? Como nós deveríamos caracterizar o sistema político
romano?
Seria
fácil demais traçar um quadro dos processos políticos republicanos como sendo
completamente dominados pela minoria rica. O resultado do Conflito das Ordens
não foi a revolução popular, mas a criação de uma nova classe governante,
compreendendo plebeus ricos e patrícios. A primeira qualificação para a maioria
dos cargos políticos era a riqueza em uma escala substancial. Ninguém podia
concorrer nas eleições sem ser aprovado num teste financeiro que excluía a
maior parte dos cidadãos; a quantia exata necessária para se qualificar não é
conhecida, mas as implicações são de que se situava em um nível bastante
elevado da hierarquia do censo, a chamada categoria da cavalaria ou equestre.
Quando as pessoas se juntaram para votar, o sistema de votação foi arranjado em
favor dos ricos. Já vimos como isso funcionava na Assembleia das Centúrias, que
elegia altos oficiais: se as centúrias ricas se unissem, podiam determinar o
resultado sem que as centúrias pobres tivessem chance de votar. A outra
assembleia importante baseada nas divisões “tribais” geográficas era mais
equitativa em tese — mas, conforme o tempo foi passando, deixou de ser assim na
prática. Das 35 divisões geográficas finalmente definidas em 241 a.C. (até esse
momento, o número de tribos foi aumentando conforme a cidadania era estendida
por toda a Itália), apenas quatro cobriam a própria cidade. As 31 restantes
abrangiam o então distante território rural de Roma. Como os votos só podiam
ser dados pessoalmente na cidade, a influência daqueles que tinham condições de
tempo e transporte para fazer a viagem era esmagadora; os votos da população
urbana residente tinham impacto apenas sobre essa pequena minoria de tribos
urbanas. Além disso, a rigor, as assembleias eram simplesmente para votar
mediante uma lista de candidatos ou de uma proposta
apresentada por uma auto-ridade importante. Não havia uma ampla discussão; de
baixo não vinham propostas ou mesmo emendas; no caso de quase todas as
propostas de legislação das quais temos notícia, o povo votava a favor daquilo
que lhe era apresentado. Isso não era poder popular como o entendemos hoje.
No
entanto, havia outro aspecto. Além das prerrogativas formais do povo que
Políbio enfatiza, há claros indícios de uma cultura política mais ampla na qual
a voz popular era um elemento-chave. Os votos dos pobres importavam e eram
ansiosamente caçados. Os ricos usualmente não eram muito unidos, e as eleições
eram concorridas. Aqueles que detinham ou procuravam obter cargos políticos
davam muita importância a persuadir o povo a votar neles ou nas leis que
propunham, e dedicavam enorme atenção a aprimorar as técnicas de retórica que
lhes permitiriam atingir esse objetivo. Se ignorassem ou humilhassem os pobres
corriam riscos. Um dos aspectos diferenciais da cena política republicana eram
as reuniões semiformais (ou contiones), com frequência realizadas pouco
antes das assembleias de votação, nas quais autoridades rivais tentavam
convencer as pessoas sobre seu ponto de vista (Cícero fez seu segundo e quarto
discursos contra Catilina, por exemplo, em contiones). Não sabemos ao
certo o quanto costumavam ser frequentes ou atrair comparecimento. Mas há
várias indicações de que envolviam fervor político, entusiasmo vociferante e
muito barulho. Certa ocasião, no século I a.C., conta-se que a gritaria era tão
estrondosa que um corvo, que desafortunadamente passara por ali, caiu
estatelado no chão, atordoado.
