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quinta-feira, 8 de março de 2018

Liberalismo. Entre civilização e barbárie – Domenico Losurdo

Editora: Anita Garibaldi
ISBN: 978-85-7277-069-9
Tradução: Bernardo Joffily e Soraya Barbosa da Silva
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 160
Sinopse: Domenico Losurdo, um dos mais notáveis pensadores marxistas contemporâneos, tem se dedicado, em uma obra já considerável, à análise crítica dos ideólogos do liberalismo. Ele mostra como o elitismo daquele pensamento olhava o mundo com um metro de classe rígido, segundo o qual toda a cultura e a civilização são apanágios legítimos dos proprietários, cabendo aos demais as durezas do trabalho, das carências, da miséria. Losurdo reconstrói cuidadosamente esta tradição e seus desastres. Mostra como ela é o biombo da exploração dos trabalhadores na Europa e também da hierarquização do mundo em raças inferiores e superiores, cujo topo é ocupado pelas elites brancas europeias.


“Mas precisamente enquanto fatos macroscópicos confirmam a validade da análise leninista do imperialismo, este sistema de relações internacionais celebra os seus maiores triunfos mesmo no plano ideológico, rodeado como está por uma aura que consagra o seu caráter benéfico para o presente, o passado e o futuro. “Finalmente o colonialismo está de volta Já era hora!”, anunciou triunfalmente, há algum tempo, o The New York Times, dando a palavra ao historiador Paul Johnson. E Popper: “Libertarmos estes Estados (as ex-colônias) depressa demais e de maneira demasiado simplista” é como “deixar um orfanato entregue a ele mesmo”. Retoma-se assim um tema clássico da tradição colonial: tal como nos tempos de Kipling, os povos do Terceiro Mundo continuam a ser considerados meio crianças e meio diabos; e, na medida em que se revelam rebeldes e diabos, é justo que sejam severamente punidos pelos que são os únicos realmente capazes de entendimento e vontade, pelos adultos titulares do patria potestas, os países e as classes dirigentes do civilizado mundo capitalista. É esta a opinião expressa ainda nos nossos dias, em letras redondas e com linguagem retumbante, pelo teórico da sociedade aberta e profeta do “racionalismo crítico” que, no entanto, considera supérfluo interrogar-se quanto às razões de por que a renovada solicitude das grandes potências pelas crianças dos “orfanatos” se concentra nas regiões mais ricas de petróleo e estrategicamente decisivas.”


“Em Lênin a crítica do colonialismo e do imperialismo desempenha um papel central, bem para além da imediatez política. O que é a democracia? Vejamos de que modo a definem os clássicos da tradição liberal.
Tocqueville descreve com lucidez e sem indulgências o tratamento desumano reservado aos peles-vermelhas e aos negros nos EUA: através de deportações sucessivas, e sofrendo os “males terríveis” que estas implicam, os primeiros estão já claramente destinados a serem eliminados da face da Terra; quanto aos segundos, são submetidos no sul a uma escravatura mais inflexível que na antiguidade clássica ou na América Latina. No norte, na teoria são livres, mas na realidade continuam a ser vítimas de um “preconceito racial” que precisamente aqui se encarniça de modo particularmente cruel, pelo que o negro fica privado não só dos direitos políticos, mas também dos civis, dado que a sociedade o entrega de fato inerme à violência racista. “Oprimido, pode queixar-se, mas só encontra brancos entre os seus juízes”. Contudo, isto não impede Tocqueville de celebrar a América como o único país no mundo em que vigora a democracia “viva, ativa, triunfante”. Um país e um regime político são definidos democráticos independentemente da sorte dos excluídos, por mais amplo que possa ser o seu número e mais cruel a sua sorte. (...)
Em relação a este mundo, Lênin representa uma ruptura não só no plano político, mas também epistemológico: a democracia não pode ser definida independentemente dos excluídos; “o despotismo” exercido sobre “bárbaros”, obrigados à “obediência absoluta” própria dos escravos e às infâmias da expansão e do domínio colonial, lança uma luz inquietante sobre os Estados liberais, e não só no que respeita à sua política internacional. Esta não é um elemento estranho da estrutura político-social interna. É elucidativo o exemplo dos Estados Unidos; aqui, é no próprio território nacional que residem as raças “na menoridade”, de cuja condição porém não se pode prescindir nem sequer quando se trata de analisar países como a Inglaterra ou a França ou a Itália. Na tradição liberal a teorização ou celebração da liberdade avança a par e passo com a enunciação de cláusulas de exclusão, pelo que a liberdade em última análise acaba por se configurar como privilégio.”


