Editora: Cosac Naify
ISBN: 978-85-7503-473-6
Tradução: Rubens Figueiredo
Opinião: ★★★★☆
Páginas: 816
Sinopse: Liev
Tolstói escreveu Anna Kariênina entre 1873 e 1877, prestes a completar
45 anos. Depois de escrever o romance Guerra e paz, entre 1863 e 1869, dedicara-se aos afazeres agrícolas, além de fundar
escolas, elaborar e difundir teorias e técnicas pedagógicas polêmicas e estudar
o grego com afinco. Ao mesmo tempo, foi acumulando uma impressionante
quantidade de informações sobre o tsar Pedro, o Grande. Seu intuito era
escrever um romance sobre a época em que Pedro I foi o imperador da Rússia.
Após tentativas obstinadas, Tolstói desistiu do projeto.
Por outro lado, nutria a ideia de fazer um relato sobre uma mulher adúltera, da
alta sociedade. Durante um tempo, estes dois temas levaram vidas independentes
em seu pensamento. Quando a imaginação os uniu, Anna Kariênina começou a
nascer. Em janeiro de 1875, a revista Mensageiro russo publicou os
primeiros catorze capítulos de Anna Kariênina.
Tolstói distribuiu ao longo do livro os temas que o inquietavam,
discutidos pelos personagens - a guerra da Sérvia, a administração agrícola, o
regime da propriedade da terra, a relação com os trabalhadores, a decadência da
nobreza, a educação das crianças, o casamento, a religião, o serviço militar
compulsório, as teorias de Spencer, Lasalle, Darwin e Schopenhauer. Estruturado
em paralelismos, o livro se articula por meio de contrates - a cidade e o
campo; as duas capitais da Rússia (Moscou e São Petersburgo); a alta sociedade
e a vida dos mujiques; o intelectual e o homem prático, etc.
O tema é descentralizado a cada novo episódio. Os dois
principais personagens, Liévin e Anna, só se encontram uma vez, em toda a longa
narrativa. Mas nem por isso estão menos ligados, pois a situação de um
permanece constantemente referida à situação do outro. Anna viaja a Moscou para
tentar salvar o casamento em crise de seu irmão. Consegue ajudá-lo, mas acaba
pondo a perder o seu próprio, apaixonando-se por um aristocrático militar por
quem larga o marido e o filho pequeno. Liévin, um rico e jovem proprietário de
terras rurais, vive às voltas com problemas de conflitos de classe de seus
lavradores e questionamentos existenciais profundos.
Nesta tradução, Rubens Figueiredo busca preservar ao
máximo os traços do original russo. Frases longas foram mantidas em sua
integridade, assim como a frequente repetição das palavras. Além das notas de
rodapé, elaboradas pelo tradutor, este volume conta com uma árvore genealógica
dos principais núcleos familiares e uma lista completa de personagens, que
facilitarão muito a leitura deste grande clássico.
“Todas as famílias felizes se parecem, cada
família infeliz é infeliz à sua maneira.”
“– O consolo, como naquela prece de que
sempre gostei, está em que posso ser perdoado não pelos meus méritos, mas por
misericórdia.”
“– Mas meu irmão, as mulheres são a hélice em
torno da qual tudo gira.”
“– Voltou cedo (pra casa), patrão – disse
Agáfia Mikhálovna.
– Cansei, Agáfia Mikhálovna. Na casa dos
outros, é bom; mas na nossa casa é melhor.”
“– Ninguém está satisfeito com os bens que
possui, mas todos estão satisfeitos com a inteligência que têm – disse o
diplomata, citando o provérbio francês.”
“De fato, Kitty escondia da mãe seus novos
pontos de vista e sentimentos. Escondia não porque não respeitasse ou não
amasse sua mãe, mas sim porque era sua mãe.”
“Konstantin Liévin encarava o irmão como um
homem de enorme inteligência e cultura, um homem nobre, no sentido mais elevado
da palavra, e dotado da capacidade de agir em prol do bem comum. No entanto, no
fundo de sua alma, quanto mais envelhecia e quanto mais intimamente conhecia o
irmão, vinha-lhe ao pensamento, de modo cada vez mais frequente, que essa
capacidade de agir em prol do bem comum, da qual se sentia completamente
privado, talvez não fosse uma virtude, mas sim, ao contrário, a falta de alguma
coisa – não uma falta de gostos e de desejos bons, honrados e nobres, mas uma
falta de força vital, daquilo que chamam de coração, daquela aspiração que
obriga a pessoa a escolher, entre todos os inumeráveis caminhos que se
apresentam na vida, somente um e desejar apenas esse. Quanto mais conhecia o
irmão, mais notava que Serguei Ivánovitch e muitos outros que agiam em prol do
bem comum não eram levados pelo coração a esse amor ao bem comum, mas sim
concluíam por força da razão que era bom incumbir-se disso e apenas por esse
motivo o faziam.”
“– De que adianta discutir? Afinal, nunca uma
pessoa consegue convencer a outra.”
“– Por que Marie está de lilás, num
casamento? É o mesmo que usar preto – disse Korsúnkaia.
– Com a cor de seu rosto, essa é a única
salvação... – respondeu Drubiétskaia. – Eu me admiro que tenham feito o
casamento à noite. É coisa de comerciantes.
– É mais bonito. Eu também me casei ao
anoitecer – retrucou Korsúnkaia, e suspirou, ao lembrar como estava graciosa
naquele dia, como seu marido estava ridiculamente apaixonado e como agora tudo
era diferente.
– Dizem que quem é padrinho de casamento mais
de dez vezes não se casa; eu quis ser padrinho, agora, pela décima vez, para me
pôr a salvo, mas a vaga já estava ocupada – disse o conde Siniávin à bela
princesa Tchárskaia, que tinha pretensões quanto a ele.
Tchárskaia respondeu apenas com um sorriso.
Olhava para Kitty e pensava em como e quando estaria, ao lado do conde
Siniávin, na mesma posição de Kitty, e como ela, nesse momento, lembraria a ele
o seu gracejo de agora.”
“Só então, pela primeira vez, Liévin
compreendeu com clareza aquilo que não havia compreendido quando, após o
casamento, a conduzia para fora da igreja. Compreendeu que ela não era apenas
íntima dele, mas que agora ele não sabia onde ela terminava e ele começava.
Compreendeu-o graças à torturante sensação de desdobramento que experimentava
nesse minuto. Ofendeu-se, no primeiro instante, mas no mesmo segundo sentiu que
não podia ofender-se por causa de Kitty, pois ela era ele mesmo. Experimentou
no primeiro instante uma sensação parecida com a de um homem que de repente
recebe uma pancada pelas costas, volta-se com raiva e com desejo de vingança,
para enfrentar o culpado, mas verifica que ele próprio se machucou por
descuido, que não há contra quem ter raiva e que é preciso suportar a dor e
amenizá-la.”
“Podemos ficar sentados durante várias horas,
com as pernas dobradas na mesma posição, quando sabemos que nada nos impede de
mudar de posição; mas se sabemos que somos obrigados a ficar sentados desse
jeito, com as pernas dobradas, logo virão as câimbras, as pernas irão repuxar e
pressionar na direção em que queremos estendê-las”.
“Porém, como dizia para Kitty, quanto mais
ficava sem fazer nada, menos tempo lhe restava”.
“Para que se tome alguma decisão na vida
conjugal, é necessário ou uma discordância completa entre os cônjuges, ou uma
harmonia amorosa. Quando as relações entre os conjugues são indeterminadas, e
não há nem uma coisa nem outra, é impossível decidir qualquer questão.
Muitas famílias permanecem durante anos nas
antigas condições, odiosas para ambos os conjugues, só porque não há plena
discórdia nem plena harmonia.”
“O respeito foi inventado para encobrir o
lugar vazio onde devia estar o amor”.
“É horrível que não se possa arrancar o
passado pela raiz. É impossível arrancar, mas é possível silenciar a sua
memória. E vou silenciar.”
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