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terça-feira, 12 de maio de 2009

Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século - Italo Moriconi (seleção)

Editora: Objetiva
ISBN: 978-85-7302-306-0
Opinião: ★★☆☆☆
Páginas: 620
Sinopse: Para Júlio Cortazar, conto é aquele texto que corre em poucas linhas e em alta velocidade narrativa, capaz de nocautear o leitor com seu impacto dramático concentrado. Coube ao professor Italo Moriconi o desafio lançado pela Objetiva de garimpar os cem melhores textos do gênero produzidos no Brasil ao longo do século XX. Um trabalho que deixasse de lado os rígidos critérios acadêmicos e fosse pautado somente pela qualidade e sabor dessas pequenas obras-primas. O resultado é a coletânea Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século, um passeio pela mais deliciosa e contundente ficção curta produzida no Brasil entre 1900 e o fim dos anos 90. Uma antologia capaz de traduzir as mudanças do país e as inquietações de várias gerações de brasileiros, em cem anos de produção literária. A prova de que a arte do gênero não cessa de melhorar em nossa literatura.



“Um carnaval sem aventuras não é carnaval. (...) Não há quem não saia no carnaval disposto no excesso, disposto aos transportes da carne e às maiores extravagâncias. O desejo, quase doentio é como incutido, infiltrado pelo ambiente. Tudo respira luxúria, tudo tem da ânsia e do espasmo, e nesses quatro dias paranoicos, de pulos, de guinchos, de confianças ilimitadas, tudo é possível. Não há quem se contente com uma...
– Nem com um, atalhou Anatólio.
– Os sorrisos são ofertas, os olhos suplicam, as gargalhadas passam como arrepios de urtiga pelo ar. É possível que muita gente consiga ser indiferente. Eu sinto tudo isso. E saindo, à noite, para a porneia da cidade, saio como na Fenícia saíam os navegadores para a procissão da Primavera, ou os alexandrinos para a noite de Afrodite. (...)
Na terça desliguei-me do grupo e caí no mar alto da depravação, só, com uma roupa leve por cima da pele e todos os maus instintos fustigados. De resto a cidade inteira estava assim. É o momento em que por trás das máscaras as meninas confessam paixões aos rapazes, é o instante em que as ligações mais secretas transparecem, em que a virgindade é dúbia e todos nós a achamos inútil, a honra uma caceteação, o bom senso uma fadiga. Nesse momento tudo é possível, os maiores absurdos, os maiores crimes; nesse momento há um riso que galvaniza os sentidos e o beijo se desata naturalmente.”
(O bebê de tarlatana rosa – João do Rio)


“Foi decerto por isto que me nasceu, esta sim, espontaneamente, a ideia de fazer uma das minhas chamadas “loucuras”. Essa fora aliás, e desde muito cedo, a minha esplêndida conquista contra o ambiente familiar. Desde cedinho, desde os tempos de ginásio, em que arranjava regularmente uma reprovação todos os anos; desde o beijo às escondidas, numa prima, aos dez anos, descoberto por Tia Velha, uma detestável de tia; e principalmente desde as lições que dei ou recebi, não sei, duma criada de parentes: eu consegui no reformatório do lar e na vasta parentagem, a fama conciliatória de “louco”. “É doido, coitado!” falavam. Meus pais falavam com certa tristeza condescendente, o resto da parentagem buscando exemplos para os filhos e provavelmente com aquele prazer dos que convencem de alguma superioridade. Não tinham doidos entre os filhos. Pois foi o que me salvou, essa fama. Fiz tudo o que a vida me apresentou e o meu ser exigia para se realizar com integridade. E me deixaram fazer tudo, porque eu era doido, coitado. Resultou disso uma existência sem complexos, de que não posso me queixar um nada.”
(O Peru de Natal - Mário de Andrade)


“Ela estava tão aflita que embora fizesse frio se abanava com uma revista. Tentei convencê-la de que não devia se abanar, mas acabei achando que era melhor que o fizesse. Ela precisava fazer alguma coisa, e a única providência que aparentemente podia tomar naquele momento de medo era se abanar. Ofereci-lhe meu jornal dobrado, no lugar da revista, e ficou muito grata, como se acreditasse que, produzindo mais vento, adquirisse maior eficiência na sua luta contra a morte.”
(Um braço de mulher – Rubem Braga)


“O divertimento é uma espécie de injúria aos infelizes.”
(A moralista – Dinah Silveira de Queiroz)


“Não gosto de olhar o Corcundinha. Ele tem mais de seis tiques diferentes. “Você está melhorando dos tiques”, eu disse; mas que besteira, ele não estava, por que eu disse aquilo? “Estou, não estou?”, disse ele satisfeito, piscando várias vezes com incrível rapidez o olho esquerdo.”
(A força humana – Rubem Fonseca)


“Mas Leninha também não ia acreditar nessa história da condessa, que acabou tendo um fim triste como todas as histórias verdadeiras.”
(A força humana – Rubem Fonseca)


“(...) e me deu vontade de rezar, e de ter amigos, o pai vivo, e um automóvel. E fui rezando lá por dentro e imaginando coisas, se tivesse pai ia beijar ele no rosto, e na mão tomando benção, e seria seu amigo e seríamos ambos pessoas diferentes.”
(A força humana – Rubem Fonseca)


“Toda família tem uma virgem abrasada no quarto.”
(O Vampiro De Curitiba – Dalton Trevisan)


“A copeira servia à francesa, meus filhos tinham crescido, eu e a minha mulher estávamos gordos. É aquele vinho que você gosta, ela estalou a língua com prazer. Meu filho me pediu dinheiro quando estávamos no cafezinho, minha filha me pediu dinheiro na hora do licor. Minha mulher nada pediu, nós tínhamos conta bancária conjunta.”
(Passeio noturno – Rubem Fonseca)


“Vocês não sabem o que é ter estudado interno cinco anos num colégio de padres jesuítas: chegava a Semana Santa e a gente se sentia culpado pela morte de Jesus Cristo...”
(A morte de D.J. em Paris – Roberto Drummond)


“O mesmo Gil jura que são de Shakespeare os versos “trepar é humano, chupar divino” e desvia o olhar para o centro da mesa, depois de diagnosticar silenciosamente minha paranoia.”
(Correspondência completa – Ana Cristina César)


“Perguntei se ele já tinha comido minha mãe pra me dar conselho.”
(A maior ponte do mundo – Domingos Pellegrini)


“Ele sabia, na pele, que quem ama não fica rico. E, se vacilar, nem sobrevive.”
(Guardador – João Antonio)


“Era desses feriados tediosos, todos os amigos queridos, todos os sujeitos interessantes, todas as amigas disponíveis viajando, restando os neuróticos, os chatos e os vampiros na cidade.”
(O vampiro da Alameda Casabranca – Márcia Denser)


“(Se as suas poesias fossem boas), mas não eram. Não eram mesmo. Ocas, delírios vagos, desconexos, de um concretismo de cabeça dura e reticências. Na mesma construção e com a mesma ênfase conviviam vísceras e sangue, cosmos e eternidade, como se essas palavras não significassem nada além de meros sons poéticos convencionais. Quando a coisa começava a esquentar, ele sempre botava as tais palavras definitivas como Deus, Espaço, Eternidade, Morte, e esquecia as preposições, tornando tudo assim delirantemente obscuro, como se possuísse uma chave, um código para sua decifração. Para os leigos, as garotas bonitas e os novos-ricos quanto menos se entende, mais a coisa deve ser boa. Palavras bonitas é igual a ideias bonitas. É gongórico, elementar. O Poeta conhecia muito bem esse princípio e aplicava-o até à exaustão. A minha, por exemplo.”
(O vampiro da Alameda Casabranca – Márcia Denser)


“A cidade está cheia desses cursinhos de balé e bordado, as festinhas movidas a vinho, coca e mau humor de suas excelências, seus namorados, pelos quais elas são capazes de se foder por toda a eternidade, em troca de um sobrenome enganchado no rabo e um apartamento nos Jardins: os homens têm as angústias, as mulheres, os interesses, e por aí vai.”
(O vampiro da Alameda Casabranca – Márcia Denser)


“E (ele) só pensava em duas coisas: garotas e moto. E isso quer dizer que não pensava.”
(O vampiro da Alameda Casabranca – Márcia Denser)


“E concordaram, bêbados, que estavam ambos cansados de todas as mulheres do mundo, suas tramas complicadas, suas exigências mesquinhas. Que gostavam de estar assim, agora, sós, donos de suas próprias vidas. Embora, isso não disseram, não soubessem o que fazer com elas.”
(Aqueles dois – Caio Fernando Abreu)


“E retifica aquela reportagem: não chegou sequer a perder a virgindade naquela lua-de-mel, os dois tão desajeitados. Dor sentiu, confirma: teria um estreitamento vaginal? Um hímen demasiado resistente? Mas não se falava dessas coisas, naquele tempo, e então tudo foi se ajeitando, ou se destruindo, em silêncio.
Lana, garante o repórter, só atingiu a maturidade sexual por volta dos 40 anos, ao cabo de um aprendizado com um total de 18 homens – o que, ele acrescenta, já parece um número modesto, para os padrões atuais.”
(Toda Lana Turner tem seu Johnny Stompanato – Sonia Coutinho)


