Editora: Boitempo
ISBN:
978-85-7559-578-7
Introdução: Tariq
Ali
Tradução: Álvaro
Pina e Ivana Jinkings; Caco Ishak (introdução)
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 57
Sinopse: Ver Parte I
“Todas as relações de propriedade têm passado
por modificações constantes em consequência das contínuas transformações das
condições históricas.
A Revolução Francesa, por exemplo, aboliu a
propriedade feudal em proveito da propriedade burguesa.
O que caracteriza o comunismo não é a
abolição da propriedade em geral, mas a abolição da propriedade burguesa.
Mas a moderna propriedade privada burguesa é
a última e mais perfeita expressão do modo de produção e de apropriação baseado
nos antagonismos de classes, na exploração de uns pelos outros.
Nesse sentido, os comunistas podem resumir
sua teoria numa única expressão: supressão da propriedade privada.
Nós, comunistas, temos sido censurados por
querer abolir a propriedade pessoalmente adquirida, fruto do trabalho do
indivíduo — propriedade que dizem ser a base de toda liberdade, de toda
atividade, de toda independência individual.
Propriedade pessoal, fruto do trabalho e do
mérito! Falais da propriedade do pequeno burguês, do pequeno camponês, forma de
propriedade anterior à propriedade burguesa? Não precisamos aboli-la, porque o
progresso da indústria já a aboliu e continua abolindo-a diariamente. Ou
porventura falais da moderna propriedade privada, da propriedade burguesa?
Mas o trabalho do proletário, o trabalho
assalariado cria propriedade para o proletário? De modo algum. Cria o capital,
isto é, a propriedade que explora o trabalho assalariado e que só pode aumentar
sob a condição de gerar novo trabalho assalariado, para voltar a explorá-lo. Em
sua forma atual, a propriedade se move entre dois termos antagônicos: capital e
trabalho. Examinemos os termos desse antagonismo.
Ser capitalista significa ocupar não somente
uma posição pessoal, mas também uma posição social na produção. O capital é um
produto coletivo e só pode ser posto em movimento pelos esforços combinados de
muitos membros da sociedade, em última instância pelos esforços combinados de
todos os membros da sociedade.
O capital não é, portanto, um poder pessoal:
é um poder social.
Assim, quando o capital é transformado em
propriedade comum, pertencente a todos os membros da sociedade, não é uma
propriedade pessoal que se transforma em propriedade social. O que se
transformou foi o caráter social da propriedade. Esta perde seu caráter de
classe.
Vejamos agora o trabalho assalariado.
O preço médio que se paga pelo trabalho
assalariado é o mínimo de salário, ou seja, a soma dos meios de subsistência
necessários para que o operário viva como operário. Por conseguinte, o que o
operário recebe com o seu trabalho é o estritamente necessário para a mera
conservação e reprodução de sua existência. Não pretendemos de modo algum
abolir essa apropriação pessoal dos produtos do trabalho, indispensável à
manutenção e à reprodução da vida humana — uma apropriação que não deixa nenhum
lucro líquido que confira poder sobre o trabalho alheio. Queremos apenas
suprimir o caráter miserável desta apropriação, que faz com que o operário só
viva para aumentar o capital e só viva na medida em que o exigem os interesses
da classe dominante.
Na sociedade burguesa o trabalho vivo é
sempre um meio de aumentar o trabalho acumulado. Na sociedade comunista o
trabalho acumulado é um meio de ampliar, enriquecer e promover a existência dos
trabalhadores.
Na sociedade burguesa o passado domina o
presente; na sociedade comunista é o presente que domina o passado. Na
sociedade burguesa o capital é independente e pessoal, ao passo que o indivíduo
que trabalha é dependente e impessoal.
É a supressão dessa situação que a burguesia chama
de supressão da individualidade e da liberdade. E com razão. Porque se trata
efetivamente de abolir a individualidade burguesa, a independência burguesa, a
liberdade burguesa.
Por liberdade, nas atuais relações burguesas
de produção, compreende-se a liberdade de comércio, a liberdade de comprar e
vender.
