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quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Réquiem para o sonho americano: os dez princípios de concentração de renda e poder (Parte II) – Noam Chomsky

Editora: Bertran Russell
ISBN: 978-85-2862-194-5
Tradução: Milton Chaves de Almeida
Opinião: ★★★★☆
Páginas: 192

Suprimindo o governo
Ficamos muito impressionados quando assistimos a um debate nos Estados Unidos — aliás, na Europa também — sobre a atual dificuldade econômica. O grande problema humano não está no déficit público — mas no desemprego. O desemprego tem um efeito devastador na sociedade. Quero dizer com isso que são terríveis as consequências para as pessoas desempregadas e suas famílias. No entanto, há também um tremendo efeito econômico, cujas razões, por sinal, são bastante óbvias: quando as pessoas estão sem trabalho, há recursos que poderiam servir para desenvolver a economia que não são usados — simplesmente são desperdiçados.
Talvez pareça desumano falar sobre a questão desta forma, e o custo humano é a pior parte dela. Mas de um franco ponto de vista econômico, é como se, por alguma razão, as pessoas decidissem deixar as fábricas ociosas. Para entender melhor a situação, faça uma viagem à Europa, ao Japão, ou até mesmo à China, e depois volte para os Estados Unidos. Uma das primeiras coisas que o deixará impressionado é que parece que nosso país está se desmantelando, como se, muitas vezes, a sensação seja de voltar para um país do terceiro mundo. A infraestrutura se esfacelou, o serviço de saúde está em ruínas, o sistema de ensino foi destroçado, apesar dos incríveis recursos disponíveis. Para fazer com que as pessoas permaneçam impassíveis, simplesmente observando essa realidade, é necessário lançar mão de uma propaganda política muito eficiente. É basicamente isso o que está acontecendo — temos uma grande força de trabalho ávida por trabalhar, formada por gente altamente qualificada, numa situação em que há muita coisa para ser feita. Aliás, o país está precisando de muita coisa.
Instituições financeiras não gostam da ideia de déficit e também não querem muito governo. Essa postura foi levada ao extremo por pessoas como Grover Norquist, homem muito influente. Ele conseguiu a promessa dos republicanos — um acordo ao qual eles realmente se comprometem —, de não permitir o aumento de impostos, e o dever de reduzir o governo. Da forma como foi expressa, basicamente queria acabar com o governo. Do ponto de vista dos senhores da nação, é meio que compreensível. Acontece que o governo, quando a democracia é legítima e realmente funciona, age em favor dos interesses da população. Este é o verdadeiro significado de democracia. Porém, eles prefeririam ter o controle total de tudo, sem a interferência do povo. Contentam-se em ver o governo encolhido — com duas condições. Uma é a garantia de que poderão contar com um Estado poderoso, capaz de mobilizar os contribuintes para socorrê-los e também para enriquecê-los ainda mais. A segunda é uma grande força militar para garantir que o mundo está sob controle.
É a isso que eles querem reduzir a função do Estado — nada para que as pessoas idosas tenham assistência médica, ou que uma viúva inválida tenha uma pensão suficiente para uma vida digna. Acham que isso não é problema deles, não está de acordo com a máxima vil, cabe a eles concentrar-se apenas no problema do déficit. Acontece que, para o povo, a falta de emprego é questão muito mais importante. Apesar disso, com poucas exceções como a de Paul Krugman, os debates públicos continuam concentrados no problema do déficit governamental.
De forma quase absoluta, as discussões sobre o assunto são moldadas pelos donos do mundo: “preocupem-se com o déficit e esqueçam tudo o mais.” Contudo, mesmo quando alguém se ocupa com a questão do déficit, é estarrecedor o fato de que eles omitem qualquer coisa relacionada com as causas que o geram. As causas são muito claras. Uma delas é o gasto extraordinário com nosso aparato militar, que chega a ser quase o mesmo de todas as nações do mundo juntas. Por sinal, isso não acontece por causa de uma questão de segurança (isso é outra história) — aliás, não nos fornece segurança nenhuma, a não ser para os senhores que controlam o mundo, assim como seus interesses. E isso é praticamente intocável.”


“Se uma pessoa estudar a história da regulamentação legal das atividades empresariais — como a da exploração do setor de transportes ferroviários, a do mercado financeiro e de outros mais —, descobrirá que é bem comum ter sido uma iniciativa tomada por quem está sendo regulado, ou é apoiada por eles. E a razão disso está no fato de eles saberem que, mais cedo ou mais tarde, conseguirão controlar os reguladores e administrar as agências. Afinal de contas, eles podem oferecer coisas equivalentes a suborno — como cargos ou qualquer outro benefício sedutor. O fato é que acaba sendo vantajoso para os fiscais desses órgãos contemporizarem com a vontade dos poderosos. É algo que acontece naturalmente, de muitas formas, e termina com o que se costuma chamar de “cooptação das agências reguladoras”. Ser regulamentado significa, na verdade, controlar as agências reguladoras. De fato, pois bancos e seus lobistas são os que fazem as leis de regulamentação financeira — chegou-se a esse extremo. É o que vem acontecendo ao longo da história e, como eu disse, uma tendência comum que verificamos quando examinamos a estrutura e a distribuição do poder.