Há
também todo tipo de anedota sobre a importância e a intensidade da caça de
votos, e sobre como o voto do povo podia ser conquistado ou perdido. Políbio
conta uma história curiosa sobre o rei sírio Antíoco IV (Epifânio,
“famoso” ou mesmo “deus manifestado”), filho de Antíoco, o Grande, que havia
sido “esmagado” por Cipião Asiático. Quando jovem ele viveu mais de uma década
como refém de Roma antes de ser trocado por um parente mais jovem, aquele a
quem Políbio mais tarde deu conselhos sobre seu plano de fuga. Ao voltar para o
Oriente, levou consigo vários hábitos romanos que havia
adquirido em sua estadia. A maioria consistia em adotar uma atitude mais
popular: falar com qualquer pessoa que encontrasse, dar presentes a pessoas
comuns e percorrer lojas de artesãos. Mas o que causava mais impacto era que
vestia toga e circulava pelo mercado como se fosse candidato a alguma eleição,
apertando as mãos das pessoas e pedindo seu voto. Isso deixou perplexas as
pessoas em sua vistosa capital, Antioquia, que não estavam acostumadas a esse
comportamento da parte de um monarca, e o apelidaram então de Epimânio
(“insano”, um trocadilho com seu nome). Mas fica claro que uma lição que
Antíoco aprendera em Roma era que o povo e seus votos importavam.
Igualmente
reveladora é uma anedota sobre outro membro da família Cipião no século II
a.C., Públio Cornélio Cipião Násica [Publius Cornelius Scipio Nasica]. Ele
estava um dia caçando votos em uma campanha para ser eleito ao cargo de edil e
ocupava-se em apertar a mão dos eleitores (procedimento-padrão, tanto naquela
época quanto hoje). Ao se deparar com alguém cujas mãos estavam calejadas pelo
trabalho no campo, o jovem aristocrata brincou: “Meu Deus, você por acaso anda
com as mãos?”. Alguém ouviu, e as pessoas comuns concluíram que ele estava
zombando de sua pobreza e de seu trabalho. O desfecho, desnecessário dizer, foi
que ele perdeu a eleição. Então que tipo de sistema político era esse? O
equilíbrio entre os diferentes interesses certamente não era tão equitativo
como Políbio faz parecer. Os pobres nunca poderiam chegar ao topo da política
romana; pessoas comuns jamais detinham a iniciativa política; e era axiomático
que quanto mais rico fosse o cidadão, maior peso político poderia ter. Mas essa
forma de desequilíbrio é familiar em muitas das chamadas democracias modernas:
em Roma também os ricos e privilegiados concorriam a cargos e poder político
que só podiam ser garantidos por eleições populares e pelo favor das pessoas
comuns, que nunca teriam os meios financeiros para concorrer elas mesmas. Como
o jovem Cipião Násica descobriu às próprias custas, o sucesso dos ricos era uma
dádiva concedida pelos pobres. Os ricos tiveram que aprender a lição de que
dependiam do povo como um todo.”
“De modo bem similar à extensão do controle romano na Itália, essa
expansão ultramarina nos séculos III e II a.C. era mais complexa do que o mito
familiar das legiões romanas marchando, conquistando e
tomando territórios estrangeiros. Primeiro, os romanos não eram os únicos
agentes no processo. Eles não invadiram um mundo de povos amantes da paz, que
viviam apenas cuidando da sua vida até que aqueles bandidos vorazes chegaram.
Por mais que possamos ser cínicos, com razão, diante das afirmações dos romanos
de que estavam indo para a guerra apenas atendendo pedidos de auxílio de seus
amigos e aliados (esse tem sido o pretexto para algumas das guerras mais agressivas
da história), parte da pressão para que Roma interviesse realmente veio de
fora.
O
mundo do Mediterrâneo oriental, da Grécia à atual Turquia e além dela, foi o
contexto da maior parte da atividade militar de Roma nesse período. Era um
mundo de conflitos políticos, alianças instáveis e violência contínua e brutal
entre os Estados, similar à da Itália em seus primórdios, mas em maior escala.