“Os políticos mais liberais e radicais da livre Grã-Bretanha (...), quando se tornam governadores da Índia, transformam-se em verdadeiros Gengis Khan.” (Lênin)


“Stálin sintetizou com eficácia o ponto de vista de Lênin:
Nas condições da opressão capitalista, o caráter revolucionário do movimento nacional de modo nenhum implica obrigatoriamente a existência de elementos proletários no movimento, a existência de um programa revolucionário ou republicano no movimento, ou a existência de uma base democrática do movimento. A luta do emir afegão pela independência do Afeganistão é objetivamente uma luta revolucionária, apesar do caráter monárquico das concepções do emir e dos seus seguidores (...). A luta dos mercadores e dos intelectuais burgueses egípcios pela independência do Egito, pelas mesmas razões, é uma luta objetivamente revolucionária, por mais que os chefes do movimento nacional egípcio sejam burgueses por origem e pertença social e por mais que sejam contra o socialismo, enquanto a luta do governo operário inglês para manter a situação de dependência do Egito, pelas mesmas razões, é uma luta reacionária, por mais que os membros deste governo sejam proletários por origem e pertença social e por mais que sejam pelo socialismo.
Ou seja, os conflitos entre países com um diferente estágio de desenvolvimento político-social têm de ser avaliados não em função do caráter mais ou menos avançado do regime vigente em cada um deles, mas sim a partir da natureza objetiva da contradição que entre eles se desenvolver: é por isso que, embora guiados por camadas feudais, os países e povos atrasados podem ser protagonistas de uma justa e progressiva luta ou guerra de libertação nacional, cujo alvo poderá eventualmente ser constituído por um governo “operário” e trabalhista!
Por fim – na opinião de Lênin, mas não infelizmente, na de Stálin –, o caráter não unilinear do processo histórico continua também a manifestar-se posteriormente ao advento do socialismo em alguns países. O próprio proletariado vitorioso pode exprimir tendências chauvinistas ou hegemônicas, pode cultivar a tentação de “se sentar às costas dos outros” e, portanto, “são possíveis quer revoluções – contra o Estado socialista – quer guerras”.
Pode acontecer até de um país socialista não exprimir a causa do progresso. Teorizar a exportação do socialismo a partir dele significa estar prisioneiro da filosofia burguesa da história: só se configuram de maneira diferente o campo da civilização e da modernidade, por um lado, e o da barbárie e do atraso, por outro, mas quanto ao resto o progresso continua a ser visto como a extensão unilinear do primeiro em prejuízo do segundo, independentemente de toda e qualquer análise concreta da situação concreta.”


“Os índios e os negros continuam a ser uma quantié negligeable, cuja sorte não intervém em nenhum momento para ofuscar o quadro luminoso da democracia americana. Esta — prossegue o “democrata” presidente dos EUA Bill Clinton — “tem de continuar a guiar o mundo”: “a nossa missão é sem prazo”. O silêncio sobre o genocídio das populações indígenas e sobre o tráfico e escravatura dos negros (que no momento da fundação dos EUA constituem 20% da população total) é o silêncio típico dos mitos de fundação dos impérios. (...)
Estes últimos dão sinais de crescente impaciência, se não no plano mais imediatamente político, pelo menos no cultural. Por ocasião da inauguração do mausoléu dedicado ao Holocausto, os sobreviventes das tribos índias interrogaram-se por que motivo não se erigia um mausoléu análogo nos EUA em recordação do genocídio que lá de fato se consumou. Por sua vez, os militantes negros sublinham, em polêmica contra a ideologia dominante, o papel central que na história americana tem o que eles definem como Black Holocaust. O fato – observam – é que a “escravidão física” foi substituída pela “escravidão psicológica”, mas sem dela eliminar a relação de dominação que continua a manifestar-se no plano cultural. Trata-se de um protesto perfeitamente justo contra a permanente hipocrisia da historiografia e da cultura ocidental no seu conjunto.”


“O pensamento de Lênin distingue-se por esta sua atenção aos excluídos e pela sua implacável denúncia dos estereótipos e dos processos de desqualificação racista, pela sua recusa de contrapor um estereótipo a outro, pelo esforço constante de recompor a unidade da história mundial e do gênero humano. O universal a construir – sublinha o revolucionário russo, citando e subscrevendo a “fórmula magnífica” da Lógica de Hegel – deve ser tal que abranja em si “a riqueza do particular”.”


