Editora: Record
ISBN: 978-85-0105-486-9
Opinião: ★★★★☆
Páginas: 478
“Ao que parece, o surdo rugir de um terremoto deu o alerta à população
de Santoríni. A ilha inteira foi sacudida. Em Acrotiri e outras cidadezinhas empoleiradas
nas encostas da montanha, muros de pedra fenderam-se e desmoronaram. É possível
que terremotos tenham se estendido por meses. E pode ser que os primeiros
avisos não tenham sido suficientes. Há indícios, em Acrotiri, de que alguns dos
fugitivos voltaram à cidade destruída e, durante algum tempo, tentaram
reconstruí-la. E então, aproximadamente em 1500 a.C., os avisos foram
amplamente confirmados. No que deve ter sido, provavelmente, a mais violenta
explosão de toda a história humana, o vulcão inteiro de Santoríni entrou em
erupção. Calcula-se que 83 quilômetros quadrados da ilha (uma área cerca de
quatro vezes maior do que a destruída na célebre erupção de Krakatoa, em 1883)
tenham-se desfeito, pura e simplesmente, num holocausto. A tempestade de lava e
cinzas escureceu o céu por centenas de quilômetros – na verdade, ainda é
possível encontrar escombros no leito marinho numa área de uns 300.000
quilômetros quadrados, quase a totalidade do leste Mediterrâneo. Depois disso,
os destroços fumegantes do vulcão – todo o centro da ilha de Santoríni –
afundaram sob as águas. E elas invadiram tudo e começaram a ferver e a soltar
vapor. O cataclismo deu origem a uma onda gigantesca, de tamanho e violência
quase inacreditáveis, que foi chocar-se contra o litoral de Creta. As
estimativas de sua altura colossal vão de 60 a 90 metros, e é possível que ela
tenha avançado a uma velocidade de mais de 160 quilômetros por hora. Quando
terminou a chuva de cinzas e dejetos, Santoríni era uma ilha morta. Nada mais
podia viver ali.”
“Ainda não compreendemos e aceitamos realmente os horrores tecnológicos
da Segunda Guerra Mundial – o violento incêndio acidental causado pelo
bombardeio de Hamburgo, que deixou o próprio ar em chamas e sufocou todos os
que estavam a seu alcance, ou a efetiva detonação, em Hiroshima, de uma bomba
tão terrível que os que foram poupados de morrer queimados puderam sentir o
próprio rosto derretendo sob suas mãos –, mas, mesmo assim, somos repetidamente
informados de que as armas usadas contra Hamburgo e Hiroshima foram simples
brinquedos, comparadas ao que se tem hoje, pronto para ser disparado. Uma
tonelada de TNT já é, por si só, uma força explosiva de horror quase
inimaginável; um quiloton representa mil toneladas de TNT; a bomba de Hiroshima
tinha vinte quilotons; um megaton representa um milhão de toneladas de TNT,
cinquenta vezes o tamanho da bomba de Hiroshima, e as armas desse porte são
consideradas pequenas e limitadas, se comparadas às de 25 megatons que já foram
construídas (destaque-se que o livro foi escrito em 1982). O
chamado tratado SALT (Strategic Arms
Limitation Talks, ou Conferências sobre Limitação de Armas Estratégicas),
que deveria limitar nossa capacidade de destruição, restringiu-nos a um total
de 2.200 dessas armas em cada lado da vulnerável fronteira que costumávamos
chamar de Cortina de Ferro.
Uma Terceira Guerra Mundial, travada com armas nucleares – uma guerra,
como disse certa vez o primeiro-ministro soviético Nikita Kruschov, em que os
vivos invejariam os mortos –, encheu uma geração inteira de um sentimento de
pavor. No entanto, à medida que os anos vão passando, nossa ideia de um futuro
apocalipse também assumiu outras formas. Uma delas é a possibilidade de uma
catástrofe natural – uma nuvem sufocante de ar poluído, um terremoto sob uma
usina atômica, o derretimento das calotas polares.”
“Enquanto Müntzer conclamava os camponeses à revolta, Martinho Lutero
apelava aos príncipes para que acabassem com os camponeses: ‘Que todos os que
têm essa possibilidade golpeiem, matem e esfaqueiem, em segredo ou
abertamente’, escreveu num tratado intitulado Contra as hordas homicidas e
ladras de camponeses, ‘lembrando que nada pode ser mais venenoso, nocivo ou
demoníaco que um rebelde. É como quando se tem que matar um cão raivoso; se não
o atacares, ele te atacará, e a terra inteira contigo.’ E mais: ‘Estes são
tempos peculiares, tão peculiares que um príncipe que derrama o sangue merece
muito mais o céu do que muitos homens que oram’.”
“O Estado Policial baseia-se na ideia de que a informação total pode
tornar-se a base do controle total, tanto da elite quanto do populacho. Essa
ideia viria a inspirar a Gestapo de Heinrich Himmler e a NKVD de Lavrenti
Beria, mas sua realização completa só ocorreu no ficcional 1984, de
George Orwell, no qual a Polícia do Pensamento do Ministério do Amor impunha a
crença em seus três lemas: a guerra é paz, a liberdade é uma escravidão, a
ignorância é força.”
“‘A vida no campo de concentração (...) ensinou-nos que o mundo inteiro,
na verdade, assemelha-se a um campo de concentração’, escreveu Tadeusz
Borowski. ‘Os fracos trabalham para os fortes e, quando não têm forças ou
disposição para o trabalho, que roubem ou morram. (...) Não há crime que um
homem não cometa para salvar a sua vida. E, depois de se salvar, ele comete
crimes por motivos cada vez mais fúteis; primeiro comete-os por dever, depois
por hábito e, no fim, por prazer. (...) O mundo não é governado pela justiça
nem pela moral; o crime não é punido e a virtude não é premiada, sendo um e
outro esquecidos com a mesma rapidez. O mundo é governado pelo poder (...)’.”
“(Na Segunda Guerra Mundial, o campo de concentração de) Birkenau tinha
apenas algumas privadas. Pelo menos metade dos prisioneiros – e, com frequência,
dois terços ou mais – sofria a miséria e a humilhação da diarreia crônica. À
noite, o único conforto disponível era um punhado de baldes, repletos até à
borda. E havia ratos por toda parte. Quando um prisioneiro morria durante a
madrugada, segundo uma prisioneira chamada Judith Sternberg Newman, os ratos
‘chegavam ao cadáver antes de ele esfriar, e comiam a carne de tal maneira que
ele ficava irreconhecível antes do amanhecer’.”