Editora: Paulus
ISBN: Bíblia do Peregrino (BPe) – 978-85-349-2005-6 / Bíblia de Jerusalém (BJ)
– 978-85-349-4282-9 / Bíblia Pastoral (BPa) – 978-85-349-0228-1
Tradução, introdução
e notas (BPa):
Ivo Storniolo e Euclides Martins Balancin
Tradução (BPe): Ivo Storniolo e José Bortolini
Notas (BPe): Luís Alonso Schökel
Opinião: N/A
Páginas: BPe – 79 / BJ – 60 / BPa – 33
Sinopse: Ver aqui
“No princípio já existia a Palavra
e a Palavra se dirigia a Deus
e a Palavra era Deus.
Esta, no princípio, se dirigia a Deus.
Tudo existiu por meio dela,
e sem ela nada existiu de tudo o que existe.
Nela havia vida,
e a vida era a luz dos homens.
A luz brilhou nas trevas,
e as trevas não a compreenderam.
Houve um homem enviado por Deus, chamado João,
que veio como testemunha da luz, de modo que todos cressem por meio dele. Ele não
era a luz, mas uma testemunha da luz.
A luz verdadeira que ilumina todo homem
estava vindo ao mundo.
Estava no mundo, o mundo existiu por ela,
e o mundo não a reconheceu.
Veio aos seus,
e os seus não a acolheram.
Mas aos que a receberam
os tornou capazes de ser filhos de Deus:
os que creem nele,
os que não nasceram do sangue
nem do desejo da carne,
nem do desejo do varão,
mas de Deus.
A Palavra se fez homem1
e habitou entre nós.2
Contemplamos sua glória,
glória como de Filho único do Pai,
cheio de lealdade e fidelidade.
João grita dando testemunho dele: Este é aquele
do qual eu dizia: Aquele que vem depois de mim existia antes de mim, porque está
antes de mim.
De sua plenitude todos recebemos:
uma lealdade que responda à sua lealdade.
Pois a lei foi promulgada por meio de Moisés,
a lealdade e a fidelidade se realizaram por Jesus
Cristo.
Ninguém jamais viu a Deus; o Filho único, Deus,
que estava ao lado do Pai, o explicou.3”
(Jo 1,1-18 – BPe / BJ)
1: BJ traduz homem por carne e o explica:
A “carne” designa a humanidade em sua condição de fraqueza e de imortalidade (Gn
6,3; Sl 56,5; Is 40,6-8; Jo 3,6;17,2). Revestindo nossa humanidade, o Verbo de Deus
assumiu todas as suas fraquezas, inclusive a morte (Fl 2,6-8). (BJ)
2: Verbo grego eskénosen, (cf. skené “tenda”).
Alusão à Tenda “mishkan” que, por ocasião
do êxodo, simbolizava a presença de Deus (Ex 26,1+), presença tornada manifesta
pela irrupção da glória de Deus nela, por ocasião de sua inauguração (Ex 40,34-35).
O Verbo, Unigênito do Pai, em que reside o Nome terrível “Eu sou” (Ex 4,14-15; Jo
8,24+), resplandecente dessa glória que tem do Pai, realiza na aliança nova essa
presença divina que deve assegurar a salvação do povo de Deus (Ex 34,9). Ele é verdadeiramente
o Emanuel, “Deus-conosco”, anunciado por Is 7,14; Mt 1,23. (BJ)
3: O Prólogo de João lembra a introdução do Gênesis
(1,1-31; 2,1-4a). No começo, antes da criação, o Filho de Deus já existia
em Deus, voltado para o Pai: estava em Deus, como a Expressão de Deus, eterna e
invisível. O Filho é a Imagem do Pai, e o Pai se vê totalmente no Filho, ambos num
eterno diálogo e mútua comunicação.
A Palavra é a Sabedoria de Deus vislumbrada
nas maravilhas do mundo e no desenrolar da história, de modo que, em todos os tempos,
os homens sempre tiveram e têm algum conhecimento dela.
Jesus, Palavra de Deus, é a luz que ilumina a
consciência de todo homem. Mas, para onde nos conduziria essa luz? A Bíblia toda
afirma que Deus é amor e fidelidade. Levado pelo seu imenso amor e fiel às
suas promessas, Deus quis introduzir os homens onde jamais teriam pensado: partilhar
a própria vida e felicidade de Deus. E para isso a Palavra se fez homem e
veio à sua própria casa, neste seu mundo.
A humanidade já não está condenada a caminhar
cegamente, guiando-se por pequenas luzes no meio das trevas, por pequenas manifestações
de Deus, mas pelo próprio Jesus, Manifestação total de Deus. Com efeito, Jesus Cristo,
que é a luz, veio para tornar filhos de Deus todos os homens. Um só é o Filho, porém,
todos podem tornar-se bem mais do que filhos adotivos: nasceram de Deus.
Deus tinha dado uma lei por meio de Moisés. E
todos os judeus achavam que essa lei era o maior presente de Deus. Na realidade,
era bem mais o que Deus tinha reservado para todos. Porque Jesus, o Deus Filho,
o verdadeiro e total Dom do Pai, é o único que pode falar de Deus Pai, porque comunica
o amor e a fidelidade do Deus que dá a vida aos homens. (BPa)
“– Ninguém subiu ao céu, a não ser aquele que
desceu do céu: o Filho do Homem. Assim como Moisés levantou a serpente no deserto,
do mesmo modo é preciso que o Filho do Homem seja levantado. Assim, todo aquele
que nele acreditar, nele terá a vida eterna.1
– Pois Deus amou de tal forma o mundo, que entregou
o seu Filho único, para que todo o que nele acredita não morra, mas tenha a vida
eterna. De fato, Deus não enviou Filho ao mundo para julgar o mundo, e sim para
que o mundo seja salvo por meio dele. Quem acredita nele, não está condenado; quem
não acredita, já está condenado, porque não acreditou no nome do Filho único de
Deus.
– O julgamento é este: a luz veio ao mundo, mas
os homens preferiram as trevas à luz, porque suas ações eram más. Quem pratica o
mal, tem ódio da luz, e não se aproxima da luz, para que suas ações não sejam desmascaradas.
Mas, quem age conforme à verdade, se aproxima da luz, para que suas ações sejam
vistas, porque são feitas como Deus quer.”2
(Jo 3,13-21 – BPa)
1: Olhando para a serpente de bronze içada num
estandarte, os mordidos de serpente se curavam (Nm 21,8-9) pela fé (acrescenta Sb
16,7.10). É imagem de Jesus exaltado na cruz (8,28; 12,34). A serpente livrava de
uma morte repentina, Jesus crucificado dará a vida eterna. (BPe)
2: Deus não quer que os homens se percam, nem
sente prazer em condená-los. Ele manifesta todo o seu amor através de Jesus, para
salvar e dar a vida a todos. Mas a presença de Jesus é incômoda, pois coloca o mundo
dos homens em julgamento, provocando divisão e conflito, e exigindo decisão. De
um lado, os que acreditam em Jesus e vivem o amor, continuando a palavra e a ação
dele em favor da vida. De outro lado, os que não acreditam nele e não vivem o amor,
mas permanecem fechados em seus próprios interesses e egoísmo, que geram opressão
e exploração; por isso estes sempre escondem suas verdadeiras intenções: não se
aproximam da luz. (BPa)
“Jesus tomou a palavra e lhes disse:
— Eu vos asseguro:
O Filho não faz nada por sua conta,
se não vê o Pai fazer.
O que este faz
o Filho o faz igualmente.
Porque o Pai ama o Filho
e lhe mostra tudo o que faz;
e lhe mostrará ações maiores,
para que vos admireis.
Assim como o Pai levanta os mortos e lhes dá vida,
assim o Filho dá vida aos que quer.
O Pai não julga ninguém,
mas entrega ao Filho a tarefa de julgar,
para que todos honrem o Filho
como honram o Pai.
Quem não honra o Filho
não honra o Pai que o enviou.
Asseguro-vos que quem ouve a minha palavra
e crê em quem me enviou,
tem vida eterna e não é submetido a julgamento,
mas passou da morte à vida.