Esse era o legado das conquistas do tipo “arrebentar e levar” de Alexandre, o
Grande, que morreu em 323 a.C., antes que precisasse encarar o que fazer com
aqueles que havia derrotado. Seus sucessores formaram dinastias rivais, que se
envolveram em séries mais ou menos ininterruptas de guerras e disputas, entre
eles e com Estados menores e coalizões em suas vizinhanças. Pirro foi um desses
soberanos. Antíoco Epifânio foi outro: após sua detenção em Roma e tentativas
de política populista em casa, conseguiu em seu reinado de dez anos, entre 175
a.C. e 164 a.C., invadir o Egito (duas vezes), o Chipre, a Judeia (o que provocou
também a revolta dos Macabeus), a Pártia e a Armênia.
Quanto
mais Roma era percebida como poderosa, mais esses bandos guerreiros encaravam
os romanos como aliados úteis em suas disputas locais de poder e cortejavam sua
influência. Representantes do Oriente vinham diversas vezes a Roma na
expectativa de obter apoio moral ou intervenção militar. Esse é um tema
recorrente nos relatos históricos do período: há notícias de muitos enviados,
por exemplo, durante os preparativos para a campanha de Emílio Paulo contra
Perseu, tentando convencer os romanos a fazer algo a respeito das ambições da
Macedônia. Mas a cena mais clara de como essa “corte” funcionava na prática vem
de Teos, uma cidade no litoral ocidental da moderna Turquia. Há uma inscrição
de meados do século II a.C. que registra as tentativas
feitas para atrair os romanos a uma disputa menor, sobre a qual nada mais se
sabe, a respeito de alguns direitos territoriais, entre a cidade de Abdera, no
norte da Grécia, e um rei local, Kotys.
O
texto é uma “carta de agradecimento” entalhada em pedra, dirigida à cidade de
Teos pelo povo de Abdera. Pois, ao que parece, os habitantes de Teos haviam
concordado em enviar dois homens até Roma, quase como lobistas no sentido
moderno do termo, para conquistar o apoio de Roma à causa de Abdera contra o
rei. Os abderitas descrevem de modo preciso como essa dupla agiu, detalhando
suas visitas regulares às casas de membros-chave do Senado. Os delegados, ao
que parece, trabalharam tanto que “ficaram esgotados física e mentalmente, e
encontraram gente importante de Roma e conseguiram convencê-los fazendo-lhes
obséquios diariamente”; e quando algumas das pessoas que visitavam pareciam
favoráveis a Kotys (pois este também mandara enviados a Roma), “eles
conquistaram sua amizade expondo-lhes os fatos e fazendo visitas diárias aos
seus átrios”, isto é, aos saguões centrais de suas casas romanas.
O
silêncio de nosso texto sobre o resultado dessas abordagens sugere que as
coisas não foram bem para o lado dos abderitas. Mas esse instantâneo de
representantes rivais, não só abrindo caminho no Senado, mas pressionando
senadores individualmente todos os dias em favor de sua tese, dá uma ideia de
como o auxílio de Roma podia ser requisitado de maneira ativa e persistente. E
as centenas, literalmente, de estátuas de indivíduos romanos — como “salvadores
e benfeitores” — colocadas nas cidades do mundo grego mostram como essa
intervenção, caso viesse a ocorrer e fosse bem-sucedida, era comemorada. Não
temos como identificar cada um dos aspectos da duplicidade por trás de tais
palavras: sem dúvida havia não só medo e lisonja envolvidos, mas também
gratidão sincera. Mas trata-se de um lembrete útil de que a simples expressão
“conquista romana” pode encobrir uma ampla gama de pontos de vista, motivações
e aspirações de cada um dos lados.
Além
disso, os romanos não tentavam sistematicamente anexar território ultramarino
ou impor mecanismos padronizados de controle. O que
explica em parte por que o processo de expansão foi tão rápido: eles não estavam
implantando nenhuma infraestrutura de governo. Certamente, extraíam recompensas
materiais daqueles que derrotavam, mas de maneiras diferentes, ad hoc.
