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quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

A busca do graal: O herege – Bernard Cornwell

Editora: Record
ISBN: 978-85-0106-867-5
Tradução: Luiz Carlos do Nascimento Silva
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 392
Sinopse: Em O herege, terceiro romance da trilogia A Busca do Graal — iniciada com o romance O arqueiro — Bernard Cornwell conta uma saga tão empolgante quanto as aventuras de Artur e seus cavaleiros narradas na série As Crônicas de Artur, que conquistou milhares de fãs mundo afora. O livro apresenta os elementos que consagraram Cornwell: história e aventura na dose exata. Uma fábula sobre guerra e heroísmo que encanta do início ao fim. Mas O herege não se resume a cenas de batalhas bem escritas e reviravoltas cheias de ação e suspense. O material impõe um diferente tratamento à Guerra dos Cem Anos e mostra a importância de outros acontecimentos além das famosas batalhas de Crecy, Poitiers e Azincourt. Mudanças políticas, a ascensão da classe burguesa e a devastação da Peste Negra são tão importantes quanto a habilidade do herói ou as conquistas do Príncipe Negro. Tudo isso a partir do ponto de vista do arqueiro inglês Thomas Hookton.
Depois de participar do cerco de Calais, o jovem Thomas reúne um grupo de homens e viaja para o interior da França. Pretende tomar uma fortificação na Gasconha, perto da Astarac de seus antepassados, e assim chamar a atenção do primo Guy Vexille, o assassino de seu pai que, como Thomas, também segue a trilha do Santo Graal. Durante a jornada, deixa um rastro de aldeias saqueadas e, em uma delas, salva da fogueira uma jovem acusada de feitiçaria. Uma mulher que faz com que Thomas perca o controle sobre parte de seus guerreiros, ameaçando o sucesso da missão mais importante de sua vida: encontrar a maior relíquia de toda a Cristandade. Entre arqueiros, mercenários, reis, monges, guerreiros, cardeais, inquisidores, nobres e lindas mulheres, Thomas leva os leitores ao desfecho de uma aventura inesquecível pelo século XIV. Um livro apaixonante sobre um dos períodos mais conturbados da história inglesa. Cornwell confirma com O herege a reputação conquistada com sua releitura das aventuras de Artur e seus cavaleiros.


“Ele atirava sem pensar. Sem mirar. Aquilo era a sua vida, sua perícia e seu orgulho. Pegar um arco, mais alto do que um homem, feito de teixo, e usá-lo para disparar flechas de freixo, com penas de ganso na extremidade e armadas com ponta de estilete. Como o grande arco era puxado até a orelha, de nada adiantava tentar mirar com o olho. Eram anos de prática que permitiam saber aonde iriam suas flechas, e Thomas as disparava em ritmo alucinado, uma flecha a cada três ou quatro segundos, e as penas brancas cortavam o ar em direção ao outro lado do pântano, e as compridas pontas de aço atravessavam cotas de malha e couro e penetravam em barrigas, peitos e coxas franceses. Elas atingiam o alvo com o som de um machado de açougueiro caindo sobre carne, e faziam com que os cavalarianos parassem. Os dois que lideravam o grupo estavam morrendo, um terceiro estava com uma flecha no alto da coxa, e os homens que vinham atrás não podiam passar pelos feridos que estavam na frente porque a trilha era estreita demais, e por isso Thomas começou a atirar contra os soldados desmontados. A força do impacto de uma flecha era suficiente para jogar um homem para trás. Se um francês erguia um escudo para proteger a parte superior do corpo, Thomas mandava uma flecha nas pernas, e se o arco dele estava velho, ainda era perverso. Thomas estivera navegando mais de uma semana e sentia a dor nos músculos das costas enquanto puxava a corda. Mesmo puxar o arco enfraquecido era o equivalente a levantar do chão um homem adulto, e toda aquela potência era transferida para a flecha. Um cavaleiro tentou avançar pela lama, mas o seu pesado corcel patinhou no terreno encharcado; Thomas escolheu uma flecha para penetrar carne, com uma ponta grossa, que furasse as entranhas e os vasos sanguíneos, e disparou-a a baixa altura, viu o cavalo estremecer, apanhou uma furadora do chão e disparou-a contra um soldado que estava com a viseira levantada. Thomas não olhou para ver se qualquer uma das flechas tinha atingido o alvo, disparou e apanhou outro projétil, depois tornou a disparar, e a corda do arco raspou o braçal de osso que ele usava no pulso esquerdo. Ele nunca se preocupara em proteger o pulso antes, gostando do calor deixado pela corda, mas o dominicano torturara o seu antebraço esquerdo e o deixara encrespado com cicatrizes, de modo que agora a bainha de osso protegia a pele.”


“Um grande barulho no pátio lá embaixo fez com que o padre Roubert tornasse a olhar pela janela. Ele teve de se inclinar muito à frente, porque mesmo ali, a doze metros de altura na torre, as paredes ainda tinham metro e meio de espessura. Um cavaleiro vestindo uma armadura completa acabara de atacar o quintana no pátio e sua lança atingiu o escudo de madeira com tanta força, que toda a armação desabou.
– O seu sobrinho está brincando — disse ele enquanto recuava da janela e endireitava o corpo.
– Meu sobrinho e os amigos dele estão treinando – corrigiu o conde.
– Seria melhor ele cuidar da alma – disse o padre Roubert, mal-humorado.
– Ele não tem alma, é soldado.”


“O pai de Thomas sempre dissera que a beleza provocava tanto ódio quanto amor, porque a beleza era anormal, uma ofensa contra a lama, as cicatrizes e o sangue da vida comum.”


“– Daqui a um ou dois dias – disse, falando em inglês para que Genevieve não entendesse –, o Robbie vai querer queimá-la.
– Queimá-la? – perguntou Thomas, espantado. – Não, o Robbie, não. Ele quer salvá-la.
– Ele a deseja – disse Sir Guillaume –, e se não puder ficar com ela, vai decidir que ninguém deverá ficar. – Ele deu de ombros, e depois mudou para o francês. – Se ela fosse feia – olhou para Genevieve enquanto fazia a pergunta –, será que estaria viva?
– Se ela fosse feia – disse Thomas –, duvido que tivesse sido condenada.”


“– Seja bem-vindo ao mosteiro de São Sever.
– São Sever? – perguntou Robbie enquanto tirava o escudo que pendia do seu pescoço.
– Dizem que ele consertou a asa de um anjo neste vale. Às vezes, acho muito difícil acreditar nisso, mas Deus gosta de testar a nossa fé, e por isso rezo para São Sever todas as noites e agradeço a ele o milagre que fez e peço-lhe que me conserte como consertou a asa branca.
Robbie sorriu.
– O senhor precisa de conserto?
– Todos nós precisamos. Quando somos jovens, é o espírito que quebra, e quando ficamos velhos, é o corpo.”


“– E se eles não mandarem o dinheiro? – perguntou Faircloth.
– A honra existe, não existe? – disse Sir Guillaume. – Quer dizer, nós saqueamos, roubamos, estupramos e matamos, mas nunca tapeamos uns aos outros quanto a resgates. Meu doce Jesus! Se isso acontecesse jamais se poderia confiar em outra pessoa.”


“– Mas o que é que você faria com o Graal, Guy Vexille?
– Eu iria usá-lo – respondeu Vexille.
– Para quê?
– Para limpar o mundo do pecado.
– Seria um trabalho notável – disse Planchard –, mas nem Cristo conseguiu realizá-lo.
– Você para de eliminar ervas daninhas entre os vinhedos só porque elas sempre voltam a nascer? – perguntou Vexille.
– Não, é claro que não.
– Pois então a obra de Cristo tem de continuar – disse Vexille.
     O abade ficou olhando para o soldado por algum tempo.
– Você é o instrumento de Cristo? Ou o instrumento do cardeal Bessières?
Vexille fez uma careta.
– O cardeal é como a Igreja, Planchard. Cruel, corrupto e maligno.”


“– Vou ficar aqui – insistiu ele. – Vou morrer ao ar livre.
– Você não vai morrer – disse Thomas. – O céu não vai aceitá-lo, e o diabo não precisa de concorrentes.”


“– Houve uma peste na Itália – disse Thomas – e deve ter vindo para cá.
– Jesus Cristo – disse Sir Guillaume. – Que tipo de peste?
– Só Deus sabe – respondeu Thomas. – Uma peste violenta.
Observou um homem, envolto num lençol ensanguentado, entrar na rua principal cambaleando e cair ao chão. O homem ficou imóvel, parecendo que já estava em sua mortalha.
– Em nome de Deus, o que é que está acontecendo? – perguntou Sir Guillaume, fazendo o sinal-da-cruz. – Você já viu algo parecido?
– É a ira de Deus – disse Thomas – castigando a gente.
– Por quê?
– Por estarmos vivos – disse Thomas, com amargor.”

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