A lei Glass-Steagall
Durante a Grande Depressão, uma das normas legais instituídas foi separar bancos comerciais, que são os estabelecimentos em que os depósitos bancários são garantidos pelo governo federal, de bancos de investimento, que simplesmente assumem riscos e para cujas transações não existem garantias federais. Eles foram separados pelas disposições daquela que ficou conhecida como Lei Glass-Steagall.
Na década de 1990, os programas econômicos do governo Clinton foram comandados principalmente por Robert Rubin e seus assessores — pessoas advindas, sobretudo, de instituições financeiras — e eles queriam revogar essa lei, aprovada na década de 1930. Em 1999, eles conseguiram fazer isso, demolindo a Lei Glass-Steagall com a cooperação de Republicanos da ala mais à direita do partido, Phil Gramm e outros mais. Isso fez com que, basicamente, as operações de risco de bancos de investimento acabassem voltando a ter garantias legais do governo. Ora, era fácil entender para onde isso nos levaria — e foi o que aconteceu. Ao mesmo tempo, eles conseguiram barrar a regulamentação de operações com derivativos — exóticos instrumentos do setor financeiro —, o que significa dizer que eles seguiram desregulamentados. Agora, talvez pareçam relativamente seguras, dado que o governo irá socorrê-los se necessário for.

Os conflitos de interesses
Aliás, aquilo que o próprio Robert Rubin tratou de fazer, depois de ajudar a desmontar a Lei Glass-Steagall, foi voltar para o setor financeiro, onde se tornou diretor do Citigroup — um dos maiores bancos do mundo — e se aproveitar das novas leis. Lá, ajudou a assumir o controle de uma grande seguradora e fez outras coisas mais. Ele ganhou muito dinheiro. Só que o grupo quebrou. Ele deixou a instituição onde ganhou muito dinheiro, voltou como principal consultor de Barack Obama, e então o governo socorreu o Citigroup financeiramente — tal como vinha fazendo desde o início dos anos de 1980. O fato de senadores, deputados e assessores políticos deixarem o governo, indo para os setores comercial e industrial (a esta altura, mais financeiros do que qualquer outra coisa), os quais, em tese, eles vinham regulamentando, é quase uma consequência natural de assumirem impunemente o controle de fato de órgãos reguladores e fiscalizadores. É nisso que repousam suas relações de fidelidade. Eles ficam num eterno vaivém de um setor para outro. Isso indica que existem estreitíssimas relações entre ambos os lados — é um dos aspectos da “rotatividade de cargos”. Depois de se tornarem legisladores, se transformam em lobistas, e, como lobistas, querem controlar a legislação.

Lobismo
Uma das coisas que mais se expandiu durante os anos 1970, época em que o mundo dos negócios passou a mobilizar-se intensamente para tentar controlar o poder legislativo, foi o lobismo.2 Houve um esforço gigantesco dos lobistas para tentar até mesmo criar leis. O mundo dos negócios estava muito preocupado com os avanços no bem-estar social da década de 1960, principalmente com os decorrentes das intervenções de Richard Nixon — embora muitos não entendam isto bem, ele foi o último presidente do New Deal, o que os homens de negócio consideravam uma traição à classe.
Basta considerarmos que, em seu governo, houve a implementação da legislação de proteção ao consumidor (que resultou na criação da agência independente — CPSC, na sigla em inglês), o estabelecimento de normas de segurança e higiene no ambiente de trabalho (OSHA) e a criação da Agência de Proteção Ambiental (EPA). Logicamente, o empresariado não gostou — tanto do aumento dos impostos quanto da regulamentação. E iniciou um esforço coordenado para tentar anular esses avanços, levando a um imenso crescimento nas práticas lobistas. Avançados institutos de pesquisas interdisciplinares foram criados para tentar controlar o sistema ideológico, tal como a Heritage Foundation. Os gastos com campanhas eleitorais aumentaram muito — em parte, por causa da televisão. Além disso, houve também um aumento simplesmente incrível do papel do setor financeiro na economia. Com isso, a desregulamentação começou de forma realmente impetuosa.
2: Ver “Como Lobistas das Grandes Empresas Passaram a Controlar a Democracia Americana”, New America Weekly, New America, Lee Drutman, 20 de abril de 2015, na página 108.