Eles impuseram grandes indenizações em dinheiro a alguns Estados, um total de
mais de seiscentas toneladas de lingotes de prata só na primeira metade do
século II a.C. Em outras partes, assumiram os regimes regulares de taxação já
estabelecidos por governantes anteriores. Algumas vezes conceberam novas
maneiras de extorquir ricas receitas. As minas de prata da Espanha, por
exemplo, antes parte do domínio de Aníbal, logo passaram a produzir tanto
minério que a poluição ambiental de seu processamento ainda pode ser detectada
em amostras datáveis extraídas das profundas camadas de gelo da Groenlândia. E
Políbio, que visitou a Espanha em meados do século II a.C., escreveu a respeito
de 40 mil mineiros, a maior parte escravos, trabalhando em apenas uma região do
território de mineração (talvez não seja literal: “40 mil” era uma expressão
comum para se referir a “um número muito grande”, como o nosso “milhares”). As
formas de controle político dos romanos eram igualmente variadas, indo de
tratados de “amizade” que asseguravam a não interferência à tomada de reféns
como garantia de bom comportamento, ou à presença mais ou menos permanente de
soldados ou autoridades romanas. O que aconteceu depois que Emílio Paulo
derrotou o rei Perseu é apenas um exemplo da aparência de tal pacote de
arranjos. A Macedônia foi dividida em quatro Estados autogovernados
independentes; eles pagavam impostos a Roma, pela metade do valor que Perseu
cobrava; e, neste caso, as minas macedônias foram fechadas, para evitar que
seus recursos fossem usados para construir uma nova base de poder na região.
Era
de fato um Império coercitivo no sentido de que os romanos levavam embora os
ganhos e tentavam assegurar que poderiam impor sua vontade quando quisessem,
com a ameaça da força sempre no ar. Não era um Império de anexação no sentido
que romanos posteriores iriam entendê-lo. Não havia nenhuma estrutura legal
detalhada de controle, nem regras ou regulamentações. Nesse período, até mesmo
a palavra latina imperium, que por volta do final do século
I a.C. podia significar “Império” como uma área inteira sob governo romano
direto, tinha um sentido mais próximo de “poder de expedir ordens que são
obedecidas”. E provincia, que se tornou o termo-padrão para uma
subdivisão bem definida do Império sob o controle de um governador, não era um
termo geográfico, e sim uma responsabilidade atribuída a uma autoridade romana.
Podia ser, e com frequência era, uma atribuição de atividade militar ou
administrativa em um lugar determinado. A partir do final do século III a.C., a
Sicília e a Sardenha passaram a ser designadas como provinciae, e a
partir do início do século II a.C., duas provinciae militares na Espanha
tornaram-se um padrão, embora suas fronteiras fossem fluidas. Mas podia muito
bem ser uma responsabilidade em relação a algo, digamos, o tesouro romano — e,
por volta da passagem para o século II a.C., Plauto em suas comédias usa o
termo provincia como uma brincadeira para se referir aos deveres dos
escravos. Nessa época, nenhum romano era enviado para ser o “governador de uma
província”, como ocorreria mais tarde.
O que
estava em jogo para os romanos era se poderiam vencer em batalha e depois se —
por meio de persuasão, ameaça ou força — poderiam impor sua vontade onde,
quando e conforme decidissem. O estilo desse imperium é claramente
resumido na história do último encontro entre Antíoco Epifânio e os romanos. O
rei estava invadindo o Egito pela segunda vez, e os egípcios tinham pedido
ajuda aos romanos. Um enviado romano, Caio Popílio Lenas [Gaius Popilius
Laenas], foi despachado e encontrou Antíoco fora de Alexandria. Em razão de sua
longa familiaridade com os romanos, o rei sem dúvida esperava um encontro
bastante cortês. Em vez disso, Lenas passou-lhe um decreto do Senado que o
instruía a retirar-se do Egito imediatamente. Quando Antíoco pediu tempo para
consultar seus conselheiros, Lenas pegou um pedaço de pau e desenhou um círculo
no chão empoeirado em volta do rei. Só poderia colocar o pé para fora daquele
círculo depois de ter dado sua resposta. Perplexo, Antíoco mansamente concordou
com a exigência do Senado. Esse era um Império de obediência.”
