Editora: Terceiro Nome
ISBN: 978-85-8755-677-6
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 210
Sinopse: O título
foi sugerido por Frans Krajcberg, e reflete a proposta deste livro: mostrar
retratos de 138 artistas plásticos brasileiros, natos ou adotivos, de várias
gerações, fotografados por Juan Esteves em ambientes como suas casas, ateliês
ou galerias. Raramente conhecemos o artista que está por trás de uma obra de
arte, e este livro mostra seus olhares, seus gestos, sua expressão interior –
sua presença. São 153 imagens, pois alguns artistas foram fotografados mais de
uma vez, em anos diferentes. Juan Esteves iniciou este trabalho há cerca de vinte
anos, quando era fotógrafo na Folha de S. Paulo, e ao longo desses vinte anos
retratou representantes de diferentes gerações e tendências das artes plásticas
no Brasil. Mesmo com um recorte pessoal, o livro tem caráter histórico, pois
abrange desde o modernismo, o concretismo, o Grupo Rex, a Escola Brasil: a
Geração 80 e o Ateliê Abstração, até artistas jovens. É, como diz o autor, “um
trabalho denso, carregado, com olhares fortes, significativos, cheio de dúvidas
e ansiedade, vivos, olhares de quem viveu uma vida complexa, produtiva e
intensa”. O livro é bilíngue (português e inglês) e é único – jamais poderá ser
refeito, até porque muitos dos artistas que estão presentes nele já faleceram,
como Cícero Dias, Lina Bo e Pietro Maria Bardi, Aldemir Martins, Amilcar de
Castro, Anatol Wladislav, Franz Weissmann, Geraldo de Barros, Iberê Camargo,
Luiz Sacillotto, Manabu Mabe, Maurício Nogueira Lima, Thomaz Ianelli e Tikashi
Fukushima, entre outros, e muitos moram fora do Brasil, como Flávio- Shiró,
Sergio Ferro, Antonio Dias, Marcia Grostein, Alex Flemming e Arthur Luiz Piza,
alguns dos quais fotografados em etapas diversas de suas carreiras. Além de
mais de 150 fotografias, o livro conta com um panorama da arte no período do
mais antigo ao mais novo artista, feito pelo crítico de arte Olívio Tavares de
Araújo; e conta ainda com pequenas biografias de todos os artistas retratados.
Texto de Olívio Tavares Araújo.
“A tendência (do abstracionismo) chegava aos
quarenta anos de idade na Europa, mas por aqui ainda era sediciosa e
ameaçadora. Não se tem ideia, hoje, da virulência com que a esquerda brasileira
ortodoxa investiu contra a Bienal: “Terminou a época idílica. Assim como
fizeram os países mais adiantados, também entre nós as classes dominantes [...]
estão montando a sua máquina de corrupção e propaganda, para controlar e
orientar o desenvolvimento das artes plásticas. Este verdadeiro truste
internacional de arte, chefiado por Nelson Rockefeller e que inclui,
notadamente [...] o Museu de Arte Moderna de Nova York, e o British Council
(além do próprio Museu de Arte Moderna de São Paulo...) cuida agora de reforçar
suas bases no Brasil”. O mesmo texto fala ainda de “modernismo decadente” e “pântano
do formalismo moderno”.
O ataque seria, portanto, duplo: não só o
dedo do grande monstro, o capitalismo yankee; mas também a introdução, por ele,
de linguagens corruptas destinadas à corrupção. Reservam-se ao figurativismo,
ao relativismo e à arte nacionalista o status de reserva moral e o privilégio
do humanismo. Até Di Cavalcanti se envolveu na contenda. “Hoje, quando se
proclama como arte do nosso tempo o abstracionismo, o surrealismo ou todos os
outros cacoetes metafísicos do anarquismo modernista, caminha-se numa rua
estreita, só agradável para aqueles refinados que amam a podridão”. Corrido o
tempo e ultrapassadas as posições sectárias, essa briga nos parece descabida.
De minha parte, estou seguro de que os fatos de um quadro ser representativo e
incluir a figura – ou, pelo contrário, de substituir estas por formas, manchas
e cores abstratas – não bastam nem para conter nem excluir a consciência ética
e política do artista que o fez, e menos ainda para mudar a daqueles que o
olham. A verdadeira briga não é essa. Reacionária e pantanosa é a arte de má
qualidade, seja figurativa ou abstrata, porque não desenvolve a sensibilidade
do indivíduo.”