“Mais que de choque entre civilização e barbárie, um autor americano que agora se tornou célebre, Samuel P. Huntington, prefere falar de “choque de civilizações” (clash of civilisations), mas o significado é substancialmente o mesmo, dado que só a civilização ocidental representa a causa do “individualismo”, dos “direitos humanos, igualdade, liberdade”, tolerância etc.  Contudo, é o próprio autor quem reconhece que o “fundamentalismo” não é de modo nenhum um fenômeno exclusivamente islâmico, e admite igualmente a hipocrisia e a brutalidade do Ocidente nas suas relações com o Islã. A “comunidade internacional”, chamada a conferir legitimidade à cruzada anti-iraquiana e a outras análogas, na realidade não passa de um sinônimo eufemístico do “mundo livre” dos tempos da Guerra Fria, ou seja, do Ocidente. O comportamento deste ultimo é assim descrito:
Depois de ter derrotado o mais forte exército árabe (o iraquiano), o Ocidente não hesita em fazer sentir o seu peso sobre o mundo árabe (e sobre a Líbia em particular). O Ocidente, com efeito, está usando instituições internacionais, poderio militar e recursos econômicos para impor um governo do mundo que mantenha o predomínio ocidental, defenda os interesses ocidentais e promova os valores políticos e econômicos ocidentais”. (...)
Huntington, de qualquer modo, reconhece tudo isto e, no entanto, continua a considerar o Ocidente como o intérprete exclusivo dos “direitos humanos” e inclusive do ideal da “igualdade”. Mais uma vez a democracia não tem validade para as relações internacionais, e da igualdade continuam a ser excluídos os bárbaros. Não é por acaso que o ensaio conclui com um apelo ao Ocidente para “manter o poder econômico e militar necessário para proteger os seus interesses” (nesta altura os valores já não parecem desempenhar um papel significativo).
A tese do “choque de civilizações” oculta os reais conteúdos da contradição entre o Ocidente e o mundo árabe, acabando por transfigurar ideologicamente a tradicional política colonial e imperial das grandes potências que se autoproclamam representantes únicas se não da civilização enquanto tal pelo menos da civilização autêntica. A Oeste nada de novo, poder-se-ia então concluir. Agora já devia tornar-se claro para todos: a expedição anti-iraquiana (de 1991) representou uma “autêntica fratura geopolítica” na relação entre o Ocidente e o mundo árabe, reforçando os movimentos islamitas e fundamentalistas. “Até os intelectuais francófonos do Magrebe, durante muito tempo considerados por seus compatriotas como a “quinta coluna da França”, têm assumido posições antiocidentais”*. Reconhece-o também Huntington: bastante cedo os intelectuais e as massas do mundo árabe se aperceberam do engano que o extraordinário poder multimidiático das grandes potências tentava fazer passar. A guerra do Golfo viu não “o mundo contra o Iraque”, mas sim “o Ocidente contra o Islã”. Até a consciência nas vítimas da arrogância branca ou ocidental da real identidade dos sujeitos em conflito não é propriamente um fato novo. A trágica novidade, na sequência da falta de um movimento anti-imperialista capaz de fazer frutificar a lição leninista, reside antes no fato de o mundo árabe começar a interpretar o confronto com as mesmas categorias dos seus inimigos. Tal como Huntington, também alguns intelectuais árabes já teorizam atualmente as “guerras de civilizações”, de que a do Golfo constituiria o primeiro exemplo.
O enfraquecer ou o desagregar de uma posição capaz de combinar a crítica do Ocidente com o reconhecimento dos seus pontos altos e da validade universal da sua herança explica o fato de os movimentos de resistência à política hegemônica e imperial das grandes potências e dos EUA terem tendência de assumir cada vez mais a forma de guerra religiosa e de civilizações. Quebrado o equilíbrio entre crítica do Ocidente e herança dos seus pontos altos, a guerra santa do Ocidente corresponde à guerra santa do Islã. A situação aí delineada é extremamente prenhe de perigos. Quem a evidenciou, embora numa situação profundamente diferente da atual, foi uma grande personalidade política claramente influenciada pela lição de Lênin. Em 1954, Togliatti põe assim em guarda a Europa e os EUA empenhados em conter os movimentos de emancipação anticolonial, em impetuoso crescimento naqueles anos:
Mesmo se devesse continuar, entre o mundo “ocidental” e os povos asiáticos, o atual estado de guerra fria e semibeligerância, a catástrofe delineia-se, porque está situada na ruptura que esta guerra fria implica, entre duas partes do mundo cuja tarefa histórica atual, pelo contrário, é a de se compreenderem e aproximarem (...). Mesmo que não se chegue agora a uma guerra aberta, em tudo isto está já em germinação uma catástrofe histórica de dimensões enormes”.
A catástrofe do “choque de civilizações” e das guerras religiosas delineia-se mais claramente nos nossos dias. Em vez de proceder a uma reflexão autocrítica, o Ocidente parece querer apelar a uma cruzada contra o fundamentalismo por ele mesmo evocado e alimentado com sua arrogância imperial que em certos casos não hesita em condenar à inanição povos inteiros. O ensaio de Huntington é expressão desta situação e desta política.
Há contradição entre a tese do “choque de civilizações” e a do “fim da história” que Fukuyama exprimiu? A intervenção deste filósofo-funcionário do Departamento de Estado americano tem sido com frequência interpretada como o prenúncio do fim dos conflitos e das guerras. Mas trata-se de leituras superficiais: na realidade, a tese do “fim da história” constitui uma plataforma ideológica das cruzadas do Ocidente que, tendo agora atingido a fase final do processo histórico (representado pela sociedade capitalista e liberal), é chamado a edificar também o Terceiro Mundo, por meio de oportunas expedições militar-pedagógicas, ao nível dos países mais avançados, de maneira a edificar o “Estado universal homogêneo”. O que, para Fukuyama, é o choque entre o Ocidente liberal (e individualista) que atingiu o fim da história, e bárbaros ou semicivilizados ainda aquém dessa fase, para Huntington, é o choque entre a civilização ocidental (a única autêntica por ser a única que respeita o “individualismo” e os “direitos do homem”) e civilizações ainda aquém da tolerância liberal. A diferença relevante está só no maior realismo e na maior franqueza do segundo autor que tem poucas ilusões quanto à realização do “Estado universal homogêneo” e acaba por reconhecer que o “choque de civilizações” tem tendência para se configurar como confronto cujos sujeitos são kin countries, quer dizer, estirpes diferentes e contrapostas.”
*: cf. A. Benantar, Gli Arabi e L’Ovest: mettete in soffitta le crociate, cit. P. 23.


