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domingo, 16 de maio de 2010

Moby Dick – Herman Melville

Editora: Cosac Naify
ISBN: 978-85-7503-670-9
Tradução: Irene Hirsch e Alexandre Barbosa de Souza.
Opinião: ★★★★☆
Páginas: 656
Sinopse: Versão definitiva da obra-prima Moby Dick, ou A Baleia, considerado um dos maiores romances norte-americanos. O livro traz o relato de um marinheiro letrado, Ishmael, sobre a última viagem de um navio baleeiro de Nantucket, o Pequod, que parte da costa leste dos Estados Unidos – com sua tripulação multiétnica – rumo ao Pacífico Sul, onde encontra o imenso cachalote branco que, no passado, arrancara a perna do vingativo capitão Ahab. Ao longo de 135 capítulos, Herman Melville (1819-1891) explora com brilhantismo e ironia os mais variados gêneros literários: da narrativa de viagens ao teatro shakespeariano, do sermão à poesia popular, passando pela descrição científica e a meditação filosófica.
A nova tradução se vale da longa experiência acadêmica da tradutora Irene Hirsch com a obra de Melville e de um minucioso trabalho de pesquisa de vocabulário náutico por parte do tradutor Alexandre Barbosa de Souza.
O volume inclui ainda fortuna crítica com três textos fundamentais para a compreensão da obra: uma resenha de Evert Duyckinck, publicada em 1851; o clássico ensaio de D. H. Lawrence, incluído em Studies in Classic American Literature, de 1923, e um trecho do célebre estudo de F. O. Mathiessen, American Renaissance, de 1941. Além disso, a edição traz apêndice com Glossário Náutico Ilustrado e bibliografia.


“Melhor dormir com um canibal sóbrio do que com um cristão bêbado”.


“Em que recenseamento de seres vivos estão incluídos os mortos da humanidade; por que há um provérbio que afirma que os mortos não falam, embora saibam mais segredos que Goodwin Sands; como se explica que, ao nome daquele que partiu ontem para outro mundo, nós associemos uma palavra tão significativa e inverídica, e no entanto não a associemos a ele, que parte para as Índias mais remotas; por que as companhias de seguro pagam pela morte de imortais; em que paralisação eterna e imóvel, e transe mortífero e desesperado, jaz o antigo Adão, morto há sessenta séculos; como é possível que ainda não encontremos consolo pela perda daqueles que afirmamos estar na mais completa bem-aventurança; por que todos os vivos se esforçam tanto para não mencionar os mortos; por que motivo um simples ruído num túmulo assusta uma cidade inteira? Todas essas coisas têm seu significado.
Mas a Fé, como um chacal, se alimenta por entre os túmulos, e mesmo dessas dúvidas mortais recolhe sua esperança mais vital.”


“Pois é, existe a morte neste negócio baleeiro – um modo caótico, rápido e sem palavrório de empacotar o homem para a Eternidade. Mas e daí? Parece-me que estamos profundamente equivocados a respeito dessa história de Vida e Morte. Parece-me que, olhando para as coisas espirituais, somos como ostras observando o sol através da água e achando que a água espessa é o ar mais sutil.”


“De resto, todas as coisas que Deus ordena são difíceis de cumprir – lembrem-se disso – e por isso é mais frequente ouvi-Lo comandar do que tentar nos persuadir. E para obedecermos a Deus temos que desobedecer a nós mesmos; é nesta desobediência de nós mesmos que consiste a dificuldade de obedecer a Deus.”


“Como o Ramadã, (a Quaresma) ou Jejum e Penitência de Queequeg iria continuar durante o dia, resolvi não incomodá-lo até o cair da noite; porque sinto muito respeito pelas obrigações religiosas das pessoas, por mais ridículas que sejam, e não subestimaria nem mesmo uma congregação de formigas adorando um cogumelo.”


“As memórias mais profundas não concedem epitáfios.”


““Não quero no meu bote”, dizia Starbuck, “homem que não tenha medo de baleia.” Com isso parecia querer dizer não apenas que a coragem mais útil e confiável é a que surge de uma avaliação justa do perigo iminente, mas também que um homem totalmente destemido é um sujeito muito mais perigoso do que um homem covarde.”


“É mesmo duvidoso que Stubb pensasse na morte; mas, se lhe ocorresse tal ideia depois de um agradável jantar, consideraria, como um bom marinheiro, que se tratava de um chamado do vigia para subir ao topo do mastro e ocupar-se com algo cuja natureza descobriria ao cumprir a ordem, e não antes.”


“– Raios me partam, valeria a pena nascer neste mundo nem que fosse apenas para dormir. A propósito, essa é praticamente a primeira coisa que os bebês fazem, e isso também é um pouco esquisito. Raios me partam, mas tudo é esquisito, quando se pensa a respeito. Mais isso é contra os meus princípios. Não pensar, meu décimo primeiro mandamento, e dormir quando puder, o décimo segundo.”


“Quem ofereceu um jantar aos amigos uma só vez já provou o que é ser César. É um feitiço do czarismo social que não encontra resistência.”


“São poucos os homens cuja coragem resiste à reflexão prolongada sem o alívio da ação.”