Desregulamentação e bancarrotas no mercado financeiro
Não houve quebras no mercado financeiro nas décadas de 1950 e 1960, pois o aparato regulatório do New Deal ainda estava em vigor. Porém, à medida que, por pressão das grandes empresas e de políticos, o programa começou a ser desmontado, foram ocorrendo mais e mais quebras de instituições, tendo isso continuado por vários anos. O processo de desregulamentação começou na década de 1970, mas foi nos anos de 1980 que o número de falências aumentou muito de fato.
Tomemos o exemplo do que aconteceu no governo Reagan: em vez de deixar que arcassem com o custo e as consequências de seus atos, ele socorreu bancos tal como o Continental Illinois, protagonista, em 1984, da maior operação de resgate da história americana à época. No início dos anos 1980, os Estados Unidos entraram na mais grave recessão desde a Grande Depressão, sendo resgatados com várias formas de subsídios, entre outras coisas mais. Em 1987, houve mais uma crise financeira — outra Segunda-Feira Negra, ou algo bem próximo disso. Aliás, Reagan chegou ao fim do mandato em meio a uma gigantesca crise financeira — a crise das instituições de empréstimos e poupança. Mais uma vez, o governo interveio e salvou instituições.

Grandes demais para a cadeia
A crise das instituições de empréstimo e poupança foi um pouco diferente da crise financeira de 2008, pois os perpetradores da primeira foram levados aos tribunais, em cujo julgamento soube-se muita coisa a respeito de esquemas fraudulentos, manobras escusas, trapaças e crimes cometidos por seus agentes. O mesmo não aconteceu com a crise de 2008. É que o poder dos bancos aumentou tanto que agora eles não são apenas “grandes demais para quebrar”, mas também, nas palavras de um economista, “grandes demais para a cadeia”. Assim, as únicas investigações criminais que podem ser feitas são as que envolvem, por exemplo, tráfico de informações privilegiadas ou confidenciais, prática na qual o criminoso prejudica outras empresas, logo é possível fazer alguma coisa. Contudo, nas situações em que eles estejam roubando o povo, seguem agindo impunemente.
O processo de desregulamentação se materializou no governo Clinton. Bill foi na onda, deixando o barco correr, o que levou a um surto especulativo no setor de tecnologia. No final da década de 1990, outra bolha estourou, a bolha das ponto.com. Em 1999, as normas regulatórias que impunham uma separação entre bancos comerciais e bancos de investimentos estavam aniquiladas. Desta vez, foi Bush quem foi na onda e aí tivemos o boom imobiliário, cuja existência, por incrível que pareça, os elaboradores de políticas econômicas não perceberam — ou simplesmente ignoraram o fato de que havia uma bolha imobiliária de cerca de 8 trilhões de dólares sem relação com o custo dos imóveis residenciais. Obviamente, isso estourou em 2007, quando trilhões de dólares simplesmente desapareceram — riqueza fraudulenta, pura e simplesmente. Essa situação levou à maior crise financeira desde a Grande Depressão, mas aí vieram as operações de socorro financeiro de Bush e Obama, as quais reconstruíram as mesmas instituições poderosas — os perpetradores da crise — e deixaram todos os demais à deriva. Os mais severamente prejudicados foram as pessoas comuns, que perderam casas, empregos etc. E é nesta situação que estamos hoje. Tudo isso foi feito com total impunidade e, ainda assim, eles estão preparando a próxima jogada.

         O Estado-babá
Toda vez que acontece uma crise, as autoridades lançam mão dos vultosos recursos do contribuinte para socorrer financeiramente os que a provocaram, que são, em número cada vez maior, as grandes instituições financeiras. Numa economia capitalista, esse tipo de coisa não deveria ser feita. Num sistema capitalista de verdade, um desastre financeiro varreria do mapa os investidores que fizeram investimentos arriscados. No entanto, os ricos e poderosos não querem um sistema capitalista. Eles querem dispor de um “Estado-babá” para socorrê-los assim que se metem numa enrascada, de modo que acabem sendo socorridos pelo contribuinte. Eles recebem uma generosa apólice de seguros governamental, o que vale dizer que não importa o sem-número de vezes que eles se arrisquem temerariamente, pois, se entrarem em apuros, o dinheiro público os socorrerá, pois são grandes demais para quebrar. É algo que vem se repetindo sem parar.
O poder deles é tão grande que qualquer tentativa de lidar com esse estado de coisas é rechaçada. Tentativas sóbrias de enfrentar o problema têm sido feitas, como a Lei Dodd-Frank, mas a execução de seus dispositivos acaba sendo cerceada por lobistas. Em todo caso, são medidas que não atacam de fato os principais problemas. E as razões para isso são muito fáceis de compreender. Há laureados com o Prêmio Nobel de Economia que discordam dos rumos que estamos tomando — pessoas como Joseph Stiglitz, Paul Krugman, entre outras —, mas nenhuma delas foi procurada ou consultada. As pessoas escolhidas para enfrentar a crise foram as mesmas que a criaram — a turma de Robert Rubin e o pessoal do Goldman Sachs. Criaram a crise, mas estão mais poderosos do que nunca. Esse aumento de poder é mera coincidência? Ora, claro que não, já que foram eles os escolhidos para criar um plano econômico. Portanto, o que poderíamos esperar dessa situação?
A última operação de resgate financeiro foi algo sem precedentes. As grandes empresas socorridas foram mantidas economicamente viáveis num período em que, numa economia capitalista, elas teriam ido à falência. Porém, de fato, não temos uma economia capitalista — os grandes homens de negócios não aceitariam esse tipo de coisa e têm poder suficiente para impedi-lo. Desse modo, o povo, por assim dizer, acaba sendo chamado: despeja, literalmente, trilhões de dólares nas mãos dos donos de grandes empresas em processo de falência e passa a sustentá-las. Esse é o caso, de várias formas. Tanto que existe um importante estudo técnico em torno de operações de socorro financeiro realizadas ao longo de vários anos em que seus autores concluem que provavelmente 25 por cento delas — aliás, é um estudo sobre as cem maiores corporações constantes na lista da Fortune, feito por dois economistas muito reconhecidos — sobreviveram a desastres financeiros graças aos subsídios dos contribuintes. O estudo indica também que a maior parte das demais grandes empresas ganhou com isso. Portanto, embora esses acontecimentos sejam em escala sem precedentes, não são novos. A situação se repete depois de cada crise financeira.3
3: Ver A Lógica da Reestruturação Econômica Mundial: A Gestão de Empresas Subsidiárias em Complexos Industriais Rivais, Winfried Ruigrok e Rob van Tulder, 1995, na página 110.

