Lista de Livros no YouTube

Lista Completa

sábado, 3 de julho de 2021

O Capital: crítica da economia política. Livro III: o processo global da produção capitalista (Parte I), de Karl Marx

Editora: Boitempo

Edição: Friedrich Engels

ISBN: 978-85-7559-390-5

Tradução: Rubens Enderle

Opinião: ★★★☆☆

Páginas: 984

Sinopse: Certamente um dos livros mais aguardados do ano é este volume da obra-prima de crítica da economia política de Marx. Intitulado O processo global da produção capitalista, o texto procura conjugar as análises do Livro I (dedicado ao processo de produção do capital) e do Livro II o (dedicado ao processo de circulação do capital).Embora possa ser considerado em muitos sentidos o ápice da obra de Marx – é nele que está contida, por exemplo, a famosa apresentação do problema da queda tendencial da taxa de lucro, bem como toda a discussão sobre capital de comércio financeiro –, o Livro III de O capital é também um texto muito delicado, porque não chegou a ser finalizado em vida pelo autor, sendo editado posteriormente por Friedrich Engels. Por isso é tão importante o fato de a edição da Boitempo ser a primeira realizada a partir dos documentos da MEGA-2 (Marx-Engels-Gesamtausgabe), que traz a mais completa e minuciosa apuração dos manuscritos, notas e apontamentos de Marx e das opções de Friedrich Engels para a publicação.



Quando as coisas e suas relações recíprocas não são concebidas como fixas, mas como mutáveis, também seus reflexos mentais, os conceitos, estão igualmente submetidos a modificação e renovação; que estes não se encontram enclausurados em definições rígidas, mas desenvolvidos em seu processo de formação histórico ou, a depender do caso, lógico.” (Friedrich Engels)

 

 

A fórmula geral do capital é D-M-D’; isto é, uma soma de valor é posta em circulação para dela se extrair uma soma de valor maior. O processo que cria essa soma de valor maior é a produção capitalista; o processo que a realiza é a circulação do capital. O capitalista produz a mercadoria não em razão dela mesma, não em razão de seu valor de uso ou para consumo próprio. O produto que o capitalista tem realmente em vista não é o produto palpável em si, mas o excedente de valor do produto, acima do valor do capital nele consumido. O capitalista adianta o capital total sem levar em consideração os diferentes papéis que seus componentes desempenham na produção do mais-valor. Ele adianta todos esses componentes em igual medida, não só para reproduzir o capital adiantado, mas para produzir um excedente de valor sobre esse capital. Transformar o valor do capital variável por ele adiantado num valor maior é algo que ele só pode fazer por meio de seu intercâmbio com trabalho vivo, da exploração de trabalho vivo. E ele só pode explorar o trabalho na medida em que adianta as condições para a realização desse trabalho – os meios e os objetos de trabalho, a maquinaria e a matéria-prima –, isto é, na medida em que utiliza, na forma de condições de produção, uma soma de valor de que dispõe; do mesmo modo, ele só é capitalista, só é capaz de promover o processo de exploração do trabalho, porque, como proprietário das condições de trabalho, ele se confronta com o trabalhador como mero proprietário da força de trabalho. No Livro I[a], já mostramos que é precisamente a posse desses meios de produção pelo não trabalhador que transforma os trabalhadores em assalariados e os não trabalhadores em capitalistas.”

[a] Cf. Karl Marx, O capital, Livro I, cit., p. 244. (N. T.)

 

 

A produção capitalista, quando a consideramos de forma isolada, abstraindo do processo da circulação e dos excessos da concorrência, lida de modo extremamente parcimonioso com o trabalho efetivado, objetivado em mercadorias. Em contrapartida, ela é, num grau muito maior que qualquer outro modo de produção, uma dissipadora de seres humanos, de trabalho vivo, uma dissipadora não só de carne e sangue, mas também de nervos e cérebro. Com efeito, é apenas por meio do mais gigantesco desperdício de desenvolvimento individual que o desenvolvimento da humanidade em geral é assegurado e conduzido na época histórica que precede imediatamente à reconstituição consciente da sociedade humana. Como toda essa economia, da qual se trata aqui, resulta do caráter social do trabalho, conclui-se que é esse caráter imediatamente social do trabalho que gera essa dissipação de vida e de saúde dos trabalhadores. Característica, nesse sentido, é a pergunta lançada pelo inspetor de fábricas R. Baker: “A questão inteira é digna de uma séria consideração: qual é a melhor maneira de evitar esse sacrifício da vida infantil ocasionado pelo trabalho em massas aglomeradas?” (Rep.[orts of the Inspectors of] Fact.[ories], Oct.[ober] 1863, p. 157).”

 

 

Como quer que estejam regulados os preços, o resultado é o seguinte:

1.      A lei do valor rege seu movimento, uma vez que a alta ou a baixa dos preços de produção decorrem do aumento ou diminuição do tempo de trabalho requerido para a produção. É nesse sentido que Ricardo (que, sem dúvida, percebe que seus preços de produção diferem dos valores das mercadorias) diz que the inquiry to which he wishes to draw the reader’s attention, relates to the effect of the variations in the relative value of commodities, and not in their absolute value[d].

2.     O lucro médio, que determina os preços de produção, tem de ser sempre aproximadamente igual à quantidade de mais-valor que corresponde a um capital dado como alíquota do capital social total. Suponhamos que a taxa geral de lucro e, por conseguinte, o lucro médio estejam expressos num valor monetário mais elevado que o mais-valor médio real, calculado segundo seu valor monetário. Para os capitalistas, é indiferente que cada um deles cobre do outro um lucro de 10% ou 15%. Nenhuma dessas porcentagens corresponde a um valor-mercadoria real maior que a outra, já que o exagero na expressão monetária é recíproco. Mas, no que diz respeito aos trabalhadores (estando pressuposto que eles recebem o salário normal, de modo que o aumento do lucro médio não expressa uma dedução real do salário, isto é, expressa uma coisa inteiramente distinta do mais-valor normal do capitalista), o aumento dos preços das mercadorias, que resulta do aumento do lucro médio, precisa corresponder a uma elevação na expressão monetária do capital variável. Na realidade, essa elevação nominal geral da taxa de lucro e do lucro médio acima da taxa dada pela relação entre o mais-valor real e o capital total adiantado não é possível sem produzir uma alta do salário e, do mesmo modo, uma alta dos preços das mercadorias que formam o capital constante. O mesmo ocorre, de maneira inversa, no caso de uma redução. Como o valor total das mercadorias regula o mais-valor total, que, por sua vez, regula o grau do lucro médio e, assim, da taxa geral de lucro – seja como norma geral, seja regulando as flutuações –, então a lei do valor regula os preços de produção.

O que a concorrência realiza, começando por uma esfera individual da produção, é a criação de um valor de mercado e um preço de mercado iguais a partir dos diversos valores individuais das mercadorias. E é a concorrência dos capitais nas diversas esferas que primeiro fixa o preço de produção, equalizando as taxas de lucro nas distintas esferas. Este último processo requer um grau mais elevado de desenvolvimento do modo de produção capitalista do que o anterior.

Para que as mercadorias da mesma esfera de produção, do mesmo tipo e aproximadamente da mesma qualidade, possam ser vendidas a seus valores, são necessárias duas coisas:

Primeiramente, que os diversos valores individuais se equalizem num só valor social, o valor de mercado a que nos referimos anteriormente; para isso, requer-se uma concorrência entre os produtores do mesmo tipo de mercadorias, bem como a existência de um mercado no qual eles ofertem conjuntamente suas mercadorias. Para que o preço de mercado de mercadorias idênticas, porém produzidas, cada uma delas, sob circunstâncias ligeiramente distintas, corresponda ao valor de mercado, não divergindo dele, seja com uma elevação acima, seja com uma redução abaixo de seu valor, é necessário que a pressão que os diversos vendedores exercem uns sobre os outros seja grande o suficiente para lançar no mercado a massa de mercadorias requerida para a satisfação das necessidades sociais, isto é, a quantidade pela qual a sociedade pode pagar o valor de mercado. Se a massa de produtos lançada no mercado excede essas necessidades, as mercadorias terão de ser necessariamente vendidas abaixo de seu valor de mercado; no caso contrário, precisarão ser vendidas acima de seu valor de mercado, caso a massa de produtos não seja suficiente ou, o que dá no mesmo, a pressão da concorrência entre os vendedores não seja suficientemente forte para obrigá-los a levar ao mercado essa massa de mercadorias. Se varia o valor de mercado, variam também as condições nas quais a massa total de mercadorias pode ser vendida. Caindo o valor de mercado, crescem, em média, as necessidades sociais (que, nesse caso, são sempre necessidades solventes), que podem então absorver massas maiores de mercadorias. Subindo o valor de mercado, contraem-se as necessidades sociais com relação a essas mercadorias, de modo que apenas massas menores destas últimas podem ser absorvidas. Assim, se a oferta e a demanda regulam o preço de mercado ou, melhor dizendo, os desvios dos preços de mercado com relação ao valor de mercado, temos que, por outro lado, este regula a relação entre oferta e demanda ou é o centro em torno do qual as flutuações da oferta e da demanda fazem oscilar os preços de mercado.

Se observamos a questão mais de perto, percebemos que as condições que regem o valor da mercadoria individual se reproduzem aqui como condições para o valor da soma total de um tipo[e]; que a produção capitalista é, em si mesma, produção em massa e que, pelo menos quanto às mercadorias principais, outros modos de produção menos desenvolvidos concentram, acumulam e põem a venda no mercado, em grandes massas e nas mãos de relativamente poucos comerciantes, o produto fabricado em pequena quantidade como produto coletivo – ainda que fruto do trabalho de um grande número de produtores de pequeno porte – de um ramo inteiro da produção ou de um contingente maior ou menor deste último.

Observemos aqui, apenas de passagem, que as “necessidades sociais”, isto é, aquilo que regula o princípio da demanda, encontram-se essencialmente condicionadas pela relação das diversas classes entre si e por sua respectiva posição econômica, ou seja, em primeiro lugar, pela proporção entre o mais-valor total e o salário; em segundo lugar, pela proporção entre as diversas partes nas quais se decompõe o mais-valor (lucro, juros, renda fundiária, impostos etc.). De modo que aqui novamente se demonstra que não se pode explicar absolutamente nada a partir da relação entre a oferta e a demanda, antes de estar desenvolvida a base sobre a qual opera essa relação.

Ainda que ambos os elementos, a mercadoria e o dinheiro, sejam unidades de valor de troca e de valor de uso, já vimos (Livro I, capítulo 1, item 3) que, nas operações de compra e venda, essas duas funções aparecem distribuídas como polos extremos, de modo que a mercadoria (vendedor) representa o valor de uso, e o dinheiro (comprador), o valor de troca. A mercadoria tem um valor de uso, ou seja, satisfaz uma necessidade social, e isso constitui precisamente um dos requisitos da venda. O outro requisito é, como vimos, que a quantidade de trabalho contida na mercadoria represente trabalho socialmente necessário, ou seja, que o valor individual (e, o que sob esse pressuposto é sinônimo, o preço de venda) da mercadoria coincida com seu valor social[28].”

[d] “A investigação para a qual ele deseja chamar a atenção do leitor refere-se ao efeito das variações no valor relativo das mercadorias, não em seu valor absoluto.” (N. T.)

[e] Leia-se: de um tipo de mercadorias. (N. T.)

[28] Karl Marx, Zur Kritik der pol.[itischen] Ök.[onomie] (Berlim, 1859) [ed. bras.: Contribuição à crítica da economia política, trad. Florestan Fernandes, São Paulo, Expressão Popular, 2008].

 

 

Embora cada artigo ou cada quantidade determinada de um tipo de mercadoria possa conter somente o trabalho social requerido para sua produção e embora, considerado sob esse aspecto, o valor de mercado de toda essa classe de mercadoria represente apenas trabalho necessário, quando a mercadoria determinada tiver sido produzida numa medida que, em dado momento, ultrapasse a necessidade social, uma parte do tempo de trabalho social terá sido desperdiçada, e a massa de mercadorias representará então, no mercado, uma quantidade de trabalho social muito menor que a quantidade nela efetivamente contida. (É somente onde a produção está submetida a um controle preestabelecido da sociedade que esta última pode estabelecer a coordenação necessária entre o tempo de trabalho social aplicado na produção de determinados artigos e o volume da necessidade social que esse artigo deve satisfazer.) Por conseguinte, essas mercadorias têm de ser vendidas abaixo de seu valor de mercado, e uma parte delas pode até tornar-se invendável. Já quando o volume do trabalho social empregado para a produção de uma classe determinada de mercadorias é pequeno demais para o volume da necessidade social particular que esse produto deve satisfazer, o resultado é o inverso. Em contrapartida, se o volume do trabalho social empregado para a produção de um artigo determinado corresponde ao volume da necessidade social a ser satisfeita, de modo que, mantendo-se inalterada a demanda, a massa produzida corresponda à escala habitual da reprodução, então a mercadoria será vendida por seu valor de mercado. O intercâmbio ou a venda das mercadorias por seu valor é o racional [das Rationelle], a lei natural de seu equilíbrio; dela devemos partir para explicar os desvios – e não o inverso, partir dos desvios para explicar a lei.”

 

 

Com um salário e uma jornada de trabalho dados, um capital variável, por exemplo, de 100, representa um número determinado de trabalhadores postos em movimento; ele é o índice desse número. Seja de £100 o salário de 100 trabalhadores, digamos, por 1 semana. Se esses 100 trabalhadores efetuam tanto trabalho necessário quanto mais-trabalho, ou seja, se trabalham diariamente tanto tempo para si mesmos, isto é, para a reprodução de seu salário, quanto para o capitalista, quer dizer, para a produção de mais-valor, seu produto de valor total seria = £200, e o mais-valor por eles gerado seria de £100. A taxa do mais-valor m/v seria = 100%. No entanto, ela se expressaria, como vimos, em taxas de lucro muito diversas segundo os vários volumes do capital constante c e, por conseguinte, do capital total C, uma vez que a taxa de lucro = C. Sendo a taxa de mais valor 100%,

se c = 50 e v = 100, então l’ = 100/150 = 66%

se c = 100 e v = 100, então l’ = 100/200 = 50%

se c = 200 e v = 100, então l’ = 100/300 = 33%

se c = 300 e v = 100, então l’ = 100/400 = 25%

se c = 400 e v = 100, então l’ = 100/500 = 20%

A mesma taxa de mais-valor, com um grau de exploração constante do trabalho, seria expressa assim numa taxa decrescente de lucro, porque, com seu volume material, também aumenta, ainda que não na mesma proporção, o volume de valor do capital constante e, com isso, do capital total.

Se, além disso, partirmos do pressuposto de que essa alteração gradual na composição do capital não se opera simplesmente em esferas isoladas da produção, mas, em maior ou menor grau, em todas ou pelo menos nas esferas decisivas da produção e que, portanto, essas alterações afetam a composição orgânica média do capital total existente numa determinada sociedade, chegaremos necessariamente à conclusão de que crescimento gradual do capital constante em proporção ao variável tem necessariamente como resultado uma queda gradual na taxa geral de lucro, mantendo-se constante a taxa do mais-valor, ou seja, o grau de exploração do trabalho pelo capital. Porém, vimos que constitui uma lei do modo de produção capitalista que, conforme este se desenvolve, opera-se uma diminuição relativa do capital variável em relação ao capital constante e, assim, em proporção ao capital total mobilizado. Isso significa apenas que o mesmo número de trabalhadores, a mesma quantidade de força de trabalho tornada disponível por um capital variável de volume de valor dado, mobiliza – elabora, consome produtivamente –, em consequência dos métodos de produção peculiares que se desenvolvem no interior da produção capitalista, uma massa sempre crescente de meios de trabalho, maquinaria e capital fixo de todo tipo, matérias-primas e materiais auxiliares, no mesmo intervalo de tempo e, por conseguinte, também um capital constante de volume de valor sempre crescente. Essa diminuição relativa crescente do capital variável em relação ao capital constante e, assim, ao capital total, é idêntica ao aumento progressivo da composição orgânica do capital social em sua média. E, do mesmo modo, não é mais que outro modo de expressar o desenvolvimento progressivo da força produtiva social do trabalho, que se revela precisamente no fato de que, graças ao emprego crescente de maquinaria e de capital fixo em geral, o mesmo número de trabalhadores transforma em produtos uma quantidade maior de matérias-primas e materiais auxiliares no mesmo tempo, ou seja, com menos trabalho. A esse crescente volume de valor do capital constante – embora ele só represente de forma longínqua o crescimento da massa real dos valores de uso, das quais o capital constante é materialmente constituído – corresponde um crescente barateamento do produto. Cada produto, considerado em si mesmo, contém uma soma de trabalho menor que nos estágios inferiores da produção, nos quais o capital desembolsado em trabalho se encontra em proporção incomparavelmente maior em relação ao capital desembolsado em meios de produção. Portanto, a série hipoteticamente formulada no início expressa a tendência efetiva da produção capitalista. Com a queda progressiva do capital variável em relação ao capital constante, a produção capitalista gera uma composição orgânica cada vez mais alta do capital total, que tem como consequência imediata o fato de que a taxa do mais-valor, mantendo-se constante e inclusive aumentando o grau de exploração do trabalho, se expressa numa taxa geral de lucro sempre decrescente. (Adiante mostraremos por que esse decréscimo aparece não nessa forma absoluta, mas, antes, tendendo a uma queda progressiva.) A tendência progressiva da taxa geral de lucro à queda é, portanto, apenas uma expressão, peculiar ao modo de produção capitalista, do desenvolvimento progressivo da força produtiva social do trabalho. Não dizemos, com isso, que a taxa de lucro não possa cair provisoriamente por outras razões, mas demonstramos como uma necessidade evidente, com base na própria essência do modo de produção capitalista, que no progresso deste último a taxa média geral do mais-valor tem necessariamente de se expressar numa taxa geral decrescente de lucro. Assim como a massa do trabalho vivo empregado sempre decresce em relação à massa do trabalho objetivado que o trabalho vivo mobiliza, isto é, em relação aos meios de produção produtivamente consumidos, também a parte desse trabalho vivo que não é paga e que se objetiva em mais-valor tem de encontrar-se numa proporção sempre decrescente em relação ao volume de valor do capital total empregado. E essa proporção entre a massa de mais-valor e o valor do capital total empregado constitui a taxa de lucro, que tem, portanto, de diminuir constantemente.

Ainda que, de acordo com o que foi exposto até aqui, essa lei pareça muito simples, toda a economia política não conseguiu descobri-la até o momento atual, como veremos numa seção posterior. Ela vislumbrou o fenômeno e supliciou-se em contraditórias tentativas de interpretá-lo. Porém, dada a grande importância que possui para a produção capitalista, pode-se dizer que essa lei constitui o mistério de toda a economia política desde Adam Smith e que a diferença entre as diversas escolas desde Adam Smith consiste nas tentativas de lhe dar uma solução. Se, por outro lado, menciona-se o fato de que a economia política até o presente tateava às cegas a diferença entre capital constante e capital variável, sem jamais conseguir formulá-la com exatidão; que ela jamais apresentou o mais-valor separado do lucro, tampouco este último em forma pura, em contraste com seus diversos componentes reciprocamente autonomizados como lucro industrial, lucro comercial, juros, renda fundiária; que ela jamais analisou profundamente a diferença na composição orgânica do capital e, por isso, tampouco o fez com a formação da taxa geral de lucro – então deixa de ser enigmático o fato de que ela jamais tenha encontrado a solução desse enigma. (...)

A lei da taxa decrescente de lucro, na qual se expressa a mesma taxa ou inclusive uma taxa superior de mais-valor, quer dizer, em outras palavras, que, partindo de uma quantidade determinada qualquer do capital social médio, por exemplo, de um capital de 100, a parte destinada a meios de trabalho tende sempre a aumentar, ao passo que a destinada ao trabalho vivo tende a diminuir. Como a massa total do trabalho vivo agregado aos meios de produção diminui em relação ao valor desses meios de produção, diminui também o trabalho não pago e a parcela de valor na qual ele se representa, em relação ao valor do capital total adiantado. Ou: uma alíquota sempre menor do capital total desembolsado converte-se em trabalho vivo, e esse capital total suga, assim, cada vez menos mais-trabalho em relação a sua grandeza, embora a proporção entre a parte não paga do trabalho empregado e a parte paga deste último possa crescer simultaneamente. O decréscimo relativo do capital variável e o acréscimo do capital constante, apesar de ambos crescerem em termos absolutos, é, como já vimos, apenas outra expressão da produtividade aumentada do trabalho. (...)

A lei da queda progressiva da taxa de lucro ou da diminuição relativa do mais-trabalho apropriado em comparação com a massa de trabalho objetivado posta em movimento pelo trabalho vivo não exclui de modo nenhum a possibilidade de crescer a massa absoluta do trabalho posto em movimento e explorado pelo capital social e, por conseguinte, também a massa absoluta do mais-trabalho por ele apropriado; tampouco exclui o fato de que os capitais que se encontram nas mãos de diversos capitalistas movimentem uma massa crescente de trabalho e, assim, de mais-trabalho, ainda que não aumente o número dos trabalhadores por eles empregados.”

 

 

Aqui se mostra a lei já exposta[b], segundo a qual, na medida em que diminui relativamente o capital variável, isto é, na medida em que se desenvolve a força produtiva social do trabalho, uma massa maior de capital total é necessária para pôr em movimento a mesma quantidade de força de trabalho e absorver a mesma massa de mais-trabalho. Por isso, na mesma proporção em que se desenvolve a produção capitalista, desenvolve-se a possibilidade de uma população trabalhadora relativamente supranumerária, não porque a força produtiva do trabalho social diminui, mas porque aumenta, isto é, não por uma desproporção absoluta entre trabalho e meios de existência ou meios para a produção desses meios de existência, mas por uma desproporção decorrente da exploração capitalista do trabalho, da desproporção entre o crescimento progressivo do capital e sua necessidade relativamente decrescente de uma população cada vez maior.

Se a taxa de lucro cai em 50%, então ela cai pela metade. Portanto, para que a massa de lucro permaneça constante, o capital terá de duplicar-se. Para que a massa do lucro continue a mesma ao diminuir a taxa de lucro, o multiplicador que indica o crescimento do capital total tem de ser igual ao divisor que indica a queda da taxa de lucro. Se a taxa de lucro cai de 40 para 20, o capital total tem de aumentar inversamente na proporção de 20 : 40, a fim de que o resultado permaneça o mesmo. Se a taxa de lucro tivesse diminuído de 40 para 8, então o capital precisaria aumentar na relação de 8 : 40, isto é, o quíntuplo. Um capital de 1.000.000 a 40% produz 400.000, e um capital de 5.000.000 a 8% produz igualmente 400.000. Isso tem validade para que o resultado permaneça o mesmo. Se, pelo contrário, o resultado deve aumentar, então o capital terá de crescer numa proporção maior que aquela em que diminui a taxa de lucro. Em outros termos, para que o componente variável do capital total não só permaneça invariável em termos absolutos, mas para que aumente, ainda que diminua sua porcentagem do capital total, é necessário que este último cresça numa proporção maior que a queda percentual do capital variável. Ele tem de aumentar tanto que, em sua nova composição, necessite não só da antiga parte variável do capital, mas de uma quantidade ainda maior desta última para a compra de força de trabalho. Se a parte variável de um capital = 100 diminui de 40 para 20, então o capital total terá de aumentar a mais de 200 para poder empregar um capital variável maior que 40.