Mas, se o tráfico desaparece, desaparecerá
também a liberdade de traficar. Toda a fraseologia sobre o livre comércio, bem
como todas as bravatas de nossa burguesia sobre a liberdade, só têm sentido quando
se referem ao comércio constrangido e ao burguês oprimido da Idade Média;
nenhum sentido têm quando se trata da supressão comunista do tráfico, das
relações burguesas de produção e da própria burguesia.
Vós vos horrorizai porque queremos suprimir a
propriedade privada. Mas em vossa sociedade a propriedade privada está
suprimida para nove décimos de seus membros. E é precisamente porque não existe
para estes nove décimos que ela existe para vós. Censurai-nos, portanto, por
querermos abolir uma forma de propriedade que pressupõe como condição
necessária que a imensa maioria da sociedade não possua propriedade.
Numa palavra, censurai-nos por querermos
abolir a vossa propriedade. De fato, é isso que queremos.
A partir do momento em que o trabalho não
possa mais ser convertido em capital, em dinheiro, em renda da terra — numa
palavra, em poder social capaz de ser monopolizado —, isto é, a partir do
momento em que a propriedade individual não possa mais se converter em propriedade
burguesa, declarais que o indivíduo está suprimido.
Confessais, no entanto, que quando falais do
indivíduo, quereis referir-vos unicamente ao burguês, ao proprietário burguês.
E este indivíduo, sem dúvida, deve ser suprimido.
O comunismo não priva ninguém do poder de se
apropriar de sua parte dos produtos sociais; apenas suprime o poder de subjugar
o trabalho de outros por meio dessa apropriação.
Alega-se ainda que com a abolição da
propriedade privada toda a atividade cessaria, uma inércia geral apoderar-se-ia
do mundo.
Se isso fosse verdade, há muito que a
sociedade burguesa teria sucumbido à ociosidade, pois os que no regime burguês
trabalham não lucram e os que lucram não trabalham. Toda a objeção se reduz a
essa tautologia: não haverá mais trabalho assalariado quando não mais existir capital.
As objeções feitas ao modo comunista de
produção e de apropriação dos produtos materiais foram igualmente ampliadas à
produção e à apropriação dos produtos do trabalho intelectual. Assim como o
desaparecimento da propriedade de classe equivale, para o burguês, ao desaparecimento
de toda a produção, o desaparecimento da cultura de classe significa, para ele,
o desaparecimento de toda a cultura.
A cultura, cuja perda o burguês deplora, é
para a imensa maioria dos homens apenas um adestramento que os transforma em
máquinas.
Mas não discutais conosco aplicando à
abolição da propriedade burguesa o critério de vossas noções burguesas de
liberdade, cultura, direito etc. Vossas próprias ideias são produtos das
relações de produção e de propriedade burguesas, assim como o vosso direito não
passa da vontade de vossa classe erigida em lei, vontade cujo conteúdo é
determinado pelas condições materiais de vossa existência como classe.
Essa concepção interesseira, que vos leva a
transformar em leis eternas da natureza e da razão as relações sociais oriundas
do vosso modo de produção e de propriedade — relações transitórias que surgem e
desaparecem no curso da produção —, é por vós compartilhada com todas as
classes dominantes já desaparecidas. O que aceitais para a propriedade antiga,
o que aceitais para a propriedade feudal, já não podeis aceitar para a
propriedade burguesa. (...)
O palavreado burguês sobre a família e a
educação, sobre os doces laços que unem a criança aos pais, torna-se cada vez
mais repugnante à medida que a grande indústria destrói todos os laços
familiares dos proletários e transforma suas crianças em simples artigos de
comércio, em simples instrumentos de trabalho.
“Vós, comunistas, quereis introduzir a
comunidade das mulheres!”, grita-nos toda a burguesia em coro.
Para o burguês, a mulher nada mais é do que
um instrumento de produção. Ouvindo dizer que os instrumentos de produção serão
explorados em comum, conclui naturalmente que o destino de propriedade coletiva
caberá igualmente às mulheres. Não imagina que se trata precisamente de
arrancar a mulher de seu papel de simples instrumento de produção.