“Em conclusão, nos nossos dias acabam por reemergir todos os estereótipos (quer os que presidem as cruzadas e as expedições coloniais, quer os que sempre têm acompanhado os conflitos interimperialistas) contra os quais Lênin desenvolveu a sua implacável e lúcida polêmica.”


“Mas Hayek insiste na sua hagiografia: “o liberalismo clássico apoiara as reivindicações de ‘liberdade de associação’” Na realidade, a polêmica antissindical, ora mais explícita e virulenta, ora em surdina e pouco perceptível, acompanha constantemente a história do pensamento liberal. Por outro lado, para desmentir o patriarca do neoliberalismo, basta citar seus autores prediletos. Mandeville, por exemplo, escreveu surpreso e indignado sobre as primeiras tentativas dos miseráveis do seu tempo de se organizarem de modo a melhorar suas condições de vida:
“estou informado por pessoas dignas de fé que alguns destes servos chegaram a tal ponto de insolência de se reunir em associação e fizeram leis que estabelecem como obrigação não prestar serviço por uma quantia inferior à estabelecida por eles, não carregar pacotes ou cargas que superem um certo peso, fixado em duas ou três libras, e se impuseram uma série de outras regras diretamente opostas ao interesse daqueles para quem prestam serviço e, ao mesmo tempo, contrárias ao objetivo pelo qual foram contratados”. (...)
Mandeville escreve: “para tornar a sociedade feliz é necessário que a grande maioria permaneça ignorante e pobre”. Ou então: “a riqueza mais segura consiste em uma massa de pobres trabalhadores” Não é tão importante que o autor mais querido de Hayek considere como um fato natural, inevitável, e ao mesmo tempo benéfico, a miséria e a ignorância dos trabalhadores assalariados. O que mais importa é examinar a estrutura epistemológica do discurso de Mandeville. Ao exigir o sacrifício de uma numerosa massa de indivíduos, é a “sociedade” — ou melhor, a “riqueza” — um monstro universal que engole a grande maioria da população. Ou então, se nos lembrarmos de Destutt de Tracy, ele também na mira de Marx: “as nações pobres são aquelas em que o povo vive em condições de riqueza, enquanto as nações ricas são aquelas em que este é ordinariamente pobre”. A “riqueza das nações” — para usar uma expressão de Adam Smith — é o novo nome deste Moloch devorador. Este último pode inclusive se chamar “liberdade”: a carga antiestatal e liberal de Mandeville é fortemente destacada e celebrada por Hayek, o qual, porém, transita com desenvoltura na outra face da moeda, “the working slaving people”, “a parte mais mesquinha e pobre da nação”, que, segundo Mandeville, trabalha e é justo e inevitável que trabalhe precisamente à maneira dos escravos. E como antes a “riqueza das nações” exigia a miséria da maioria da população, agora aquela que podemos chamar de “liberdade das nações” exige sempre a substancial escravidão da maioria da população.
É preciso analisar um pouco mais a estrutura do discurso criticado por O Capital: a felicidade, ou melhor, a riqueza, ou melhor, a liberdade da “sociedade” ou da “nação” exigem a infelicidade, a miséria, a escravidão da maioria de seus membros. Por que esta proposição não é vista como logicamente contraditória? É claro: porque os trabalhadores assalariados não são contratados propriamente, ou a título pleno, sob a categoria de “sociedade” e “nação”, um universal que a eles faz apelo só porque funciona como vítimas de sacrifício.”


