quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Norte Verdadeiro: Peary, Cook e a Corrida ao Polo, de Bruce Henderson

Editora: Objetiva
ISBN: 978-85-7302-742-6
Tradução: Marta Miranda O'Shea
Opinião: ★★★☆☆
Páginas: 356
Sinopse: No verão de 1909, dois norte-americanos, inicialmente amigos e colaboradores, reivindicaram a descoberta do Polo Norte, a mais cobiçada distinção entre os exploradores geográficos. O engenheiro civil Robert Peary afirmava ter alcançado o polo em março de 1909; seu rival, o médico Frederick Cook, rebatia com provas de que lá chegara em abril de 1908. Um século depois, a batalha entre os dois homens continua.
Norte Verdadeiro trata de uma das controvérsias mais amargas e duradouras da história da exploração, uma contenda que haveria de dividir a comunidade científica internacional e resultar na ruína de um dos reivindicantes e no descrédito do outro. Usando os argumentos e contra-argumentos de cada uma das partes, e um extenso diário publicado somente no final do século XX, o escritor americano Bruce Henderson revela qual dos dois mentiu e quem foi o verdadeiro descobridor do Polo Norte.



“Imerso naquela cultura, Cook já se parecia com um esquimó; deixou de cortar o cabelo e trocou as roupas de lã pelas peles mais quentes que os nativos usavam no inverno. Através deles soube que não adotavam qualquer forma de governo, conselho, nem possuíam chefes tribais. Não tinham sacerdotes e seus conceitos de religião eram elementares, a maioria relacionada a espíritos maus. Não acreditavam ter sido criados por um deus onipotente, embora tivessem a própria versão de Adão e Eva e da criação. Segundo a tradição esquimó, houve um dilúvio que dizimou quase toda a espécie humana. Um homem sobreviveu e mais tarde, encontrando-se numa montanha, bateu numa pedra com um bastão de madeira. A pedra transformou-se numa mulher. Esse casal deu origem a todos os seres humanos. Para o esquimó, a noção de Paraíso vinculava-se ao conforto. O Paraíso, conforme a descrição feita pelos nativos, era um local onde a paisagem era acidentada como aquelas às quais estavam acostumados, mas com sol eterno, riachos de águas límpidas e morsas, renas e aves em quantidade. Não tinham leis, nem tribais nem de qualquer outro tipo – cada família era regida pelo homem, que podia resolver, mediante o consentimento de outro homem casado, trocar de mulher. Caso não se chegasse a um consenso, os homens lutavam e o vencedor ficava com as duas mulheres.”


“Com o nascimento de bebês, no território esquimó, durante aquele inverno, Cook ficou sabendo que o atendimento de um médico não era nem requisitado, nem desejado. A sobrevivência do mais forte começava no nascimento. Quando uma mulher entrava em trabalho de parto e estava prestes a dar à luz, era conduzida a um iglu onde permanecia sozinha com a quantidade suficiente de óleo, gordura de baleia e carne congelada para duas semanas. Se ela sobrevivesse e o choro do bebê fosse ouvido, os demais se aproximavam para dar assistência à mãe e à criança. Se tudo silenciasse no iglu, este era fechado para sempre.”


“Quanto aos bebês que nasciam, Cook observou que nos dois primeiros anos a criança não usava roupa nenhuma da cintura para baixo e era carregada dentro de uma sacola às costas da mãe, junto ao calor do seu corpo. Uma criança era amamentada durante quatro ou seis anos, ou até que a mãe tivesse outro bebê; normalmente a diferença de idade entre as crianças era de quatro anos. Quando nasciam gêmeos, ambos eram mortos, pois se considerava impossível que a mãe carregasse e cuidasse de duas crianças. Quando morria a mãe ou o pai de uma criança com menos de três anos de idade, esta era estrangulada com uma tira de couro de foca. O gesto não era considerado cruel ou desapiedado e sim a fatalidade mais rápida que poderia se abater sobre tal criança diante de um mundo implacável. Ter pai e mãe era fator decisivo para uma criança, escreveu Cook, “numa região onde não existe animal ou vegetal vivos, durante meses seguidos, para se manter uma família. É preciso que estejam presentes o pai para caçar focas e a mãe para criar o bebê, até que ele tenha idade suficiente para cuidar de si mesmo. Todos os esquimós lamentam o costume que lhes foi transmitido pelos ancestrais, mas admitem sua necessidade.”


“A relutância dos esquimós em percorrer a calota de gelo não se baseava apenas na superstição e no temor aos espíritos maus, era também uma questão de bom senso. Desde os primórdios da exploração, os nativos do Ártico jamais compreenderam o interesse dos visitantes brancos em explorar regiões áridas, isoladas. Por longo tempo, os nativos sobreviveram ao rigor do frio, aprendendo a buscar a caça, normalmente no litoral ou nas proximidades, ou procurando simplificar a vida, em vez de dificultá-la. Quando se deparavam com grupos de homens brancos, provenientes de terras distantes, dirigindo-se a regiões onde era grande a possibilidade de passar fome e morrer, não se inclinavam a acompanhá-los”.


“Cheguei onde não havia qualquer longitude.” (Cook)

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