Externalidades e risco sistêmico
O sistema financeiro apresenta características próximas às de um sistema de economia de mercado — realmente, está mais para uma economia de mercado, ao contrário do sistema produtivo, que sofre a influência do enorme poder e da intervenção do Estado para mantê-lo funcionando. Numa economia de mercado, existem problemas conhecidos, como o fato de os participantes de uma transação comercial pensarem prioritariamente em si mesmos. Não dão a mínima para os efeitos que isso possa causar às demais pessoas. A título de exemplo, digamos que você queira me vender um carro. Logicamente, você tentará obter lucro na transação, ao passo que eu vou querer comprar um bom carro, mas nós dois nem sequer pensamos no impacto que isso pode ter sobre outras coisas: problemas ambientais, congestionamentos, aumento do preço dos combustíveis e assim por diante. Acontece que, embora, individualmente, esses fatores possam ser pequenos, eles se avolumam. São denominados “externalidades” na terminologia econômico-financeira.
Já no caso de um grande banco de investimentos, como o Goldman Sachs, quando seus executivos fazem um investimento ou um empréstimo, eles tentam calcular os riscos que correrão — mas, logicamente, isso é muito fácil, já que sabem que serão socorridos se necessário, pois são considerados grandes demais para quebrar. Todavia, algo que eles não levam em conta é o que se chama de “risco sistêmico”. Trata-se do risco presente numa situação em que, caso os investimentos fracassem, o sistema inteiro pode quebrar. Ora, foi isso que aconteceu, tendo-se repetido várias vezes, e que provavelmente voltará a acontecer. E essa situação foi agravada pela desregulamentação, e também pela criação de intricadíssimos instrumentos financeiros que, vale repetir, não deram nenhuma contribuição à economia, mas tornam possível a divisão de riscos por meio de mecanismos complexos.
Foi o que aconteceu com a crise do setor imobiliário. Os corretores de hipotecas imobiliárias estavam oferecendo financiamentos para a compra da casa própria concedendo hipotecas de alto risco a pessoas que sabiam que não conseguiriam pagar, e os bancos endossavam essas transações. No entanto, os credores não precisavam preocupar-se com o risco, pois faziam a chamada “securitização” — dividiam os empréstimos em pequenos passivos e os negociavam com terceiros, na forma de débitos garantidos por caução real. Acontece que, na maioria das vezes, os investidores nem sequer sabiam o que estavam comprando e, por outro lado, os instrumentos que permitiam a compra eram, na verdade, o seguro para protegê-los contra um possível fracasso daquilo que estavam fazendo. Em tese, isso deveria reduzir riscos. Na prática, aumentou os riscos de tal forma que, quando o sistema entrou em colapso — isso aconteceu com o advento da crise dos créditos imobiliários —, os efeitos foram gigantescos. E, mais uma vez, os contribuintes foram usados para o resgate. Foi uma operação de socorro que não envolveu apenas o resgate dos bancos, mas também centenas de bilhões de dólares jorrando dos cofres do Federal Reserve e do Departamento do Tesouro americano, com vistas a oferecer crédito barato entre outras coisas.
Não que haja algo de surpreendente nisso — são os mesmos mecanismos de sempre. Portanto, se a sociedade permitir que isso continue a funcionar, os resultados serão sempre os mesmos, tais como descritos. Será assim até a próxima crise financeira — que é dada como tão certa que as agências de avaliação de risco estão incluindo em seus cálculos o montante que o contribuinte precisará desembolsar no próximo resgate. Os beneficiários dessa avaliação de risco, tais como os grandes bancos, conseguem tomar empréstimos a juros mais baixos, anulando assim a concorrência de rivais menores, e aumentando cada vez mais a concentração do poder econômico.
E, para onde quer que voltemos nossa atenção, veremos que as políticas econômicas são elaboradas com isso em mente, o que não é surpresa para ninguém. É o que acontece quando permitimos transferir o poder para as mãos de uma pequena parcela dos super-ricos, os quais vivem empenhados em aumentar seu próprio poderio — tal como se esperaria.