Asseguro-vos que chega a hora, e já chegou,
em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus,
e os que a ouvirem viverão.
Pois como o Pai possui vida em si,
assim faz que o Filho possua vida em si;
e, visto que é homem,
confiou-lhe o poder de julgar.
Não estranheis isto: chega a hora
em que todos os que estão no sepulcro ouvirão
sua voz.
Os que agiram bem ressuscitarão para viver,
os que agiram mal ressuscitarão para ser julgados.
Eu não posso fazer nada por minha conta;
julgo pelo que ouço, e a minha sentença é justa,
porque não pretendo fazer a minha vontade,
mas a vontade daquele que me enviou.1
Se eu desse testemunho em meu favor,
meu testemunho não seria válido.
Outro testemunha em meu favor, e me consta
que seu testemunho em meu favor é fidedigno.
Vós enviastes uma delegação a João,
e ele deu testemunho da verdade.
E, embora eu não me apoie em testemunho humano,
digo isso para vossa salvação.
Ele era uma lâmpada que ardia e iluminava,
e vós quisestes desfrutar um pouco de sua luz.
Eu tenho um testemunho mais valioso que o de João:
as obras que meu Pai me encarregou de fazer e
que eu faço
testemunham em meu favor que o Pai me enviou.
Também o Pai que me enviou
dá testemunho em meu favor.
Nunca ouvistes sua voz,
não vistes sua figura,
e sua palavra não a conservais em vós
porque não credes naquele que ele enviou.
Estudais a Escritura pensando que encerra vida
eterna:
pois ela dá testemunho em meu favor;
mas vós não quereis vir a mim para terdes vida.
Já não recebo honra dos homens;2
mas de vós me consta que não possuís o amor de
Deus.3
Eu vim em nome de meu Pai, e não me recebeis;
se outro viesse em nome próprio, vós o receberíeis.
Como podeis crer se, recebendo honras mútuas,
não buscais a honra que vem somente de Deus?
Não penseis que serei eu quem vos acusará diante
do Pai;
Moisés, em quem confiais, vos acusará.
Pois, se crêsseis em Moisés, creríeis em mim,
pois ele escreveu a meu respeito.
E se não credes no que ele escreveu,
como ireis crer em minhas palavras?”4
(Jo 5,19-47 – BPe)
1: Em tudo o que faz, Deus procura dar a vida,
e sua maior obra é a ressurreição. Ressuscitar não é apenas voltar à vida física,
mas levantar-se para começar vida nova e transformada. A fé em Jesus, que é compromisso
com sua palavra e ação, leva o povo a começar a vida nova da ressurreição, organizando-se
como família dos filhos de Deus e irmãos de Jesus. Assim, a morte já está sendo
vencida, e o será definitivamente na ressurreição final. (BPa)
2: A honra e o crédito de Jesus não dependem do
que os homens dizem e propagam, tantas vezes interesseiros e maliciosos. Assim o
aprendeu Paulo (1 Cor 4,3). (BPe)
3: O amor de Deus: o de Deus ao homem, que eles
não conservam quando se fecham para ele. Ou o do homem a Deus, que eles não têm
porque estão dominados pelo egoísmo e desejo de honrarias. Na falta dele, submetem-se
a qualquer que pretenda ter autoridade, talvez a falsos profetas ou falsos messias.
(BPe)
4: Como distinguir o verdadeiro e o falso, reconhecendo
se Jesus realiza ou não a vontade de Deus? Jesus apresenta as três testemunhas que
confirmam sua missão divina: primeiro, sua ação
em favor da vida e da liberdade; segundo, o testemunho
de João Batista, que o apresenta como salvador; terceiro, as Escrituras, que anunciavam o que Jesus agora
realiza. Não adianta nada uma comunidade dizer que tem fé e repetir as palavras
da Bíblia; é necessário que as ações dessa comunidade sejam continuação da ação
de Jesus, confirmando a própria fé. (BPa)
“Quando encontraram Jesus no outro lado do lago,
perguntaram: “Rabi, quando chegaste aqui?” Jesus respondeu:
– Eu garanto a vocês: vocês estão me procurando,
não porque viram os sinais, mas porque comeram os pães e ficaram satisfeitos. Não
trabalhem pelo alimento que se estraga; trabalhem pelo alimento que dura para a
vida eterna. É este alimento que o Filho do Homem dará a vocês, porque foi ele quem
Deus Pai marcou com seu selo.
