Editora: Leitura
ISBN: 978-85-7358-964-1
Tradução: Caroline Frurukawa
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 176
Sinopse: A lenda dos lobisomens atravessou séculos e
ainda é muito presente no imaginário de crianças, adolescentes e adultos. O
estudioso inglês Sabine Baring-Gould apresenta na publicação Lobisomens, com tradução de Caroline Frurukawa, lendas
de metamorfoses famosas e o fenômeno da licantropia. Ele mostra que os
lobisomens realmente existem e tem sede de sangue e carne humana.
“O que é
licantropia? A transformação de um homem ou uma mulher em lobo, tanto por meios
mágicos – para que a pessoa possa satisfazer o apetite por carne humana – ou
por castigo imposto pelos deuses em punição a uma grande ofensa.
Essa é a definição
popular. Na verdade, a licantropia consiste em uma forma de loucura, como
aquela encontrada na maioria dos hospícios.”
“Toda a superestrutura
da fábula e do romance relativo à transformação em animais selvagens reside
simplesmente sobre esta base de verdade: que entre as nações escandinavas
existiu uma forma de loucura ou possessão, sob a influência da qual homens
agiram como se fossem transformados em brutos selvagens, uivando, espumando
pela boca, sedentos de sangue e matança, prontos para cometer qualquer ato de
atrocidade, e tão irresponsáveis por suas ações quanto lobos e ursos, com cujas
peles eles geralmente se vestiam. (...)
Pode-se aceitar
como axioma que nenhuma superstição de aceitação geral está destituída de uma
base verdadeira; e, se nós descobrirmos o mito de um lobisomem sendo
disseminado amplamente, não apenas por toda a Europa, mas por todo o mundo,
devemos ter certeza de que há um núcleo sólido factual, rodeado por superstição
popular que se cristalizou; e que o fato é a existência de uma espécie de
loucura, uma crise na qual as pessoas afetadas acreditam ser um animal selvagem
e agem como ele.”
“Na dissertação de
Muller (1736), cuja fonte foi Cluverius e Danhaverus, (Acad. Homilet. p.
ii.), tivemos conhecimento de que um certo Albertus Pericofcius em
Moscou tinha o hábito de tiranizar e fustigar seus súditos das formas mais
inescrupulosas. Uma noite, quando ele estava fora de casa, todo seu rebanho de
gado, adquirido por meio de extorsão, pereceu. Quando voltou para casa foi
informado a respeito da perda, e o perverso homem desferiu as mais horríveis
blasfêmias, exclamando: “Permita que aquele que matou coma; e se Deus conceder,
que ele também possa me devorar.”
Assim que ele
falou, gotas de sangue caíram no chão, e o nobre se transformou em um cão
selvagem, correu até seu gado morto, destroçou e dilacerou as carcaças e
começou a devorá-las; e não parou até que chegasse o seu fim (ac forsan
hodie que pascitur). Sua esposa, então próxima à sua reclusão, morreu de
medo. Dessas circunstâncias não há apenas relatos, mas também testemunhas. (Non
ab auritis tantum, sed et ocidatis accepi, quod narro).”
“Os esportistas e
pescadores seguem um instinto natural de destruição quando atiram em um pássaro
ou outro animal, ou fisgam um peixe: a pretensão de que a presa seja caçada
para colocá-la à mesa não pode ser feita com justiça, pois o esportista se
preocupa pouco com o jogo que ganhou, desde que tenha a presa em mãos. O motivo
para a feroz perseguição de um pássaro ou animal certamente é outro: o desejo
ardente de se extinguir a vida que existe em sua alma. Por que uma criança
impulsivamente bate em uma borboleta assim que ela passa voando? Ela não se
importa com o inseto ao esmagá-lo com os pés, a menos que esteja agonizando, o
que ela observa com grande interesse. A criança bate na criatura voando porque
a borboleta tem vida, e ela tem um instinto que a impele a destruir a vida
assim que a encontra.
Pais e enfermeiras
sabem bem que as crianças por natureza são cruéis, e que a humanidade tem de
ser adquirida pela educação. Uma criança exulta com maldade os sofrimentos de
um animal ferido até que sua mãe lhe peça: “deixe-o em paz, tenha compaixão”.
Uma criança inocente nem pensaria em pôr fim à agonia da criatura abruptamente,
como se saboreasse um bombom inteiro antes de engoli-lo. A crueldade inerente
pode ser obscurecida por impressões posteriores ou pode ser mantida sob repressão
moral; a pessoa que é inerentemente um “Nero”, não consegue reconhecer a sua
própria natureza, até que algum dia, por acidente, o ímpeto se torne dominante
e arrebate tudo diante de si. Um relaxamento da posição moral, um choque do
intelecto controlador ou uma condição anormal do corpo são suficientes para
permitir que o ímpeto se afirme.”
“Vi uma jovem
realizada, de considerável refinamento e de um temperamento extremamente
nervoso, enfiar moscas com a agulha em um pedaço de linha e assistir com complacência
o bater de asas agonizante. A crueldade pode permanecer latente até que, por
algum acidente, ela apareça: então, irromperá em uma chama devastadora. O
ímpeto do amor e do ódio é semelhante ao que ocorre com a sede por sangue; nós
não fazemos ideia da intensidade com que eles podem surgir até que as
circunstâncias ocorram. Amor ou ódio serão dominantes em um peito que esteve
sereno até agora, pois quando a fagulha surge repentinamente, a paixão se
acende, e a serenidade de um peito quieto é destruída para sempre. Uma palavra,
um olhar, um toque são suficientes para atear fogo ao paiol da paixão no
coração e desolar para sempre uma existência. É o mesmo que acontece com a sede
por sangue. Ela pode espreitar nas profundezas do coração de alguém muito
querido para nós. Pode queimar no seio daquele que é muito importante, e nós
podemos ser perfeitamente inconscientes da sua existência. Talvez as
circunstâncias não propiciem seu surgimento; talvez o princípio moral possa
tê-la abatido com grilhões que jamais conseguirá arrebentar.”
“A mitologia
popular na maioria das culturas considera a alma oprimida pelo corpo, e sua
libertação é uma libertação do “fardo” da carne. Se a alma é capaz de agir ou
expressar-se completamente sem um corpo, assim como o fogo existe sem o aparato
da caldeira a vapor ou da maquinaria, é uma questão que ainda não foi aceita
pela mente popular. Somente a religião cristã dá o mesmo valor ao corpo e à
alma, e dando uma esperança de enobrecimento e ressurreição nunca sonhado em qualquer
outro sistema mitológico.
Mas o credo
popular, em vez do testemunho mais enfático das Escrituras, é de que a alma
está sujeita há tanto tempo, que se uniu ao corpo, uma crença inteiramente de
acordo com o Budismo.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário