Editora:
Martin Claret
ISBN: 978-85-7232-279-9
Opinião: ★★★★☆
Páginas: 190
“Nenhum artista quer demonstrar coisa alguma. Até as verdades podem ser
demonstradas. ”
“O que a arte realmente espelha é o espectador, não a vida.”
“Podemos perdoar a um homem que faça alguma coisa útil, contanto que a
não admire. A única justificação para uma coisa inútil é que ela seja
profundamente admirada.”
“Toda a arte é completamente inútil.”
“– Vocês, os pintores, são uns indivíduos estranhos! Fazem tudo para ganhar fama e, assim que a têm na mão, parecem querer atirá-la fora. É um disparate, pois só há uma coisa no mundo pior do que falarem de nós: é que de nós ninguém fale. Um retrato como este colocá-lo-ia muito acima de todos os jovens de Inglaterra e faria muita inveja aos velhos, se é que os velhos são capazes de qualquer emoção.”
“Mas a beleza, a verdadeira beleza, acaba onde começa a expressão
intelectual. O intelecto é em si uma forma de exagero e destrói a harmonia de
qualquer rosto. Assim que nos sentamos a pensar, ficamos todos nariz, todos
testa, ou outra coisa horrenda. Veja esses homens que triunfam em qualquer
profissão intelectual. São completamente hediondos! Com exceção, evidentemente,
dos homens da Igreja. Mas é que os da Igreja não pensam. Um bispo continua a
dizer aos oitenta anos aquilo que lhe mandaram dizer aos dezoito e, como
consequência natural, ele mantém-se sempre uma pessoa encantadora.”
“Há em toda a superioridade física e intelectual certa fatalidade, aquela fatalidade que parece perseguir ao longo da história os passos vacilantes dos reis. É preferível não sermos diferentes dos outros. Os feios e os estúpidos são os que mais ganham neste mundo. Podem ficar despreocupadamente embasbacados a olhar. Se não conhecem o triunfo, pelo menos também não conhecem a derrota. Vivem como todos nós devíamos viver – impassíveis, indiferentes, e sem inquietações. Não trazem o mal a ninguém, nem o recebem de mãos alheias.”
“Havemos
todos de sofrer por aquilo que os deuses nos concederam... sofrer
terrivelmente.”
“A coisa mais banal adquire encanto simplesmente quando não revelada.”
“Você
parece esquecer-se de que sou casado, e o único encanto do casamento é a
necessidade absoluta de uma vida de engano recíproco. Nunca sei onde está a
minha mulher, e ela nunca sabe o que eu faço. Quando nos encontramos, o que
acontece uma vez por outra quando jantamos fora ou visitamos o duque, contamos
um ao outro as histórias mais absurdas, e com o ar mais sério deste mundo. A
minha mulher tem muito jeito para isso, muito mais do que eu. Nunca confunde as
datas, ao passo que eu confundo-as sempre. Mas se me apanha em falta, nunca
protesta. Às vezes, eu bem gostaria que o fizesse, mas ela limita-se a rir de
mim.”
“– Esse seu cinismo não é mais do que uma pose.
– A naturalidade não é mais do que uma pose, a pose mais irritante
que conheço.”
Você sabe que nós, pobres artistas, temos de nos mostrar, de vez em
quando, à sociedade, para fazer lembrar ao público que não somos selvagens.
Como você uma vez me disse, de fraque e laço branco qualquer pessoa, até um
corretor da Bolsa, pode ganhar a reputação de civilizado.”
“– O riso não é um mau começo para uma amizade, e é de longe o seu melhor final.”
“– Eu estabeleço uma norma para diferenciar bem as pessoas. Escolho
os amigos pela beleza, os conhecidos pelas qualidades de caráter, e os inimigos
pelas de inteligência. Todo o cuidado é pouco na escolha dos inimigos. Não
tenho um único que seja estúpido. São todos homens de capacidade intelectual e,
por conseguinte, todos me apreciam. Será isto vaidade? Talvez seja um pouco.”