Neoliberalismo e Nova Direita
Se hoje, quando se fala de direitos do homem, se entende – ao menos por parte da cultura política mais avançada – o homem na sua universalidade, o homem como tal, não se pode ignorar a grande contribuição, para este resultado, da tradição política que vai de Robespierre (foi o primeiro que contestou as limitações censitárias do direito de voto e aboliu a escravidão nas colônias) a Lênin (a revolução de Outubro deu um impulso decisivo ao processo de descolonizar e reconhecer o direito de autodeterminação também aos povos em certo tempo considerados bárbaros). É claro que a constatação deste fato histórico não deve ser um obstáculo para um balanço crítico, sem indulgências, desta tradição revolucionária. No que se refere mais especificamente ao marxismo, a ilusão que o penetra profundamente, quanto à breve fase de transição para um comunismo utopicamente transfigurado, produziu consequências claramente nefastas: esta ilusão levou a negligenciar, ou pior, a considerar puramente “formal”, o problema das garantias democráticas, ou o velho problema liberal dos limites de poder, qualquer que seja.
Seria, porém, errado pensar que este tema seja totalmente ausente em Marx e Engels. Existe inclusive uma celebração apaixonada da tradição liberal anglo-saxônica: “o direito inglês” — escreve Engels em 1892 — é “o único que manteve conservada intacta, e transmitida para a América e para as colônias, a melhor parte daquela liberdade pessoal, daquela autonomia local e daquela independência frente a toda intervenção estrangeira, com exceção da justiça”. Tudo isso que, com a monarquia absoluta, se perdeu na Europa continental e nunca mais foi reconquistado completamente.
Não é o tema da liberdade do indivíduo que faz a diferença entre Marx e Engels, por um lado, e, por outro, a tradição liberal. É, ao contrário, o reconhecimento da dignidade de indivíduo e de homem em cada ser humano, e também o conhecimento de que sem a “liberdade da necessidade” correm o risco de resultarem formais a liberdade civil e política e o próprio reconhecimento da dignidade do homem. É certo que profundas transformações políticas e sociais se desenvolveram de modos muito diferentes dos previstos e desejados por Marx e Engels. Todavia, Hayek tem razão quando reconhece em Roosevelt e nos documentos da ONU, na atual configuração da sociedade “liberal-democrática”, uma influência do movimento democrático-socialista e do marxismo. É importante traçar um balanço histórico correto do mundo no qual vivemos para compreender os termos reais do atual debate político. Ao que se assiste hoje é uma gigantesca tentativa de purificar a sociedade “liberal-democrática” dos elementos (ou do maior número possível de elementos) de democracia, daquilo que inseriram as lutas prolongadas do movimento democrático-socialista. Dahrendorf identifica corretamente no neoconservadorismo a tentativa de reverter a “ideia de direitos civis e sociais”, de privar a ideia de direito daquela “substância social” que é o resultado da “resposta que a sociedade aberta apresenta aos desafios da luta de classes”. E então, apesar de todas as diferenças, o neoconservadorismo e o neoliberalismo acabam, inevitavelmente, se encontrando com a velha e a Nova Direita na liquidação, não apenas do movimento socialista, mas da herança da Revolução Francesa e da ideia de igualdade, do “Estado-Providência” etc. Por vezes a Nova Direita reivindica explicitamente a tradição liberal para contrapô-la à massificação do mundo moderno. Tocqueville foi “um dos primeiros a descobrir a contradição escondida no slogan que, a partir de 1789, associa igualdade a liberdade”.
Assim, o anti-igualitarismo dos neoconservadores não parece suficientemente radical e consequente para a Nova Direita. E, todavia, existe um tema de fundo que aproxima as duas consentes. Benoist não se cansa de denunciar no conceito universal de homem a versão superficialmente laicizada do monoteísmo hebraico-cristão, a gênese do “totalitarismo igualitário”. Com referência à Declaração Universal dos Direitos do Homem, Hayek ironiza por sua vez o conceito de ‘direito universal’ que assegura ao camponês, ao esquimó e talvez também ao abominável homem das neves ‘férias periódicas remuneradas’”.
A destruição da herança do movimento democrático-socialista não pode deixar de colidir com o conceito de homem e de direito do homem como tal, e é apenas neste quadro que se pode compreender a tese desenvolvida por Hayek em relação ao problema da fome do Terceiro Mundo: “Contra a superpopulação existe apenas um freio, ou seja, que se mantenham e que cresçam apenas aqueles povos que são capazes de se alimentarem sozinhos”. É natural que o regresso à concepção liberal clássica, vista e cuidada na sua “pureza” e autenticidade comporte – também em nível internacional – a rejeição de qualquer redistribuição de recursos que não derive da caridade individual. Mesmo quando alcança dimensões trágicas, até levar à morte de milhões de pessoas, a fome continua a ser um fato privado, daqueles que a sofrem ou dos eventuais benfeitores que fazem caridades. Desta forma, os povos aprenderão a “se alimentar sozinhos”.
É certo que milhões de crianças não terão sequer o tempo de aprender. Mas a resposta para uma eventual objeção já está contida num clássico da tradição liberal. Segundo Malthus, é intrínseco ao “governo moral deste universo que os pecados dos pais sejam punidos nos seus filhos”; “pelas leis da natureza, uma criança é confiada direta e exclusivamente aos cuidados de seus pais” e não tem nenhum direito de reivindicar à sociedade.
É desta desconfiança em relação à categoria dos direitos universais do homem e desta indiferença para com a sorte de milhões de indivíduos concretos que emerge mais uma vez o caráter ideológico e mistificador da profissão de fé que o liberalismo clássico e o neoliberalismo fazem do “individualismo”.”


