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sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Os Pastores da Noite – Jorge Amado

Editora: Record
ISBN: 978-85-0105-236-0
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 305
Sinopse: Narrativa densa e madura em que o autor satiriza as contradições da sociedade brasileira, enlaçando de modo irresistível alguns de seus motivos permanentes: a luta pela emancipação social, a força da cultura popular, a mesquinhez e o ridículo da elite.
Escrito às vésperas do golpe militar de 1964, este romance modelar se constrói em três partes autônomas, interligadas por personagens comuns: prostitutas, boêmios, vigaristas, a comunidade notívaga de Salvador, com suas leis e valores próprios: o culto à cachaça, o ódio à polícia, o horror ao trabalho.
Na primeira parte, o cabo Martim, craque dos baralhos marcados e dos dados viciados, sedutor cobiçado, aparece com companheira fixa e planos de constituir um lar. A notícia cai como uma bomba entre os pastores da noite. A segunda narrativa trata do batizado do filho de Massu, negro musculoso que ganha a vida fazendo pequenos fretes. O padrinho do menino é o próprio Ogum, e assim o batizado mobiliza a noite da cidade, embaralhando candomblé e catolicismo. Na última parte, a ocupação do morro do Mata Gato por desabrigados desencadeia um conflito social e político. O dono do terreno recorre à polícia, mas entram em cena outras forças e interesses: autoridades governamentais, imprensa corrupta, banqueiros do jogo do bicho.
O romance foi levado ao cinema em 1976 pelo francês Marcel Camus, e em 1995 a segunda parte do livro virou a minissérie de tevê O compadre de Ogum.

“E, se não fôssemos nós, pontais ao crepúsculo, vagarosos caminhantes dos prados do luar, como iria a noite – suas estrelas acendidas, suas esgarçadas nuvens, seu manto de negrume –, como iria ela, perdida e solitária, acertar os caminhos tortuosos dessa cidade de becos e ladeiras? Em cada ladeira um ebó, em cada esquina um mistério, em cada coração noturno um grito de súplica, uma pena de amor, gosto de fome nas bocas de silêncio, e Exu solto na perigosa hora das encruzilhadas. Em nosso apascentar sem limites, íamos recolhendo a sede e a fome, as súplicas e os soluços, o estrume das dores e os brotos da esperança, os ais de amor e as desgarradas palavras doloridas, e preparávamos um ramalhete cor de sangue para com ele enfeitar o manto da noite.
Varávamos os distantes caminhos, os mais estreitos e tentadores, chegávamos às fronteiras da resistência do homem, ao fundo de seu segredo, iluminando-o com as trevas da noite, enxergávamos seu chão e suas raízes. O manto da noite cobria toda a miséria e toda a grandeza e as confundia numa só humanidade, numa única esperança.”


“E de repente, quando todos o pensavam por inteiro devotado àquele amor profundo e recente – nem um mês ainda se passara, a contar do primeiro encontro na Gafieira –, eis o escândalo a envolver Martim: agredido por um sapateiro, nas proximidades do Terreiro de Jesus, ferido a faca no ombro. O sapateiro, avisado por uma vizinha assanhada, solteirona, é claro, fora encontrar sua esposa na cama com Martim, e esquecida das obrigações familiares, em plena tarde de dia útil. Estava o sapateiro trabalhando quando a intrigante cochichou-lhe a desventura: levantou-se levando a faquinha de cortar couro, precipitou-se para casa, atirou-se sobre Martim, atingindo-o no ombro. Os vizinhos impediram desgraça maior: o sapateiro querendo matar a mulher, suicidar-se, necessitando de sangue para lavar os chifres. Com tanta balbúrdia, acabaram todos na polícia e saiu notícia nos jornais, na qual o cabo Martim era tratado como sedutor. Ficou Martim muito vaidoso com esse qualificativo, guardou o recorte no bolso para exibi-lo.”


“Só tem uma coisa que eu quero te dizer: quando a gente discute com a mãe da gente quem tem razão é ela e mais ninguém.”


“Não era possível, a um homem só, dormir com todas as mulheres do mundo mas devia-se fazer esforço para consegui-lo, assim ensinavam no cais os velhos marinheiros.”


“Nunca teve ela marido, nem quis ligar homem à sua sina. Homem, em sua opinião, só servia na hora de fazer o menino. Depois, só dava trabalho e confusão.”


“Em negócio de gente grande, pequeno não deve se meter. Senão quem paga os pratos quebrados é a gente...”


“Os brancos lá embaixo, brancos de rico e não de cor, eram capazes de terminar por se entenderem (...). Eram graúdos, os graúdos sempre se entendem, briga entre eles não prospera.”

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