Deixem o livre mercado comandar tudo
A definição mais simples de “neoliberalismo” é “deixem o livre mercado comandar tudo.” Em outras palavras, façam com que o governo fique de fora da elaboração de políticas públicas, exceto quando for para incentivar as atividades do livre mercado. Na verdade, nenhum dos preconizadores desse princípio quer exatamente isso. Essas medidas são para os pobres, não para eles. Essa ideia vem persistindo ao longo de toda a história da economia moderna, desde o século XVII até os dias atuais. A única diferença é que, naqueles tempos, eles não chamavam isso de neoliberalismo.
Tomemos como exemplo as recomendações de Adam Smith às recém-independentes colônias americanas. Ele era o grande economista da época e dava conselhos às colônias — é quase a mesma coisa que o Banco Mundial e o FMI fazem com os países pobres e com os pobres dos Estados Unidos. Disse que as colônias deveriam concentrar-se naquilo que sabiam fazer bem — mais tarde, isso foi chamado de “vantagens relativas” —, ou seja, exportar bens primários, tais como produtos agrícolas, peixes e peles de animal, e importar os superiores produtos de origem britânica. Além disso, obviamente para defender o interesse do colonizador, sugeriu que não tentassem monopolizar. Naqueles dias, o principal produto econômico era o algodão. Ele tinha uma importância equivalente à do combustível no início da Revolução Industrial. Segundo ele, isso melhoraria a produção econômica das colônias, e assim por diante.4
Logicamente, como as colônias constituíam um país independente a essa altura, tinham total liberdade para ignorar o conselho e adotarem princípios de uma “economia saudável”, tal como se denominava então. Desse modo, impuseram altas tarifas alfandegárias aos tais superiores produtos britânicos para impedir que entrassem em seu território — inicialmente, sobre os têxteis e, mais tarde, sobre o aço, e assim por adiante. Com isso, conseguiram desenvolver sua indústria interna. Lançaram-se num grande esforço para tentar monopolizar e, aliás, quase conseguiram, a exploração do algodão — essa foi a grande motivação por trás da questão da conquista do Texas e de metade do México.5 As razões eram bem claras: os presidentes jacksonianos diziam que, se eles conseguissem monopolizar a exploração do algodão, poderiam muito bem ter a Grã-Bretanha a seus pés. Calcularam que o império não conseguiria manter toda a sua potência econômica se eles controlassem esse produto. Assim, sem entrar em maiores detalhes, as ex-colônias fizeram exatamente o contrário das recomendações neoliberais (o que, aliás, a Grã-Bretanha fizera também durante seu processo de desenvolvimento). Simultaneamente, os pobres e oprimidos eram vítimas dos esforços para lhes enfiar esses princípios goela abaixo. Desse modo, Índia, Egito, Irlanda entre outros foram desindustrializados, devastados — algo que, por sinal, prossegue até os dias atuais.
E isso acontece bem diante de nossos olhos. Vejam, por exemplo, os Estados Unidos — aqui, martelam na cabeça da maior parte da população o princípio de que ela tem de “deixar o mercado comandar os rumos da economia”. Portanto, que as autoridades tratem de cortar o número de benefícios sociais, de reduzir a previdência social ou acabar com ela de uma vez, de diminuir ainda mais o limitado serviço de saúde pública, enfim, deixem o livre mercado comandar tudo. Mas não para os ricos. Para estes, o Estado deve ser uma entidade poderosa, sempre pronta para intervir e resgatá-los sempre que se meterem em apuros financeiros. Tomemos o exemplo de Reagan, um ícone do neoliberalismo, do livre mercado entre outras coisas. Ele foi o presidente mais protecionista na história do pós-guerra americano, tendo dobrado as barreiras de importação, na tentativa de proteger os incompetentes dirigentes americanos da superioridade dos produtos japoneses. Assim, mais uma vez, ele socorreu bancos, em vez de deixá-los arcar com seus custos. Na verdade a economia americana cresceu durante o governo Reagan, tornando-se um ícone do neoliberalismo. Devo acrescentar que seu programa “Guerra nas Estrelas” foi abertamente propagandeado no mundo dos negócios como um incentivo do governo, como uma espécie de profícua vaca-leiteira em cujas tetas eles podiam mamar. Mas isso era apenas para os ricos. Já no caso dos pobres, que deixassem que os princípios do livre mercado conduzissem os rumos da economia e que não esperassem nenhum auxílio do governo. Enfim, o governo era o problema, não a solução, e por aí vai. Basicamente falando, isso é neoliberalismo. Ele tem esse caráter dualístico, algo que perdura na história econômica. Um conjunto de regras para os ricos. Outro diametralmente oposto para os pobres.”
4: Ver Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações, Adam Smith, 1776, na página 110.
5: Ver Presidente John Tyler em carta enviada ao filho, coronel Tyler, 17 de abril de 1850, na página 111.