Ainda que a massa explorada da população trabalhadora permanecesse constante e só aumentassem a duração e a intensidade da jornada de trabalho, a massa do capital empregado teria de aumentar, inclusive para que, ao mudar a composição modificada do capital, ela pudesse empregar a mesma massa de trabalho sob as antigas condições de exploração.

Portanto, com o progresso do modo de produção capitalista, o mesmo desenvolvimento da força produtiva social do trabalho se expressa, por um lado, numa tendência à queda progressiva da taxa de lucro e, por outro, no aumento constante da massa absoluta do mais-valor ou do lucro apropriado; de modo que, em geral, ao decréscimo relativo do capital variável e do lucro corresponde um aumento absoluto de ambos. Como já demonstramos, esse efeito dúplice só se pode representar num aumento do capital total em progressão mais acelerada que aquela na qual diminui a taxa de lucro. No caso de uma composição mais alta ou um aumento relativo mais intenso do capital constante, o emprego de um capital variável acrescido em termos absolutos requer que o capital total aumente não só na proporção da composição mais alta, mas com rapidez ainda maior. Disso se segue que, quanto mais se desenvolve o modo de produção capitalista, uma quantidade cada vez maior de capital é requerida para ocupar a mesma força de trabalho e, mais ainda, para ocupar uma força de trabalho crescente.”

[b] Cf. Karl Marx, O capital, Livro I, cit., p. 699-700 e 719-20. (N. T.)

 

 

A massa de mais-valor gerada por um capital de dada grandeza é produto de dois fatores: da taxa do mais-valor, multiplicada pelo número de trabalhadores empregados com a taxa dada. Portanto, dada a taxa do mais-valor, ela depende do número de trabalhadores, e dado o número de trabalhadores, depende da taxa do mais-valor, ou seja, depende em geral da relação composta entre a grandeza absoluta do capital variável e a taxa do mais-valor. Ora, ficou demonstrado que, via de regra, as causas que elevam a taxa do mais-valor relativo são as mesmas que reduzem a massa da força de trabalho empregada, mas está claro que, nesse caso, produz-se mais ou menos, conforme a proporção determinada em que se realiza esse movimento antitético, e que a tendência de diminuição da taxa de lucro é especialmente enfraquecida pela elevação da taxa do mais-valor absoluto, gerado graças ao prolongamento da jornada de trabalho.

No caso da taxa de lucro, descobrimos, em geral, que o crescimento da massa de lucro corresponde à diminuição da taxa ocasionada pelo aumento da massa do capital total empregado. Considerando o capital variável total da sociedade, o mais-valor que ele gera é igual ao lucro produzido. Além da massa absoluta, cresceu também a taxa de mais-valor – a primeira, devido ao aumento da massa da força de trabalho empregada pela sociedade; a segunda, devido ao aumento do grau de exploração desse trabalho. Porém, com relação a um capital de dada grandeza, por exemplo, de 100, a taxa do mais-valor pode aumentar enquanto diminui a média de sua massa, uma vez que a taxa está determinada pela proporção em que a parte variável do capital se valoriza, ao passo que a massa se determina pela parte proporcional do capital total que constitui o capital variável.

O aumento da taxa de mais-valor – porquanto ele também ocorre especialmente em circunstâncias em que, como indicado, não se verifica um aumento do capital constante nem um aumento relativo deste último com relação ao capital variável – é um fator por meio do qual se determinam a massa do mais-valor e, por conseguinte, também a taxa de lucro. Ele não derroga a lei geral, mas faz com que esta atue mais como tendência, isto é, como uma lei cuja aplicação absoluta é contida, refreada e enfraquecida por circunstâncias contra-arrestantes. Considerando que as mesmas causas que elevam a taxa do mais-valor (o prolongamento do tempo de trabalho é um resultado da grande indústria) tendem a diminuir a força de trabalho empregada por dado capital, essas mesmas causas tendem a diminuir a taxa de lucro e a frear o movimento dessa diminuição. Se um trabalhador é forçado a efetuar o trabalho que racionalmente só poderia ser executado por dois trabalhadores e se isso ocorre em circunstâncias nas quais ele poderia substituir outros três, esse trabalhador produzirá tanto mais-trabalho quanto antes o forneciam dois trabalhadores e, em tal medida, terá aumentado a taxa do mais-valor. Mas ele não produzirá tanto quanto antes produziam três, e desse modo a massa do mais-valor terá diminuído. Sua queda estará compensada ou limitada pelo aumento da taxa do mais-valor. Se a população inteira for ocupada com a taxa do mais-valor aumentada, aumentará a massa do mais-valor, ainda que a população permaneça a mesma. E aumentará ainda mais se a população crescer – embora isso esteja ligado a uma queda relativa do número de trabalhadores ocupados em relação com a grandeza de capital total, tal queda se verá moderada ou freada pelo aumento na taxa de mais-valor.

Antes de finalizar esse ponto, cabe sublinhar uma vez mais que, com uma grandeza dada do capital, pode ocorrer um aumento da taxa do mais-valor, embora sua massa diminua, e vice-versa. A massa do mais-valor é igual à taxa multiplicada pelo número de trabalhadores; a taxa jamais é calculada sobre o capital total, mas sobre o capital variável e, com efeito, apenas sobre uma jornada de trabalho em cada caso. Ao contrário, com uma grandeza dada do valor de capital, a taxa de lucro jamais pode aumentar ou diminuir sem que também aumente ou diminua a massa do mais-valor.”

 

 

“O pressuposto de Ricardo, de que o lucro industrial (mais os juros) embolsa originalmente todo o mais-valor, é histórica e conceitualmente falso. Pelo contrário, é apenas o progresso da produção capitalista que 1) dá aos capitalistas industriais e comerciais todo o lucro para sua ulterior distribuição e 2) reduz a renda ao excedente acima do lucro. Sobre essa base capitalista cresce, por sua vez, a renda (que é uma parte do lucro, isto é, do mais-valor considerado produto do capital total), mas não a parte específica do produto que o capitalista embolsa.

Estando pressuposta a existência dos meios de produção necessários, isto é, de uma acumulação suficiente de capital, a criação de mais-valor pode encontrar apenas dois obstáculos: a população trabalhadora, se está dada a taxa de mais-valor, isto é, o grau de exploração do trabalho; e o grau de exploração do trabalho, se está dada a população trabalhadora. O processo de produção capitalista consiste essencialmente na produção de mais-valor, representado pelo mais-produto, ou na alíquota das mercadorias produzidas, na qual o trabalho não pago está objetivado. Não se pode jamais esquecer que a produção desse mais-valor – e a reconversão de parte dele em capital (ou seja, a acumulação) constitui parcela integrante dessa produção do mais-valor – é a finalidade direta e o motivo determinante da produção capitalista. Razão pela qual não se deve apresentá-la como o que ela não é, a saber, como uma produção que tem por finalidade direta o desfrute ou a criação de meios de desfrute para o capitalista. Com isso, abstraímos inteiramente de seu caráter específico, que se apresenta em toda sua configuração nuclear interna.

A obtenção desse mais-valor constitui o processo direto de produção, que, como já dissemos, não encontra outros obstáculos senão os já indicados. O mais-valor estará produzido tão logo a quantidade espoliável de mais-trabalho estiver objetivada. Mas com essa produção do mais-valor está consumado apenas o primeiro ato do processo de produção capitalista, o processo direto de produção. O capital absorveu certa quantidade de trabalho não pago. Com o desenvolvimento do processo que se expressa na queda da taxa de lucro, a massa do mais-valor assim produzido aumenta monstruosamente. Tem-se, então, o segundo ato do processo. É preciso vender a massa inteira das mercadorias, o produto total, tanto a parte que repõe o capital constante e variável como a que representa o mais-valor. Se não se conseguir vendê-la ou se conseguir apenas em parte ou a preços inferiores aos de produção, o trabalhador terá sido explorado, certamente, mas sua exploração não se terá realizado como tal para o capitalista, não terá alcançado em absoluto a realização do mais-valor espoliado ou o terá alcançado apenas parcialmente, podendo inclusive acarretar a perda parcial ou total de seu capital. As condições da exploração direta e as de sua realização não são idênticas. Elas divergem não só quanto ao tempo e ao lugar, mas também conceitualmente. Umas estão limitadas pela força produtiva da sociedade; outras, pela proporcionalidade entre os diversos ramos de produção e pela capacidade de consumo da sociedade. Essa capacidade não é determinada pela força absoluta de produção nem pela capacidade absoluta de consumo, mas pela capacidade de consumo sobre a base de relações antagônicas de distribuição, que reduzem o consumo da grande massa da sociedade a um mínimo só suscetível de variação dentro de limites mais ou menos estreitos. Além disso, ela está limitada pelo impulso de acumulação, de aumento do capital e da produção de mais-valor em escala ampliada. Essa é uma lei da produção capitalista, lei dada pelas constantes revoluções nos próprios métodos de produção, pela constante desvalorização do capital existente acarretada por essas revoluções, pela luta concorrencial generalizada e a necessidade de melhorar a produção e ampliar sua escala, apenas como meio de autoconservação e sob pena de sucumbir. Por isso, o mercado precisa ser constantemente expandido, de modo que seus nexos e as condições que os regulam assumam cada vez mais a forma de uma lei natural independente dos produtores, tornem-se cada vez mais incontroláveis. A contradição interna procura ser compensada pela expansão do campo externo da produção. Quanto mais se desenvolve a força produtiva, mais ela entra em conflito com a base estreita sobre a qual repousam as relações de consumo. Sobre essa base plena de contradições não é em absoluto uma contradição que o excesso de capital esteja ligado a um excesso crescente de população, pois, se os fatores combinados fazem aumentar a massa do mais-valor produzido, justamente com isso se acentua a contradição entre as condições nas quais esse mais-valor é produzido e as condições nas quais ele é realizado.

Partindo de dada taxa de lucro, a massa do lucro dependerá sempre da grandeza do capital adiantado. A acumulação se determina, então, pela parte dessa massa que volta a se converter em capital. Porém, essa parte, por ser igual ao lucro menos a renda consumida pelo capitalista, dependerá não só do valor de tal massa, como também do baixo preço das mercadorias que o capitalista pode comprar com ela – mercadorias destinadas em parte a seu consumo, sua renda, em parte a seu capital constante. (Nesse caso, o salário é pressuposto como dado.)

A massa do capital que o trabalhador põe em movimento e cujo valor ele conserva e faz reaparecer no produto por meio de seu trabalho é totalmente distinta do valor que esse mesmo trabalhador agrega. Se a massa do capital é = 1.000 e o trabalho agregado é = 100, o capital reproduzido será = 1.100. Se a massa é = 100 e o trabalho agregado é = 20, o capital reproduzido será = 120. A taxa de lucro será, no primeiro caso, = 10%; no segundo, = 20%. No entanto, pode-se acumular mais a partir de 100 do que a partir de 20. Assim o fluxo do capital (abstraindo de sua desvalorização em virtude do aumento da força produtiva), ou sua acumulação, avança em proporção ao peso que ele já possui, e não em proporção ao nível da taxa de lucro. (...)

