Editora: Ediouro
ISBN: 978-85-0002-554-9
Tradução: Fernando
Py
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 494
Sinopse: Ver primeiro
livro
“Pois a essa época eu pensava ainda que era
por meio das palavras que a gente revela aos outros a verdade.”
“Ah, os aristocratas, o Terror foi bastante
culpado de não ter degolado a todos. São todos crápulas sinistros, quando não
simplesmente sombrios idiotas.”
“– O amor? – dissera uma vez a sra.
Villeparisis em resposta a uma dama que a interrogara:
– Que pensa do amor?
– O amor? Faço-o muitas vezes, mas nunca falo
sobre ele.”
“Que me importa o frasco, desde que eu me
embriague?” (Augier)
“Cada um vê mais bonito o que vê a distância,
o que vê nos outros.”
“Não devemos passar por alto as agitações
provocadas pelos elementos de direita que, em vez de servir à ideia patriótica,
sonham em servir-se dela.”
“O príncipe – em suas embaixadas e como
ministro das Relações Exteriores – mantivera, por seu país, em vez de agora
para proveito próprio, dessas conversações em que se sabe, por antecipação, até
onde se deseja ir e o que não nos farão dizer. Não ignorava que, na linguagem
diplomática, conversar significa oferecer.”
“Há males cuja cura não se deve procurar
porque eles nos protegem contra outros mais graves.”
“Este Argencourt, bem-nascido mas
mal-educado, diplomata mais que medíocre, marido detestável e mulherengo,
velhaco feito nas comédias, é um desses homens incapazes de compreender, mas
bem capazes de destruir as coisas verdadeiramente grandes. (...) Infelizmente,
é por esse molde que é feita a maioria das pessoas deste mundo.”
“Subi e achei minha avó bem pior. Desde algum
tempo, sem bem saber do que sofria, ela se queixava da saúde. Na enfermidade é
que percebemos que não vivemos sós, mas acorrentados a uma criatura de outro
reino, cujos abismos nos separam, que não nos conhece e pelo qual nos é
impossível fazer-nos compreender: nosso corpo. Qualquer assaltante que
encontrássemos no caminho, talvez pudéssemos sensibilizá-lo em seu interesse
pessoal, senão pela nossa desgraça. Mas rogar piedade ao nosso corpo é
discursar diante de um polvo, para quem nossas palavras não podem ter mais
sentido que o rumor das águas, e com o qual nos aterrorizaríamos de ser
condenados a conviver.”
“Sendo a medicina um compêndio de erros
sucessivos e contraditórios dos médicos, recorrendo-se aos melhores dentre
estes corre-se o risco de solicitar uma verdade que será reconhecida como falsa
alguns anos depois. De modo que acreditar na medicina seria a maior loucura,
caso não acreditar em absoluto nela não fosse uma outra ainda maior, pois desse
amontoado de erros se desprenderam, ao longo dos anos, algumas verdades.”
“Tudo o que sabemos de grandioso nos vem dos
nervosos. Foram eles e não os outros que fundaram as religiões e compuseram as
obras-primas. O mundo jamais saberá tudo o que lhes deve, e principalmente o
que eles sofreram para lhe dar o que deram. Desfrutamos das finas músicas, dos
belos quadros, mil delicadezas, mas não sabemos o que essas obras custaram aos
que as inventaram, em insônias, choros, risos espasmódicos, urticárias, asmas,
epilepsias, numa angústia de morrer que é pior que tudo isso (...).”
“Bem dizemos que a hora da morte é incerta,
mas, quando dizemos isto, afiguramo-nos essa hora como situada num espaço vago
e longínquo, não imaginamos que ela tenha uma relação qualquer com o dia já
começado, e possa significar que a morte – ou sua primeira posse parcial de
nós, após a qual não nos larga mais – poderá ocorrer nessa mesma tarde, tão
pouco incerta, essa tarde em que o emprego de todas as horas está previamente
agendado.”
“A guerra é o mais insensato dos crimes, o
que importa é viver.”
“Não há nada como o desejo para impedir as
coisas que dizemos de terem alguma semelhança com o que nos vai pelo pensamento.”
“O que me dava pena era saber que quase todas
as casas eram habitadas por gente infeliz. Aqui, a mulher chorava sem parar
porque o marido a enganava. Ali, dava-se o contrário. Além, uma mãe
trabalhadora, moída de pancadas por um filho bêbado, procurava ocultar seus
sofrimentos aos olhos dos vizinhos. Uma metade inteira da humanidade chorava.”
“Os dias que precederam meu jantar com a Sra.
de Stermaria não foram deliciosos, mas insuportáveis. É que, em geral, quanto
mais curto o tempo que nos separa daquilo a que nos propusemos, mais longo
parece, pois a ele aplicamos medidas mais breves ou simplesmente porque
imaginamos medi-lo. O papado, dizem, conta por séculos, e talvez mesmo nem
pense em contar, pois seu objetivo está no infinito. Estando o meu apenas à
distância de três dias, eu contava por segundos, entregava-me a essas fantasias
que são começos de carícias, carícias que nos enraivece não poder fazer com que
as termine a própria mulher (precisamente essas carícias, à exclusão de todas
as outras). E em suma, se é certo que em geral a dificuldade de atingir o
objeto de um desejo contribui para aumentá-lo – a dificuldade, não a
impossibilidade, pois esta última o suprime –, no entanto, para um desejo
puramente físico, a certeza de que será realizado num momento próximo e
determinado não é menos estimulante que a incerteza; quase tanto como a dúvida
ansiosa, a ausência de dúvida torna intolerável a espera do prazer infalível
porque faz dessa espera uma realização inumerável e, devido à frequência das
representações antecipadas, divide o tempo em fatias tão miúdas que provocam
angústia.”
“É verdade que, a exemplo de certas afecções
nervosas cujas manifestações se atenuam na idade madura, tal esnobismo em geral
devia deixar de se traduzir de um modo tão hostil entre os que tinham sido
jovens tão insuportáveis. Uma vez passada a juventude, é raro que permaneçamos
confinados à insolência. Havíamos achado que só ela existia, e de súbito
descobrimos, por mais príncipe que sejamos, que há também a música, a
literatura, e até mesmo a deputação.”
“Um artista não tem necessidade de exprimir
diretamente seu pensamento em sua obra para que esta lhe reflita a qualidade;
pode-se dizer até que o louvor mais alto de Deus está na negação do ateu, que
acha a criação perfeita o bastante para prescindir de um criador.”