“Em dezembro de 1952, o ministro da Justiça estadunidense enviou uma carta à Corte Suprema, empenhado em discutir a questão da integração nas escolas públicas: “A discriminação racial fortalece a propaganda comunista e gera dúvida mesmo entre as nações amigas sobre a intensidade de nossa devoção à fé democrática”. Washington corre perigo – observa o historiador americano que relata essa declaração – de afastar-se das “raças de cor” não só no Terceiro Mundo e no Oriente, mas no coração mesmo dos EUA: aqui também a propaganda comunista tem obtido um sucesso considerável na sua tentativa de “ganhar os negros para sua causa revolucionária”, fazendo desabar neles a “fé na instituição americana”. A decisão da Corte Suprema a favor da não segregação só começa a ser aplicada nos Estados do Sul após a intervenção do exército federal. Em última análise, uma revolução planetária vinda de baixo constrangeu os dirigentes estadunidenses a uma limitada revolução pelo alto, e a liquidarem ao menos os aspectos mais visíveis e revoltantes do regime da white supremacy. Nesse mesmo contexto podemos incluir o episódio da África do Sul, onde, em 1994, estimulada por décadas de lutas de baixo, uma revolução do alto e de fora põe fim, também nesse país, ao monopólio branco sobre os direitos políticos e o poder.”


“A ideologia neoliberal hoje dominante pretendia liquidar o movimento que partiu de Marx, ou que se inspirou nele, como se fosse uma gigantesca e ruinosa derrapagem antidemocrática. Na realidade, o advento da democracia contemporânea pressupõe a superação das três grandes discriminações: censitária, racial e sexual, que por tanto tempo excluíram do gozo dos direitos políticos os não proprietários, as “raças inferiores” e as mulheres. Nesses três casos, o movimento comunista desenvolveu um papel relevante. O primeiro grande país a estender o sufrágio as mulheres foi a Rússia oriunda da revolução de fevereiro, na qual já eram bastante ativos os “bolchevistas” que, mais tarde, seriam os protagonistas da Revolução de Outubro. É verdade que a discriminação censitária já estava em crise desde o final do século 19, mas nem por isso tinha sido suprimida. Tomemos por exemplo o caso da Inglaterra. Aqui – denuncia Lênin em 1917 –, o direito eleitoral “é ainda bastante limitado e exclui o estrato inferior propriamente proletário”. Ainda se poderia acrescentar que a Câmara Alta, completamente hereditária, é privilégio da aristocracia; para não falar do fato de que o “voto plural” – de que gozam alguns privilegiados, obviamente representantes das classes proprietárias – somente seria extinto em 1948. Vale dizer: também no Ocidente, o fim da revolução burguesa não pode ser pensado sem a contribuição de um movimento iniciado com uma revolução que agita a bandeira do socialismo e da luta contra a burguesia.”


“Todo o terrorismo francês não foi nada mais do que um modo plebeu de livrar-se dos inimigos da burguesia: o absolutismo, o feudalismo e o filisteísmo”; “o proletariado e as frações burguesas não pertencentes à burguesia”, embora se tenham “oposto à burguesia, como a exemplo da França de 1793 a 1794, só lutaram pela realização dos interesses da burguesia, ainda que não ao modo da burguesia”.” (Karl Marx)


“Há boas razões a favor da tese de uma única “época de ‘revolução social”. Graças à supressão de seu significado político imediato — já sublinhava o jovem Marx —, a propriedade pôde empreender sua marcha triunfal e conquistar a sociedade inteira e o mundo inteiro. Desfeitos os vínculos “políticos” que ainda atrapalhavam a liberdade de movimento do capital, a humanidade no seu conjunto constitui-se agora de “indivíduos” fechados na esfera de suas próprias vidas e de seus interesses privados, cujo “único objetivo” é “a necessidade natural, a necessidade e o interesse privado, a conservação da propriedade e da própria egoística pessoa”. A observação que os Manuscritos econômico-filosóficos fazem a respeito do objeto da produção capitalista — que, por ter como fim a realização da mais-valia, perde “toda a determinação natural e social” – é válida também para a figura do sujeito.
Assim, então desenvolve-se uma globalização capitalista que, junto a outros vínculos políticos, está agora empenhada em transformar o mundo inteiro, no plano econômico, em um “livre mercado” e, no plano político, em um “livre mercado político”, segundo a definição de democracia cara a Schumpeter e que hoje faz escola nos EUA e no mundo inteiro. Generaliza-se a figura do indivíduo-consumidor que, já desprovido de “toda determinação social e natural”, resulta indefeso perante a superpotência financeira do grande capital.”