A taxa de lucro diminui não porque o trabalhador seja menos explorado, mas porque se emprega menos trabalho em proporção ao capital investido em geral.

Se, como demonstramos, a taxa decrescente de lucro coincide com o aumento da massa de lucro, uma parte maior do produto anual do trabalho será apropriada pelo capitalista sob a categoria capital (como reposição do capital consumido), e uma parte proporcionalmente menor, sob a categoria do lucro. Isso explica a fantasia do padre Chalmers de que, quanto menor for a parte do produto anual desembolsada pelos capitalistas como capital, maiores serão os lucros por eles obtidos; e nisso ele recebe a ajuda da Igreja estatal[a], que zela pelo consumo, em vez de pela capitalização, de uma grande parte do mais-produto. O padre confunde a causa e o efeito. Além disso, ainda que o lucro seja menor, a massa do lucro aumenta com a grandeza do capital desembolsado. Isso condiciona ao mesmo tempo a concentração do capital, já que agora as condições de produção exigem o emprego massivo de capital. E condiciona também sua centralização – isto é, que os pequenos capitalistas sejam engolidos pelos grandes – e a descapitalização dos primeiros. Trata-se, uma vez mais, porém elevada à segunda potência, do divórcio entre as condições de trabalho e os produtores, entre os quais ainda se encontram esses pequenos capitalistas, já que, no caso deles, o trabalho próprio ainda desempenha certo papel; em geral, o trabalho do capitalista se encontra em proporção inversa à grandeza de seu capital, isto é, ao grau em que ele é capitalista. Esse divórcio entre as condições de trabalho, de um lado, e os produtores, de outro, é o que forma o conceito de capital; um divórcio que tem início com a acumulação primitiva (Livro I, capítulo 24) aparece em seguida como processo constante na acumulação e na concentração do capital e, por fim, se expressa aqui na centralização de capitais já existentes em poucas mãos e na descapitalização de muitos (fenômeno no qual se converte agora a expropriação). Esse processo logo provocaria o colapso da produção capitalista, se tendências contra-arrestantes não atuassem constantemente com um efeito descentralizador junto à força centrípeta.”

[a] Isto é, a Igreja anglicana. (N. T.)

 

 

O desenvolvimento da força produtiva social do trabalho revela-se duplamente: em primeiro lugar, na grandeza das forças produtivas já produzidas, no volume do valor e da massa das condições de produção sob as quais tem lugar a nova produção e na grandeza absoluta do capital produtivo já acumulado; em segundo lugar, na relativa pequenez da parte de capital desembolsada no salário em relação ao capital total, isto é, na relativa pequenez do trabalho vivo requerido para a reprodução e a valorização de um capital dado, para a produção em massa. Isso supõe, ao mesmo tempo, a concentração do capital.

Com relação à força de trabalho empregada, o desenvolvimento da força produtiva também se revela de dois modos: primeiro, no aumento do mais-trabalho, isto é, na abreviação do tempo de trabalho necessário para a reprodução da força de trabalho. Segundo, na diminuição da quantidade de força de trabalho (número de trabalhadores) que se emprega, em geral, para pôr em movimento um capital dado.

Ambos os movimentos não só transcorrem paralelamente, mas se condicionam de maneira recíproca, são fenômenos nos quais se expressa a mesma lei. No entanto, atuam em sentido contrário sobre a taxa de lucro. A massa total do lucro é igual à massa total do mais-valor, e a taxa de lucro m/C = mais-valor/capital total adiantado. Mas o mais-valor, como soma total, está determinado, em primeiro lugar, por sua taxa e, em segundo lugar, pela massa do trabalho simultaneamente empregado a essa taxa, ou, o que dá no mesmo, pela grandeza do capital variável. Por um lado, aumenta um dos fatores, a taxa de mais-valor; por outro, diminui (relativa ou absolutamente) o outro fator, o número de trabalhadores. Ao diminuir a parte paga do trabalho empregado, o desenvolvimento da força produtiva provoca o aumento do mais-valor, porquanto aumenta sua taxa; porém, ao diminuir a massa total do trabalho empregado por um capital dado, ele diminui o fator do número pelo qual se multiplica a taxa de mais-valor para obter sua massa. Dois trabalhadores que trabalham 12 horas diárias não podem fornecer a mesma massa de mais-valor que 24 trabalhadores que trabalham apenas 2 horas cada, ainda que pudessem viver de ar e, portanto, não tivessem de trabalhar um só minuto para si mesmos. Por isso, aqui a compensação do menor número de trabalhadores mediante o aumento do grau de exploração do trabalho encontra certos limites insuperáveis; ela pode, portanto, frear a queda da taxa de lucro, mas não a anular.

A taxa de lucro diminui, pois, à medida que se desenvolve o modo de produção capitalista, enquanto sua massa aumenta na proporção do crescimento da massa do capital empregado. Partindo de uma taxa dada, a massa absoluta em que cresce o capital depende da grandeza atual deste último. Por outro lado, dada essa grandeza, a proporção na qual ele cresce – a taxa de seu crescimento – depende da taxa de lucro. O incremento da força produtiva (que, além disso, como já indicamos, acompanha sempre a desvalorização do capital existente) só pode aumentar diretamente a grandeza de valor do capital se, elevando a taxa de lucro, ele aumenta a parte de valor do produto anual que se reconverte em capital. Quando se considera a força produtiva do trabalho, isso só pode ocorrer (pois essa força produtiva nada tem a ver diretamente com o valor do capital existente) na medida em que se eleve o mais-valor relativo ou se reduza o valor do capital constante, isto é, na medida em que as mercadorias que entram na reprodução da força de trabalho ou nos elementos do capital constante baratearem. Ambas as coisas implicam uma desvalorização do capital existente, e ambas correm paralelamente à redução do capital variável em relação ao capital constante. Ambas condicionam a queda da taxa de lucro, e ambas freiam essa queda. Além disso, elevação da taxa de lucro, enquanto provoca elevação na demanda de trabalho, influi sobre o aumento da população trabalhadora e, por conseguinte, do material explorável, que faz com que o capital seja capital.

