Editora: Boitempo
ISBN: 978-85-7559-210-6
Tradução: Lívia Cotrim e Márcio Brilharinho Naves
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 80
Sinopse: Planejado
por Friedrich Engels e Karl Kautsky, o artigo O socialismo jurídico foi publicado sem assinatura na revista da
social-democracia alemã, Neue Zeit, em 1887. O objetivo era dar uma resposta
aos ataques à teoria econômica de Karl Marx, assim como elaborar uma crítica ao
reformismo jurídico e combater a sua influência no movimento operário.
“À época da escrita deste livro, os reformistas, em
combate às ideias revolucionárias de Marx, apontavam para uma transição
controlada, objetivando ganhos por meio do aumento de direitos, sem transformar
plenamente as contradições da exploração capitalista”, afirma na orelha do
livro o professor da Faculdade de Direito da USP, Alysson Leandro Mascaro, para
quem O socialismo jurídico é uma das
obras clássicas do marxismo sobre a relação entre o direito e o capitalismo.
“Engels e Kautsky dedicam esta obra justamente a combater
o socialismo dos juristas – ou o socialismo por meio do direito. O direito é,
irremediavelmente, uma forma do capitalismo. Assim sendo, é a revolução – e não
a reforma por meio de instituições jurídicas – a única opção realmente
transformadora das condições das classes trabalhadoras”, conclui Mascaro. O
texto é também uma crítica ao livro O direito ao produto integral do trabalho
historicamente exposto, do sociólogo e jurista burguês austríaco Anton Menger,
publicado em 1886, e que vinha obtendo grande repercussão. Em tal obra, Menger
tentou provar que a teoria econômica de Marx fora plagiada dos socialistas
utópicos ingleses da escola ricardiana, especialmente William Thompson. Essas
afirmações, bem como a falsificação da essência da teoria marxiana efetuada por
Menger, não poderiam passar despercebidas a Engels, que decidiu interceder.
“Relacionando a forma do direito com a forma
da mercadoria – “O intercâmbio de mercadorias [...] engendra complicadas
relações contratuais recíprocas” –, Engels e Kautsky permitem desvendar todo o
segredo do direito: o processo de trocas mercantis generalizado exige, para a
sua efetivação, o surgimento da subjetividade jurídica e dos princípios
da liberdade, da igualdade etc. que a acompanham8. A emergência da
categoria de sujeito de direito vai possibilitar, então, que o homem circule
no mercado como mercadoria, ou melhor, como proprietário que oferece a si mesmo
no mercado: “O sujeito existe apenas a título de representante da mercadoria que
ele possui, isto é, a título de representante de si próprio enquanto
mercadoria”9. Desse modo, o direito põe o homem em termos de
propriedade, ele aparece ao mesmo tempo na condição de sujeito e objeto de si mesmo,
isto é, na condição de proprietário que aliena a si próprio: “A estrutura mesma
do sujeito de direito, na dialética da vontade-produção-propriedade, não é,
definitivamente, mais que a expressão jurídica da comercialização do homem”10.
O direito faz funcionar, assim, as categorias da liberdade e da igualdade, já
que o homem não poderia dispor de si se não fosse livre – a liberdade é essa
disposição de si como mercadoria – nem poderia celebrar um contrato – esse
acordo de vontades – com outro homem se ambos não estivessem em uma condição de
equivalência formal (caso contrário, haveria a sujeição da vontade de um pela
do outro). Como diz Bernard Edelman:
O essencial são as trocas, e as trocas realizam o homem; as formas
jurídicas que são impostas pela circulação são as mesmas formas da liberdade e
da igualdade; a forma sujeito desvenda a realidade das suas determinações numa
prática concreta: o contrato; a circulação é um processo de sujeitos.11
A Engels e Kautsky não escapou a percepção do
papel decisivo da categoria da igualdade jurídica e é a isso que eles se
referem quando relacionam a concorrência, “forma fundamental das relações entre
livres produtores de mercadorias”, “niveladora ao extremo”, com a igualdade
jurídica, que se tornou o “brado de guerra” da burguesia12.