“Sorri para ela, no espelho, um rosto sem nenhuma inocência, mas ao qual o tempo conferiu um toque de pureza cínica.
Até onde posso ir, até onde irei, questiona-se Melissa, estremecendo, porque os anos tinham passado, como um vento frio. E, entre maridos, viagens, uma carreira movimentada, tragédias – ah, tantas coisas se haviam tornado, de repente, definitivas. Amores perdidos, aventuras não vividas e, o que é pior, não mais desejadas.”
(Toda Lana Turner tem seu Johnny Stompanato – Sonia Coutinho)


“E, como disse o poeta Whitman num poema corretamente intitulado “A Woman Waits for Me”, sexo contém tudo, corpos, almas, significados, provas, purezas, delicadezas, resultados, promulgações, canções, comandos, saúde, orgulho, mistério maternal, leite seminal, todas as esperanças, benefícios, doações e concessões, todas as paixões, belezas, delícias da terra.”
(A Confraria Dos Espadas – Rubem Fonseca)


“Como membro da Confraria dos Espadas eu acreditava, e ainda acredito, que a cópula é a única coisa que importa para o ser humano. Foder é viver, não existe mais nada, como os poetas sabem muito bem.”
(A Confraria Dos Espadas – Rubem Fonseca)


“Puxei-a para o quarto e joguei-a na cama. Com a língua, umedeci sofregamente e por muito tempo as fendas de seu corpo. Quando a cobri, ela quis. Abriu-se como fruta que se racha no solo. O desejo é vagalhão enfurecido, avalanche que se nutre do próprio excesso para melhor derrubar e engolir. Iniciado, nada pode detê-lo. Se abrissem a porta e me vissem dentro de minha irmã, gozando-a, meu sêmen estancaria? Penso que não. Uma vez explodindo, é esperar que a convulsão cesse por si mesma. Assim, fomos de roldão nas asas da carne até que o esgotamento nos fez dormir, eu ainda com o membro dentro dela.”
(Olho – Miriam Campello)


“Você está vivendo no apartamento como se morasse num quarto de hotel. Você liga o aparelho de televisão. Você e os móveis se entreolham de perfil, como bandido e polícia se estranham um ao outro no filme que está sendo exibido a está hora da madrugada.”
(Days Of wine And Roses – Silviano Santiago)


“Você traduz as carícias iniciais trocadas com Roy pelos nomes mais grosseiros dos órgãos sexuais envolvidos na batalha do leito e, com a fita métrica da retina, mede tamanho, diâmetro e largura e, com a sensibilidade dos ouvidos, faz a listagem completa dos ruídos malcheirosos e envergonhados e, com a suavidade do tato, apalpa espessura e asperezas, descrevendo em seguida os túneis vulgares lubrificados pela saliva pastosa e as rotas clandestinas perseguidas e finalmente permitidas e devassadas. Você menospreza a ânsia gerada pelos movimentos repetitivos, ridículos e nada monótonos, enxergando nela o prejuízo do suor que se tornara pegajoso e nojento, a sujeira das peles lambuzadas que reclamam sabão e o banho de chuveiro e o cansaço dos músculos que teriam optado pelo descanso naquela noite de dia cansativo. Você descreve o gozo sexual enunciando os vários nomes do líquido, quanto mais sórdidos os nomes, e nojentos, mais vantajosos, você descreve o gozo sexual medindo a quantidade expelida de líquido e a frequência, atendo-se a dados complementares como a indolência ou a agressividade do esguicho. A memória das suas experiências amorosas com Roy são como os dois espelhos ovais e reflexivos do guarda-roupa, que a decoração fim-de-século permitia ter ao lado da cama do casal. Recordando, você se vangloria da capacidade que tem de oferecer, pele, boca, dentes, órgãos, músculos e líquido que satisfazem.”
(Days Of wine And Roses – Silviano Santiago)

Um comentário:

  1. JESUS ​​TE AMA

    Porque Deus amou o mundo que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que crê não pereça, mas tenha a vida eterna.
    João 3:16


    Porque Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele.
    João 3:17

    Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, ea verdade, ea vida: ninguém vem ao Pai, senão por mim.
    João 14:6

    Quem crer e for batizado será salvo, mas quem não crer será condenado.
    Marcos 16:16

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