Editora: Nova Cultura
ISBN: 85-130-0847-8
Tradução: Leonel Vallandro e Gerd Bornheim
Opinião: ★★☆☆☆
Páginas: 202
“Platão ensinava na Academia e nos seus Diálogos que a compreensão dos fenômenos
que ocorrem no mundo físico depende de uma hipótese: a existência de um plano
superior da realidade, atingido apenas pelo intelecto, e constituído de formas ou ideias, arquétipos eternos dos quais a realidade concreta seria a
cópia imperfeita e perecível. Através da dialética — feita de sucessivas
oposições e superposições de teses — seria possível ascender do mundo físico
(apreendido pelos sentidos e objeto apenas de opiniões múltiplas e mutáveis) à
contemplação dos modelos ideais (objetos da verdadeira ciência).”
(José Américo Motta Pessanha)
“Aristóteles justamente já teria percebido
que a dialética platônica só se comprometia com a certeza em última instância —
o que conferia ao platonismo sua inquietação permanente e sua flexibilidade,
deixando-o, porém, sob a constante ameaça do relativismo. O projeto
aristotélico torna-se, então, o de forjar um instrumento mais seguro para a
constituição da ciência: o Organon.
Nele a dialética é reduzida à condição de exercício mental que, não lidando com
as próprias coisas, mas com as opiniões dos homens sobre as coisas, não pode
atingir a verdade, permanecendo no âmbito da probabilidade. Essa concepção da
dialética como uma “ginástica do espírito”, útil como fase preparatória para o
conhecimento, mas incapaz de chegar à certeza sobre as coisas, justifica a
concepção aristotélica da história e, em particular, da história da filosofia:
a história — inserida no domínio da dialética — é útil e indispensável na
medida em que conduz à sua própria superação, quando o provável se transforma
em certeza. Ou quando as opiniões dos antecessores preparam e dão lugar à
verdade que somente seria alcançada pelo pensamento aristotélico.
Para se atingir a certeza científica e
construir um conjunto de conhecimentos seguros, torna-se necessário, segundo
Aristóteles, possuir normas de pensamento que permitam demonstrações corretas
e, portanto, irretorquíveis. O estabelecimento dessas normas confere a
Aristóteles o papel de criador da lógica formal, entendida como a parte da
lógica que prescreve regras de raciocínio independentes do conteúdo dos
pensamentos que esses raciocínios conjugam.”
(José Américo Motta Pessanha)
“Um problema de dialética é um tema de
investigação que contribui para a escolha ou a rejeição de alguma coisa, ou
ainda para a verdade e o conhecimento, e isso quer por si mesmo, quer como
ajuda para a solução de algum outro problema do mesmo tipo.”
(Tópicos)
“O raciocínio é um argumento em que,
estabelecidas certas coisas, outras coisas diferentes se deduzem
necessariamente das primeiras.”
(Tópicos)
“Uma “tese” é uma suposição de algum filósofo
eminente que esteja em conflito com a opinião geral: por exemplo, a ideia de
que a contradição é impossível, como disse Antístenes; ou o ponto de vista de
Heráclito, de que todas as coisas estão em movimento; ou de que o ser é um,
como afirma Melisso; pois ocupar-nos com uma pessoa comum quando expressa
pontos de vista contrários às opiniões usuais dos homens seria tolice.”
(Tópicos)
“E também o que se deseja por si mesmo é
preferível àquilo que se deseja com vistas noutra coisa: por exemplo, a saúde é
preferível à ginástica, porque a primeira é desejada por si mesma, enquanto a
segunda é desejada com vistas noutra coisa. E do mesmo modo, o que é desejável
por si mesmo é mais desejável do que aquilo que se deseja por acidente; por
exemplo, a justiça é mais desejável em nossos amigos do que em nossos inimigos,
pois a primeira é desejável em si mesma e a segunda por acidente: com efeito,
desejamos que nossos inimigos sejam justos por acidente, a fim de que não nos
causem dano. Este princípio é o mesmo que o precedente, embora expresso de
outro modo. Porquanto desejamos a justiça em nossos amigos por si própria,
mesmo que isso não faça nenhuma diferença para nós e ainda que eles estejam na
Índia, ao passo que em nossos inimigos nós a desejamos por outra coisa e a fim
de que eles não nos causem dano.
Por outro lado, aquilo que em si mesmo é
causa do bem é mais desejável do que aquilo que o é por acidente, por exemplo,
a virtude é mais desejável do que a sorte (pois a primeira é por si mesma causa
de coisas boas, ao passo que a segunda só o é acidentalmente); e do mesmo modo
nos outros casos da mesma espécie. E analogamente também no caso contrário,
pois aquilo que é em si mesmo a causa do mal é mais reprovável do que aquilo
que o é acidentalmente, por exemplo, o vício e o acaso, pois o primeiro é mau
em si mesmo e o segundo só por acidente.