Não é de surpreender, portanto, que a classe
operária, na luta contra a burguesia, ou permanecesse dentro do campo do
direito, formulando reivindicações de igualdade, ou construísse projetos
utópicos de sociedade, em uma apenas aparente recusa do campo
jurídico-político. Dizem Engels e Kautsky:
Ambas as concepções abstraíam a base histórica à qual deviam a
existência; as duas apelavam para o sentimento, uma para o sentimento jurídico,
outra para o sentimento de humanidade. Ambas formulavam suas reivindicações
como votos piedosos.13
Nos dois casos, a rigor, a classe operária
exprimia os seus interesses dentro do terreno jurídico, seja por meio de uma
alteração no direito existente (reivindicação de igualdade), seja pela
elaboração de um novo direito (sociedade utópica). Como lembra Peter Schöttler,
“em ambos os casos se trata ainda de ‘votos piedosos’; a ilusão jurídica mantém
toda a sua força”14.
Para que a classe operária possa transformar
as relações sociais existentes, é necessário que rompa com a ideologia
jurídica, pois ela “não pode exprimir plenamente a própria condição de vida
na ilusão jurídica”, de modo que os trabalhadores possam compreender essas condições
na própria realidade, a partir da demonstração de que “todas as representações
dos homens – jurídicas, políticas, filosóficas, religiosas etc. – derivam, em última
instância, [...] de seu modo de produzir e trocar os produtos”15.
Ora, a isso se contrapõe todo o esforço dos
aparelhos de Estado burgueses, que se encaminha no sentido de encerrar a
existência da classe operária e suas lutas no estrito terreno jurídico, ali
onde a luta já está, por antecipação, ganha pela burguesia, uma vez que o
funcionamento do direito implica obrigatoriamente a reprodução das relações sociais
burguesas.
Essa legalização da luta de classes significa
que as formas de luta do proletariado só são legalmente reconhecidas se
observam os limites que o direito e a ideologia jurídica estabelecem. Assim, a
greve só se transforma em direito de greve se os trabalhadores aceitam os
termos que a ela emprestam licitude: a greve não pode desorganizar a produção
colocando em risco o processo do capital, questionando, portanto, a dominação burguesa
dos meios de produção. Como diz Edelman:
O direito de greve é um direito burguês. Entendemo-nos: eu não disse que
a greve é burguesa, o que não teria sentido, mas o direito de greve é um
direito burguês. O que quer dizer muito precisamente que a greve só acede à
legalidade em certas condições, e que essas condições são as mesmas que
permitem a reprodução do capital.16
8 Cf. Evgeni Pasukanis, A teoria geral do
direito e o marxismo (Rio de Janeiro, Renovar, 1989).
9 Bernard Edelman, O direito captado pela
fotografia, cit., p. 95.
10 Idem, “Esquisses d’une théorie du sujet”, Communications,
n. 26, 1977, p. 195.
11 Idem, O direito captado pela fotografia,
cit., p. 130.
12 Ver p. 19 desta edição. Sobre a questão da
igualdade jurídica, ver o excepcional trabalho de Celso Naoto Kashiura Júnior, Crítica
da igualdade jurídica – contribuição ao pensamento jurídico marxista, cit.
13 Ver p. 21 desta edição.
14 Peter Schöttler, “Friedrich Engels and
Karl Kautsky...“, cit., p. 14.
15 Ver p. 21-2 desta edição.
16 Bernard Edelman, La légalisation de la
classe ouvrière, t. 1: L’entreprise (Paris, Christian Bourgois, 1980), p.
52.
(Márcio Brilharinho Naves)
“As reivindicações jurídicas do proletariado
devem conter um elemento desestabilizador, que “perturbe” a quietude do domínio
da ideologia jurídica. É precisamente a isso que se refere Peter Schöttler
quando menciona um texto de Engels no qual ele aponta para a espécie de
reivindicação jurídica que o movimento operário pode exprimir: Engels, após
analisar a tradicional reivindicação jurídica do movimento sindical em favor de
um salário “justo”, sugere a sua substituição pela reivindicação da posse
dos meios de produção pelos trabalhadores20.
Ora, essa reivindicação é incompatível com o
direito burguês, revela os seus limites e demonstra a necessidade da sua
abolição21.