De resto, nada é mais ridículo que a virtuosa
indignação que os nossos burgueses, em relação à pretensa comunidade oficial
das mulheres que adotariam os comunistas. Os comunistas não precisam introduzir
a comunidade das mulheres. Ela quase sempre existiu.
Nossos burgueses, não contentes em ter à sua
disposição as mulheres e as filhas dos proletários, sem falar da prostituição
oficial, têm singular prazer em seduzir as esposas uns dos outros.
O casamento burguês é, na realidade, a
comunidade das mulheres casadas. No máximo, poderiam acusar os comunistas de
querer substituir uma comunidade de mulheres, hipócrita e dissimulada, por outra
que seria franca e oficial. De resto, é evidente que com a abolição das atuais
relações de produção desaparecerá também a comunidade das mulheres que deriva
dessas relações, ou seja, a prostituição oficial e não-oficial.
Os comunistas também são acusados de querer
abolir a pátria, a nacionalidade.
Os operários não têm pátria. Não se lhes pode
tirar aquilo que não possuem. Como, porém, o proletariado tem por objetivo
conquistar o poder político e elevar-se a classe dirigente da nação, tornar-se
ele próprio nação, ele é, nessa medida, nacional, mas de modo nenhum no sentido
burguês da palavra.
Os isolamentos e os antagonismos nacionais
entre os povos desaparecem cada vez mais com o desenvolvimento da burguesia,
com a liberdade de comércio, com o mercado mundial, com a uniformidade da
produção industrial e com as condições de existência a ela correspondentes.
A supremacia do proletariado fará com que
desapareçam ainda mais depressa. A ação comum do proletariado, pelo menos nos
países civilizados, é uma das primeiras condições para sua emancipação.
À medida que for suprimida a exploração do
homem pelo homem será suprimida a exploração de uma nação por outra.
Quando os antagonismos de classes, no
interior das nações, tiverem desaparecido, desaparecerá a hostilidade entre as
próprias nações.
As acusações feitas aos comunistas em nome da
religião, da filosofia e da ideologia em geral não merecem um exame
aprofundado.
Será preciso grande inteligência para
compreender que, ao mudarem as relações de vida dos homens, as suas relações
sociais, a sua existência social, mudam também as suas representações, as suas concepções
e conceitos; numa palavra, muda a sua consciência?
Que demonstra a história das ideias senão que
a produção intelectual se transforma com a produção material? As ideias
dominantes de uma época sempre foram as ideias da classe dominante.
Quando se fala de ideias que revolucionam uma
sociedade inteira, isto quer dizer que no seio da velha sociedade se formaram
os elementos de uma sociedade nova e que a dissolução das velhas ideias acompanha
a dissolução das antigas condições de existência.
Quando o mundo antigo declinava, as antigas
religiões foram vencidas pela religião cristã; quando, no século XVIII, as ideias
cristãs cederam lugar às ideias iluministas, a sociedade feudal travava sua
batalha decisiva contra a burguesia então revolucionária. As ideias de
liberdade religiosa e de consciência não fizeram mais que proclamar o império
da livre concorrência no domínio do conhecimento.
“Mas” — dirão — “as ideias religiosas,
morais, filosóficas, políticas, jurídicas etc. modificaram-se no curso do
desenvolvimento histórico. A religião, a moral, a filosofia, a política, o
direito sobreviveram sempre a essas transformações.
“Além disso, há verdades eternas, como a
liberdade, a justiça etc., que são comuns a todos os regimes sociais. Mas o
comunismo quer abolir estas verdades eternas, quer abolir a religião e a moral,
em lugar de dar uma nova forma, e isso contradiz todos os desenvolvimentos históricos
anteriores”.
A que se reduz essa acusação? A história de
toda a sociedade até nossos dias moveu-se em antagonismos de classes,
antagonismos que se têm revestido de formas diferentes nas diferentes épocas.
Mas qualquer que tenha sido a forma assumida,
a exploração de uma parte da sociedade por outra é um fato comum a todos os
séculos anteriores. Portanto, não é de espantar que a consciência social de
todos os séculos, apesar de toda sua variedade e diversidade, se tenha movido sempre
sob certas formas comuns, formas de consciência que só se dissolverão
completamente com o desaparecimento total dos antagonismos de classes.
