Editora: Novo Século
ISBN:
978-85-7679-174-4
Tradução: Lya Luft
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 552
Sinopse: Publicado em 1915, A viagem é o
primeiro romance de Virginia Woolf e também um dos mais brilhantes e difíceis
livros de sua carreira. Embora a autora tenha sofrido consideráveis perdas
familiares durante a redação da obra, nela já estão presentes as magníficas
características de sua linguagem e de seu estilo.
Apesar
de ter sido uma crítica ferina tanto da romantização, quanto da caracterização
pseudo-realista dos enredos e personagens, Virginia Woolf deixa transparecer
aqui elementos e dados mais imediatos de sua vida pessoal, familiar e social.
Pode se dizer que Rachel Vinrace é ela própria, assim como Helen e Ridley são
seus pais. No entanto, já em seu primeiro romance, o que interessa a Virginia
Woolf não é apenas a elaboração de um interessantíssimo enredo – basta dizer
que uma das regiões desta viagem é a boca do Amazonas. É, antes de tudo,
transformar o texto num espaço em que o leitor descubra que a experiência
literária consiste em libertar-se da vida cotidiana e viajar para além de seus
constrangimentos e limites.
“Sentir qualquer coisa intensamente era criar
um abismo entre si mesma e outros, que sentem intensa mas talvez diferentemente.
(...) Era como se ninguém jamais dissesse algo que fosse realmente sincero, ou jamais
falasse de uma emoção que sentia, mas para isso existia a música. Com a realidade
residindo no que se via ou se sentia, mas não se comentava, era possível aceitar
um sistema em que as coisas giravam de modo bastante satisfatório para outras pessoas,
sem se perturbar em pensar sobre elas com frequência, exceto como algo superficialmente
estranho.”
“– É preferível ser um assassino a um chato.”
“– Ah, mas a esta altura concordamos em que a
natureza é um erro. Ou é muito feia, espantosamente desconfortável, ou absolutamente
aterradora. Não sei o que me deixa mais alarmado: uma vaca ou uma árvore. Uma vez
encontrei uma vaca no campo à noite. A criatura me olhava. Acreditem, fiquei de
cabelo branco. É uma desgraça permitirem animais assim à solta.
– E o que foi que a vaca pensou dele? –
murmurou Venning para Susan.”
“– Acho que é preciso entender uma coisa. Nunca
haverá no mundo mais do que cinco pessoas com quem valha a pena falar.
– Cinco pessoas? – comentou Helen. – Eu diria
que há mais do que cinco.
– Então a senhora tem muita sorte – disse Hirst.
– Ou talvez eu tenha azar.”
“Quando duas pessoas estão casadas há anos, parecem
tornar-se inconscientes da presença corporal uma da outra, de modo que se movem
como se estivessem sozinhas, falam alto coisas que não esperam respostas, e em geral
parecem experimentar todo o conforto do isolamento sem a solidão.”
“– Eu quero escrever um romance sobre o silêncio
– disse Hewet –, as coisas que as pessoas não dizem. Mas a dificuldade é imensa.
Porém, a senhorita não se importa – continuou ele. Olhava-a quase com severidade.
– Ninguém se importa. Só se lê um romance para ver que tipo de pessoa é o escritor
e, se é conhecido, para ver quais de seus amigos ele colocou no livro. Quanto ao
romance em si, toda a concepção, a maneira como se vê a coisa, como se sente, como
se relaciona com outras coisas, nem uma pessoa num milhão se interessa por isso.
Mas às vezes fico imaginando se há alguma coisa no mundo inteiro que valha tanto
a pena ser feita. Essas outras pessoas – ele apontou o hotel – estão sempre querendo
algo que não conseguem ter. Mas há uma extraordinária satisfação em escrever, mesmo
em tentar escrever. O que a senhorita acaba de dizer é verdade: não queremos ser
coisas; queremos apenas poder vê-las. (...) Parece-me tão complicado e confuso.
Não se pode tomar decisão alguma; e somos cada vez menos capazes de fazer um julgamento.
Você acha isso? E depois, nunca sabemos o que sentimos. Estamos todos no escuro.
Tentamos descobrir, mas pode imaginar algo mais ridículo do que a opinião de uma
pessoa acerca de outra pessoa? Achamos que sabemos, mas na verdade não sabemos.”
“– Graças a Deus, não sou como você, Helen! Às
vezes acho que você não pensa, nem sente, nem se importa, nem faz nada senão existir!
Você é como Mr. Hirst. Vê que as coisas estão ruins e orgulha-se de dizer isso.
É o que chama de ser honesta; na verdade isso é ser preguiçosa, ser chata, ser nada.
Você não ajuda; liquida com as coisas.”
“Quando se cria expectativas, sempre há desapontamentos.”
“– É tão raro pensarmos em algo além de nós mesmos
que uma ferroada de vez em quando é até agradável.”
“O amor parece explicar todas as coisas.”
A editora Novo Século inseriu no livro um lamentável prefácio de Antonio Bivar. Primeiramente, ele forçou imensamente a barra tentando fazer crer que o enredo do livro se passa no Brasil (se passa na América do Sul, em local de exuberante natureza, onde TODOS os nativos falam espanhol, portanto, é absolutamente incongruente supor que o livro se passaria no Brasil). Mas isso não foi nada. Neste mesmo prefácio, sem mais nem menos, seu autor contou o final do livro (!!!), um spoiler dos mais ridículos que li na vida.
ResponderExcluirAo invés de preocupar em contar o final do livro antes mesmo de ele ter começado, a editora poderia se preocupar mais em corrigir os inúmeros erros de português contidos ao longo da obra.
Adorei esse blog!
ResponderExcluirTrechos de livros certamente me trarão maior interesse à leitura do que essas resenhas tão comuns em blogs por aí.
\o/
Apesar do livro ter ganhado três estrelas, os trechos selecionados são muito bons. Destaco três:
ResponderExcluir“- Ah, mas a esta altura concordamos em que a natureza é um erro. Ou é muito feia, espantosamente desconfortável, ou absolutamente aterradora. Não sei o que me deixa mais alarmado: uma vaca ou uma árvore. Uma vez encontrei uma vaca no campo à noite. A criatura me olhava. Acreditem, fiquei de cabelo branco. É uma desgraça permitirem animais assim à solta.
- E o que foi que a vaca pensou dele? – murmurou Venning para Susan.”
“Quando se cria expectativas, sempre há desapontamentos.”
“- É tão raro pensarmos em algo além de nós mesmos que uma ferroada de vez em quando é até agradável.”