“Podemos surpreender o reconhecimento desse segundo aspecto num autor inesperado. Criticando a teorização dos “direitos sociais e econômicos” que encontram sua expressão na Declaração Universal dos Direitos do Homem, adotada pela ONU em 1948, Hayek observou: “Este documento é uma clara tentativa de fundir direitos da tradição liberal ocidental com a concepção completamente diferente da revolução marxista russa”. Portanto, com o explícito reconhecimento do patriarca do neoliberalismo, o Estado social desenvolvido no Ocidente – isto é, a tentativa de impor limites ao pleno desdobramento do poder econômico-social da riqueza – não pode ser pensado sem o impulso e o desafio provenientes da Revolução de Outubro. Não por acaso, ao desabamento ocorrido no Leste correspondeu o desmantelamento do Estado social no Oeste, e até mesmo a eliminação dos direitos sociais e econômicos do catálogo dos direitos.
Além do proletariado do Ocidente, a Revolução de Outubro também chamou à luta os “escravos das colónias”. Desencadeou, como vimos, um enorme processo de emancipação que liquidou o domínio colonial e suprimiu o significado político imediato da cor da pele e da qualificação étnica. Mas, ainda a esse respeito, percebemos, se não uma inversão de tendência, uma clara paralisia, Além de caracterizar-se pela polarização da riqueza e da pobreza, a atual sociedade capitalista caracteriza-se também por sua polarização política, além de econômica, nas relações internacionais. Se os povos coloniais conquistaram os direitos políticos mediante a construção do Estado nacional independente (do qual eram considerados indignos e para o qual eram considerados incapazes), o esgotamento da soberania nacional, no Terceiro Mundo e nas zonas periféricas, é o modo concreto pelo qual se desenvolve hoje o processo de desemancipação, isto é, de liquidação dos direitos políticos que aqueles povos já haviam conquistado.
Nesse sentido, não há dúvidas: estamos diante de uma dupla derrota do projeto originado da Revolução de Outubro. Mas essa derrota já não representa a solução do problema e, sim, sua agudização. A precariedade e a miséria de considerável massa das metrópoles capitalistas, de regiões inteiras ou de continentes no Terceiro Mundo, resultam tão mais intoleráveis quanto mais prodigioso revela-se o desenvolvimento das forças produtivas; a desigualdade política nas relações internacionais é também dificilmente aceitável, com a insegurança e os perigos de guerra que dela derivam, em um momento em que as armas de destruição em massa (outra face do desenvolvimento das forças produtivas) fazem pesar terríveis perigos para a humanidade inteira. São dois aspectos diferentes da contradição entre as novas forças produtivas e relações de produção burguesas. São exatamente aquela dupla derrota e os problemas que ela deixa sem solução que comprovam o fato de que, com a Revolução de Outubro, iniciou-se uma nova “época de revolução social” com processos revolucionários sempre determinados peculiarmente, com os ziguezagues e os percursos tortuosos e muitas vezes insuspeitados que caracterizam cada “época de revolução social”.”


“A história dos Estados Unidos é trespassada em profundidade por transformações tendenciais da tradição judaico-cristã como tal, em uma espécie de religião nacional que consagra o exceptionalism do povo americano e a missão salvadora a ele confiada.
Mas essa mistura de religião e política não é sinônimo de fundamentalismo? Não é por acaso que o termo fundamentalismo aparece pela primeira vez em âmbito norte-americano e protestante — e como designação positiva e orgulhosa de si.
Podemos agora entender as ressalvas de Freud e Keynes. Obviamente, nos governos que se sucedem nos Estados Unidos, não faltam os hipócritas, os calculistas, os cínicos; mas não há motivo para duvidar da sinceridade de Wilson ontem, ou de Bush Jr. hoje. Não se deve perder de vista que estamos em presença de uma sociedade com baixa escolarização, na qual 70% dos habitantes acreditam no diabo, e mais de um terço dos adultos creem que Deus fala diretamente com eles.
Mas este é um fator de força e não de fraqueza. A tranquila certeza de representar uma causa santa e divina facilita tanto a mobilização coletiva em momentos de crise, como também a remoção ou banalização das páginas mais tenebrosas da história dos EUA. Sim, no decorrer da Guerra Fria, Washington encenou na América Latina sanguinários golpes de Estado e impôs ferozes ditaduras militares; na Indonésia de 1965, promoveu o massacre de duas centenas de milhares de comunistas e filo-comunistas, porém, por mais desagradáveis que sejam, esses detalhes não chegam a ofuscar a santidade da causa encarnada pelo “Império do Bem”.
Weber está mais próximo da realidade quando, no decurso da Primeira Guerra Mundial, denuncia o “cant”. O “cant” não é a mentira e nem é propriamente a hipocrisia consciente, é a hipocrisia de quem consegue mentir até para si próprio; é um pouco a falsa consciência de que fala Engels. Tanto em Keynes quanto em Freud, manifestam-se a um só tempo a força e a fraqueza do Iluminismo. Largamente imunizada face à ideologia imperial-religiosa que faz furor do outro lado do Atlântico, a Europa, ainda assim, mostra-se incapaz de compreender adequadamente aquela mistura de fervor moral, fervor religioso e lúcida e inescrupulosa perseguição da hegemonia política, econômica e militar em nível mundial.
Mas é essa mistura, essa mescla explosiva, esse fundamentalismo peculiar que constitui hoje o principal perigo para a paz mundial. O fundamentalismo islâmico refere-se, mais que a uma determinada nação, a uma comunidade de povos, os quais, não sem razão, veem-se postos como alvo de uma política de agressão e ocupação militar. O fundamentalismo norte-americano, por sua vez, transfigura e inebria um país bem determinado, o qual, amparado na consagração divina, considera irrelevante a ordem internacional vigente: as leis apenas humanas. É neste quadro que se promove a deslegitimação da ONU, o substancial descarte da Convenção de Genebra, as ameaças dirigidas não só aos inimigos, mas também aos “aliados” da Otan.”


“Retomemos ao jovem indochinês que vimos denunciar, em 1924, enquanto vivia nos EUA, o horror dos linchamentos de negros. Dez anos mais tarde, ele retorna à terra natal para assumir o nome, mais tarde celebrizado no mundo inteiro, de Ho Chi Minh. No momento dos ferozes bombardeios desfechados por Washington, terá o dirigente vietnamita pensado no honor da violência antinegros promovida pelos campeões da white supremacy?
Em outras palavras, a emancipação dos afro-americanos e a conquista por eles de direitos civis e políticos realmente significaram uma virada? Ou os Estados Unidos continuam a ser em essência uma Herrenvolk democracy1, ainda que se procurem desculpas já não no território metropolitano, mas fora dele, como tantas vezes aconteceu no âmbito da história da “democracia” europeia?
Podemos examinar o problema de maneira prospectiva, a partir de uma reflexão de Kant: “O que é um monarca absoluto? É aquele que, quando ordena – faça-se a guerra –, a guerra se faz”. Tem-se em mente aqui não os Estados do Antigo Regime, mas a Inglaterra, que, no entanto, tinha atrás de si mais de um século de desenvolvimento liberal.
Do ponto de vista do grande filósofo, o presidente dos Estados Unidos devia ser considerado duplamente despótico. Primeiro, dada a emergência nas últimas décadas de uma "imperial presidency”, que, ao empreender a ação militar, com frequência coloca o Congresso diante de um fato consumado. Porém, interessa-nos sobretudo o segundo aspecto: a Casa Branca decide a ocupação militar desses países de modo soberano, quando as decisões da ONU são vinculantes ou quando não o são; decide soberanamente quem são os rogue States2, contra os quais é lícito impor um embargo, esfaimando um povo inteiro, ou quando é lícito despejar um inferno de chamas, inclusive mísseis com urânio empobrecido e cluster bombs3, que continuam a atingir a população civil bem depois de terminado o conflito. Sempre de modo soberano, a Casa Branca decide a ocupação militar desses países por todo tempo que considere necessário, condenando à forca ou encarcerando seus dirigentes e os “cúmplices” destes. Contra eles, e os “terroristas”, é lícito recorrer até ao “targed killing4, ou mesmo a um “killing” que nada tem de “targed”, por exemplo o bombardeio de um restaurante qualquer onde se suspeite que Saddam Hussein possa estar...
É claro que as garantias jurídicas não têm validade para os “bárbaros”. Mas, reparando bem, como demonstra o Patriot Act5, o rufe of law6, não se aplica tampouco aos que, mesmo não sendo “bárbaros” no sentido estrito do termo, podem ser suspeitos de fazer o jogo destes.
É interessante acompanhar a história da expressão “rogue States”. Por longo tempo, na Virgínia dos séculos 17 e 18, os semiescravos – escravos temporários, brancos – que eram capturados depois de tentativa de fuga, que amiúde empreendiam, eram marcados com ferro em brasa, com a letra R, de “rogue”; e, assim identificados, não tinham mais escapatória. Mais tarde, o problema da identificação foi resolvido definitivamente com a substituição dos semiescravos brancos por escravos negros: a cor da pele tornava supérflua a marca do ferro; um negro era intrinsecamente sinônimo de rogue.
Agora, Estados inteiros são marcados com o ferrete de ”rogue”. A Herrenvolk democracy é dura de matar...
Esta é uma velha história. Mas é nova, entretanto, a intolerância crescente de Washington em relação aos “aliados”. Também estes são chamados a inclinar-se, sem muitas tergiversações, à vontade da nação eleita por Deus. São compreensíveis as perplexidades e reações negativas provocadas pelo comportamento de um presidente dos Estados Unidos que se comporta como soberano planetário não vinculado, nem limitado, a nenhum organismo internacional. E eis que os ideólogos da guerra bradam escandalizados quando se dissemina esta moléstia horrível que é, como sabemos, o antiamericanismo.”
1: “Democracia” onde apenas os etnicamente dominantes detêm o poder.
2: Estados fora da lei.
3: Bombas de fragmentação.
4: Assassinato seletivo.
5: Act patrioct, decreto de George W. Bush após os ataques das torres gêmeas que hipertrofiava as prerrogativas dos órgãos de defesa estadunidenses, permitindo inclusive interceptação de ligações telefônicas e e-mails sem autorização judicial. Posteriormente ele foi prorrogado no mandato de Barack Obama e, mais adiante, foi substituído pelo USA Freedom Act, que alterou algumas destas prerrogativas.
6: Império da lei.

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