A revolução comunista é a ruptura mais
radical com as relações tradicionais de propriedade; não admira, portanto, que
no curso de seu desenvolvimento se rompa, do modo mais radical, com as ideias
tradicionais.
Mas deixemos de lado as objeções feitas pela
burguesia ao movimento comunista.
Vimos antes que a primeira fase da revolução
operária é a elevação do proletariado a classe dominante, a conquista da
democracia.
O proletariado utilizará sua supremacia
política para arrancar pouco a pouco todo o capital da burguesia, para
centralizar todos os instrumentos de produção nas mãos do Estado, isto é, do
proletariado organizado como classe dominante, e para aumentar o mais
rapidamente possível o total das forças produtivas.
Isso naturalmente só poderá ser realizado, a
princípio, por intervenções despóticas no direito de propriedade e nas relações
de produção burguesas, isto é, pela aplicação de medidas que, do ponto de vista
econômico, parecerão insuficientes e insustentáveis, mas que no desenrolar do
movimento ultrapassarão a si mesmas e serão indispensáveis para transformar
radicalmente todo o modo de produção.
Essas medidas, é claro, serão diferentes nos
diferentes países. Nos países mais adiantados, contudo, quase todas as
seguintes medidas poderão ser postas em prática:
1. Expropriação da propriedade fundiária e
emprego da renda da terra para despesas do Estado.
2. Imposto fortemente progressivo.
3. Abolição do direito de herança.
4. Confisco da propriedade de todos os
emigrados e rebeldes.
5. Centralização do crédito nas mãos do
Estado por meio de um banco nacional com capital do Estado e com o monopólio
exclusivo.
6. Centralização de todos os meios de
comunicação e transporte nas mãos do Estado.
7. Multiplicação das fábricas nacionais e dos
instrumentos de produção, arroteamento das terras incultas e melhoramento das
terras cultivadas, segundo um plano geral.
8. Unificação do trabalho obrigatório para
todos, organização de exércitos industriais, particularmente para a
agricultura.
9. Unificação dos trabalhos agrícola e
industrial; abolição gradual da distinção entre a cidade e o campo por meio de
uma distribuição mais igualitária da população pelo país.
10. Educação pública e gratuita a todas as
crianças; abolição do trabalho das crianças nas fábricas, tal como é praticado
hoje. Combinação da educação com a produção material etc.
Quando, no curso do desenvolvimento,
desaparecerem os antagonismos de classes e toda a produção for concentrada nas
mãos dos indivíduos associados, o poder público perderá seu caráter político. O
poder político é o poder organizado de uma classe para a opressão de outra.
Se o proletariado, em sua luta contra a
burguesia, se organiza forçosamente como classe, se por meio de uma revolução
se converte em classe dominante e como classe dominante destrói violentamente
as antigas relações de produção, destrói, juntamente com essas relações de
produção, as condições de existência dos antagonismos entre as classes, destrói
as classes em geral e, com isso, sua própria dominação como classe.
Em lugar da antiga sociedade burguesa, com
suas classes e antagonismos de classes, surge uma associação na qual o livre
desenvolvimento de cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos.”
“Em resumo, os comunistas apoiam em toda
parte qualquer movimento revolucionário contra a ordem social e política
existente.
Em todos estes movimentos colocam em
destaque, como questão fundamental, a questão da propriedade, qualquer que seja
a forma, mais ou menos desenvolvida, de que esta se revista.
Finalmente, os comunistas trabalham pela
união e pelo entendimento dos partidos democráticos de todos os países.
Os comunistas se recusam a dissimular suas
opiniões e seus fins.
Proclamam abertamente que seus objetivos só
podem ser alcançados pela derrubada violenta de toda a ordem social existente.
Que as classes dominantes tremam à ideia de uma revolução comunista! Nela os proletários
nada têm a perder a não ser os seus grilhões. Têm um mundo a ganhar.
PROLETÁRIOS DE TODOS OS PAÍSES, UNI-VOS!”
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