Então eles perguntaram:
– O que é que devemos fazer para realizar as obras
de Deus?
Jesus respondeu:
– A obra de Deus é que vocês acreditem naquele
que ele enviou.
Eles perguntaram:
– Que sinal realizas para que possamos ver e acreditar
em ti? Qual é a tua obra? Nossos pais comeram o maná no deserto, como diz a Escritura:
‘Ele deu-lhes um pão que veio do céu’.
Jesus respondeu:
– Eu garanto a vocês: Moisés não deu para vocês
o pão que veio do céu. É o meu Pai quem dá para vocês o verdadeiro pão que vem do
céu, porque o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá vida ao mundo.
Então eles pediram:
– Senhor, dá-nos sempre desse pão.1
Jesus disse:
– Eu sou2 o pão da vida. Quem vem a
mim não terá mais fome, e quem acredita em mim nunca mais terá sede.3
Eu já disse: vocês me viram e não acreditaram. Todos aqueles que o Pai me dá, virão
a mim. E eu nunca rejeitarei aquele que vem a mim4, pois eu desci do
céu, não para fazer a minha própria vontade, e sim para fazer a vontade daquele
que me enviou. E a vontade daquele que me enviou é esta: que eu não perca nenhum
daqueles que ele me deu, mas que eu os ressuscite no último dia. Esta é a vontade
do meu Pai: que todo homem que vê o Filho e nele acredita, tenha a vida eterna,
e eu o ressuscitarei no último dia.
As autoridades dos judeus começaram a criticar,
porque Jesus tinha dito: “Eu sou o pão que desceu do céu.” E comentavam:
– Esse Jesus não é o filho de José? Nós conhecemos
o pai e a mãe dele. Como é que ele diz que desceu do céu?
Jesus respondeu:
– Parem de criticar. Ninguém pode vir a mim se
o Pai que me enviou não o atrai, e eu o ressuscitarei no último dia. Está escrito
nos Profetas: ‘Todos os homens serão instruídos por Deus’. Todo aquele que escuta
o Pai e recebe sua instrução vem a mim. Não que alguém já tenha visto o Pai. O único
que viu o Pai é aquele que vem de Deus. Eu garanto a vocês: quem acredita possui
a vida eterna. Eu sou o pão da vida. Os pais de vocês comeram o maná no deserto
e, no entanto, morreram.5 Eis aqui o pão que desceu do céu: quem dele
comer nunca morrerá.6 Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Quem come
deste pão viverá para sempre7. E o pão que eu vou dar é a minha própria
carne, para que o mundo tenha a vida.8
As autoridades dos judeus começaram a discutir
entre si:
– Como pode esse homem dar-nos a sua carne para
comer?
Jesus respondeu:
– Eu garanto a vocês: se vocês não comem a carne
do Filho do Homem e não bebem o seu sangue, não terão a vida em vocês. Quem come
a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último
dia.9 Porque a minha carne é verdadeira comida e o meu sangue é verdadeira
bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue vive em mim e eu vivo nele.
E como o Pai, que vive, me enviou e eu vivo pelo Pai, assim, aquele que me receber
como alimento viverá por mim.10 Este é o pão que desceu do céu. Não é
como o pão que os pais de vocês comeram e depois morreram. Quem come deste pão viverá
para sempre.
Jesus disse essas coisas quando ensinava na sinagoga
de Cafarnaum.11
Depois que ouviram essas coisas, muitos discípulos
de Jesus disseram:
– Esse modo de falar é duro demais. Quem pode
continuar ouvindo isso?
Jesus sabia que seus discípulos estavam criticando
o que ele tinha dito. Então lhes perguntou:
– Isso escandaliza vocês? Imaginem então se vocês
virem o Filho do Homem subir para o lugar onde estava antes! O Espírito é que dá
a vida, a carne não serve para nada. As palavras que eu disse a vocês são espírito
e vida.” 12
(Jo 6,25-63 – BPa)
1: A multidão procura Jesus, desejando continuar
na situação de abundância, isto é, governada por um líder político que decide e
providencia tudo, sem exigir esforço. Jesus mostra que essa não é a solução; é preciso
buscar a vida plena, mas isso exige o empenho do homem. Além do alimento que sustenta
a vida material, é necessária a adesão pessoal a Jesus para que essa vida se torne
definitiva.
Pedindo um milagre como o do maná do deserto,
a multidão impõe condições para aceitar Jesus. Mas o desejo da multidão fica sem
efeito, se ela não se compromete com Jesus, o pão da vida que dura para sempre.
(BPa)
2: Primeiro de sete (número que indica a totalidade)
fórmulas pelas quais Jesus define a si mesmo. Ele é: o pão verdadeiro (6,35.48.51),
a luz verdadeira (8,12), a porta (10,7.9), o bom pastor (10,11.14), a ressurreição
(11,25), o caminho (14,6), a verdadeira vinha (15,1.5). (BJ)
3: Enuncia e explica uma tese. Compare-se com
o que diz a Sabedoria: “Quem me come terá mais fome, quem me bebe terá mais sede”
(Eclo 24,21). Na raiz o homem tem fome e sede de vida. Comer e beber visam à vida,
são necessidades vitais. Tal desejo sublima-se na ânsia de vida sem fim. Somente
Jesus satisfaz essa ânsia. A articulação comida e bebida poderia indicar uma reminiscência
eucarística; também pode ser devida ao paralelo tão sugestivo desta seção com o
diálogo com a samaritana (no qual também havia bebida e comida). Vir a ele e crer
nele são equivalentes. (BPe)
4: Viram o milagre, não o penetraram como sinal,
não acreditaram na pessoa de Jesus. É o olhar superficial que não penetra na realidade.
A este se opõe a comunidade dos fiéis que Jesus recebe como dom do Pai. O Pai tem
a iniciativa: envia seu Filho, recomenda-o aos que creem, designa-lhe uma missão
salvadora. “Lançar fora” pode ser reminiscência da expulsão do paraíso (Gn 3); também
poderia aludir polemicamente à prática de excomungar da sinagoga (cf. Jo 9,22).
(BPe)
“Vir a Jesus” equivale a crer. (BJ)
5: E morreram lá no deserto, sem chegar à terra
prometida (Nm 914,21-23; SI 95, 7-9). (BPe)
6: O uso do pão ou do alimento em sentido figurado
é conhecido na Escritura. Os profetas o aplicam à palavra de Deus: o citado Am 8,11;
de modo especial Is 55, 1-11, que soa quase como paralelo do texto que comentamos.
Os sapienciais o aplicam à sabedoria ou sensatez: Pr 9,1-6; Eclo 15,3; 24,18.21-
22. No Pentateuco, é fundamental Dt 8,3 e por contraste Gn 2-3 sobre a árvore da
vida.
Do estilo homilético podemos mencionar (segundo
o narrador, Jesus prega numa sinagoga): a citação da Escritura como tema (v. 31),
o comentário e seus elementos, comer-pão-céu, uma citação de profetas (v. 45), conclusão
repetindo o tema. (BPe)
7: Retoma Gn 3,22: “...não coma dele e viva para
sempre”. Por seu ensinamento, Cristo-sabedoria nos dá de novo acesso à árvore da
vida, da qual Adão fora privado (Pr 3,18). Nós não seremos mais expulsos do paraíso
(6,37; cf. Gn 3,23). (BJ)
8: O versículo 51 (última frase do parágrafo),
com suas três peças concatenadas, serve de eixo para unir o discurso sobre o pão
vivo com a explicação eucarística. Repetindo a frase programática, passa à nova
seção, de tema eucarístico, marcada pela palavra “carne”, repetida seis vezes (cf.
1,14). A relação do milagre dos pães com a eucaristia é evidente nos quatro evangelhos.
A explanação presente tem importância especial porque João não narra a instituição
da eucaristia; supre-a com essas palavras que esclarecem o sentido dela. “Dar a”
alude à eucaristia; “dar por”, ao sacrifício. Desse modo o versículo 51 sustenta-se
numa síntese teológica; descida do céu, dom sacrifical na cruz, vida do ressuscitado.
(BPe)
9: A objeção e mal-entendido responde Jesus afirmando
a necessidade da eucaristia para conseguir a vida eterna. Afirmação e não raciocínio,
que a fé capta e aceita. Jesus se entrega como alimento dessa vida participada do
Pai, que agora ele comunica aos fiéis. Porém, “comer e beber” não são atos puramente
mentais, mas a eucaristia é “verdadeira comida e bebida”. Realismo sensível do sacramento.
(BPe)
10: A Eucaristia comunica aos fiéis a vida que
o Filho recebe do Pai. (BJ)
Esta vida já está presente naquele que crê e come,
mas alcançará sua plenitude na ressurreição futura. A fórmula “eu nele e ele em
mim” procura expressar, com mais força do que usando a preposição “com”, a união
íntima e permanente. Explica-o e completa-o a fórmula seguinte “viver por”. Aduzir
como modelo e exemplo de dita união do Filho com o Pai é o máximo que se pode dizer.
É claro que aqui se coloca a questão vital para o homem. (BPe)
11: A vida definitiva se encontra justamente na
condição humana de Jesus (carne): Jesus é o Filho de Deus que se encarnou para dar
vida aos homens, isto é, para viver em favor dos homens. A vida definitiva começa
quando os homens, comprometendo-se com Jesus, aceitam a própria condição humana
e vivem em favor dos outros. E Jesus dá um passo além: ele vai oferecer sua própria
vida (carne e sangue) em favor dos homens. Por isso, o compromisso com Jesus exige
que também o fiel esteja disposto a dar a própria vida em favor dos outros.
A Eucaristia é o sacramento que manifesta eficazmente
na comunidade esse compromisso com a encarnação e a morte de Jesus. (BPa)
12: Age com uma semelhança de proporção. A carne,
ainda que orgânica, sem o princípio vital do alento ou espírito, está morta e não
percebe. De modo semelhante o homem carnal se encerra em um horizonte puramente
humano, e não percebe mais além. Somente o princípio vital do Espírito eleva a uma
vida superior com horizonte novo. O dom do Espírito sucede à ascensão, também em
João (7,38-39; 20,22). Veja-se o paralelo no diálogo com Nicodemos (3,13). (BPe)
“– O mundo não pode detestar-vos; a mim detesta,
pois lhe jogo na cara que suas ações são más.”
(Jo 7,7 – BPe)
“Disse, então, Jesus aos judeus que nele haviam
crido:
“Se permanecerdes na minha palavra,
sereis verdadeiramente meus discípulos
e conhecereis a verdade,1
e a verdade vos libertará.”2
(Jo 8,31-32 – BJ)
1: A verdade é a expressão da vontade de Deus
a respeito do homem, tal qual nos foi transmitida por Cristo (8,40.45; 17,17). Nós
a “conhecemos” no sentido (semítico) que ela habita em nós (2Jo 1-2), como um princípio
de vida moral: “caminhamos” (= vivemos) segundo suas diretivas (3Jo 3-4; SI 86,1
1), “fazemos a verdade” (3,21; 1Jo 1,6; cf. Tb 4,6), isto é, agimos em conformidade
com aquilo que ela exige de nós. Ela se opõe portanto ao “mundo” (1,9+) como uma
espécie de meio ético: aqueles que pertencem ao “mundo” só podem odiá-la (15,19;
17,14-16), aqueles que são “da verdade” obedecem à mensagem de amor que Cristo nos
transmitiu da parte de Deus (18,37; 1Jo 3,18-19). Eles são santificados pela verdade
como também pela Palavra de Cristo (17,17; 15,3). Uma vez que essa Verdade nos é
dada por Cristo, este pode afirmar que ele é a Verdade que nos conduz ao Pai (14,6+),
assim como, depois de sua volta para junto do Pai , é o Espírito que, conduzindo-nos
em toda a verdade ( 1 6,1 3), será a Verdade (1Jo 5,6) ou o Espírito de verdade
(14,17+). (BJ)
2: A verdade que liberta é aceitar a vida nova
trazida por Jesus, que relativiza tudo aquilo que antes parecia absoluto: riqueza,
poder, ideias, estruturas. A liberdade só é possível quando se rompe com uma ordem
injusta, que impede a experiência do amor de Deus através do amor ao homem. (BPa)
“Jesus disse:
– Vim a este mundo para instaurar um processo,
para que os cegos vejam e os que veem1 fiquem cegos.”
(Jo 9,39 – BPe)
1: Os autossuficientes, que se fiam em suas próprias
luzes (cf. vv. 24.29.34), em oposição aos humildes, dos quais o cego é o símbolo
(cf. Dt 29,3; Is 6,9s; Jr 5,21; Ez 12,2). (BJ)
“Jesus lhe respondeu:
– Eu sou a ressureição e a vida. Quem crê em mim,
ainda que morra, viverá; e quem vive e crê em mim, não morrerá para sempre. Crês
nisto?1
(Jo 11,25 – BPe)
1: Jesus se apresenta como a ressurreição e a
vida, mostrando que a morte é apenas uma necessidade física. Para a fé cristã a
vida não é interrompida com a morte, mas caminha para a sua plenitude. A vida plena
da ressurreição já está presente naqueles que pertencem à comunidade de Jesus. (BPa)
“Jesus respondeu para eles, dizendo:
– Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser
glorificado. Eu garanto a vocês: se o grão de trigo não cai na terra e não morre,
fica sozinho. Mas se morre, produz muito fruto. Quem tem apego à sua vida, vai perdê-la;
quem despreza a sua vida neste mundo, vai conservá-la para a vida eterna. Se alguém
quer servir a mim, que me siga. E onde eu estiver1, aí também estará
o meu servo. Se alguém serve a mim, o Pai o honrará. Agora estou muito perturbado.
E o que vou dizer? Pai, livra-me desta hora? Mas foi precisamente para esta hora
que eu vim. Pai, manifesta a glória do teu nome!”
(Jo 12,23-28a)
1: Na glória do Pai (cf. 14,3; 17,24). (BJ)
“Sabendo Jesus que chegava a hora de passar deste
mundo ao Pai, depois de ter amado os seus do mundo, amou-os até o extremo.”
(Jo 13,1b – BPe)
“Eu vos dou um mandamento novo: Amai-vos uns aos
outros, como eu vos amei: amai-vos assim uns aos outros. Nisso conhecerão todos
que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros.”1
(Jo 13,34-352 – BPe)
1: O mandamento novo supera todos os outros mandamentos.
Deus e o homem são inseparáveis. E é somente amando ao homem que amamos a Deus.
Em Jesus, Deus se fez presente no homem, tornando-o intocável. Tal mandamento novo
gera uma comunidade, que oferece uma alternativa de vida digna e liberdade perante
a morte e a opressão. (BPa)
2: Cf. 15,9-12.
“— Agora credes?
Vede: Chega a hora, e já chegou,
em que vos dispersareis cada qual para seu lado,
e me deixareis sozinho.
Mas eu não estou só, pois o Pai está comigo.
Eu vos disse isso para que tenhais paz graças
a mim.
No mundo passareis tribulações;
mas tende ânimo, pois eu venci o mundo.”
(Jo 16,32-33 – BPe)
“Depois, Jesus levantou os olhos ao céu e disse:
Pai, chegou a hora:
dá glória ao teu Filho, para que o teu Filho te
dê glória;
Pois lhe deste autoridade sobre todos os homens,
para que ele dê vida eterna aos que lhe confiaste.
isto consiste a vida eterna:
em conhecer a ti, o único Deus verdadeiro,
e ao teu enviado, Jesus, o Messias.
Eu te dei glória na terra,
cumprindo a tarefa que me encarregaste fazer.