“O primeiro barco de que lemos notícia flutuou num oceano que, em vingança digna de um Português, inundou um mundo inteiro sem nem deixar sequer uma viúva. Aquele mesmo oceano se agita agora; aquele mesmo oceano destruiu os navios naufragados do ano passado. Sim, mortais insensatos, o dilúvio de Noé ainda não cessou; dois terços do belo mundo ele ainda cobre.”


“Quando os botes a circundaram mais de perto, toda a sua porção superior, grande parte da qual em geral fica submersa, estava bem visível. Seus olhos, ou melhor, os lugares onde antes estavam, podiam ser vistos. Do mesmo modo que substâncias estranhas crescem nos olhos dos nós dos carvalhos mais nobres, quando derrubados, assim também nos lugares onde os olhos da baleia haviam estado saíam bulbos cegos, uma comiseração horrível de ser vista. Mas não havia clemência. Apesar de toda a sua idade, apesar da sua única barbatana e dos seus olhos cegos, ela devia morrer aquela morte horrível, assassinada para iluminar as núpcias alegres e outras festividades dos homens, e também para iluminar as igrejas solenes que pregam que todos devem ser incondicionalmente inofensivos uns para os outros.”


“De camisetas e de ceroulas, lançamo-nos ao freixo dos nossos remos, e depois de fazer força por várias horas estávamos quase desistindo da caça, quando as baleias, numa hesitação generalizada, deram sinais de que estavam, por fim, sob a influência daquela estranha perplexidade da indecisão inerte, que os pescadores, quando a percebem nas baleias, dizem que estão sarapantadas. As compactas fileiras marciais em que haviam nadado, depressa e com determinação, até ali, agora se desfaziam numa balbúrdia desmedida; e, como os elefantes do rei Poro na batalha da Índia contra Alexandre, pareciam ensandecidos de consternação. Espalhavam-se em todas as direções, formando vastos círculos irregulares, nadando sem rumo de um lado para o outro, e os seus sopros espessos e curtos demonstravam claramente estarem confusas de pânico. Isso ficava ainda mais estranhamente demonstrado por algumas dentre elas que, estando completamente paralisadas, flutuavam indefesas como navios despedaçados quase a pique. Se esses Leviatãs fossem um simples rebanho de ovelhas perseguidas no pasto por três lobos ferozes, não teriam demonstrado mais horror. Mas essa timidez eventual é uma característica de quase todas as criaturas que vivem em rebanhos. Embora formem manadas de dezenas de milhares, os búfalos do oeste, com as suas jubas de leão, fogem quando veem um cavaleiro solitário. Seres humanos também são testemunhas de que, quando aglomerados no aprisco da plateia de um teatro, ao menor sinal de alarme de fogo, logo começa o corre-corre em busca das saídas, empurrando, pisoteando, apertando e atirando uns aos outros à morte. Melhor, portanto, é refrear todo espanto diante de baleias estranhamente sarapantadas, pois não existe insensatez de animal algum da terra que não seja infinitamente superada pela loucura dos homens.”


“Muito esforço e poucos ganhos para aos que pedem ao mundo que lhes dê uma explicação; o mundo não pode explicar-se.”


“Nem, àquelas alturas, deixou de passar por sua mente monomaníaca que toda a angústia de seu sofrimento fosse consequência direta de um infortúnio anterior; e ele parecia ver com clareza que, como o réptil mais venenoso do pântano perpetua sua espécie tão inevitavelmente quanto o cantor mais doce do bosque; assim também toda a desgraça, como a felicidade, gera naturalmente acontecimentos similares a si. Não exatamente como, pensou Ahab; já que a linhagem e a posteridade da Dor superam as da Alegria. Pois, para que não se subentenda isso: que se pode inferir certos ensinamentos canônicos que alguns deleites naturais deste mundo não gerarão filhos no outro mundo, mas, ao contrário, devido à esterilidade da alegria, serão seguidos de todo o desespero infernal; ao passo que os fatais sofrimentos criminosos gerarão com fertilidade para o além-túmulo uma prole eterna de tristezas sucessivas; para que não se subentenda isso, parece haver uma desigualdade, quando se analisa o assunto com profundidade. Pois, pensou Ahab, se mesmo na felicidade terrena mais elevada sempre existe oculta uma certa mesquinhez insignificante, enquanto, no fundo, todas as dores do coração escondem um significado místico e, em certos homens, uma grandeza angelical; assim, sua análise diligente não desmente a dedução óbvia. Percorrer a genealogia dessas altas misérias mortais nos conduz afinal às primogenituras sem origens dos deuses; de modo que, diante de todos os alegres sóis fecundos e das rotundas luas outonais, iluminando o suave farfalhar da colheita, é necessário dar-se conta disso: de que os próprios deuses nem sempre são felizes. O sinal de nascença, triste e indefectível na fronte do homem, é apenas a marca da tristeza dos que a imprimiram.”


“– É extraordinário como são amigáveis os idiotas!”

Um comentário:

  1. Congratulo a editora Cosac Naify pela caprichada edição do livro, que apresenta figuras, mapa, glossário náutico (bastante necessário, já que o léxico marítimo é incomum), textos (a título de pós-fáscio) de Evert Duyckinck, D.H Lawrence e F. O. Matthiessen. Além disso, seu apêndice contém uma bela bibliografia sobre a obra e sobre o autor, as edições do livro no Brasil e de outras obras de Melville.
    A editora foi feliz no trabalho que realizou, aqui dedico meus sinceros parabéns.

    “- Lá ela sopra!”

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