terça-feira, 29 de dezembro de 2015

As Memórias do Livro: romance sobre o manuscrito de Sarajevo – Geraldine Brooks

Editora: Ediouro
ISBN: 978-85-0002-332-3
Tradução: Marcos Malvezzi Leal
Opinião: ★☆☆☆☆
Páginas: 384
Sinopse: Anna Heath, uma australiana especialista em livros raros, acaba de ser convocada para a missão de sua vida: restaurar e analisar a história por trás da famosa Hagadá de sarajevo, resgatada após um bombardeio sérvio durante a guerra da Bósnia. Uma obra de beleza e valor imensuráveis, o livro é um dos primeiros volumes judaicos a conter ilustrações. Quando Hanna descobre uma série de minúsculos elementos no interior do livro – o fragmento da asa de um inseto, manchas de vinho, cristais de sal e um cabelo branco –, começa a desvendar os mistérios por trás daquelas páginas desde sua criação até os dias atuais, revelando um passado de exílio, coragem, sofrimento e redenção. ao mesmo tempo em que Hanna desvenda as histórias por trás da Hagadá, ela reúne a coragem que tanto necessitava para revisitar os fantasmas de seu passado e perceber que suas paixões também podem estar muito além das páginas dos velhos e fascinantes volumes aos quais dedicou toda sua vida até então.
Inspirado em uma história real, As Memórias do Livro é um romance composto por duas tramas paralelas: uma rica e emocionante recriação histórica que vai desde o século XV até a segunda Guerra Mundial, e uma cativante trama contemporânea, que combina as artimanhas e a ambição dos bastidores do mundo acadêmico com uma história emocionante sobre família, afeto e a eterna busca pelo amor.
As Memórias do Livro é uma narrativa vívida e poderosa sobre a paixão pelos livros e a infindável luta por sobrevivência e liberdade.


“No lugar onde se queimam livros, no fim se queimam homens.” (Heinrich Heine)


“Anos atrás, testemunhamos o Líbano se despedaçar e dizíamos: “Assim é o Oriente Médio, essa gente é primitiva”. Depois vimos Drubrovnik em chamas e dissemos: “Nós somos diferentes em Sarajevo”. Era o que todos pensávamos. Como poderíamos ter uma guerra étnica aqui, nesta cidade, onde cada pessoa é produto de um casamento misto? Como ter uma guerra religiosa numa cidade onde ninguém frequenta a igreja? Para mim, a mesquita é como um museu, um local curioso para você visitar com seus avós. Pitoresco, entende? Uma vez por ano, talvez, íamos ver o zikr, onde os dervixes dançam, e era como um teatro. Como vocês dizem? Uma pantomina. Meu melhor amigo, Danilo, é judeu, e nunca sequer foi circuncidado. Não há nenhum mohel aqui; era preciso ir ao barbeiro para fazer a circuncisão. (...) Nós não acreditávamos na guerra. Nosso líder dizia: ”São necessários dois lados para haver uma guerra, e nós não vamos lutar.” Não aqui, não em nossa preciosa Sarajevo, nossa idealística cidade olímpica. Éramos inteligentes demais, cínicos demais para uma guerra. Claro que você não precisa ser estúpido e primitivo para ter uma morte estúpida e primitiva. Agora, nós sabemos disso. Mas naquela época, naqueles primeiros dias, todos fazíamos coisas um pouco loucas. Garotos, adolescentes, saíam em demonstrações contra a guerra, com cartazes e música, como se estivessem indo a um piquenique. Mesmo depois de uma dúzia de tiros neles, nós ainda não acreditávamos. Esperávamos que a comunidade internacional pusesse um fim naquilo. Eu acreditava nisso. Preocupava-me que pudesse durar alguns dias, e nada mais, enquanto o mundo – como se diz? – tomaria uma providência.”


“Ele saiu da cama, deu um passo em minha direção, segurou meu rosto entre as mãos e se aproximou tanto de mim, que seus traços de zanga pareciam até fora de foco.
– Você – ele disse; e a voz mais parecia um sussurro contido. – Você é que é consumida por baboseiras.
Aquela súbita ferocidade me assustou. Eu me afastei.
– Você – ele prosseguiu, agarrando meu punho. – Todos vocês, do mundo seguro, com seus air bags, e suas embalagens hermeticamente fechadas e suas dietas livres de gordura. Vocês é que são os supersticiosos. Vocês se convencem de que podem tapear a morte, e se sentem absolutamente ofendidos quando descobrem que não podem. Vocês ficam sentados em seus apartamentos confortáveis e assistem à guerra, e nos veem sangrando, pela televisão. E pensam: “Que horror!”, e depois se levantam e tomam outra xícara de café expresso. (...) Coisas ruins acontecem. Algumas coisas muito ruins aconteceram comigo. E eu não sou diferente de mil outros pais nesta cidade cujos filhos sofrem. Eu convivo com isso. Nem toda história tem um final feliz. Cresça, Hanna, e aceite isso.”


“Quanto à minha assim chamada família disfuncional, é verdade que eu herdei uma crença básica, para ficar alerta: Não confie em ninguém para sustento emocional. Encontre alguma coisa para fazer que a absorva – que a absorva a ponto de você não ter tempo para entrar no esquema de “Oh, pobre de mim”. Minha mãe ama o trabalho dela, e eu amo o meu. Portanto, o fato de nós não amarmos uma à outra... bem, eu quase nunca penso nisso.”


“Se uma pergunta tem uma resposta, eu não suporto não sabê-la.”

Um comentário:

Suzana Martins disse...

Esse livro é incrível, incrível demais!
Uma história maravilhosa!
Fiquei com vontade de ler novamente! rs

Abraços