terça-feira, 30 de abril de 2024

Somos as palavras que usamos, de Manuela D’ávila

Subtítulo: Um guia para entender (um pouco) e explicar (um pouquinho) o mundo

Editora: Planeta

Opinião: ★★☆☆☆

ISBN: 978-65-5535-823-0

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Páginas: 176

Sinopse: ACREDITO que as palavras, quando usadas para machucar, podem ser como bombas, mas, quando generosas, podem ser como pedaços de um caminho que aproxima. Afinal, como ensinou Saramago, “somos as palavras que usamos”, e eu quero, com este pequeno livro, te ajudar a encontrar as palavras certas para que determinados assuntos, tão importantes, deixem de ser o motivo de briga ou de silêncio na noite de Natal (não, eu não estava espiando a tua ceia de natal, eu simplesmente sei que isso aconteceu em quase todas as famílias) e passem a ser uma das razões para aquelas conversas que duram até tarde e que, dentro de nós, guardamos para sempre.

Nada do que você vai ler tem o sentido de ponto-final. Ao contrário, são reticências. Estou abrindo o papo para que tu sigas falando por aí. Para que as palavras que somos (porque usamos) sejam pontos para luz. E, nunca mais, para sombras.



“Não ter consciência de tudo não é um problema.

O problema é não ter acesso ao que te permite ter consciência.”

 

 

“É importante entender sobre liberdade de expressão justamente porque o discurso de ódio se situa num equilíbrio delicado entre direitos e princípios fundamentais, incluindo a liberdade de expressão e a defesa da dignidade humana, como afirma a SaferNet Brasil, organização referência no enfrentamento aos crimes e violações aos direitos humanos na internet. Mesmo que a definição de discurso de ódio seja aplicada a partir de cada caso concreto, levando em conta leis nacionais, tratados internacionais e termos de uso das plataformas, podemos defini-lo como manifestações que fomentam o ódio contra determinados grupos sociais baseadas em raça, etnia, gênero, orientação sexual, religião ou origem nacional.

O discurso de ódio, exposto de maneira mais nítida ou mais sutil, aprofunda preconceitos contra grupos específicos e, hoje em dia, é impossível dissociá-lo da fábrica de desinformação, explorando preconceitos e construindo uma reação moral que naturaliza a raiva contra quem é, na verdade, vítima.”

 

 

“Estima-se que, dos aproximadamente 12 milhões de africanos levados como escravizados, 5 milhões chegaram ao Brasil. Talvez você não saiba, mas esse número é mais de dez vezes superior ao norte-americano. Talvez você também não saiba que nosso país foi o último país das Américas a acabar com a escravização, que durou quase quatrocentos anos.

Nos longínquos anos 1990, quando eu fiz o Ensino Fundamental, 13 de maio marcava a data de assinatura da Lei Áurea pela princesa Isabel. Pouco se estudava sobre a luta do povo negro que culminou na abolição e muito se dizia da virtual “benevolência” de Isabel. Praticamente nada se dizia sobre a assinatura da lei não ter garantido direitos para a população negra. É por isso que, nos últimos cinquenta anos, o movimento negro reivindica o 20 de novembro como data de suas lutas. (...)

Mas, agora que tu já sabes a dimensão da escravização no Brasil e as razões pelas quais o movimento negro refuta o 13 de maio como data da liberdade, qual o resultado desse processo para o nosso país? Poderia o mais longevo e numericamente expressivo processo de escravização resultar numa população que vive harmoniosamente, independentemente da raça? Quantas vezes você leu na internet que esse debate sobre raça divide o povo brasileiro, que é miscigenado?

No livro Racismo estrutural, Silvio Almeida afirma que é impossível compreender a sociedade contemporânea sem os conceitos de raça e racismo e que o conceito de raça, mesmo que de maneira velada, sempre dialoga com a filosofia, a ciência política, a teoria econômica etc. Ou seja, o conceito de raça precisa ser compreendido dentro dos marcos das circunstâncias históricas em que é utilizado. Entre os séculos XVII e XVIII, a classificação de seres humanos (raça) emergiu para justificar — diante de uma Europa que vivia o apogeu do Iluminismo e de suas revoluções liberais — a destruição das populações das Américas, da África, da Ásia e da Oceania pelo colonialismo europeu. Depois, no final do século XIX, com a primeira grande crise do capitalismo de 1873, as grandes nações pactuaram a ocupação da África (neocolonialismo) com base na ideia de inferioridade racial.

O racismo é a discriminação sistêmica baseada em raça, podendo ser consciente ou inconsciente. Por que usar discriminação em vez de preconceito? Essa é uma questão que pode parecer irrelevante, mas não é. E está relacionada a outras questões que surgem por aí.

Vamos lá: o preconceito é o juízo a partir de estereótipos raciais, por exemplo, judeus são bons em lidar com dinheiro, quenianos nascem para a corrida. Isso pode ou não se transformar em discriminação. Já o racismo pressupõe o tratamento diferente em função do pertencimento a um grupo racializado e, para tanto, exige o exercício do poder.”

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