Agora tu, Pai, dá-me glória junto a ti,
a glória que eu tinha junto a ti, antes que houvesse
mundo.1
Manifestei o teu nome aos homens tirados do mundo
e que me confiaste:
eram teus e os confiaste a mim, e cumpriram tuas
palavras.
Agora compreendem que tudo o que me confiaste
procede de ti.
As palavras que tu me comunicaste, eu as comuniquei;
eles as receberam e compreenderam realmente
que vim de tua parte2,
e creram que me enviaste.
Rogo por eles; não rogo pelo mundo,
mas pelos que me confiaste, pois são teus.
Tudo o que é meu é teu, e o que é teu é meu:
neles se revela a minha glória.
Já não estou no mundo, enquanto eles estão no
mundo;
eu vou para ti, Pai santo;
guarda-os no teu nome, que me deste,
para que sejam um como nós.
Enquanto estava com eles, eu os guardava no teu
nome,
aquele que me deste; eu os guardei, e nenhum deles
se perdeu;
exceto o destinado à perdição,
para cumprimento da Escritura.
Agora vou para ti; e ainda no mundo digo isso,
para que possuam minha alegria completa.
Eu lhes comuniquei tua palavra, e o mundo os odiou,
porque não são do mundo, como também eu não sou
do mundo.
Não peço que os tires do mundo,
mas que os livres do Maligno.
Não são do mundo, como também eu não sou do mundo.
Consagra-os com a verdade: tua palavra é verdade.
Como tu me enviaste ao mundo, eu os enviei ao
mundo.
Por eles me consagro, para que fiquem consagrados
com a verdade.
Não rogo somente por eles, mas também
pelos que crerão em mim por meio de suas palavras:
Que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim
e eu em ti;
que também eles sejam um em nós,
para que o mundo creia que tu me enviaste.
Eu lhes dei a glória que tu me deste,
para que sejam um, como somos nós.
Eu neles e tu em mim, para que sejam plenamente
um;
para que o mundo conheça que tu me enviaste
e os amaste, como me amaste.
Pai, os que me confiaste quero que estejam comigo
onde eu estou; para que contemplem minha glória;
a glória que me deste,
porque me amaste antes da criação do mundo.
Pai justo, o mundo não te conheceu; eu te conheci,
e estes conheceram que tu me enviaste:
Dei-lhes a conhecer teu nome e o darei a conhecer,
para que o amor que tiveste por mim esteja neles,
e eu neles.”
(Jo 17 – BPe)
1: A glória que Jesus possuía, em sua preexistência
divina ou a glória que o Pai lhe reserva, desde toda a eternidade (1,14+). (BJ)
A vida eterna consiste em comprometer-se com o
verdadeiro Deus e o verdadeiro homem, que se manifestaram na vida e ação de Jesus.
O Deus verdadeiro é o Pai que ama os homens, a ponto de entregar seu Filho até à
morte, para dar vida. Todo deus que não dá vida ao homem é falso, é ídolo. O homem
verdadeiro é aquele que se abre para se tornar filho do Deus que dá vida e para
ser irmão dos outros homens, dando a vida por eles, como Jesus fez. Todo homem que
se fecha para Deus e para os irmãos é um falso homem. (BPa)
2: Outra tradução: “eles verdadeiramente as acolheram,
porque saí de ti”. (BJ)
“– Quem está a favor da verdade escuta minha voz.”
(Jo 18,37g – BPe)
“Jesus realizou diante dos discípulos muitos outros
sinais que não estão escritos neste livro. Estes sinais foram escritos para que
vocês acreditem que Jesus é o Messias, o Filho de Deus. E para que, acreditando,
vocês tenham a vida em seu nome.
Este é o discípulo que deu testemunho dessas coisas
e que as escreveu. E nós sabemos1 que o seu testemunho é verdadeiro.
Jesus fez ainda muitas outras coisas. Se fossem
escritas uma por uma, penso que não caberiam no mundo os livros que seriam escritos.”
(Jo 20,30-31. 21,24-25 – BPa)
1: Talvez fale aqui de um grupo de discípulos.
(BJ)