“Como eu disse, concentração de riqueza gera concentração de poder político, principalmente numa situação em que o custo das campanhas eleitorais não para de crescer. O sistema democrático é simplesmente retalhado pelo rápido aumento da capacidade de decidir eleições com dinheiro. Consideremos o exemplo do caso da Citizens United, a respeito do qual a Suprema Corte de Justiça tomou uma importantíssima decisão em 2009. Esse caso tem uma história sobre a qual devemos refletir.1
A Décima Quarta Emenda da Constituição americana tem uma cláusula estipulando que os direitos de uma pessoa não podem ser violados sem o devido processo legal (aliás, essa disposição consta também na Quinta Emenda, mas foi ampliada na Décima Quarta), e o objetivo, claramente, foi proteger escravos libertos. É como se ela dissesse: “OK, eles estão protegidos por lei agora.” Não acho que ela tenha sido usada uma única vez em relação a casos de escravos libertos — se isso aconteceu, foi apenas em alguma situação isolada. Na verdade, foi usada quase imediatamente em negócios privados — ou seja, por grandes empresas. Afinal, os direitos delas não podem ser violados sem o devido processo legal. Isso representou um forte ataque aos princípios liberais clássicos e foi condenado por conservadores daquela época. No entanto, essa tendência continuou até o início do século 20, quando ficou estabelecido que as grandes empresas também tinham direitos individuais, e ampliou-se progressivamente ao longo do século quando elas se tornaram pessoas inclusive do ponto de vista legal.

Personalidade jurídica
Grandes corporações são uma ficção legal criada pelo Estado. Talvez isso seja bom; talvez não. Em todo caso, chamá-las de pessoas é, de certo modo, ultrajante. Por exemplo, consideremos a questão dos acordos de livre comércio, no caso, digamos, do NAFTA. As autoridades deram às grandes empresas direitos muito além daqueles que as pessoas têm. Assim, se a General Motors investir no México, ela passa a gozar dos direitos federais desse país, os mesmos direitos de um negócio privado mexicano. No entanto, se um mexicano vier a Nova York e disser “Quero ter esses mesmos direitos”, nem é necessário dizer o que acontece. Portanto, embora a noção de personalidade jurídica tenha sido ampliada para incluir corporações, ela foi restringida no caso das pessoas.
Se interpretarmos os termos da Décima Quarta Emenda literalmente, nenhum estrangeiro ilegal pode ser privado dos direitos de qualquer outra pessoa física. Com o correr dos anos, os tribunais suprimiram isso de suas interpretações do texto legal e passaram a afirmar que estrangeiros ilegais não são propriamente pessoas. Portanto, imigrantes ilegais que moram aqui, constroem edifícios, cuidam dos jardins e assim por diante, não são pessoas, mas a General Electric é uma pessoa superpoderosa, um ente imortal. Essa inversão de um valor moral fundamental e a deturpação do significado da lei são simplesmente inacreditáveis.”
1: Ver A Disputa Judicial entre James L. Buckley e Francis Valeo, Suprema Corte dos Estados Unidos, 30 de janeiro de 1976, na página 120.


Além da urna eleitoral
Em minha opinião, a extravagância eleitoral que acontece de quatro em quatro anos deveria tomar, no máximo, uns dez minutos do nosso tempo, literalmente. O primeiro minuto deveria ser gasto com aritmética. Eleitoralmente falando, existe uma questão muito simples — se você mora num estado decisivo para o resultado das eleições, um estado em que o desfecho eleitoral ainda esteja indefinido e acaba se abstendo, não votar em Hillary Clinton equivale a votar em Trump ou vice-versa. Simples aritmética. Levamos um minuto para a questão aritmética; levaremos dois minutos para avaliar os méritos de ambos os partidos. E não apenas deles, logicamente, mas dos candidatos também. Nas circunstâncias atuais, reitero que não leva mais do que dois minutos. Os últimos sete minutos são para ir à urna eleitoral depositar o voto.
Depois que tivermos gastado aqueles dez minutos, poderemos nos voltar para o que realmente interessa, que não é eleição, mas sim o esforço constante para criar e organizar movimentos populares de pessoas engajadas que continuarão a lutar ininterruptamente em prol do que precisa ser feito. É um processo que não envolve apenas manifestações de protesto, pressionar candidatos entre outras coisas, mas também a criação de um sistema eleitoral que signifique algo de verdadeiro e bom para todos. Afinal, não se pode criar uma democracia que funcione melhor, ou até mesmo um partido, votando a cada quatro anos.
Se você quer um partido alternativo, um partido independente, não basta votar nele de quatro em quatro anos. Você tem de continuar na luta constantemente — desenvolvendo o sistema, que vai desde conselhos escolares a câmaras municipais e assembleias legislativas, abrangendo, enfim, todas as instâncias até chegar ao Congresso. E existem pessoas na extrema-direita que fizeram isso. Foi assim que se organizou o movimento Tea Party — com bastante dinheiro e muito raciocínio — e os resultados vieram. O problema é que as pessoas que estão interessadas num partido progressista independente simplesmente não fizeram isso. Ficaram presas na armadilha de uma propaganda política enganosa, que preconiza a ideia de que a única coisa que importa é a extravagância eleitoral. É verdade que não se pode ignorá-la — ela existe mesmo —, mas, como eu disse, ela só deve ocupar dez minutos de nosso tempo. No entanto, as coisas que realmente importam precisam ser feitas constantemente.”