Mas, além disso, Engels e Kautsky acrescentam
que o movimento socialista não elabora “uma nova filosofia do direito”,
isto é, que não pode existir um “direito socialista”, e que o direito burguês
perdura na fase da transição socialista até que se extinga a forma valor. Só
quando a natureza das relações de produção e o caráter das forças produtivas
capitalistas forem revolucionarizados, e as formas mercantis
extintas, só então será possível, como dizia Karl Marx na Crítica do
Programa de Gotha*, ultrapassar o estreito horizonte do direito burguês e
conhecer, por fim, a liberdade real jamais experimentada, a liberdade
comunista.”
20 Peter Schöttler, “Friedrich Engels and Karl Kautsky as Critics of
‘Legal Socialism’”, International Journal of the Sociology of Law, n.
14, 1986, p. 22.
21 A transferência de titularidade não é,
evidentemente, incompatível com o direito burguês. Observemos, porém, que
Engels e Kautsky não se referem à propriedade, mas à “posse” dos meios de
produção, apontando, assim, para uma condição não jurídica, absolutamente
necessária para a instauração das novas relações sociais, a apropriação real
dos meios de produção pelos trabalhadores. É por isso que essa
reivindicação é incompatível com o direito burguês, porque ela traz em si um
elemento que anula a sua natureza jurídica. De modo que, nesse inocente
“deslize” jurídico, revela-se a impossibilidade de se sair desse círculo de
ferro: uma vez apenas formulada, a reivindicação jurídica simplesmente se despedaça!
Sobre a questão da propriedade, da posse e da apropriação real, ver Charles
Bettelheim, Cálculo económico e formas de propriedade (Lisboa, Dom
Quixote, 1972), Etienne Balibar, “Sobre os conceitos fundamentais do materialismo
histórico”, em Louis Althusser, Etienne Balibar e Roger Establet, Ler O
capital, v. II (Rio de Janeiro, Zahar, 1980), e Maria Turchetto, “As
características específicas da transição ao comunismo”, em Márcio Bilharinho Naves
(org.), Análise marxista e sociedade de transição (Campinas, IFCH/Unicamp,
2005).
* São Paulo, Boitempo, 2012, p. 31-2. (N. E.)
(Márcio Brilharinho
Naves)
“Na Idade Média, a concepção de mundo era essencialmente
teológica. A unidade interna europeia, de fato inexistente, foi estabelecida
pelo cristianismo diante do inimigo exterior comum representado pelo sarraceno.
Essa unidade do mundo europeu ocidental, formada por um amálgama de povos em
desenvolvimento, foi coordenada pelo catolicismo. A coordenação teológica não
era apenas ideal; consistia, efetivamente, não só no papa, seu centro
monárquico, mas sobretudo na Igreja, organizada feudal e hierarquicamente, a
qual, proprietária de cerca de um terço das terras, em todos os países detinha
poderosa força no quadro feudal. Com suas propriedades fundiárias feudais, a
Igreja se constituía no verdadeiro vínculo entre os vários países; sua
organização feudal conferia consagração religiosa à ordem secular. Além disso,
sendo o clero a única classe culta, era natural que o dogma da Igreja fosse a
medida e a base de todo pensamento. Jurisprudência, ciência da natureza e
filosofia, tudo se resumia em saber se o conteúdo estava ou não de acordo com
as doutrinas da Igreja.
Entretanto, no seio da feudalidade
desenvolvia-se o poder da burguesia. Uma classe nova se contrapunha aos grandes
proprietários de terras. Enquanto o modo de produção feudal se baseava, essencialmente,
no autoconsumo de produtos elaborados no interior de uma esfera restrita – em parte
pelo produtor, em parte pelo arrecadador de tributos –, os burgueses eram
sobretudo e com exclusividade produtores de mercadorias e comerciantes. A
concepção católica de mundo, característica do feudalismo, já não podia
satisfazer à nova classe e às respectivas condições de produção e troca. Não
obstante, ela ainda permaneceu por muito tempo enredada no laço da onipotente teologia.
Do século XIII ao século XVII, todas as reformas efetuadas e lutas travadas sob
bandeiras religiosas nada mais são, no aspecto teórico, do que repetidas
tentativas da burguesia, da plebe urbana e em seguida dos camponeses rebelados de
adaptar a antiga concepção teológica de mundo às condições econômicas
modificadas e à situação de vida da nova classe. Mas tal adaptação era impossível.
A bandeira religiosa tremulou pela última vez na Inglaterra no século XVII, e
menos de cinquenta anos mais tarde aparecia na França, sem disfarces, a nova
concepção de mundo, fadada a se tornar clássica para a burguesia, a
concepção jurídica de mundo.
Tratava-se da secularização da visão
teológica. O dogma e o direito divino eram substituídos pelo direito humano, e
a Igreja pelo Estado. As relações econômicas e sociais, anteriormente
representadas como criações do dogma e da Igreja, porque esta as sancionava,
agora se representam fundadas no direito e criadas pelo Estado. Visto que o
desenvolvimento pleno do intercâmbio de mercadorias em escala social – isto é,
por meio da concessão de incentivos e créditos – engendra complicadas relações
contratuais recíprocas e exige regras universalmente válidas, que só poderiam
ser estabelecidas pela comunidade – normas jurídicas estabelecidas pelo Estado
–, imaginou-se que tais normas não proviessem dos fatos econômicos, mas dos
decretos formais do Estado. Além disso, uma vez que a concorrência, forma
fundamental das relações entre livres produtores de mercadorias, é a grande
niveladora, a igualdade jurídica tornou-se o principal brado de guerra da
burguesia. Contribuiu para consolidar a concepção jurídica de mundo o fato de
que a luta da nova classe em ascensão contra os senhores feudais e a monarquia absoluta,
aliada destes, era uma luta política, a exemplo de toda luta de classes, luta
pela posse do Estado, que deveria ser conduzida por meio de reivindicações
jurídicas.
Mas a burguesia engendrou o antípoda de si mesma,
o proletariado, e com ele novo conflito de classes, que irrompeu antes mesmo de
a burguesia conquistar plenamente o poder político. Assim como outrora a
burguesia, em luta contra a nobreza, durante algum tempo arrastara atrás de si
a concepção teológica tradicional de mundo, também o proletariado recebeu
inicialmente de sua adversária a concepção jurídica e tentou voltá-la contra a
burguesia. As primeiras formações partidárias proletárias, assim como seus
representantes teóricos, mantiveram-se estritamente no jurídico “terreno do
direito”, embora construíssem para si um terreno do direito diferente daquele
da burguesia. De um lado, a reivindicação de igualdade foi ampliada, buscando
completar a igualdade jurídica com a igualdade social; de outro lado,
concluiu-se das palavras de Adam Smith – o trabalho é a fonte de toda a
riqueza, mas o produto do trabalho dos trabalhadores deve ser dividido com os
proprietários de terra e os capitalistas – que tal divisão não era justa e
devia ser abolida ou modificada em favor dos trabalhadores. Entretanto, a percepção
de que relegar o fato apenas ao jurídico “terreno do direito” absolutamente não
possibilitava eliminar as calamidades criadas pelo modo de produção
burguês-capitalista, especialmente pela grande indústria moderna, levou as
cabeças mais significativas dentre os primeiros socialistas – Saint-Simon,
Fourier e Owen – a abandonar por completo a esfera jurídico-política e a
declarar que toda luta política é estéril.
As duas posições eram igualmente
insuficientes, tanto para expressar a situação econômica da classe trabalhadora
quanto para estruturar a luta emancipatória dela decorrente. A reivindicação da
igualdade, assim como do produto integral do trabalho, perdia-se em
contradições insolúveis tão logo se buscava formular seus pormenores jurídicos,
e deixava mais ou menos intacto o cerne do problema, a transformação do modo de
produção. A rejeição da luta política pelos grandes utópicos era, ao mesmo
tempo, rejeição da luta de classes, portanto da única forma de ação possível para
a classe cujos interesses defendiam. Ambas as concepções abstraíam a base
histórica à qual deviam a existência; as duas apelavam para o sentimento, uma
para o sentimento jurídico, outra para o sentimento de humanidade. Ambas
formulavam suas reivindicações como votos piedosos, dos quais era impossível
dizer por que deviam se realizar justamente agora, e não mil anos antes ou
depois.
A classe trabalhadora – despojada da
propriedade dos meios de produção no curso da transformação do modo de produção
feudal em modo de produção capitalista e continuamente reproduzida pelo
mecanismo deste último na situação hereditária de privação de propriedade – não
pode exprimir plenamente a própria condição de vida na ilusão jurídica da
burguesia. Só pode conhecer plenamente essa condição se enxergar a realidade
das coisas, sem as coloridas lentes jurídicas. A concepção materialista da
história de Marx ajuda a classe trabalhadora a compreender essa condição de
vida, demonstrando que todas as representações dos homens – jurídicas,
políticas, filosóficas, religiosas etc. – derivam, em última instância, de suas
condições econômicas de vida, de seu modo de produzir e trocar os produtos.
Está posta com ela a concepção de mundo decorrente das condições de vida e luta
do proletariado; à privação da propriedade só podia corresponder a ausência de
ilusões na mente dos trabalhadores. E essa concepção proletária de mundo
percorre agora o planeta.”
“É francamente desprezível a opinião de Menger
de que as condições econômicas para o socialismo nunca tenham sido tão
favoráveis como no tempo do Império Romano. Os socialistas, alvo da contestação
dele, veem a garantia do êxito do socialismo no desenvolvimento da própria
produção. De um lado, por meio do desenvolvimento da mecanização industrial e agrícola
em larga escala, a produção se torna cada vez mais social e a produtividade do
trabalho, gigantesca; isso estimula a superação das diferenças de classes e a
transição da produção de mercadorias em empresas privadas para a produção
direta para e pela sociedade. De outro lado, o moderno modo de produção gera a
classe que, em medida sempre crescente, tem o interesse e a força para de fato
levar avante esse desenvolvimento – um proletariado livre e trabalhador.”
“O direito jurídico, que apenas reflete as
condições econômicas de determinada sociedade, ocupa posição muito secundária
nas pesquisas teóricas de Marx; ao contrário, aparecem em primeiro plano a
legitimidade histórica, as situações específicas, os modos de apropriação, as
classes sociais de determinadas épocas, cujo exame interessa fundamentalmente
aos que veem na história um desenvolvimento contínuo, apesar de muitas vezes
contraditório, e não simples caos [Wust] de loucura e brutalidade, como
a via o século XVIII. Marx compreende a inevitabilidade histórica e, em consequência,
a legitimidade dos antigos senhores de escravos, dos senhores feudais medievais
etc. como alavancas do desenvolvimento humano em um período histórico
delimitado; do mesmo modo, reconhece também a legitimidade histórica temporária
da exploração, da apropriação do produto do trabalho por outros; mas demonstra igualmente
não apenas que essa legitimidade histórica já desapareceu, mas também que a
continuidade da exploração, sob qualquer forma, ao invés de promover o
desenvolvimento social, dificulta-o cada vez mais e implica choques
crescentemente violentos.”
“Isso naturalmente não significa que os
socialistas renunciem a propor determinadas reivindicações jurídicas. É
impossível que um partido socialista ativo não as tenha, como qualquer partido
político em geral. As reivindicações resultantes dos interesses comuns de uma
classe só podem ser realizadas quando essa classe conquista o poder político e
suas reivindicações alcançam validade universal sob a forma de leis. Toda
classe em luta precisa, pois, formular suas reivindicações em um programa, sob
a forma de reivindicações jurídicas. Mas as reivindicações de cada
classe mudam no decorrer das transformações sociais e políticas e são
diferentes em cada país, de acordo com as particularidades e o nível de
desenvolvimento social. Daí decorre também o fato de as reivindicações jurídicas
de cada partido singular, apesar de concordarem quanto à finalidade, não serem
completamente iguais em todas as épocas e entre todos os povos. Constituem
elemento variável e são revistas de tempos em tempos, como se pode observar nos
partidos socialistas de diversos países. Para essas revisões, são as relações
reais que devem ser levadas em conta; em contrapartida, não ocorreu a
nenhum dos partidos socialistas existentes fazer uma nova filosofia do direito
a partir do seu programa, e possivelmente não lhes ocorrerá no futuro.”