Mais ainda: o que é bom de maneira absoluta é
mais desejável do que aquilo que é bom para uma pessoa particular: por exemplo,
recuperar a saúde é mais desejável do que uma operação cirúrgica, pois a
primeira é boa de maneira absoluta e a segunda só o é para uma pessoa
particular, a saber: o homem que precisa de ser operado. Assim também, o que é
um bem por natureza é mais desejável do que o bem que não é tal por natureza:
por exemplo, a justiça é mais desejável do que o homem justo, pois a primeira é
boa por natureza, ao passo que no segundo a bondade é adquirida. E também é
mais desejável o atributo que pertence ao melhor e mais honroso sujeito; por
exemplo, o que pertence a um deus é mais desejável do que o que pertence a um
homem, e o que pertence à alma, mais desejável do que o que pertence ao corpo.
Do mesmo modo, a propriedade de uma coisa melhor é mais desejável do que a propriedade
de uma coisa pior, por exemplo: a propriedade de um deus do que a propriedade
do homem; porque, assim como no tocante ao que é comum a ambos não diferem
absolutamente entre si, no que respeita às suas propriedades um sobrepuja o
outro. Também é melhor o que é inerente a coisas melhores, anteriores ou mais
honrosas: assim, por exemplo, a saúde é preferível à força e à beleza, pois a
primeira é inerente tanto ao úmido como ao seco, tanto ao quente como ao frio —
em suma, a todos os constituintes primários de um animal ao passo que as outras
são inerentes ao que é secundário, sendo a força uma característica dos tendões
e dos músculos, enquanto a beleza, segundo se supõe geralmente, consiste numa
certa simetria dos membros.”
(Tópicos)
“Todas as coisas são também mais desejáveis
na ocasião em que assumem maior importância; por exemplo, estar isento de dor é
mais desejável na velhice do que na juventude, porque se reveste de maior
importância na velhice. Dentro do mesmo princípio, também a prudência é mais
desejável na velhice; com efeito, ninguém escolhe os jovens para guiá-los, pois
não se espera que eles sejam prudentes. Com a coragem dá-se o caso inverso,
pois é na mocidade que se requer de maneira mais imperativa o exercício dessa
virtude. E da mesma forma no que toca à temperança, porquanto os jovens sofrem
mais do que os velhos as consequências de suas paixões.
Além disso, é mais desejável aquilo que é
mais útil em todas as ocasiões ou na maioria delas, por exemplo, a justiça e a
temperança mais do que a coragem, pois as primeiras são sempre úteis, enquanto
a segunda só o é em determinadas ocasiões. E dentre duas coisas, aquela que, se
todos a possuíssem, tornaria desnecessária a outra é mais desejável do que
aquela que todos poderiam possuir e, ainda assim, sentir falta da outra.
Considere-se a esta luz o caso da justiça e da coragem: se todos fossem justos,
não haveria necessidade de coragem, ao passo que. se todos fossem corajosos,
ainda assim haveria necessidade de justiça.”
(Tópicos)
“Não se deve argumentar com todo mundo, nem
praticar argumentação com o homem da rua, pois há gente com quem toda discussão
tem por força que degenerar. Com efeito, contra um homem que não recua diante
de meio algum para aparentar que não foi derrotado, é justo tentar todos os
meios de levar a bom fim a conclusão que nos propomos; mas isso é contrário às
boas normas. Por isso, a melhor regra é não se pôr levianamente a argumentar
com o primeiro que se encontra, pois daí resultará seguramente uma má argumentação.
Todos vemos, com efeito, que ao praticar umas com as outras as pessoas não
podem refrear-se de cair em argumentos contenciosos.”
(Tópicos)
“Exigir um “sim” ou um “não” como resposta é
tarefa de quem procede à crítica, e não do que expõe alguma coisa. Porque a
arte da crítica é um ramo da dialética e se dirige não ao homem que conhece,
mas ao ignorante que presume conhecer. É, pois, um dialético aquele que
considera os princípios comuns em sua aplicação ao assunto particular em
debate, enquanto o que só faz isso em aparência é um sofista.”
(Dos argumentos sofísticos)
“As pessoas não desejam as mesmas coisas que
afirmam desejar: dizem o que melhor soa, mas desejam o que parece promover os
seus interesses.”
(Dos argumentos sofísticos)
Um comentário:
Os trechos lembraram muito o que é discutido no programa de rádio: Nas Ondas da Filosofia.
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