“Existe uma força organizada que, apesar de todas as imperfeições, sempre se manteve na linha de frente dos esforços para melhorar a vida da população como um todo. Ela é formada pelas organizações sindicais. É a única barreira capaz de deter o avanço desse círculo vicioso, que nos conduz a um Estado em que impera a tirania empresarial.
Por isso, uma das principais razões para o concentrado e quase fanático ataque contra sindicatos e trabalhadores sindicalizados está no fato de que eles são uma força democratizante. Eles funcionam como uma barreira na defesa dos direitos dos trabalhadores, mas também dos direitos da população de maneira geral. Isso interfere nas prerrogativas e no poder dos donos e administradores da sociedade.
Devo dizer que o sentimento antissindical existente nas elites dos Estados Unidos é tão forte que o componente fundamental dos direitos trabalhistas — o princípio elementar previsto pela Organização Internacional do Trabalho, que é o direito de livre associação e, como consequência natural, o direito de organizar sindicatos — nunca foi ratificado neste país. Nesse aspecto, acho que os Estados Unidos devem estar sozinhos em meio às grandes sociedades do planeta. Ele é considerado um direito tão absurdo na esfera política americana que, literalmente, nunca foi nem sequer analisado.
A classe empresarial é movida por um forte espírito de classe e, desse modo, todo vislumbre de ascensão do poder popular sempre causou grandes preocupações neles, que sempre acharam que “democracia demais” é muito perigoso.”


O New Deal
Franklin Delano Roosevelt tinha alguma simpatia a leis progressistas que beneficiassem a população como um todo, mas precisava antes aprová-las. Tanto que ele dizia a líderes do movimento operário: “Forcem-me a fazer isso. Se vocês conseguirem, terei satisfação em fazê-lo.” Com essas palavras, ele queria dizer o seguinte: “Saiam às ruas em manifestações, organizem-se, protestem, desenvolvam o movimento operário, façam greve e tudo o mais. Quando a pressão popular for suficiente, terei condições de fazer com que aprovem as leis que vocês querem.” Portanto, havia uma espécie de combinação entre um governo simpático à causa trabalhista que estava interessado em superar o tremendo abalo e as consequências desastrosas da Grande Depressão — por sinal, causada também por uma crise financeira que eles estavam igualmente interessados em vencer — e a criação de leis que beneficiassem o povo de uma forma geral.
O mundo dos negócios, na verdade, ficou dividido durante os anos do New Deal, a década de 1930. As empresas de alta tecnologia voltadas para o mercado internacional apoiavam o New Deal. Elas não faziam objeções à concessão de direitos trabalhistas, salários dignos e outras coisas mais. E gostavam do aspecto de interesses político-comerciais globais abrangidos pelas diretrizes do New Deal. No caso, porém, da Associação Nacional de Fabricantes,2 que reúne representantes do setor muito mais dependentes de mão de obra e com interesses bem mais voltados para o mercado interno, seus membros se opunham veementemente ao New Deal. Como se vê, havia uma divisão entre os donos do mundo. Por exemplo, o presidente da General Electric foi um dos maiores apoiadores de Roosevelt. E isso ajudou, juntamente com os maciços levantes populares, a permitir que Roosevelt seguisse adiante com a aprovação e execução das leis do New Deal, muito bem-sucedidas, por sinal. Isso assentou as bases para o crescimento econômico americano no pós-guerra, bem como para a superação dos piores efeitos da Grande Depressão. Não, porém, do problema do desemprego — esse perdurou até a Segunda Guerra Mundial.
Portanto, houve uma espécie de combinação de governo favorável à população e, em meados da década de 1930, um ativismo popular muito significativo. Ocorreram atos de protesto no interior das fábricas, como greves brancas, consideradas assustadoras por donos de negócios. Estes se viam obrigados a reconhecer que essas greves de ocupação e paralisação equivalem a uma situação em que os trabalhadores estão apenas a um passo de dizer: “Não precisamos de patrões. Podemos administrar isto aqui sozinhos.” E os empresários ficaram horrorizados. Quando lemos matérias da imprensa corporativa de fins da década de 1930, vemos coisas como: “O perigo que os industriais têm pela frente com a ascensão do poder político das massas”, o qual, logicamente, eles achavam que tinha de ser debelado. E também do tipo: “[Temos que travar] a incessante batalha pela conquista das mentes de certos homens para doutrinar o povo com a história do capitalismo” e por aí vai. Pode soar um marxismo vulgar, mas as classes empresariais tendem a ser marxistas vulgares mesmo ao combater a luta de classes. A literatura da área de negócios da década de 1930, aliás, nos faz lembrar o Memorando Powell: “Estamos perdidos. Está tudo arruinado.” O mundo dos negócios começou a desenvolver, ademais, o que chamaram na época de métodos científicos de prevenção de greves. Como atos de violência não estavam funcionando, foram buscar formas mais sofisticadas para minar o movimento operário.
A Grande Depressão só terminou com a Segunda Guerra Mundial, quando foram criados enormes incentivos pelo governo à produção industrial — que praticamente quadruplicou —, fazendo com que as pessoas retomassem os postos de trabalho. Esse acontecimento preparou o terreno para o crescimento e desenvolvimento sem precedentes do pós-guerra, com estímulos e a injeção de recursos muito significativos na economia por parte do governo. (Se examinarmos corretamente o passado, veremos que os computadores, a Internet e outras inovações se desenvolveram consideravelmente graças ao que poderíamos chamar de setor estatal da economia. Aliás, a maior parte do setor de alta tecnologia se desenvolveu dessa forma.)

A ofensiva dos empresários
Com isso, as ações contra os interesses dos trabalhadores ficaram suspensas durante a Segunda Guerra Mundial, mas, imediatamente após o fim do conflito, a ofensiva dos empresários foi retomada com força total. Por exemplo, da instituição da Lei Taft-Hartley (limitava as ações e o poder dos sindicatos de 1947), e macartismo, com maciças campanhas empresariais de propaganda ideológica — com ataques a sindicatos, ambicionando o controle do sistema de ensino e das ligas esportivas, infiltrando-se em igrejas, enfim, controlar tudo mesmo —, algo simplesmente gigantesco. O que não falta são bons estudos sobre essa época.
A par de tudo isso, providenciaram também para que as pessoas fossem induzidas a ter uma atitude ambivalente em relação ao governo. Assim, por um lado, elas deveriam ser levadas a odiar e temer o governo, pois, afinal, ele podia ser um grande instrumento de concretização dos anseios populares. Simultaneamente, as grandes empresas privadas ficam livres de toda necessidade de prestação de contas por seus atos, criando, desse modo, uma forma de tirania oculta — quanto mais poder elas tivessem e quanto menor o poder nas mãos do governo, melhor seria, do ponto de vista dos ricos e poderosos. Então, por um lado, as pessoas tinham que ser induzidas a odiar o governo e, por outro, precisavam apoiá-lo, já que a iniciativa privada depende amplamente do apoio governamental em setores da economia que vão da alta tecnologia a finanças, passando pela possibilidade de ser socorrido financeiramente se necessário, de poder contar com uma grande força militar internacional e assim por diante. Enfim, um vasto espectro.
Nos anos do governo Reagan, a campanha aumentou tremendamente. Reagan disse mais ou menos o seguinte aos homens de negócios: “Se vocês querem acabar ilegalmente com as ações sindicais e as greves de forma ilegal, sigam em frente” — e realmente, os atos à margem da lei de cessação e debelação de greves deram um salto enorme, resultando na triplicação das demissões ilegais. Até mesmo antes, em 1978, o presidente do sindicato United Auto Workers, Doug Fraser, lamentou o fato de que, nas palavras dele: “Os homens de negócios estão travando uma luta desigual com a classe trabalhadora.”3 Ela continuou até os anos 1990 e, logicamente, se intensificou muito com George W. Bush. Nos dias atuais, menos de sete por cento dos trabalhadores do setor privado estão sindicalizados, embora isso não aconteça porque eles não queiram filiar-se. Pesquisas indicam que, em sua grande maioria, eles querem isso, mas não podem fazê-lo.

Alguns anos atrás, mais precisamente em 2011, vimos um exemplo impressionante de apoio público aos sindicatos — em Madison, Wisconsin, e em vários outros estados —, quando os esforços para aniquilar de vez os remanescentes do movimento operário pelo governador Walker e seus apoiadores super-ricos, os irmãos Koch e os membros do Partido Republicano, integrantes do Legislativo, provocaram maciças manifestações de protesto. Em Madison, dezenas de milhares de pessoas saíam às ruas todos os dias para “ocupar” a sede do Poder Legislativo do Estado. Elas tiveram um apoio popular enorme e pesquisas indicaram que a maioria da população os apoiava. Nem isso, porém, foi suficiente para fazer os legisladores recuarem em seus intentos, mas, se esse apoio popular continuasse, pudesse muito bem levar a um tipo de situação em que um governo simpático à causa pudesse reagir instituindo políticas destinadas a enfrentar os verdadeiros problemas do país (e não os que são alvos da preocupação das instituições financeiras). O efeito das campanhas de ofensiva empresarial do pós-guerra foi o de ter conseguido dissolver as costumeiras forças contrárias a assaltos lançados pela zelosa classe corporativista do empresariado.”
2 Ver “Discurso de Harry Truman em Louisville, Kentucky”, 30 de setembro de 1948, na página 136.
3 Ver Carta de exoneração do dirigente sindical Douglas Fraser apresentada ao Comitê Consultivo sobre Questões Trabalhistas do governo Carter, 17 de julho de 1978, na página 137.

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