“– Mas não consigo deixar de detestar os meus parentes. Creio que se
deve ao fato de nenhum de nós poder suportar ver nos outros os próprios
defeitos.”
“– Ora, o valor de uma ideia não tem nada que ver com a sinceridade
da pessoa que a expressa. Na realidade, existem fortes probabilidades de que
quanto mais insincero for o homem, mais puramente intelectual é a ideia, visto
que, nessas circunstâncias, ela não será colorida pelas suas necessidades, nem
desejos, nem preconceitos. Contudo, não pretendo discutir consigo política,
sociologia ou metafísica. Gosto mais das pessoas do que dos princípios e, mais
que tudo no mundo, gosto de pessoas sem princípios.”
“– Creio que você não tem razão, Basil. Mas não quero discutir
consigo. Só os intelectualmente perdidos é que discutem.”
“– E o pior em qualquer aventura romântica é que ela nos deixa tão
pouco românticos.”
“– Os que são fiéis conhecem apenas o lado trivial do amor, os
infiéis são precisamente aqueles que conhecem o seu lado trágico.”
“– As mulheres não apreciam a beleza... pelo menos, as mulheres
boazinhas.”
“– Uma boa influência é coisa que não existe, Mr. Gray. Toda a
influência é imoral, imoral sob o ponto de vista científico.
– Por quê?
– Porque exercer a nossa influência sobre alguém é darmos a própria
alma. Esse alguém deixa de pensar com os pensamentos que Lhe são inerentes, ou
de se inflamar com as suas próprias paixões. As suas virtudes não lhe são
reais. Os seus pecados – se é que os pecados existem – são
emprestados. Tal pessoa passa a ser o eco da música de outrem, o ator de um
papel que não foi escrito para si. O objetivo da vida é o nosso desenvolvimento
pessoal. Compreender perfeitamente a nossa natureza – é para isso que estamos
cá neste mundo. Hoje as pessoas temem-se a si próprias. Esqueceram o mais nobre
de todos os deveres: o dever que cada um tem para consigo mesmo. É certo que
não deixam de ser caritativos. Dão de comer aos que têm fome e vestem os
pobres. Mas as suas almas andam famintas e nuas. A coragem desapareceu da nossa
raça. Ou talvez nunca a tivéssemos tido. O temor da sociedade, que é a base da
moral, o temor de Deus, que é o segredo da religião – eis as duas
coisas que nos governam. E, contudo (...) se um homem devesse viver a sua vida
em toda a plenitude, dar forma a todos os sentimentos, expressão a todos os
pensamentos, realidade a todos os sonhos, creio que o mundo ganharia um novo
impulso de alegria que nos levaria a esquecer todos os males do medievalismo e
a regressar ao ideal helênico. Talvez mesmo a algo mais refinado e mais rico
que o ideal helênico. Mas o mais ousado de todos nós teme a si mesmo. O
selvagem mutilado que nós somos sobrevive tragicamente na auto-rejeição que
frustra as nossas vidas. Somos punidos pelas nossas rejeições. Todo o impulso
que esforçadamente asfixiamos fica a fermentar no nosso espírito, e
envenena-nos. O corpo peca uma vez, e mais não precisa, pois a ação é um
processo de purificação. E nada fica, a não ser a lembrança de um prazer, ou o
luxo de um pesar. Ceder a uma tentação é a única maneira de nos libertarmos
dela. Se lhe resistimos, a alma enlanguesce, adoece com as saudades de tudo o
que a si mesma proíbe, e de desejo por tudo o que as suas leis monstruosas
converteram em monstruosidade e ilegalidade. Diz-se que as grandes realizações
deste mundo ocorrem no cérebro. É também no cérebro, e só aí, que ocorrem os
grandes erros do mundo.”
“– Só os sentidos podem curar a alma, assim como só a alma pode curar os sentidos.”
“– Só os sentidos podem curar a alma, assim como só a alma pode curar os sentidos.”
“– (...) Porque tem uma juventude deslumbrante, e a juventude é a
única coisa que vale a pena ter.
– Não penso assim, Lord Henry.
– Pois não, não pensa assim agora. Um dia, quando for velho,
enrugado e feio, quando o pensamento lhe tiver sulcado a fronte de rugas, e a
paixão, com suas chamas medonhas, lhe tiver crestado os lábios, sentirá então
uma impressão terrível. Agora, aonde quer que vá, consegue seduzir todas as
pessoas. Mas será sempre assim? Tem um rosto de beleza deslumbrante, Mr. Gray.
Não precisa fazer esse ar tão contrariado. É verdade. E a Beleza é uma forma de
Gênio, sendo mesmo superior ao gênio, pois não necessita de ser explicada. Ela
faz parte dos grandes elementos do universo, como a luz do sol, a Primavera, ou
o reflexo nas águas noturnas, dessa concha de prata a que chamamos lua. Não
pode ser contestada. Tem o direito divino de um soberano. Transforma em
príncipes os que a possuem. Sorri? Ah, quando a tiver perdido, deixará de
sorrir... Por vezes, ouve-se dizer que a Beleza é apenas superficial. Talvez
seja. Mas, ao menos, não é tão superficial como o Pensamento. Considero a
Beleza a maravilha das maravilhas. Só os fúteis não julgam pelas aparências. O
verdadeiro mistério do mundo é o visível, e não o invisível. Sim, Mr. Gray, os
deuses foram-lhe favoráveis. Mas os deuses dão agora, para tirar depois. O
senhor tem tão-somente alguns anos para poder viver a vida em real plenitude.
Quando a mocidade se for, com ela irá a sua beleza, e, então, cedo descobrirá
que não lhe restaram êxitos, ou terá que se contentar com os êxitos
insignificantes, que a lembrança do passado tornará mais amargos do que às
derrotas. À medida que os meses vão minguando, eles vão-no aproximando de algo
terrível. O tempo tem ciúmes de si, e faz guerra à primavera dos seus anos.
Então, ficará com a pele macilenta, as faces encovadas e o olhar mortiço. Irá
sofrer tormentos... Ah! Tome plena consciência da sua juventude enquanto a
possuir. Não esbanje o ouro dos seus dias a dar ouvidos a gente maçadora que
tenta aproveitar o fracasso irremediável, nem perca o seu tempo com os
ignorantes, os medíocres e os boçais. São esses os objetivos doentios, os
falsos ideais dos nossos dias. Viva, viva a vida maravilhosa que existe em si!
Não desperdice nenhuma oportunidade, procure sempre novas sensações. Não tenha
medo de nada... Um novo Hedonismo – eis o que faz falta ao nosso
século.”
“– Sempre! Que palavra horrível! Faz-me arrepios ouvi-la. As
mulheres é que gostam muito de a usar. Conseguem destruir um romance de amor
quando procuram fazê-lo durar para sempre. Além disso, é também uma palavra sem
sentido. A única diferença entre um capricho e uma paixão para toda a vida é
que o capricho dura um pouco mais.”
“– Adoro prazeres simples – respondeu Lord
Henry. – São o último refúgio dos complicados. Mas não gosto de
cenas, a não ser no palco. Que indivíduos tão absurdos vocês dois! Quem seria
que definiu o homem como um animal racional! Foi a definição mais prematura que
já se fez. O homem é muitas coisas, mas não é racional. Apesar de tudo, ainda
bem que o não é (...)”.
“– O pecado é o único elemento realmente colorido que ficou na vida
moderna.”
“– Os jovens querem ser fiéis, e não o são, os velhos querem ser
infiéis, e não o conseguem.”
“– Quem me dera poder confiar em mim mesmo.”
“– As raparigas americanas são tão hábeis a esconder os pais como o
são as mulheres inglesas a encobrir o seu passado.”
“– Gosto sempre de saber tudo dos meus novos amigos, e nada acerca
dos velhos.”
“– Como todas as pessoas que tentam esgotar um assunto, ele
esgotava os seus ouvintes.”
“– Consigo suportar a força bruta, mas a sensatez bruta é
absolutamente intolerável. Há certa deslealdade na sua utilização. Aplica o
golpe abaixo do intelecto.”
“– Eu sou capaz de ter simpatia por tudo, exceto pelo sofrimento.”
“Normalmente, atrasava-se sempre, tendo por princípio que a pontualidade
é o ladrão do tempo.”
“– É melhor nunca se casar, Dorian. Os homens casam-se por cansaço,
as mulheres, por curiosidade, e uns e outros ficam decepcionados.
– Não é provável que eu me case, Henry. Estou demasiado
apaixonado.”
“– Mas um dia as pessoas hão-de ouvir falar dela. Ela é um gênio.
– Meu caro, não há mulher alguma que seja um gênio. As mulheres
pertencem ao sexo de ornamento. Nunca têm nada para dizer, mas dizem-no de uma
maneira encantadora. As mulheres representam o triunfo da matéria sobre o
espírito, ao passo que os homens representam o triunfo do espírito sobre a
moral.”
“– Pessoas frívolas são aquelas que amam só uma vez na vida. Àquilo
a que chamam lealdade e fidelidade, chamo eu letargia do hábito ou falta de
imaginação. A fidelidade está para a vida emocional como a coerência está para
a vida do intelecto, quer dizer, uma simples confissão de fracassos. A
fidelidade! Preciso analisá-la um dia destes. Existe nela a paixão pela posse.
Há muitas coisas que atiraríamos fora se não receássemos que os outros as
pudessem apanhar.”
“– Quando uma pessoa se apaixona, começa sempre por se enganar a si
mesma e acaba sempre por enganar outras pessoas. A isso o mundo chama um caso
de amor.”
“– Depois perguntou-me se eu escrevia para os jornais. Respondi-lhe
que nem sequer os leio. Pareceu ter ficado extremamente decepcionado, e
confidenciou-me que todos os críticos de teatro estavam conluiados contra ele e
que todos eles se deixavam comprar – não me surpreendia nada que nisso ele
tivesse razão. Mas, por outro lado, a julgar pelo seu aspecto, grande parte
deles não devem sair muito caros.”
“– O judeu quis contar-me a história da vida dela, mas eu disse-lhe
que não estava interessado.
– Fez muito bem. Há sempre qualquer coisa extremamente mesquinha na
tragédia das outras pessoas.”
“– E você disse-me repetidas vezes que são as personalidades, e não
os princípios, que fazem mover os nossos tempos.”
“– É talvez preferível que você lhe escreva. Não quero estar a sós
com ele. Diz coisas que me aborrecem. Costuma dar-me bons conselhos.”
“Seria a alma uma sombra sentada na casa do
pecado?”
“Nós, por assim dizer, nunca nos entendíamos a nós mesmos e raramente
compreendíamos os outros. A experiência não tinha valor ético algum. Era
simplesmente o nome que os homens davam aos seus próprios erros. (...) Na
realidade, apenas demonstrava que o nosso futuro seria igual ao nosso passado,
e que o pecado, que cometêramos apenas uma vez e com relutância, seria cometido
muitas vezes e com prazer.”
“– As crianças começam por amar os pais, à medida que crescem
tornam-se seus juízes, perdoam-lhes, às vezes.”
“– Além disso, toda a experiência tem valor e, digam o que disserem
do casamento, ele é seguramente uma experiência.”
“– Gostamos de pensar tão bem dos outros porque temos medo de nós
mesmos. A base do otimismo é simplesmente o terror. Consideramo-nos generosos
porque atribuímos ao nosso semelhante o mérito de possuir aquelas virtudes que
poderão vir a beneficiar-nos.”
“– As mulheres são espantosamente práticas - murmurou Lord Henry -,
muito mais práticas do que nós. Em situações desse gênero nós esquecemo-nos
frequentemente de falar em casamento, mas elas fazem-nos lembrar.”
“– Ser bom é estar em harmonia consigo mesmo. (...) O conflito é ser obrigado a estar em harmonia com os outros.”
“– Eu sei o que é o prazer – afirmou Dorian
Gray. – É adorar alguém.
– Sempre é melhor do que ser adorado. (...) Ser adorado é uma
maçada. As mulheres tratam-nos exatamente como a Humanidade trata os seus
deuses. Veneram-nos, e depois andam sempre a importunar-nos com pedidos.”
“– As mulheres, como dizia, com espírito, um francês, inspiram-nos
o desejo de realizar obras-primas, e impedem-nos sempre de as executar.”
“– Existem apenas dois tipos de pessoas que são realmente
fascinantes: as que sabem absolutamente tudo e as que não sabem absolutamente
nada.”
“Há sempre qualquer coisa de ridículo nas emoções das pessoas que
deixamos de amar.”
“Além do mais, as mulheres tinham melhor preparação para o sofrimento do
que os homens. Viviam das próprias emoções, só pensavam nas suas emoções.”
“Numa época em que as coisas inúteis são as nossas únicas necessidades.”
“A auto-recriminação é um luxo. Quando nos autocensuramos, temos a
sensação de que mais ninguém tem o direito de nos censurar. É a confissão, e
não o sacerdote, que nos dá a absolvição.”
“– Meu caro Dorian, a única maneira de uma mulher poder alguma vez
regenerar um homem consiste em aborrecê-lo tanto, que ele perde todo o
interesse que possa ter pela vida. Você seria um desgraçado se tivesse casado
com essa rapariga. É certo que teria sido atencioso para com ela. Podemos ser
sempre atenciosos com as pessoas por quem não nos interessamos. Mas em pouco
tempo ela haveria de chegar à conclusão de que você Lhe era completamente
indiferente. E quando uma mulher chega a essa conclusão a respeito do marido,
ou se torna pavorosamente desmazelada, ou passa a usar toucas muito elegantes
pagas pelo marido de outra mulher.”
“– Infelizmente as mulheres apreciam a crueldade, a pura crueldade,
mais que tudo. Têm instintos espantosamente primitivos. Nós emancipamo-las,
mas, mesmo assim, continuam a ser escravas à procura dos seus senhores. Adoram
ser dominadas.”
“– Só as pessoas fúteis precisam de anos para se libertarem de
qualquer emoção. Um homem que seja senhor de si consegue pôr fim a uma tristeza
com a mesma facilidade com que inventa um prazer. Não quero ficar à mercê das
minhas emoções. Quero usá-las, desfrutá-las e dominá-las.”
“– Muitas vezes afigura-se-me que a arte esconde o artista muito
mais do que o revela.”
“(...) amando pela sua simples artificialidade as renúncias a que os
homens insensatamente chamavam virtude, bem como as rebeldias naturais a que os
homens sensatos continuam a chamar pecado.”
“Possivelmente, em quase todo o júbilo, como de certo em todo o prazer,
há lugar para a crueldade.”
“O culto dos sentidos tem sido frequentemente, e muito justamente,
condenado, dado que os homens sentem um natural instinto de terror em relação
às paixões e às sensações que parecem ser mais fortes do que eles, e de que têm
a consciência de partilhar com formas de vida inferiores.”
“Ao relembrar o percurso do homem ao longo da história, assediava-o um
sentimento de perda. Tanta renúncia! E para tão ínfimo propósito! Ocorreram
loucas rejeições deliberadas, formas monstruosas de autoflagelação e de
rejeição de si mesmo, com origem no medo, e cujo resultado foi uma degradação
infinitamente mais terrível do que a degradação imaginada.”
“– Não quero saber nada dessas coisas. Adoro os escândalos dos
outros, mas os escândalos acerca da minha pessoa não me interessam. Falta-lhes
o encanto da novidade.”
“Talvez nunca aparentemos tanta naturalidade como quando temos de
representar um papel.”
“E o resto era constituído por Ernest Harrowden, uma daquelas
mediocridades tão banais dos clubes de Londres que não têm inimigos mas que são
profundamente detestados pelos amigos (...)”
“– Os maridos das mulheres muito belas pertencem à classe dos
criminosos.”
“– A senhora nunca voltará a casar, Lady
Narborough – interrompeu Lord Henry. – Foi muito feliz.
Quando uma mulher se casa outra vez, é porque detestava o primeiro marido.
Quando um homem se casa outra vez, é porque adorava a primeira esposa. As
mulheres tentam a sorte, os homens arriscam a sua.”
“– As mulheres amam-nos pelos nossos defeitos. Se os tivermos em
número suficiente, perdoam-nos tudo, até a nossa inteligência. Parece-me que nunca
tornará a convidar-me para jantar, Lady Narborough, depois do que acabo de
dizer, mas é a pura verdade.
– Claro que é verdade, Lord Henry. Se nós as mulheres não os
amássemos pelos seus defeitos, onde estariam vocês todos? Nenhum de vocês se
teria casado. Seriam um bando de infelizes solteirões. Todavia, isso não os
iria modificar muito. Nos dias de hoje, todos os casados vivem como se fossem
solteiros, e os solteiros como se fossem casados.”
“– Os dislates que se dizem sobre casamentos felizes! – exclamou
Lord Henry. – Um homem pode ser feliz com qualquer mulher, desde que
não a ame.”
“– Não tem importância, Lady Narborough. Fumo em demasia.
Futuramente, vou ser mais comedida.
– Peço-lhe que não o faça, Lady Ruxton – interveio Lord
Henry. – A moderação é fatal. O suficiente é tão mau como uma refeição. O mais
do que suficiente é tão bom como um banquete.”
“– Você é tão curioso, Harry! Quer sempre saber o que os outros
fazem. E eu quero sempre esquecer o que fiz.”
“– Estou farto das mulheres que amam. As mulheres que odeiam têm
muito mais interesse.”
“A vida era demasiado curta para sobrecarregar os ombros com os erros
dos outros. Cada um vivia a sua vida, e pagava o seu preço por vivê-la. Só era
pena que se tivesse de pagar tantas vezes por um único erro. Na verdade,
pagava-se vezes sem conta. Nos seus negócios com o homem, o Destino nunca dava
as contas por encerradas.”
“É uma triste verdade, mas perdemos a capacidade de atribuir nomes
bonitos às coisas. Os nomes são tudo: Nunca tenho divergências com as ações.”
“– Eu comunico as verdades de amanhã.
– Eu prefiro os erros de hoje – replicou ela.
– Você desarma-me, Gladys – exclamou ele, apercebendo-se
da sua obstinação caprichosa.
– Do seu escudo, Harry, não da sua lança.
– Nunca uso lança contra a beleza – retorquiu, fazendo um
gesto com a mão.
– Esse é o seu erro, Harry, creia-me. Dá demasiado valor à beleza.
– Como pode dizer uma coisa dessas? Admito que considero melhor
ser-se belo do que ser-se bom. Mas, por outro lado, ninguém mais do que eu está
disposto a reconhecer que mais vale ser-se bom do que ser-se feio.”
“– Todo o efeito que produzimos dá-nos um inimigo. Para termos
popularidade temos de ser medíocres.
– Isso não acontece com as mulheres – disse a duquesa,
abanando a cabeça, – e as mulheres governam o mundo. Garanto-lhe que
não suportamos mediocridades. Nós as mulheres, como diz alguém, amamos com os
ouvidos, do mesmo modo que vocês os homens amam com os olhos, se é que vocês
amam mesmo.
– Parece-me que nunca fazemos outra coisa – murmurou
Dorian.
– Ah, nesse caso, realmente nunca amam, Mr. Gray – respondeu a
duquesa, num arremedo de mágoa.
– Minha querida Gladys! – exclamou Lord Henry. – Como
pode dizer isso? Um romance de amor vive da repetição, e a repetição converte
um apetite em arte. Além disso, cada vez que se ama é a única vez que já se
amou. A diferença no objeto do amor não altera a integridade da paixão. Só lhe
dá mais intensidade. Na melhor das hipóteses, podemos ter na vida apenas uma
experiência magnífica, e o segredo da vida está em reproduzir essa experiência
tantas vezes quanto possível.
– Mesmo quando ela nos magoou, Harry? – perguntou a
duquesa, após algum silêncio.
– Especialmente quando nos magoou – respondeu Lord Henry.
A duquesa voltou-se para Dorian Gray, olhando-o com uma expressão
singular.
– Que diz a isto, Mr. Gray? – perguntou-lhe.
Dorian hesitou um pouco. Depois atirou a cabeça para trás e riu-se.
– Eu concordo sempre com o Harry, duquesa.
– Mesmo quando ele não tem razão?
– O Harry tem sempre razão, duquesa.
– E a sua filosofia fá-lo feliz?
– Nunca busquei a felicidade. Quem quer a felicidade? Tenho buscado
o prazer.
– E encontrou-o, Mr. Gray?
– Muitas vezes. Vezes demais.”
“Quanto aos presságios, é coisa que não existe. O Destino não se faz
anunciar. Tem demasiado bom senso ou demasiada crueldade para o fazer.”
“– Uma mulher namora com qualquer pessoa deste mundo desde que
tenha espectadores.
– Como você gosta de dizer coisas perigosas, Harry! No caso
presente está muito enganado. Gosto muito da duquesa, mas não a amo.
– E a duquesa ama-o muito, mas gosta menos, por isso, estão feitos
um para o outro.
– Está a difamar sem haver motivo algum, Harry.
– O motivo de toda a difamação é uma certeza imoral – observou
Lord Henry.”
“– Está muito apaixonada por ele? – perguntou-lhe.
Ela demorou algum tempo a responder, quedando-se a contemplar a
paisagem.
– Quem me dera saber – disse, por fim.
Ele meneou a cabeça.
– O saber seria fatal. A incerteza é que dá encanto. A bruma torna
as coisas maravilhosas.
– Podemos perder-nos no caminho.
– Todos os caminhos vão dar ao mesmo sítio, minha querida Gladys.
– E qual é?
– O da desilusão.”
“– Meu rapaz – disse Lord Henry sorrindo –, no
campo, quem quer que seja pode ser boa pessoa. Lá não existem tentações. Por
esse motivo é que as pessoas que vivem fora da cidade são totalmente
incivilizadas. A civilização não é de modo algum fácil de se conseguir. Há
apenas duas maneiras possíveis de alcançá-la. Uma é através da cultura, a outra
através da corrupção. As pessoas que vivem no campo não têm oportunidade para
nenhuma delas e, por isso, estagnam.”
“– É certo que a vida de casado é simplesmente um hábito, um mau
hábito. Mas depois lamentamos a perda até dos nossos piores hábitos. São talvez
os que mais lamentamos. São uma parte essencial da nossa personalidade.”
“As coisas acerca das quais temos certezas absolutas nunca são
verdadeiras. Essa é a fatalidade da Fé e a lição da aventura amorosa.”
“– Para reaver a minha juventude, eu faria tudo
no mundo, exceto ginástica, levantar-me cedo, ou ser uma pessoa respeitável.”
Um comentário:
Esta postagem data de 2 de junho de 2009, porém, ocorreu algum problema de formatação nela, e por mais que eu tentasse não conseguia corrigir.
Restou postar novamente, então. Não faz mal, de qualquer modo, porque os trechos selecionados são interessantes.
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