Editora: Rocco
ISBN: 978-85-3251-002-0
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 664
“Aqui em Atlanta
tem um velho ditado que também diz: “O dinheiro fala e a babaquice se cala”.”
“– Roger – disse
ele – você deve saber o que é “dinheiro de campanha”. Às vezes é chamado de
“caixinha de campanha”.
– De forma geral –
disse Roger. – Já ouvi a expressão. Por quê?
– Bom – disse Wes
Jordan – você diria que isso significa o quê, de forma geral?
– Pelo que eu sei,
isso se refere ao dinheiro que você tem que gastar na campanha eleitoral e até
no dia das eleições para incentivar o pessoal que apóia você nos bairros mais
pobres... não sei bem... mandando carros de som para lá, pagando as pessoas que
ficam nas esquinas perto das seções eleitorais distribuindo santinhos, e
arranjando gente para levar as pessoas de van até as seções, coisas assim. Por
quê?
Wes sorriu, com um
ar de superioridade um pouco excessivo, na estimativa de Roger. – Isso foi o
que eu sempre achei também, Roger. Mas logo depois que eu anunciei minha
candidatura a prefeito, o Archie Blount... se lembra do Archie? O deputado do
Quinto Distrito?... o Archie me aparece, e diz: “Wes, essa é a primeira vez que
você vai concorrer numa coisa tão grande, uma eleição municipal. No primeiro mês
de campanha, o seu conhecimento de como a política realmente funciona vai
aumentar 100 por cento. No segundo mês, vai aumentar 200 por cento, e no
terceiro mês vai aumentar 400 por cento... e mesmo assim você ainda vai estar
no jardim-de-infância.” Eu agradeci a ele, provavelmente de maneira
condescendente... eu gostava dele, mas não o achava muito inteligente... e
continuei meus preparativos para concorrer baseados no próprio mérito do meu
programa, que me favorecia, calculava eu.
– Na manhã
seguinte já tive minha primeira surpresa. Em cima da minha escrivaninha havia
uma pilha de cartas deste tamanho. Junto com cada carta, um cheque em favor da
minha campanha. A carta propriamente dita é um contrato entre mim e a
organização que a mandou. Uma, eu me lembro, era de uma organização de
“direitos dos gays”. Eu só precisava assinar embaixo daquela carta dizendo que
iria falar a favor de casamentos entre pessoas do mesmo sexo, de direitos de
herança entre casais do mesmo sexo, de educação sexual gay a partir do primeiro
grau, de sanções criminais contra a intolerância antigay, nem consigo me
lembrar de tudo, e aí eu podia ficar com o cheque, que era de 20 mil dólares.
Recusei aquilo, por questões de mérito, e mandei minha secretária devolver o
troço. Em primeiro lugar, uma besteirada total, e em segundo, os meus eleitores
da base, nossos irmãos e irmãs, não queriam nem saber de facilitar a vida para
os homossexuais, fossem negros ou brancos. E quando esses grupos de direitos
para os gays, que são todos de garotos brancos, claro, começam a tentar
comparar a “luta” deles... é sempre “luta”... com a do nosso povo (negro)...
quer dizer, ficam comparando um monte de rapazes brancos aos beijos e abraços
uns com os outros com um povo se erguendo da escravidão... você começa a soltar
fogo pelas ventas. De modo que calculei que tinha tomado a decisão certa.
Devolvi a carta e o cheque com um bilhete cortês, agradecendo e recusando, e
achei que a coisa ia ficar por isso mesmo. Aí, quatro dias depois, vejo uma
manchete de primeira página num semanário chamado The Five Pointer. Sou denunciado como um oportunista homofóbo que
não apoia nem os mais fundamentais direitos dos gays. Você pode dizer “Bom, mas
e daí?” A tiragem do The Five Pointer
é de 15 mil exemplares no máximo. É o que se chama de um jornal alternativo.
Mas ele é muito popular entre os homossexuais brancos... e assim eu acabo de
perder o voto gay, sem nem chegar a abrir a boca sobre o assunto.
– Cada carta
daquela pilha propunha o mesmo acordo. “Se comprometa com a nossa luta e você
pode ficar com o dinheiro.” Depois de uns dois meses, você já está começando a
ficar no sufoco por dinheiro. Está começando a precisar dele do jeito que
precisa de ar e comida. Essas campanhas devoram
dinheiro, e a essa altura os comerciantes já estão espertos demais para
venderem qualquer coisa a você a crédito. Você começa a pensar de novo em todos
aqueles cheques que você recusou de forma tão altaneira. Você começa a imaginar
se não poderia rever suas posições e encontrar espaço debaixo do seu
guarda-chuva para algumas daquelas organizações de interesses especiais... que
não são tão ruins assim... e seus cheques de 20 mil dólares... porque você já
aprendeu uma lição elementar, que é: ninguém... ninguém... vence uma eleição municipal majoritária estritamente com base no próprio mérito do seu programa.”
“Que diabos
acontecera com todos aqueles filhos dos ricos da geração de Wally, aqueles
garotos bem-criados que iam para os internatos particulares? Aquelas malditas
escolas estavam produzindo um novo tipo de rebento da elite: um garoto
totalmente entediado do mundo à idade de dezesseis, cínico, fleumático e
apático na presença de adultos, embora perfeitamente respeitoso e terrivelmente
educado, um garoto sem talento para esportes, com aversão a caçar, pescar, montar
cavalos ou lidar com animais de qualquer forma, um garoto com vergonha de seus
privilégios, desesperado para escondê-los, ávido para usar bonés de beisebol ao
contrário, calças esculhambadas e outros trapos de gueto, com horror de ser
invejado, um garoto que encarava o mundo sem nenhum sinal visível da alegria de
viver e sem... culhões...”
(refletindo sobre sua jovem segunda esposa)
“Cristo... quem
era aquela mulher? Como diabos ela entrara ali? Essas perguntas o deixaram
espantado. Depois percebeu que elas vinham se formando na sua mente já há uns
trinta meses, pelo menos, e ele só estava casado com ela há trinta e seis. Mas
elas nunca haviam surgido na sua cabeça em palavras tão claras. Quem era ela? O
que ela estava fazendo ali? E o mais terrível era que, depois que finalmente
fizera as perguntas, ele sabia as respostas. Sexo e vaidade; era só isso; e
talvez vaidade mais do que sexo. Martha, (sua ex-esposa,) envelhecera, era só isso... (...)
A vingança é minha,
disse o Senhor, e irei cobrar. Ninguém avisava você disso, avisava!? Todos os
peritos, todas as pessoas que escreviam livros e artigos quando falavam de
casamento, estavam sempre falando do primeiro casamento, do casamento original.
Mas àquela altura, calculou ele, já devia haver milhares de homens feito ele,
empresários ricos que nos últimos dez ou quinze anos haviam se divorciado das
esposas antigas e arranjado esposas novas, garotas uma geração inteira mais
jovens. E o que os peritos tinham a dizer sobre aqueles piteuzinhos
irresistíveis? Nada! E se um homem passar por tudo aquilo, a separação, o
divórcio, aquela agonia toda, aquela luta, aquela despesa infernal, aquela...
aquela... aquela culpa... e um dia,
ou uma noite, ele acordar e se perguntar, Quem está aqui na cama comigo,
Diacho? Por que ela está aqui? De onde ela veio? O que ela quer? Por que ela
não vai embora. Isso eles não dizem a você.”
“E depois Charlie
percebeu que havia quebrado uma de suas próprias regras cardeais, que era: ao
lidar com subordinados e mulheres, nunca justifique, nunca explique, nunca
recue.”
“Para um homem de
sessenta anos, como Charlie Croker, um dos mais sinistros lembretes da
aproximação da Parca é quando os seus médicos, as pessoas que vêm cuidando do seu
corpo há décadas, começam a se aposentar... ou a morrer... ou as duas coisas.”
“– Você ficou
nervoso, papai?