“Existem, como sabemos, duas vertentes
abstratas, opostas pela índole que as anima. De um lado, a abstração
construtivista ou construtiva, que se funda na organização racional de formas
geométricas e linhas e pretende abolir quaisquer conteúdos subjetivos e
líricos; o artista se entende como o simples fabricante de um produto
auto-significante: a obra. De outro lado, o abstracionismo lírico ou informal,
baseado em manchas e gestos livres e expressivos, e nem um pouco avesso à
confissão. Pelo contrário, em certos casos extremos, como Jackson Pollock (o
criador da norte-americana action
painting) e o Iberê Camargo dos anos 1970, chega a constituir uma
verdadeira catarse de demônios pessoais.”
“Não se pode deixar de registrar que
Grassmanm constitui uma das poucas exceções à regra brasileira de artistas que
pioram na segunda metade da carreira.”
“O triunfo do abstracionismo tinha a ver com
o fim da Segunda Guerra Mundial, a reconstrução da Europa, a afluência
econômica norte-americana, a fantasia de se poder criar um mundo menos conflituoso,
e até com certas inquietações metafísicas. Desde Kandinsky e Mondrian, seus
criadores, a arte abstrata correspondeu a uma concepção mais essencialista do
mundo, a uma maior introspecção, a certa religiosidade e à necessidade de uma
verdade absoluta. Kandinsky falava de “alma secreta”, de “pulso íntimo” das
coisas, e Mondrian, da “pura e invariável realidade” por trás da realidade
aparente. Já as linguagens figurativas que ressurgem internacionalmente na
década de 1960 correspondem a circunstâncias bem mais imediatas, ao mundo
construído pelo homem e ao momento particularmente agitado que ele então
atravessa – e que em maio de 1968 estará conflagrado às claras, na França.
Surgem os Nouveax Réalistes, cujo
teórico, Pierre Restany, defende “a apaixonante aventura do real polido em si”
e “a natureza moderna, que é a da cidade e da usina, da publicidade e dos meios
de comunicação de massa”. Nos Estados Unidos e na Inglaterra, começam a
aparecer (ainda em separado) os criadores da pop art, da qual não haverá, a rigor, uma exposição oficial de
lançamento.
Ao Brasil, os pop artistas chegam plenamente na IX Bienal, em 1967, numa
inesquecível sala denominada Environment
USA. Exercem forte influência em diversos pintores, chegando até a parecer
que alguns – como Maurício Nogueira Lima e Cláudio Tozzi – andavam falando
exatamente sua linguagem. Não existe unanimidade, hoje, em interpretar a pop art como crítica ou apologia da sociedade
de consumo. Seu extenso levantamento da cena americana, a apropriação de
imagens dos meios de comunicação de massa, os halterofilistas e as pin up girls, os retratos de Jackie
Kennedy e Marilyn Monroe, as latas de sopa e de cerveja, as caixas de Brillo, a entronizaç ão
do trivial e do vulgar, o gosto pelo kitsch
– significam uma adesão aos valores e símbolos do capitalismo triunfante ou os
estão ironizando? As duas respostas têm sido dadas, e para quem nos anos 70
concluíra que a pop art embutia uma
sátira amarga, surpreende que importantes exegetas possam falar de “decidido
otimismo”, de um “otimismo sem rebuço” a ela subjacente (Lucy R. Lippard), e de
“celebração” de “nossa civilização comum” (Alan Solomon).”
“No Brasil, o rótulo ainda se presta a
equívocos. Já pude perceber que mesmo gente da área, que teria por obrigação
ser mais precisa, por conceitual costuma simplesmente designar toda obra de
difícil entendimento, que exige reflexão e raciocínio além da percepção
sensível, escapa às categorias tradicionais, com elas mistura a fotografia e a
palavra, e parece reunir poucos estímulos; é, por assim dizer, “fria”. No
entanto, a verdadeira arte conceitual vai bem mais longe, propõe-se abolir a
obra como intermediário da relação artística e instituir em seu lugar ideias e
conceitos expressos de modos variados – ou, quando muito, o registro de um
processo de natureza criadora cujos resultados diretos (a obra propriamente
dita) não são preserváveis ou não foram preservados. Subverte uma das poucas
certezas absolutas em dois mil anos de estética: que a arte se presentifica num
objeto.”
Comentário:
A segunda foto apresentada, de Roberto Magalhães, é bastante similar
(possivelmente da mesma série), mas não exatamente a que se encontra no livro.
Gostaria de ter postado as fotos das páginas 33 (Gilvan Samico, 2004),
114 (Carlos Vergara, 2001), e 143 (Nuno Ramos, 1993), porém não as encontrei disponíveis na internet.
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