“Os novos horizontes do Império também ajudaram a criar — ou pelo menos a
definir com contornos e sentidos ideológicos mais nítidos — a imagem do “romano
antiquado”. Esse personagem prático, sensato, audacioso, sem floreios,
desempenha seu papel até hoje em nosso estereótipo da cultura romana. É
provável que tenha sido em grande parte uma criação também desse período.
Alguns
dos oradores mais eloquentes dos séculos III e II a.C. ficaram famosos por atacar
a influência corruptora da cultura estrangeira em geral,
e da grega em particular, sobre a moral e o comportamento romano tradicional.
Seus alvos iam da literatura e filosofia ao hábito de se exercitar nu, à comida
sofisticada e à depilação. Na linha de frente dessas críticas estava Marco
Pórcio Catão [Marcus Porcius Cato] (“Catão, o Velho”), um contemporâneo e rival
de Cipião Africano, que Catão criticou, entre outras coisas, por se divertir
com ginástica grega e teatros na Sicília. Dizem ainda que Catão teria chamado
Sócrates de “tagarela inveterado”, que recomendava uma dieta medicinal romana à
base de legumes e verduras verdes, pato e pombo (em contraposição às
prescrições dos médicos gregos, que segundo ele podiam muito bem matá-lo), e
que advertia que o poder romano podia ser derrubado por causa da paixão pela
literatura grega. Segundo Políbio, Catão uma vez observou que um dos sinais da
deterioração da República era que os garotos bonitos agora custavam mais caro
que os campos, e que jarras de peixe em conserva valiam mais do que
agricultores. Não estava sozinho nessas opiniões. Em meados do século II a.C.,
outra destacada figura encontrou apoio ao defender que um teatro em estilo
grego em construção em Roma deveria ser demolido, já que era melhor e mais
favorável à formação do caráter dos romanos que eles assistissem às peças em
pé, como tradicionalmente vinham fazendo, e não sentados à moda decadente do
Oriente. Em resumo, segundo tais argumentos, o que se fazia passar por
“sofisticação” grega nada mais era do que uma insidiosa “flacidez” (ou mollitia,
no jargão romano), que fatalmente minaria a força do caráter romano.
Seria
isso uma simples reação conservadora contra as ideias modernas que chegavam a
Roma de fora, um surto de “guerras culturais” entre tradicionalistas e
modernizadores? Em parte talvez fosse. Mas era também algo mais complexo, e
mais interessante do que isso. Apesar de todas as suas queixas, Catão ensinara
grego ao filho, e seus escritos que sobreviveram — notavelmente, um ensaio técnico
sobre cultivo e gestão agrícola, além de citações de seus discursos e de sua
história da Itália — mostram que era bem familiarizado com os recursos gregos
de retórica que dizia deplorar. E algumas de suas afirmações sobre a “tradição
romana” eram mais próximas de uma mera fantasia criativa. Não há qualquer razão
para supor, por exemplo, que os veneráveis romanos idosos assistissem
espetáculos teatrais em pé.
A
verdade é que a versão de Catão dos valores romanos antigos e sensatos era
também uma invenção do seu tempo, e não só uma defesa de tradições romanas
ancestrais. Identidade cultural é sempre uma noção enganosa, e não temos ideia
de como os primeiros romanos encaravam seu próprio caráter, nem como se
distinguiam de seus vizinhos. Mas o sentido, diferenciado, bem demarcado, da
dura austeridade romana — que romanos posteriores projetaram em seus pais
fundadores e que foi preservado como uma visão poderosa de romanidade no mundo
moderno — era resultado de um forte choque cultural, nesse período de expansão
exterior, a respeito do que significava ser romano nesse novo e vasto mundo
imperial. Colocado de outro modo, a “greguice” e a “romanidade” eram não só
inseparavelmente ligadas mas também diametralmente opostas.”
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