Charlie não
conseguiu perceber se Wally estava realmente curioso ou simplesmente falando
por falar. E naquele momento chegou a perceber que nunca chegara a conhecer o
filho suficientemente bem para saber a diferença; e que jamais chegaria a
conhecer, mas tudo bem; a gente faz o melhor que pode, só isso; e tanto faz.”
“A vida é feita de
crueldade e intimidação.”
“– Ah, é. Bom... tá
legal... o que o Epicteto tem a dizer da falência?... ou um filósofo não pode
pensar numa coisa tão prosaica assim?
– Para o Epicteto
isso não é prosaico demais, Sr. Croker. Num certo trecho ele diz “Vós ficais
nervosos e sem conseguir dormir à noite com medo de ficar sem dinheiro. Dizeis
‘Como vou arranjar o suficiente, até para comer?’, No entanto, estais com medo
mesmo não de morrer de fome, mas da perspectiva de não ter uma cozinheira,
alguém para servir a mesa do jantar, alguém para cuidar das vossas roupas, dos
vossos sapatos e da roupa suja, e fazer as camas e limpar a casa. Em outras
palavras, vós estais com medo de não poder mais levar a vida de um inválido”.
(...) Ele diz “para onde esse medo de perder vossas posses mundanas vos leva?
Para a morte. Quando Ulisses naufragou com seu navio e foi dar à praia sem ter
nada, isso não arrefeceu o seu ânimo. Enfrentou a enrascada na qual se
enfrentava feito um leão criado na montanha, confiando na sua força. Não ficou
dependendo sua reputação, dinheiro ou posição, mas da sua própria força. O que
nos torna livres é o que está dentro de nós”. (...)
– Aonde é que ele
quer chegar na realidade? Esse tal de Epicteto?
– Bom... eu não
sou uma autoridade no assunto, Sr. Croker, mas o que ele está dizendo, me
parece, é que a única posse real que temos são o nosso caráter e “projeto de
vida”, como ele diz. Zeus deu a cada pessoa uma centelha da própria divindade,
e ninguém pode tirar isso de nós, nem mesmo Zeus, e dessa centelha vem o nosso
caráter. Todo o resto é temporário e sem valor a longo prazo, inclusive o nosso
corpo. Sabe do que ele chama as nossas posses? “Ninharias”. Sabe do que ele
chama o corpo humano? “Um vaso de barro com um quarto de sangue”. Se
compreendermos isso, não vamos nos lamentar, nem nos queixar, ou culpar os
outros pelos nossos problemas, não vamos sair por aí bajulando ninguém. Acho
que é isso que ele está dizendo, Sr. Croker.
Charlie disse: –
Ele falou sobre bajular as pessoas?
(...)
– Sim, senhor –
disse o rapaz – foi o que ele disse. “O bajulador se degrada e engana o objeto
de suas lisonjas”. “Os cães mostram afeição um pelo outro”, diz ele, “mas se
jogares um pedaço de carne entre eles, verás quanta amizade sobra ali.” (...) Epicteto
diz que quando você se vende, se rebaixa ao nível de um animal, feito uma
doninha ou uma raposa. Por alguma razão ele considerava a raposa o animal mais
baixo de todos.
– Ele chega a
dizer “se vender”?
– Praticamente –
disse o rapaz. – Xô ver... – Folheou o livro. – Aqui está, no livro I, Capítulo
2. Ele diz “Acautela-te de uma coisa, ó homem. Vê bem qual é o preço pelo qual
vendes tua vontade. Se nada mais fizerdes, não vende tua vontade barato”.
O velho disse: –
Como ocê sabe se tá se vendeno barato demais ou não?
– Se você está se
vendendo, já é barato demais – disse Conrad – ou pelo menos é assim que eu
interpreto o que ele está dizendo, Sr. Croker, já que o verdadeiro estoico não
aceita o meio-termo. Vender-se e aceitar meios-termos não fazem parte do seu
caráter.”
“Ninguém pode progredir virado para ambos os lados.” ( Epicteto)
Nenhum comentário:
Postar um comentário