Mas o desenvolvimento da força produtiva do trabalho contribui indiretamente para o aumento do valor de capital existente ao incrementar a massa e a variedade dos valores de uso nos quais se apresenta o mesmo valor de troca e que constituem o substrato material, os elementos materiais do capital, os objetos materiais em que consistem diretamente o capital constante e, ao menos indiretamente, o capital variável. Com o mesmo capital e o mesmo trabalho, criam-se mais coisas a ser transformadas em capital, abstraindo de seu valor de troca. Coisas que podem servir para absorver trabalho adicional – portanto, também mais-trabalho adicional – e, assim, formar capital adicional. A massa de trabalho que pode ser comandada pelo capital não depende de seu valor, mas da massa das matérias-primas e dos materiais auxiliares, da maquinaria e dos elementos do capital fixo, dos meios de subsistência que compõem esse capital, independentemente do valor desses componentes. Ao crescer assim a massa do trabalho empregado – e, consequentemente, do mais-trabalho –, aumenta também o valor do capital reproduzido e o mais-valor novo que lhe foi adicionado.

Mas esses dois fatores compreendidos no processo de acumulação não devem ser considerados apenas na tranquila justaposição em que os trata Ricardo; eles implicam uma contradição que se manifesta em tendências e manifestações contraditórias. As forças antagônicas operam umas contra as outras.

Simultaneamente ao impulso para o aumento real da população trabalhadora, impulso que emana do incremento da parte do produto social total que funciona como capital, atuam as forças que criam uma superpopulação apenas relativa.

Simultaneamente à queda da taxa de lucro cresce a massa dos capitais, e paralelamente a essa queda ocorre uma desvalorização do capital existente, que detém essa queda e imprime um impulso acelerador à acumulação de valor do capital.

Simultaneamente ao desenvolvimento da força produtiva há o aumento progressivo da composição do capital e a diminuição relativa da parte variá­vel em relação à parte constante.

Essas diversas influências se fazem sentir, ora de maneira mais justaposta no espaço, ora de maneira mais sucessiva no tempo; o conflito entre as forças antagônicas desemboca periodicamente em crises. Estas são sempre apenas violentas soluções momentâneas das contradições existentes, erupções violentas que restabelecem por um momento o equilíbrio perturbado.

A contradição, expressa de maneira bem genérica, consiste no fato de que o modo de produção capitalista implica uma tendência ao desenvolvimento absoluto das forças produtivas, abstraindo do valor – e do mais-valor nele incorporado – e também das relações sociais no interior das quais se dá a produção capitalista; por outro lado, esse modo de produção tem como objetivo a conservação do valor de capital existente e sua valorização na máxima medida possível (isto é, o incremento cada vez mais acelerado desse valor). Seu caráter específico orienta-se para o valor de capital existente como meio para a maior valorização possível desse valor. Os métodos pelos quais ela atinge esse objetivo incluem: o decréscimo da taxa de lucro, a desvalorização do capital existente e o desenvolvimento das forças produtivas do trabalho à custa das forças produtivas já produzidas.

A desvalorização periódica do capital existente, que é um meio imanente ao modo de produção capitalista para conter a queda da taxa de lucro e acelerar a acumulação do valor de capital mediante a formação de capital novo, perturba as condições dadas nas quais se consuma o processo de circulação e reprodução do capital e é, por isso, acompanhada de paralisações súbitas e crises do processo de produção.

O decréscimo relativo do capital variável em relação ao constante, que ocorre paralelamente ao desenvolvimento das forças produtivas, incentiva o crescimento da população trabalhadora, enquanto cria de modo permanente uma superpopulação artificial. A acumulação do capital, considerada em relação ao valor, é desacelerada pela queda da taxa de lucro a fim de acelerar ainda mais a acumulação do valor de uso, enquanto esta, por sua vez, imprime um movimento acelerado à acumulação em relação ao valor.

A produção capitalista tende constantemente a superar esses limites que lhes são imanentes, porém consegue isso apenas em virtude de meios que voltam a elevar diante dela esses mesmos limites, em escala ainda mais formidável.

O verdadeiro obstáculo à produção capitalista é o próprio capital, isto é, o fato de que o capital e sua autovalorização aparecem como ponto de partida e ponto de chegada, como mola propulsora e escopo da produção; o fato de que a produção é produção apenas para o capital, em vez de, ao contrário, os meios de produção serem simples meios para um desenvolvimento cada vez mais amplo do processo vital, em benefício da sociedade dos produtores. Os limites nos quais unicamente se podem mover a conservação e a valorização do valor de capital, as quais se baseiam na expropriação e no empobrecimento da grande massa dos produtores, entram assim constantemente em contradição com os métodos de produção que o capital tem de empregar para seu objetivo e que apontam para um aumento ilimitado da produção, para a produção como fim em si mesmo, para um desenvolvimento incondicional das forças produtivas sociais do trabalho. O meio – o desenvolvimento incondicional das forças produtivas sociais – entra em conflito constante com o objetivo limitado, que é a valorização do capital existente. Assim, se o modo de produção capitalista é um meio histórico para desenvolver a força produtiva material e criar o mercado mundial que lhe corresponde, ele é, ao mesmo tempo, a constante contradição entre essa sua missão histórica e as relações sociais de produção correspondentes a tal modo de produção.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário